Reproduzo artigo de Emir Sader, publicado em seu blog no sítio Carta Maior:
O Brasil saiu da ditadura política, mas as transformações estruturais que poderiam democratizar o país nos planos econômico, social e cultural, não foram realizadas. O governo Sarney representou essa frustração, essa redução da democratização aos marcos liberais da recomposição do Estado de direito e dos processos eleitorais.
Em seguida o país foi varrido pelas ondas neoliberais – com os governos de Collor, Itamar e FHC – sofrendo graves retrocessos no plano econômico – com a retração do Estado, com a abertura da economia, com as privatizações -, no plano social – com o retrocesso nas politicas sociais, com a expropriação de direitos da maioria, a começar pela carteira de trabalho –, no plano politico – com o poder do dinheiro corrompendo os processos eleitorais – e no plano cultural – com a consolidação dos grandes monopólios privados da mídia, que concentraram nas suas mãos a formação da opinião púbica.
Foi nesta década que esse processo começou a ser revertido e o Brasil pôde retomar seu processo de democratização. No plano econômico, com o Estado retomando seu papel de indutor do crescimento promovendo o acesso ao crédito a pequenas e médias empresas, com a expansão do mercado interno de consumo popular. No plano social, com a incorporação, pela primeira vez, das grandes maiorias de menor renda ao mercado de consumo e à possibilidade de ter formas de atividades econômicas rentáveis e sustentáveis. No plano político, quebrando o controle das elites mais atrasadas sobre as massas de regiões periféricas do país, com a participação nas politicas governamentais e nos processos eleitorais dos movimentos populares e dos setores até então marginalizados e subordinados politicamente. E no plano cultural, com alguns avanços, como a descentralização das publicidades governamentais, com o surgimento e fortalecimento de mídias alternativas – especialmente da internet -, assim como com um discurso que levanta a autoestima do país, quebra preconceitos em relação ao papel da mídia privada e de comportamentos egoístas da elite brasileira.
Mas as resistências não se fizeram esperar. As pressões para que o Brasil mantenha a taxa de juros mais alta do mundo, que atrai capital especulativo – que não cria nem riquezas, nem empregos, que ajuda a desequilibrar a balança comercial, entre tantos problemas – continuam fortes. Esse mecanismo impede a democratização econômica do país, porque concentra nas mãos do sistema financeiro a maior quantidade de recursos, com taxas de juros altas dificulta o acesso ao crédito, monopoliza recursos do Estado para o pagamento da dívida pública. O PAC é o grande instrumento de reconversão da hegemonia do capital especulativo para o capital produtivo, mas ele corre contra a atração da alta taxa de juros. A democratização econômica requer terminar com essa atração do capital, pela alta taxa de juros, para o setor financeiro.
A democratização social encontra obstáculos nos que se opõem à integração plena dos setores até aqui completamente marginalizados. A democratização social seus principais obstáculos nos que lutam para bloquear a expansão dos recursos para as politicas sociais que promovem os direitos de todos e nos preconceitos que continuam a ser difundidos contra os mais pobres e os habitantes das regiões até aqui marginalizadas do país.
A democratização política se choca com os que se opõem a uma reforma política que faça com que as campanhas se apoiem exclusivamente em financiamento publico e em votos por lista, que favorecem o fortalecimento ideológico e politico dos partidos. Mas encontra obstáculos também nos partidos e movimentos populares que não se dedicam a apoiar a organização dos setores que chegam agora a seus direitos econômicos e sociais básicos, seja os que estão integrados ao bolsa família, seja a cooperativas e pequenas empresas, seja a programas como os Pontos de Cultura e outros similares.
A democratização cultural significa que as distintas identidades do povo brasileiro possam construir seus próprios valores para orientar suas vidas, suas próprias formas de expressão cultural, possam ter acesso às múltiplas formas de cultura. Que possa se libertar dos modelos de consumismo importados e difundidos pela mídia comercial, pela publicidade massiva, pelos valores divulgados pelos representantes dos grandes monopólios.
Significa o direito de ter acesso livre e universal à internet, possa ter acesso à cultura como bem comum, que possa ter acesso a livros, a músicas, a pinturas, a peças de teatro, a filmes, a todas as formas de cultura e que tenha possibilidades de produzir suas próprias formas de expressão.
A democratização cultural enfrenta obstáculos na gigantesca máquina de interesses econômicos privados dos monopólios que dominam a mídia, o setor editorial, o audiovisual. Enfrenta ainda os setores mercantis que tentam dominar e controlar a livre produção e consumo culturais, as corporações que se apropriam dos recursos fundamentais das obras artísticas, incentivando ainda mais o poder econômico sobre a esfera cultural. Só mesmo um imenso processo de democratização da cultura poderá fazer do Brasil um país realmente independente, soberano, justo, plural.
Quem tem medo da democracia no Brasil? As elites, que fizeram do nosso país o mais desigual do mundo, e agora se ressentem da inclusão social dos que sempre foram postergados, discriminados, humilhados, ofendidos, marginalizados. São os que sempre tiveram todos os privilégios e acreditavam que o país era deles, que o Brasil era das elites brancas e ricas.
Quem tem medo da democratização tem medo dos trabalhadores, que produzem as riquezas do Brasil. Tem medo dos trabalhadores sem terra, que querem apenas acesso à terra no país com maior área cultivável no mundo, importa alimentos, mas mantem milhões de gente no campo sem acesso à terra. Tem medo dos jovens, que não leem jornais, mas leem e escrevem na internet, irreverentes, que lutam pela liberdade de expressão e de formas de viver, em todas as suas formas. Tem medo dos intelectuais críticos e independentes, que não tem medo do poder dos monopólios e da imprensa mercantil e suas chantagens. Tem medo dos artistas e da sua criatividade sem cânones dogmáticos e sem pensar no dinheirinho dos direitos de autor, mas na liberdade de expressão e na cultura como um bem comum. Tem medo dos nordestinos pobres, que como Lula, não se rendeu à pobreza e à discriminação e se tornou o presidente mais popular do Brasil. Tem medo de que todos eles queiram ser como o Lula.
Quem tem medo da democracia no Brasil tem saudade da ditadura, quando detinha o monopólio da palavra, conversava e elogiava os militares no poder, sem que ninguém pudesse contestá-los publicamente. Os que têm saudades do Brasil para poucos, da elite que cooptava intelectuais para governar em nome dela.
Quem não tem medo da democracia no Brasil não tem medo de nada, porque não tem medo do povo brasileiro.
O Brasil saiu da ditadura política, mas as transformações estruturais que poderiam democratizar o país nos planos econômico, social e cultural, não foram realizadas. O governo Sarney representou essa frustração, essa redução da democratização aos marcos liberais da recomposição do Estado de direito e dos processos eleitorais.
Em seguida o país foi varrido pelas ondas neoliberais – com os governos de Collor, Itamar e FHC – sofrendo graves retrocessos no plano econômico – com a retração do Estado, com a abertura da economia, com as privatizações -, no plano social – com o retrocesso nas politicas sociais, com a expropriação de direitos da maioria, a começar pela carteira de trabalho –, no plano politico – com o poder do dinheiro corrompendo os processos eleitorais – e no plano cultural – com a consolidação dos grandes monopólios privados da mídia, que concentraram nas suas mãos a formação da opinião púbica.
Foi nesta década que esse processo começou a ser revertido e o Brasil pôde retomar seu processo de democratização. No plano econômico, com o Estado retomando seu papel de indutor do crescimento promovendo o acesso ao crédito a pequenas e médias empresas, com a expansão do mercado interno de consumo popular. No plano social, com a incorporação, pela primeira vez, das grandes maiorias de menor renda ao mercado de consumo e à possibilidade de ter formas de atividades econômicas rentáveis e sustentáveis. No plano político, quebrando o controle das elites mais atrasadas sobre as massas de regiões periféricas do país, com a participação nas politicas governamentais e nos processos eleitorais dos movimentos populares e dos setores até então marginalizados e subordinados politicamente. E no plano cultural, com alguns avanços, como a descentralização das publicidades governamentais, com o surgimento e fortalecimento de mídias alternativas – especialmente da internet -, assim como com um discurso que levanta a autoestima do país, quebra preconceitos em relação ao papel da mídia privada e de comportamentos egoístas da elite brasileira.
Mas as resistências não se fizeram esperar. As pressões para que o Brasil mantenha a taxa de juros mais alta do mundo, que atrai capital especulativo – que não cria nem riquezas, nem empregos, que ajuda a desequilibrar a balança comercial, entre tantos problemas – continuam fortes. Esse mecanismo impede a democratização econômica do país, porque concentra nas mãos do sistema financeiro a maior quantidade de recursos, com taxas de juros altas dificulta o acesso ao crédito, monopoliza recursos do Estado para o pagamento da dívida pública. O PAC é o grande instrumento de reconversão da hegemonia do capital especulativo para o capital produtivo, mas ele corre contra a atração da alta taxa de juros. A democratização econômica requer terminar com essa atração do capital, pela alta taxa de juros, para o setor financeiro.
A democratização social encontra obstáculos nos que se opõem à integração plena dos setores até aqui completamente marginalizados. A democratização social seus principais obstáculos nos que lutam para bloquear a expansão dos recursos para as politicas sociais que promovem os direitos de todos e nos preconceitos que continuam a ser difundidos contra os mais pobres e os habitantes das regiões até aqui marginalizadas do país.
A democratização política se choca com os que se opõem a uma reforma política que faça com que as campanhas se apoiem exclusivamente em financiamento publico e em votos por lista, que favorecem o fortalecimento ideológico e politico dos partidos. Mas encontra obstáculos também nos partidos e movimentos populares que não se dedicam a apoiar a organização dos setores que chegam agora a seus direitos econômicos e sociais básicos, seja os que estão integrados ao bolsa família, seja a cooperativas e pequenas empresas, seja a programas como os Pontos de Cultura e outros similares.
A democratização cultural significa que as distintas identidades do povo brasileiro possam construir seus próprios valores para orientar suas vidas, suas próprias formas de expressão cultural, possam ter acesso às múltiplas formas de cultura. Que possa se libertar dos modelos de consumismo importados e difundidos pela mídia comercial, pela publicidade massiva, pelos valores divulgados pelos representantes dos grandes monopólios.
Significa o direito de ter acesso livre e universal à internet, possa ter acesso à cultura como bem comum, que possa ter acesso a livros, a músicas, a pinturas, a peças de teatro, a filmes, a todas as formas de cultura e que tenha possibilidades de produzir suas próprias formas de expressão.
A democratização cultural enfrenta obstáculos na gigantesca máquina de interesses econômicos privados dos monopólios que dominam a mídia, o setor editorial, o audiovisual. Enfrenta ainda os setores mercantis que tentam dominar e controlar a livre produção e consumo culturais, as corporações que se apropriam dos recursos fundamentais das obras artísticas, incentivando ainda mais o poder econômico sobre a esfera cultural. Só mesmo um imenso processo de democratização da cultura poderá fazer do Brasil um país realmente independente, soberano, justo, plural.
Quem tem medo da democracia no Brasil? As elites, que fizeram do nosso país o mais desigual do mundo, e agora se ressentem da inclusão social dos que sempre foram postergados, discriminados, humilhados, ofendidos, marginalizados. São os que sempre tiveram todos os privilégios e acreditavam que o país era deles, que o Brasil era das elites brancas e ricas.
Quem tem medo da democratização tem medo dos trabalhadores, que produzem as riquezas do Brasil. Tem medo dos trabalhadores sem terra, que querem apenas acesso à terra no país com maior área cultivável no mundo, importa alimentos, mas mantem milhões de gente no campo sem acesso à terra. Tem medo dos jovens, que não leem jornais, mas leem e escrevem na internet, irreverentes, que lutam pela liberdade de expressão e de formas de viver, em todas as suas formas. Tem medo dos intelectuais críticos e independentes, que não tem medo do poder dos monopólios e da imprensa mercantil e suas chantagens. Tem medo dos artistas e da sua criatividade sem cânones dogmáticos e sem pensar no dinheirinho dos direitos de autor, mas na liberdade de expressão e na cultura como um bem comum. Tem medo dos nordestinos pobres, que como Lula, não se rendeu à pobreza e à discriminação e se tornou o presidente mais popular do Brasil. Tem medo de que todos eles queiram ser como o Lula.
Quem tem medo da democracia no Brasil tem saudade da ditadura, quando detinha o monopólio da palavra, conversava e elogiava os militares no poder, sem que ninguém pudesse contestá-los publicamente. Os que têm saudades do Brasil para poucos, da elite que cooptava intelectuais para governar em nome dela.
Quem não tem medo da democracia no Brasil não tem medo de nada, porque não tem medo do povo brasileiro.
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