Por Tarso Genro, no site Sul-21:
Uma bomba atômica social que vai desabar sobre o próximo Governo, cujos efeitos ainda são imponderáveis, é a desorganização social e produtiva que será causada pela reforma trabalhista, particularmente pela aplicação desenfreada do trabalho intermitente e precário, de acordo com as regras já vigentes, de uma parte, e com a “pejotização” acelerada, de outra parte, que transformará uma boa parte da mão de obra assalariada em falsos empresários de si mesmos. A queda da arrecadação que advirá para o financiamento da Previdência Social, o sentimento de desresponsabilização do trabalhador-nômade com os destinos da empresa tomadora “eventual” dos seus serviços e a ausência de pertencimento a uma comunidade social – aquela comunidade primária solidária que é a base de uma sociedade de convívio, como asseverara Durkheim – vai ter severas consequências políticas e econômicas.
Estamos tratando de uma sociedade – a brasileira – na qual a maioria dos trabalhadores, se perderem algo, saem direto da pobreza decente para a miséria doentia, diferentemente das sociedades europeias, mais desenvolvidas em termos sociais e de organização estatal, na qual os trabalhadores que perdem alguma coisa com reformas desta natureza, saem das suas condições de consumo – com uma certa folga para a sobrevivência – para um padrão de consumo próximo à pobreza, mas não ainda miserável. As grandes transformações tecnológicas que ocorreram nos últimos 30 anos foram apropriadas integralmente pelos ricos e pelas classes médias altas, nos países de maior concentração de renda, cuja situação de classe permitiu uma maior influência sobre o próprio conteúdo das reformas.
Na verdade o contrato social-democrático, que se espalhou pelo mundo, de formas dramaticamente diferentes em cada país – gerador de políticas sociais de proteção aos mais excluídos (como políticas compensatórias) ou de conquistas salariais importantes (em vastos setores das classes trabalhadoras), chegou ao seu fim. Os sujeitos políticos e sociais que compuseram as classes trabalhadoras da segunda revolução industrial e as burguesias industriais que lhe são correlatas, ao mesmo tempo que vem perdendo a sua força política, perdem a sua capacidade negocial, para a instauração de contratos políticos “setoriais”, que não são mais tolerados pela “sanha” da acumulação financeira. Esta, transforma toda a sociedade em refém das suas necessidades: acumulação com menos trabalho produtivo, em sentido clássico, e “rentismo” transformado em rede de interesses legitimados pela grande mídia.
É óbvio que uma luta de resistência deve ser travada nos tribunais em defesa do sistema protetivo constitucional da CLT, que ainda poderia permitir contratos de trabalho decentes para uma grande parcela dos trabalhadores “por conta alheia”, mormente aqueles que vivem com os mínimos profissionais ou com o próprio salário mínimo, que já vem sendo corroído de forma acelerada. Mas, a hora é também de pensar num outro sistema de tutelas, a partir do Estado, para repartir, não somente o direito ao trabalho remunerado previsível – trabalharmos menos para trabalharmos todos – como para repartir os benefícios das transformações tecnológicas ainda em curso, que até agora só foram apropriados por uma minoria privilegiada, a saber nem um por cento da população economicamente ativa.
Temos que transitar de uma visão de “renda mínima obrigatória” como direito cidadão devido, independentemente de que a pessoa possa trabalhar, ou não, para uma “socialização do direito ao trabalho” com o “direito a uma renda mínima do trabalho produtivo” ou dos serviços prestados à sociedade – seja qual for o tipo de prestação – para que a descoesão social que se aproxima, seja corrigida, desviando os rumos do desastre social a que o golpismo nos levou. Não se trata, na minha opinião, de uma revolução, mas de uma poderosa reforma neo-socialdemocrata, que capture o Estado para o povo soberano e retire a organização estatal da condição de mero gerenciador da dívida pública. O verdadeiro populismo que nos assola é o populismo do mercado perfeito, que tem sido impingido pela grande mídia, sobre setores das classes assalariadas e particularmente nos setores médios, convencendo que a saída é o “fim do Estado Social”, uma espécie de anarquismo de gosto do capital financeiro, que transforma vida num pesadelo em que a maioria vive a solidão da precariedade e do trabalho intermitente.
Uma bomba atômica social que vai desabar sobre o próximo Governo, cujos efeitos ainda são imponderáveis, é a desorganização social e produtiva que será causada pela reforma trabalhista, particularmente pela aplicação desenfreada do trabalho intermitente e precário, de acordo com as regras já vigentes, de uma parte, e com a “pejotização” acelerada, de outra parte, que transformará uma boa parte da mão de obra assalariada em falsos empresários de si mesmos. A queda da arrecadação que advirá para o financiamento da Previdência Social, o sentimento de desresponsabilização do trabalhador-nômade com os destinos da empresa tomadora “eventual” dos seus serviços e a ausência de pertencimento a uma comunidade social – aquela comunidade primária solidária que é a base de uma sociedade de convívio, como asseverara Durkheim – vai ter severas consequências políticas e econômicas.
Estamos tratando de uma sociedade – a brasileira – na qual a maioria dos trabalhadores, se perderem algo, saem direto da pobreza decente para a miséria doentia, diferentemente das sociedades europeias, mais desenvolvidas em termos sociais e de organização estatal, na qual os trabalhadores que perdem alguma coisa com reformas desta natureza, saem das suas condições de consumo – com uma certa folga para a sobrevivência – para um padrão de consumo próximo à pobreza, mas não ainda miserável. As grandes transformações tecnológicas que ocorreram nos últimos 30 anos foram apropriadas integralmente pelos ricos e pelas classes médias altas, nos países de maior concentração de renda, cuja situação de classe permitiu uma maior influência sobre o próprio conteúdo das reformas.
Na verdade o contrato social-democrático, que se espalhou pelo mundo, de formas dramaticamente diferentes em cada país – gerador de políticas sociais de proteção aos mais excluídos (como políticas compensatórias) ou de conquistas salariais importantes (em vastos setores das classes trabalhadoras), chegou ao seu fim. Os sujeitos políticos e sociais que compuseram as classes trabalhadoras da segunda revolução industrial e as burguesias industriais que lhe são correlatas, ao mesmo tempo que vem perdendo a sua força política, perdem a sua capacidade negocial, para a instauração de contratos políticos “setoriais”, que não são mais tolerados pela “sanha” da acumulação financeira. Esta, transforma toda a sociedade em refém das suas necessidades: acumulação com menos trabalho produtivo, em sentido clássico, e “rentismo” transformado em rede de interesses legitimados pela grande mídia.
É óbvio que uma luta de resistência deve ser travada nos tribunais em defesa do sistema protetivo constitucional da CLT, que ainda poderia permitir contratos de trabalho decentes para uma grande parcela dos trabalhadores “por conta alheia”, mormente aqueles que vivem com os mínimos profissionais ou com o próprio salário mínimo, que já vem sendo corroído de forma acelerada. Mas, a hora é também de pensar num outro sistema de tutelas, a partir do Estado, para repartir, não somente o direito ao trabalho remunerado previsível – trabalharmos menos para trabalharmos todos – como para repartir os benefícios das transformações tecnológicas ainda em curso, que até agora só foram apropriados por uma minoria privilegiada, a saber nem um por cento da população economicamente ativa.
Temos que transitar de uma visão de “renda mínima obrigatória” como direito cidadão devido, independentemente de que a pessoa possa trabalhar, ou não, para uma “socialização do direito ao trabalho” com o “direito a uma renda mínima do trabalho produtivo” ou dos serviços prestados à sociedade – seja qual for o tipo de prestação – para que a descoesão social que se aproxima, seja corrigida, desviando os rumos do desastre social a que o golpismo nos levou. Não se trata, na minha opinião, de uma revolução, mas de uma poderosa reforma neo-socialdemocrata, que capture o Estado para o povo soberano e retire a organização estatal da condição de mero gerenciador da dívida pública. O verdadeiro populismo que nos assola é o populismo do mercado perfeito, que tem sido impingido pela grande mídia, sobre setores das classes assalariadas e particularmente nos setores médios, convencendo que a saída é o “fim do Estado Social”, uma espécie de anarquismo de gosto do capital financeiro, que transforma vida num pesadelo em que a maioria vive a solidão da precariedade e do trabalho intermitente.
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