Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
O subsecretário de Comunicação do governo paulista, Marcio Aith, publica na seção “Tendências/Debates” da Folha de S.Paulo, edição de quinta-feira (29/1), um artigo no qual critica severamente o jornal pela cobertura da crise hídrica que ameaça a região metropolitana de São Paulo.
Marcio Aith fez carreira na própria Folha, onde chegou a editor de Economia, e foi editor-executivo da revista Veja antes de se tornar coordenador de comunicação da campanha do ex-governador José Serra à Presidência da República em 2010, o que pode, de certa forma, surpreender o leitor do jornal, dada a agressividade do texto.
Pelo excesso de adjetivos e a ênfase do estilo, o artigo exigiria algum esforço para ser interpretado, não fosse um detalhe muito simples: o argumento do assessor de Geraldo Alckmin é uma cópia ampliada do texto publicado na segunda-feira (26/1) pelo colunista Reinaldo Azevedo (ver aqui), da revista Veja. O tom predominante é a indignação com certa tendência da imprensa, vislumbrada pelos dois jornalistas, em equiparar as responsabilidades do governador paulista e da presidente Dilma Rousseff na crise hídrica que afeta a região Sudeste.
Basicamente, trata-se de uma operação casada, na qual o colunista de Veja “levanta a bola”, como se diz, e o responsável pela comunicação do governo paulista chuta em gol, sob o patrocínio da Folha de S. Paulo. Os dois criticam a imprensa brasileira por atribuir responsabilidades iguais a Geraldo Alckmin e a Dilma Rousseff pela falta de água, argumentando que o governador paulista vem tomando as medidas necessárias para amenizar o problema, enquanto a presidente da República estimulou o consumo de energia ao baratear as tarifas em 2012.
As coincidências entre os dois textos chegam ao nível de anedota, quando ambos citam a série de anúncios da Sabesp, a partir do início de 2014, alertando para o risco de faltar água no sistema Cantareira. O argumento central é que a empresa de saneamento avisou a população de que a situação poderia ficar crítica.
Ora, se as torneiras estão secas, a culpa é do povo, que continua com essa mania de beber água e tomar banho todos os dias.
Manobra eleitoral
Este observador evita fazer citações ad nominem, principalmente quando o objeto da crítica é obra de um desses colunistas que fazem o papel de provocadores na imprensa. No entanto, a evidência de um jogo combinado entre o colunista de Veja, o assessor de comunicação do governo paulista e a Folha de S. Paulo exige esse desconforto.
Ora, se formos garimpar nas mesmas fontes que sustentam o artigo do assessor, vamos observar que o jornal paulista tem um trajeto errático diante da crise de abastecimento. Seus editoriais têm balançado entre denunciar o estado crítico do sistema explorado pela Sabesp (ver aqui editorial do dia 9 de março de 2014) e entrar no jogo de Poliana, como no texto tranquilizador publicado dois meses depois, no dia 6 de maio (ver aqui), no qual o jornal comprou pelo valor de face a afirmação do governador Geraldo Alckmin de que não haveria racionamento de água ao longo daquele ano.
De fato, não houve racionamento oficial em 2014, ano eleitoral – houve corte seletivo do abastecimento, nos extremos da região metropolitana, para evitar que a população, de modo geral, se desse conta da gravidade da situação. Nesse período, a imprensa brasileira, principalmente a mídia sediada em São Paulo, oscilou entre sinais de alerta, com a publicação da queda constante dos níveis dos reservatórios, e o aval às declarações serenas do governador.
Há registros de reportagens sobre o perigo de desabastecimento em São Paulo pelo menos desde 2003, mas a imprensa preferiu colocar a culpa nos eventos climáticos.
Em setembro do ano passado, o conselho da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) foi alertado, por uma especialista em hidrologia, de que parte da água servida na região metropolitana estava contaminada e que o ponto crítico do sistema seria atingido em novembro de 2014, dois meses depois. A direção da Fiesp estava de mãos atadas: se divulgasse o resultado do estudo, poderia ser acusada de favorecer a candidatura de seu presidente, Paulo Skaf, ao governo do estado; além disso, teria que enfrentar o fato de que muitas fábricas usam a água tratada, que deveria ser prioritariamente destinada ao consumo humano.
A informação só vazou depois da eleição.
A imprensa não tem acesso aos conselheiros da Fiesp? Ou foi cúmplice da manobra eleitoral?
Marcio Aith fez carreira na própria Folha, onde chegou a editor de Economia, e foi editor-executivo da revista Veja antes de se tornar coordenador de comunicação da campanha do ex-governador José Serra à Presidência da República em 2010, o que pode, de certa forma, surpreender o leitor do jornal, dada a agressividade do texto.
Pelo excesso de adjetivos e a ênfase do estilo, o artigo exigiria algum esforço para ser interpretado, não fosse um detalhe muito simples: o argumento do assessor de Geraldo Alckmin é uma cópia ampliada do texto publicado na segunda-feira (26/1) pelo colunista Reinaldo Azevedo (ver aqui), da revista Veja. O tom predominante é a indignação com certa tendência da imprensa, vislumbrada pelos dois jornalistas, em equiparar as responsabilidades do governador paulista e da presidente Dilma Rousseff na crise hídrica que afeta a região Sudeste.
Basicamente, trata-se de uma operação casada, na qual o colunista de Veja “levanta a bola”, como se diz, e o responsável pela comunicação do governo paulista chuta em gol, sob o patrocínio da Folha de S. Paulo. Os dois criticam a imprensa brasileira por atribuir responsabilidades iguais a Geraldo Alckmin e a Dilma Rousseff pela falta de água, argumentando que o governador paulista vem tomando as medidas necessárias para amenizar o problema, enquanto a presidente da República estimulou o consumo de energia ao baratear as tarifas em 2012.
As coincidências entre os dois textos chegam ao nível de anedota, quando ambos citam a série de anúncios da Sabesp, a partir do início de 2014, alertando para o risco de faltar água no sistema Cantareira. O argumento central é que a empresa de saneamento avisou a população de que a situação poderia ficar crítica.
Ora, se as torneiras estão secas, a culpa é do povo, que continua com essa mania de beber água e tomar banho todos os dias.
Manobra eleitoral
Este observador evita fazer citações ad nominem, principalmente quando o objeto da crítica é obra de um desses colunistas que fazem o papel de provocadores na imprensa. No entanto, a evidência de um jogo combinado entre o colunista de Veja, o assessor de comunicação do governo paulista e a Folha de S. Paulo exige esse desconforto.
Ora, se formos garimpar nas mesmas fontes que sustentam o artigo do assessor, vamos observar que o jornal paulista tem um trajeto errático diante da crise de abastecimento. Seus editoriais têm balançado entre denunciar o estado crítico do sistema explorado pela Sabesp (ver aqui editorial do dia 9 de março de 2014) e entrar no jogo de Poliana, como no texto tranquilizador publicado dois meses depois, no dia 6 de maio (ver aqui), no qual o jornal comprou pelo valor de face a afirmação do governador Geraldo Alckmin de que não haveria racionamento de água ao longo daquele ano.
De fato, não houve racionamento oficial em 2014, ano eleitoral – houve corte seletivo do abastecimento, nos extremos da região metropolitana, para evitar que a população, de modo geral, se desse conta da gravidade da situação. Nesse período, a imprensa brasileira, principalmente a mídia sediada em São Paulo, oscilou entre sinais de alerta, com a publicação da queda constante dos níveis dos reservatórios, e o aval às declarações serenas do governador.
Há registros de reportagens sobre o perigo de desabastecimento em São Paulo pelo menos desde 2003, mas a imprensa preferiu colocar a culpa nos eventos climáticos.
Em setembro do ano passado, o conselho da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) foi alertado, por uma especialista em hidrologia, de que parte da água servida na região metropolitana estava contaminada e que o ponto crítico do sistema seria atingido em novembro de 2014, dois meses depois. A direção da Fiesp estava de mãos atadas: se divulgasse o resultado do estudo, poderia ser acusada de favorecer a candidatura de seu presidente, Paulo Skaf, ao governo do estado; além disso, teria que enfrentar o fato de que muitas fábricas usam a água tratada, que deveria ser prioritariamente destinada ao consumo humano.
A informação só vazou depois da eleição.
A imprensa não tem acesso aos conselheiros da Fiesp? Ou foi cúmplice da manobra eleitoral?
0 comentários:
Postar um comentário