Do blog: A justiceira de esquerda |
Em minha opinião, a hesitação de Joaquim Barbosa para ingressar de vez na campanha presidencial não envolve nenhuma dúvida interna, mas um fator externo e inconfessável: Lula.
Candidatos que entram numa disputa eleitoral com a fantasia do "novo" na política contam com várias vantagens comparativas em relação aos competidores conhecidos. Mas sua natureza é um elemento de risco. A identidade de "novo" é como um palito de fósforo e só pode ser riscado uma vez.
Não pode falhar - neste caso, o destino é o lixo ou a mediocridade, destino que acompanha ministros e procuradores europeus que em anos recentes correram atrás de possíveis louros eleitorais depois de fazer investigações contra a corrupção do sistema político.
Fora da carreira judicial, o procurador Antonio Di Pietro, a principal autoridade da Operação Mãos Limpas, tem uma vida política na obscuridade, que se reveza entre a Câmara de Deputados e o Senado. Eva Joly, juíza responsável pelas investigações na Elf Aquitaine, Petrobras francesa que foi esquartejada após denúncias de corrupção, chegou a disputar a presidência da República pelo Partido Verde. Após um resultado fraquíssimo, tornou-se deputada no Parlamento Europeu.
A questão de Joaquim Barbosa é saber o que acontecerá com sua campanha presidencial caso Lula consiga atravessar as imensas barreiras erguidas pelo Judiciário e garantir sua candidatura.
A diferença é gigantesca.
Caso Lula fique de fora, o país estará diante de um pleito difuso e sem referências claras, no qual as disputas de marketing e truques de publicidade podem dar o tom. A tendência é assim porque as diferenças reais de horizonte político entre os concorrentes com chance de vitória voltará ao padrão pouco diferenciado que o país possuía nas eleições realizadas antes da emergência do PT como fator de desestabilização do sistema político tradicional.
Estaremos no mais do mesmo, agravado pelo imenso coro de descontentes pela exclusão do candidato favorito em todas as pesquisas.
Neste ambiente, a biografia de Joaquim Barbosa pode fazer uma diferença, capaz de atrair o contingente de eleitores ainda empolgados pela AP 470 e pela Lava Jato. Ainda que 55% dos brasileiros considerem que Lula é vítima de perseguição judicial, como informa pesquisa do Instituto Ipsos, somados a grande massa de brasileiros pobres e negros que, vítimas de injustiças históricas, poderão ser atraídos pelo apoio já encaminhado de estrelas à direita do anti-racismo brasileiro, que envolve um pelotão cada vez mais menos oculto de personalidades globais.
Caso Lula possa se apresentar, derrotando decisões sucessivas que constituíram uma muralha quase inexpugnável para barrar sua candidatura, que só parece possível com auxílio decisivo de um vigoroso movimento popular para defender seus direitos como cidadão e como candidato, o debate eleitoral será outro.
Joaquim Barbosa será deslocado para a direita e irá disputar votos com um Geraldo Alckmin hoje enfraquecido. Também irá encontrar-se com Marina Silva na fileira de concorrentes que disputam a retórica alternativa.
Precisará definir-se com clareza sobre o conjunto de reformas implementadas por Michel Temer - a começar pelo fim da CLT - cujo apoio é condição fundamental para garantir ajuda da elite anti-Lula. O que terá a dizer sobre a independência do Banco Central, que o PSB introduziu nos debates de 2014, contribuindo para enfraquecer Marina? Poderá empregar platitudes para falar da Previdência?
Acima de tudo, Barbosa precisará enfrentar o currículo de Lula, que indiscutivelmente tem muito a apresentar na luta contra a desigualdade em geral e também à população negra, a começar pelas cotas nas universidades e programas específicos como o Pró-Uni.
Outras assombrações estarão presentes na campanha, também. No inevitável confronto de biografias que acompanha toda eleição disputada, a população poderá lembrar que, enquanto Lula subiu de baixo, na luta dos trabalhadores, e que só chegou aonde se encontra em função de seu esforço e liderança, o grande salto de Barbosa foi possível por uma decisão do presidente que agora ele quer derrotar.
É fácil entender as dúvidas de Joaquim Barbosa, vamos combinar.
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