Por Marcelo Carota, na Rede Brasil Atual:
Para tanto, havia uma imagem a ser minuciosamente construída, e que nada ou ninguém poderia arranhar, por mais que o candidato, sozinho, se encarregasse de fazê-lo como ninguém, política e pessoalmente. Apesar disso, sua irmã e mentora, Andréa Neves, e equipe tinham como mantê-lo sob controle, mas a questão era: e a mídia, e a opinião pública?
A adesão dos proprietários da primeira foi natural e satisfatória para ambas as partes, mas, entre eles, havia jornalistas compromissados com a verdade dos fatos. Por outro lado, a internet já possibilitava a quem se dispusesse ser a sua própria mídia. Conheça, ou relembre, as ações e reações dos irmãos Neves em relação à liberdade de expressão, de forma a construir uma carreira equilibrada sobre muita propaganda e, tanto quanto, sobre muitos silêncios.
2002
- O jornalista Ulisses Magnus era editor de esporte da Rede Minas quando estourou o que se chamou “Caso Cruzeiro”, sobre uma desavença entre o então técnico, Vanderlei Luxemburgo, e alguns jogadores, com grosserias por parte de Luxemburgo. Um fato comum a qualquer clube, mas que tomou um destino insólito.Ulisses fez a matéria, levou-a ao ar, causando alguma repercussão interna e externa, junto à torcida, e com mais grosserias por parte do treinador, agora contra a equipe da TV estatal. Num encontro com Zezé Perrela, à época presidente do clube, Ulisses ouviu deste, em tom de brincadeira: “Olha que quando o Aécio (cruzeirense e já eleito governador) assumir, você pode perder o emprego”. Ulisses foi demitido dias após a posse do tucano.
2004
- Belo Horizonte, 02 de junho, amistoso Brasil x Argentina no Mineirão. O jornalista esportivo da Band, Jorge Kajuru, momentos antes do início da partida, reporta com imagens as áreas de acessibilidade do estádio reservadas para a entrada dos 10 mil VIPs convidados pela CBF e pelo governador, assim impedindo a entrada de cadeirantes. No intervalo para o segundo tempo do jogo, Kajuru foi retirado do ar, a pedido, segundo ele, de Andréa Neves, irmã do governador, que também pediu à Band que o demitisse, o que aconteceu uma semana depois do episódio.
A investida do senador e presidenciável tucano contra 66 comunicadores independentes sob a alegação de “formação de quadrilha remunerada” para difamá-lo, infelizmente, não foi um caso isolado, mas uma dentre tantas semelhantes, e mesmo piores, já empreendidas pelo candidato desde 2002, na campanha para o governo de Minas Gerais, ponto de partida para sua principal ambição, a presidência da República, à qual concorre agora.
Para tanto, havia uma imagem a ser minuciosamente construída, e que nada ou ninguém poderia arranhar, por mais que o candidato, sozinho, se encarregasse de fazê-lo como ninguém, política e pessoalmente. Apesar disso, sua irmã e mentora, Andréa Neves, e equipe tinham como mantê-lo sob controle, mas a questão era: e a mídia, e a opinião pública?
A adesão dos proprietários da primeira foi natural e satisfatória para ambas as partes, mas, entre eles, havia jornalistas compromissados com a verdade dos fatos. Por outro lado, a internet já possibilitava a quem se dispusesse ser a sua própria mídia. Conheça, ou relembre, as ações e reações dos irmãos Neves em relação à liberdade de expressão, de forma a construir uma carreira equilibrada sobre muita propaganda e, tanto quanto, sobre muitos silêncios.
2002
- O jornalista Ulisses Magnus era editor de esporte da Rede Minas quando estourou o que se chamou “Caso Cruzeiro”, sobre uma desavença entre o então técnico, Vanderlei Luxemburgo, e alguns jogadores, com grosserias por parte de Luxemburgo. Um fato comum a qualquer clube, mas que tomou um destino insólito.Ulisses fez a matéria, levou-a ao ar, causando alguma repercussão interna e externa, junto à torcida, e com mais grosserias por parte do treinador, agora contra a equipe da TV estatal. Num encontro com Zezé Perrela, à época presidente do clube, Ulisses ouviu deste, em tom de brincadeira: “Olha que quando o Aécio (cruzeirense e já eleito governador) assumir, você pode perder o emprego”. Ulisses foi demitido dias após a posse do tucano.
2003
- Logo no início de seu primeiro mandato como governador, Aécio pressionou a Rede Minas, emissora oficial do governo de MG, a tirar de sua grade o programa de entrevistas políticas “Palavra Cruzada”, dirigido e apresentado pelo jornalista Gilberto Menezes, que, em carta enviada ao Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG), afirmou ter sido “censurado pelo governo Aécio Neves”. De acordo com ele, a retirada do programa do ar se deveu a uma exigência do ex-governador Eduardo Azeredo e do ex-ministro das Comunicações, hoje candidato de Aécio ao governo do estado, Pimenta da Veiga. A razão, afirma Menezes em trecho da carta, foram "(...) as críticas que fazia sistematicamente aos governos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e à administração de Eduardo Azeredo enquanto governador".
- Não muito tempo depois foi a vez do então presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais, Aloísio Lopes, em artigo publicado no jornal Pauta, da entidade, denunciar que, a partir do governo Aécio Neves, tornou-se crescente o número de queixas de jornalistas sobre a postura das redações dos jornais e das chefias de comunicação de instituições públicas em todas matérias compreendendo a gestão do governador. As queixas mais frequentes eram relativas à edição das matérias, com omissão e distorção dos fatos até que o texto publicado se tornasse absolutamente diferente do que fora produzido a partir dos fatos apurados.
- Em abril de 2003, a afiliada mineira da Rede Globo produziu matérias cuja relevância garantiu veiculação pelo Jornal Nacional: uma, sobre crianças se drogando na chamada “rua do crack”, em Belo Horizonte, a poucos metros do Departamento de Investigação; outra, denunciando a ineficiência da polícia, por desvios de função; e a última, sobre superlotação das penitenciárias mineiras. A série de reportagens causou a demissão do diretor de jornalismo da Globo Minas, Marco Nascimento. Segundo Nascimento, sua cabeça foi pedida diretamente por Andréa Neves.
- Ao final de 2003, o Instituto Brasmarket fez pesquisa nacional para avaliação dos 27 governadores da Federação no início de seus mandatos. Ugo Braga, editor do jornal O Estado de Minas, foi demitido após divulgar nota informando que o governador fora mal avaliado, ocupando o antepenúltimo lugar na pesquisa.
- O radialista Paulo Sérgio, apresentador do “Itatiaia Patrulha”, programa policial feito ao vivo, cobra ações do governo Aécio para a segurança. Certo dia, foi informado de que seu programa estava sendo gravado pela assessoria de comunicação do governo, com acompanhamento pessoal da irmã do governador, Andréa Neves. A partir daí, seu diretor, Márcio Doti, o proibiu de veicular qualquer informação sem antes submetê-la à sua avaliação, o que tornou insustentável a continuação do programa.
- Logo no início de seu primeiro mandato como governador, Aécio pressionou a Rede Minas, emissora oficial do governo de MG, a tirar de sua grade o programa de entrevistas políticas “Palavra Cruzada”, dirigido e apresentado pelo jornalista Gilberto Menezes, que, em carta enviada ao Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG), afirmou ter sido “censurado pelo governo Aécio Neves”. De acordo com ele, a retirada do programa do ar se deveu a uma exigência do ex-governador Eduardo Azeredo e do ex-ministro das Comunicações, hoje candidato de Aécio ao governo do estado, Pimenta da Veiga. A razão, afirma Menezes em trecho da carta, foram "(...) as críticas que fazia sistematicamente aos governos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e à administração de Eduardo Azeredo enquanto governador".
- Não muito tempo depois foi a vez do então presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais, Aloísio Lopes, em artigo publicado no jornal Pauta, da entidade, denunciar que, a partir do governo Aécio Neves, tornou-se crescente o número de queixas de jornalistas sobre a postura das redações dos jornais e das chefias de comunicação de instituições públicas em todas matérias compreendendo a gestão do governador. As queixas mais frequentes eram relativas à edição das matérias, com omissão e distorção dos fatos até que o texto publicado se tornasse absolutamente diferente do que fora produzido a partir dos fatos apurados.
- Em abril de 2003, a afiliada mineira da Rede Globo produziu matérias cuja relevância garantiu veiculação pelo Jornal Nacional: uma, sobre crianças se drogando na chamada “rua do crack”, em Belo Horizonte, a poucos metros do Departamento de Investigação; outra, denunciando a ineficiência da polícia, por desvios de função; e a última, sobre superlotação das penitenciárias mineiras. A série de reportagens causou a demissão do diretor de jornalismo da Globo Minas, Marco Nascimento. Segundo Nascimento, sua cabeça foi pedida diretamente por Andréa Neves.
- Ao final de 2003, o Instituto Brasmarket fez pesquisa nacional para avaliação dos 27 governadores da Federação no início de seus mandatos. Ugo Braga, editor do jornal O Estado de Minas, foi demitido após divulgar nota informando que o governador fora mal avaliado, ocupando o antepenúltimo lugar na pesquisa.
- O radialista Paulo Sérgio, apresentador do “Itatiaia Patrulha”, programa policial feito ao vivo, cobra ações do governo Aécio para a segurança. Certo dia, foi informado de que seu programa estava sendo gravado pela assessoria de comunicação do governo, com acompanhamento pessoal da irmã do governador, Andréa Neves. A partir daí, seu diretor, Márcio Doti, o proibiu de veicular qualquer informação sem antes submetê-la à sua avaliação, o que tornou insustentável a continuação do programa.
2004
- Belo Horizonte, 02 de junho, amistoso Brasil x Argentina no Mineirão. O jornalista esportivo da Band, Jorge Kajuru, momentos antes do início da partida, reporta com imagens as áreas de acessibilidade do estádio reservadas para a entrada dos 10 mil VIPs convidados pela CBF e pelo governador, assim impedindo a entrada de cadeirantes. No intervalo para o segundo tempo do jogo, Kajuru foi retirado do ar, a pedido, segundo ele, de Andréa Neves, irmã do governador, que também pediu à Band que o demitisse, o que aconteceu uma semana depois do episódio.
2007
- No início de seu segundo mandato, em janeiro de 2007, sem o habitual estardalhaço publicitário destinado às suas ações, o governador Aécio Neves, após aprovação pelo Legislativo mineiro, publicou a chamada “Lei Delegada 132/2007”, permitindo ao seu gabinete militar colher informações que julgasse de seu interesse monitorar em movimentos organizados livres e em manifestações da sociedade civil, sua comunicação, com poder, inclusive, para quebra de sigilo e demais direitos assegurados constitucionalmente.
A medida tornou-se de conhecimento público graças ao jornalista mineiro Marco Aurélio Carone, criador e editor do Novo Jornal, com sede na capital do estado, que denunciou o fato após descobrir que o jornal estava grampeado, vigiado e investigado pelo Gabinete Militar do Governo de Minas, algo equivalente ao que fazia o Serviço de Informação do Estado, criado na ditadura militar para monitorar e coibir a liberdade de expressão em todas as suas formas. Desde então, Carone teve seguidos e graves problemas para fazer seu trabalho, mas nada que se comparasse ao ponto em que chegou, sete anos depois, a obstinação do senador e presidenciável em calar o jornalista.
- No início de seu segundo mandato, em janeiro de 2007, sem o habitual estardalhaço publicitário destinado às suas ações, o governador Aécio Neves, após aprovação pelo Legislativo mineiro, publicou a chamada “Lei Delegada 132/2007”, permitindo ao seu gabinete militar colher informações que julgasse de seu interesse monitorar em movimentos organizados livres e em manifestações da sociedade civil, sua comunicação, com poder, inclusive, para quebra de sigilo e demais direitos assegurados constitucionalmente.
A medida tornou-se de conhecimento público graças ao jornalista mineiro Marco Aurélio Carone, criador e editor do Novo Jornal, com sede na capital do estado, que denunciou o fato após descobrir que o jornal estava grampeado, vigiado e investigado pelo Gabinete Militar do Governo de Minas, algo equivalente ao que fazia o Serviço de Informação do Estado, criado na ditadura militar para monitorar e coibir a liberdade de expressão em todas as suas formas. Desde então, Carone teve seguidos e graves problemas para fazer seu trabalho, mas nada que se comparasse ao ponto em que chegou, sete anos depois, a obstinação do senador e presidenciável em calar o jornalista.
2014
- Assim como toda a blogosfera, e até parte da mídia corporativa, Marco Aurélio Carone, do Novo Jornal, também fez matéria sobre o escândalo da apreensão do helicóptero da empresa Limeira Agropecuária e Participações Ltda, da família do senador Zezé Perrela (SDD/MG), com uma carga de quase meia tonelada de pasta-base de cocaína. Mas, ao contrário dos demais jornalistas e veículos que cobriram o escândalo, Carone foi o único a ser duramente retaliado por isso: a pedido do senador e presidenciável Aécio Neves, seu site foi censurado sumariamente, saindo do ar, e Carone está preso.
Cardiopata e hipertenso, já teve de ser removido em estado grave a um hospital, para atendimento de urgência, mas retornou à prisão, com a saúde ainda bastante debilitada. O tratamento do TJMG à sua sentença é um caso à parte: seus advogados já foram proibidos de falar com ele, o que compromete substancialmente a produção de sua defesa, e lhe foi negado o habeas corpus para responder o processo em liberdade sob justificativa “amparada no requisito da conveniência da instrução criminal, já que em liberdade poderá forjar provas, ameaçar e intimidar testemunhas, além de continuar a utilizar o seu jornal virtual para lançar informações inverídicas”, conforme despacho da juíza Maria Isabel Fleck. Pergunta-se: “conveniente” a quem?
Se faltava censura prévia no histórico da relação do senador com a liberdade de expressão, com a prisão de Carone nessas circunstâncias, não falta mais.
- Assim como toda a blogosfera, e até parte da mídia corporativa, Marco Aurélio Carone, do Novo Jornal, também fez matéria sobre o escândalo da apreensão do helicóptero da empresa Limeira Agropecuária e Participações Ltda, da família do senador Zezé Perrela (SDD/MG), com uma carga de quase meia tonelada de pasta-base de cocaína. Mas, ao contrário dos demais jornalistas e veículos que cobriram o escândalo, Carone foi o único a ser duramente retaliado por isso: a pedido do senador e presidenciável Aécio Neves, seu site foi censurado sumariamente, saindo do ar, e Carone está preso.
Cardiopata e hipertenso, já teve de ser removido em estado grave a um hospital, para atendimento de urgência, mas retornou à prisão, com a saúde ainda bastante debilitada. O tratamento do TJMG à sua sentença é um caso à parte: seus advogados já foram proibidos de falar com ele, o que compromete substancialmente a produção de sua defesa, e lhe foi negado o habeas corpus para responder o processo em liberdade sob justificativa “amparada no requisito da conveniência da instrução criminal, já que em liberdade poderá forjar provas, ameaçar e intimidar testemunhas, além de continuar a utilizar o seu jornal virtual para lançar informações inverídicas”, conforme despacho da juíza Maria Isabel Fleck. Pergunta-se: “conveniente” a quem?
Se faltava censura prévia no histórico da relação do senador com a liberdade de expressão, com a prisão de Carone nessas circunstâncias, não falta mais.
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