Por José Álvaro de Lima Cardoso, no site Outras Palavras:
A essa altura dos acontecimentos está mais claro para boa parte dos brasileiros que, se os golpistas seguirem implantando o seu programa, passaremos a considerar a primeira onda neoliberal, que teve seu auge no governo Fernando Henrique Cardoso, um passeio no parque. Com o golpe e a aplicação de um ultraliberalismo agressivo, que nem o FMI recomenda mais, o Estado foi colocado na condição de vilão e principal causador da crise econômica.
Os golpistas dizem querer implantar o chamado Estado mínimo, mas essa turma, na realidade, é contra o Estado público. São contra o Estado que encaminha políticas de interesse de toda a sociedade (saúde, educação, defesa) ou que atende segmentos vulneráveis da população. Isso fica patente, inicialmente, pela voracidade do assalto ao erário que eles vêm realizando desde que assumiram, em 2016. Cortaram mais de um milhão de beneficiários do Bolsa Família, mas deram perdão de dívida de R$ 25 bilhões ao maior banco privado do país, o Itaú. Reajustaram o salário mínimo abaixo da inflação, mas tiraram impostos das petroleiras estrangeiras que somente este ano significará uma perda de R$ 16 bilhões para a União. A lista é bem longa.
A oposição que fazem é ao Estado que, mesmo moderadamente, realiza algo de positivo para a maioria da população. Recentemente, nos EUA, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em debate com uma plateia de jornalistas e empresários ultraconservadores, afirmou que o programa Bolsa Família “escraviza” as pessoas. Segundo ele, o programa não seria bom porque geraria, para quem recebe, uma dependência do Estado. Curiosamente, este mesmo deputado, que critica, em plenos EUA, um programa que combate a fome de quase 50 milhões de brasileiros, utilizando meros 0,4% do PIB, apoiou o perdão de dívida concedido pelo governo ao banco Itaú. E foi o mesmo que trabalhou pela aprovação da Medida Provisória (MP 795), que concede benefícios às petroleiras estrangeiras e que representará um prejuízo para o Estado brasileiro, em 20 anos, de R$ 1 trilhão.
Os que defendem o “Estado mínimo”, na verdade querem o Estado a seu exclusivo serviço, especialmente em períodos de crises e queda das receitas. Recentemente, o dono das lojas Riachuelo e do Grupo Guararapes, em Nova York, ao lado de um grupo de empresários, lançou um manifesto, defendendo os valores liberais. O curioso é que, de 2009 a 2016, a empresa do referido empresário obteve financiamentos junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em nome da Guararapes e das lojas Riachuelo no valor de cerca de R$ 1,4 bilhão. Os empréstimos foram concedidos com juros subsidiados e dinheiro público. Para essas situações, a política de Estado mínimo não vem ao caso?
Um dos eixos do programa do governo ilegítimo é a privatização do filé das estatais, o que restou da primeira onda neoliberal, na década de 1990, especialmente Petrobras, Eletrobras, BNDES, Caixa Econômica, Banco do Brasil, Casa da Moeda, Correios. Neste momento estão preparando essas companhias para facilitar o processo de entrega para o setor privado. A prioridade agora é a Eletrobras, que pretendem privatizar rapidamente e sem debate, até abril deste ano. Estão preparando a empresa para entregar “redondinha” para o setor privado, possivelmente de capital de origem estrangeira. A empresa concluiu, por exemplo, o Plano de Aposentadoria Extraordinária, com adesão de 2.108 empregados, representando uma economia de R$ 877 milhões por ano, equivalente a 95% da meta do plano. É a lógica das privatizações, muito conhecida dos brasileiros: saneia e enxuga a empresa com dinheiro público, para repassar o ativo com altas taxas de produtividade para os investidores privados.
As mentiras caracterizam os processos de privatizações no mundo todo. No caso do Brasil é mais grave, porque elas vêm num processo de golpe de Estado continuado. Divulgam, por exemplo, que a privatização da Eletrobras vai reduzir a tarifa. Porém, com certeza absoluta, irá acontecer justamente o contrário. O sistema Eletrobras vende a energia mais barata do mundo: segundo dados dos sindicatos do setor, o preço cobrado pela Eletrobras é inferior a 1/4 do preço praticado pelo mercado. Necessariamente a privatização implicará na elevação do custo de produção, com implicações no custo de toda a cadeia de produção e no aumento do custo de vida. Outra falácia é a de que a privatização iria aumentar a eficiência da empresa. Mas em 2016, a Eletrobras foi a maior empresa em receita líquida pelo 4º ano seguido. O Sistema Eletrobras, até o terceiro trimestre de 2017, já havia obtido um lucro líquido de R$ 2,2 bilhões, havia investido no ano R$ 3,764 bilhões, sendo que R$ 1,305 bilhão somente no terceiro trimestre.
Na contramão do que ocorre no mundo, os golpistas encaminham para a privatização setores estratégicos, sob todos os pontos de vista. No mundo todo, a tendência é exatamente no sentido oposto. Populações que sentiram na carne serviços privatizados de água, energia elétrica, e outros, se mobilizam para reestatizar as companhias em função dos elevados custos dos serviços e sua baixa qualidade. Ao contrário do que dizia toda a propaganda neoliberal, que iludiu as pessoas acenando barateamento dos serviços e elevação da qualidade. O jornal inglês The Guardian publicou, no começo de janeiro, artigo de Will Hutton, intitulado “Podemos desfazer a privatização. E não nos custará um centavo”. O artigo se reporta a uma pesquisa, que constata que 83% da sociedade britânica é a favor da nacionalização da água e 77% da nacionalização da eletricidade e do gás. Este é um resultado muito importante, visto que a Inglaterra, com Margareth Thatcher, foi um dos primeiros países a privatizar setores essenciais como água, gás, eletricidade, transporte ferroviário e telecomunicações. Trata-se, portanto, de uma sociedade que convive com décadas de serviços públicos essenciais privatizados. Vale observar que na Inglaterra os trabalhadores, e a maioria da população, dispõe de condições salariais muito superiores às dos brasileiros; portanto, com melhores condições de pagar por serviços privados. No caso do Brasil, que convive com enorme informalidade, baixos salários e grande precarização das condições de trabalho em geral, os efeitos da privatização sobre a qualidade de vida da população mais pobre são ainda piores.
A situação do Brasil é surreal. Um dos principais argumentos do governo para privatizar empresas estratégicas é a necessidade de melhorar as contas do governo. No caso da Eletrobras, os números variam, mas no cenário mais otimista, o governo prevê arrecadar R$ 20 bilhões. Ao mesmo tempo, os jornais noticiam que o governo está reservando cerca de R$ 30 bilhões para “obter” os votos necessários para aprovar a destruição do sistema da Previdência, votação prevista para fevereiro. Segundo levantamento do Datafolha, divulgado em dezembro, 70% dos brasileiros são contra a privatização de estatais e 21% apenas são a favor. A pesquisa constatou que a rejeição às privatizações ocorre em praticamente em todos os cortes: por região, sexo, escolaridade, ou preferência partidária. Não por coincidência, as privatizações têm o apoio da maioria, apenas entre aqueles que possuem renda superior a dez mínimos, grupo no qual 55% se dizem favor dessa política. Segundo a pesquisa, nas regiões mais pobres do país as taxas de rejeição às privatizações chegam a 78%, e mesmo entre aqueles que têm posições mais conservadoras, a desaprovação é elevada.
Os resultados da pesquisa mostram que a população brasileira não é tão desmemoriada, como alguns imaginam. O governo Fernando Henrique Cardoso promoveu um processo de privatizações que ficou conhecido como “Privataria”, em função das inúmeras ilegalidades (pirataria) que ocorreram ao longo do processo. Uma parcela expressiva dos brasileiros sabe bem o que significaram as privatizações naquele período, especialmente porque acompanhadas de elevadas taxas de desemprego. As privatizações do governo FHC foram realizadas sem nenhuma transparência e estavam eivadas de irregularidades, conforme já está foi bem registrado. De qualquer forma, foram realizadas por um governo eleito, que alguma legitimidade ainda tinha. Agora, o que dizer de privatizações feitas à toque de caixa, sem nenhuma transparência, e por um governo advindo de um golpe e seguramente um dos mais corruptos da história da República?
A essa altura dos acontecimentos está mais claro para boa parte dos brasileiros que, se os golpistas seguirem implantando o seu programa, passaremos a considerar a primeira onda neoliberal, que teve seu auge no governo Fernando Henrique Cardoso, um passeio no parque. Com o golpe e a aplicação de um ultraliberalismo agressivo, que nem o FMI recomenda mais, o Estado foi colocado na condição de vilão e principal causador da crise econômica.
Os golpistas dizem querer implantar o chamado Estado mínimo, mas essa turma, na realidade, é contra o Estado público. São contra o Estado que encaminha políticas de interesse de toda a sociedade (saúde, educação, defesa) ou que atende segmentos vulneráveis da população. Isso fica patente, inicialmente, pela voracidade do assalto ao erário que eles vêm realizando desde que assumiram, em 2016. Cortaram mais de um milhão de beneficiários do Bolsa Família, mas deram perdão de dívida de R$ 25 bilhões ao maior banco privado do país, o Itaú. Reajustaram o salário mínimo abaixo da inflação, mas tiraram impostos das petroleiras estrangeiras que somente este ano significará uma perda de R$ 16 bilhões para a União. A lista é bem longa.
A oposição que fazem é ao Estado que, mesmo moderadamente, realiza algo de positivo para a maioria da população. Recentemente, nos EUA, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em debate com uma plateia de jornalistas e empresários ultraconservadores, afirmou que o programa Bolsa Família “escraviza” as pessoas. Segundo ele, o programa não seria bom porque geraria, para quem recebe, uma dependência do Estado. Curiosamente, este mesmo deputado, que critica, em plenos EUA, um programa que combate a fome de quase 50 milhões de brasileiros, utilizando meros 0,4% do PIB, apoiou o perdão de dívida concedido pelo governo ao banco Itaú. E foi o mesmo que trabalhou pela aprovação da Medida Provisória (MP 795), que concede benefícios às petroleiras estrangeiras e que representará um prejuízo para o Estado brasileiro, em 20 anos, de R$ 1 trilhão.
Os que defendem o “Estado mínimo”, na verdade querem o Estado a seu exclusivo serviço, especialmente em períodos de crises e queda das receitas. Recentemente, o dono das lojas Riachuelo e do Grupo Guararapes, em Nova York, ao lado de um grupo de empresários, lançou um manifesto, defendendo os valores liberais. O curioso é que, de 2009 a 2016, a empresa do referido empresário obteve financiamentos junto ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) em nome da Guararapes e das lojas Riachuelo no valor de cerca de R$ 1,4 bilhão. Os empréstimos foram concedidos com juros subsidiados e dinheiro público. Para essas situações, a política de Estado mínimo não vem ao caso?
Um dos eixos do programa do governo ilegítimo é a privatização do filé das estatais, o que restou da primeira onda neoliberal, na década de 1990, especialmente Petrobras, Eletrobras, BNDES, Caixa Econômica, Banco do Brasil, Casa da Moeda, Correios. Neste momento estão preparando essas companhias para facilitar o processo de entrega para o setor privado. A prioridade agora é a Eletrobras, que pretendem privatizar rapidamente e sem debate, até abril deste ano. Estão preparando a empresa para entregar “redondinha” para o setor privado, possivelmente de capital de origem estrangeira. A empresa concluiu, por exemplo, o Plano de Aposentadoria Extraordinária, com adesão de 2.108 empregados, representando uma economia de R$ 877 milhões por ano, equivalente a 95% da meta do plano. É a lógica das privatizações, muito conhecida dos brasileiros: saneia e enxuga a empresa com dinheiro público, para repassar o ativo com altas taxas de produtividade para os investidores privados.
As mentiras caracterizam os processos de privatizações no mundo todo. No caso do Brasil é mais grave, porque elas vêm num processo de golpe de Estado continuado. Divulgam, por exemplo, que a privatização da Eletrobras vai reduzir a tarifa. Porém, com certeza absoluta, irá acontecer justamente o contrário. O sistema Eletrobras vende a energia mais barata do mundo: segundo dados dos sindicatos do setor, o preço cobrado pela Eletrobras é inferior a 1/4 do preço praticado pelo mercado. Necessariamente a privatização implicará na elevação do custo de produção, com implicações no custo de toda a cadeia de produção e no aumento do custo de vida. Outra falácia é a de que a privatização iria aumentar a eficiência da empresa. Mas em 2016, a Eletrobras foi a maior empresa em receita líquida pelo 4º ano seguido. O Sistema Eletrobras, até o terceiro trimestre de 2017, já havia obtido um lucro líquido de R$ 2,2 bilhões, havia investido no ano R$ 3,764 bilhões, sendo que R$ 1,305 bilhão somente no terceiro trimestre.
Na contramão do que ocorre no mundo, os golpistas encaminham para a privatização setores estratégicos, sob todos os pontos de vista. No mundo todo, a tendência é exatamente no sentido oposto. Populações que sentiram na carne serviços privatizados de água, energia elétrica, e outros, se mobilizam para reestatizar as companhias em função dos elevados custos dos serviços e sua baixa qualidade. Ao contrário do que dizia toda a propaganda neoliberal, que iludiu as pessoas acenando barateamento dos serviços e elevação da qualidade. O jornal inglês The Guardian publicou, no começo de janeiro, artigo de Will Hutton, intitulado “Podemos desfazer a privatização. E não nos custará um centavo”. O artigo se reporta a uma pesquisa, que constata que 83% da sociedade britânica é a favor da nacionalização da água e 77% da nacionalização da eletricidade e do gás. Este é um resultado muito importante, visto que a Inglaterra, com Margareth Thatcher, foi um dos primeiros países a privatizar setores essenciais como água, gás, eletricidade, transporte ferroviário e telecomunicações. Trata-se, portanto, de uma sociedade que convive com décadas de serviços públicos essenciais privatizados. Vale observar que na Inglaterra os trabalhadores, e a maioria da população, dispõe de condições salariais muito superiores às dos brasileiros; portanto, com melhores condições de pagar por serviços privados. No caso do Brasil, que convive com enorme informalidade, baixos salários e grande precarização das condições de trabalho em geral, os efeitos da privatização sobre a qualidade de vida da população mais pobre são ainda piores.
A situação do Brasil é surreal. Um dos principais argumentos do governo para privatizar empresas estratégicas é a necessidade de melhorar as contas do governo. No caso da Eletrobras, os números variam, mas no cenário mais otimista, o governo prevê arrecadar R$ 20 bilhões. Ao mesmo tempo, os jornais noticiam que o governo está reservando cerca de R$ 30 bilhões para “obter” os votos necessários para aprovar a destruição do sistema da Previdência, votação prevista para fevereiro. Segundo levantamento do Datafolha, divulgado em dezembro, 70% dos brasileiros são contra a privatização de estatais e 21% apenas são a favor. A pesquisa constatou que a rejeição às privatizações ocorre em praticamente em todos os cortes: por região, sexo, escolaridade, ou preferência partidária. Não por coincidência, as privatizações têm o apoio da maioria, apenas entre aqueles que possuem renda superior a dez mínimos, grupo no qual 55% se dizem favor dessa política. Segundo a pesquisa, nas regiões mais pobres do país as taxas de rejeição às privatizações chegam a 78%, e mesmo entre aqueles que têm posições mais conservadoras, a desaprovação é elevada.
Os resultados da pesquisa mostram que a população brasileira não é tão desmemoriada, como alguns imaginam. O governo Fernando Henrique Cardoso promoveu um processo de privatizações que ficou conhecido como “Privataria”, em função das inúmeras ilegalidades (pirataria) que ocorreram ao longo do processo. Uma parcela expressiva dos brasileiros sabe bem o que significaram as privatizações naquele período, especialmente porque acompanhadas de elevadas taxas de desemprego. As privatizações do governo FHC foram realizadas sem nenhuma transparência e estavam eivadas de irregularidades, conforme já está foi bem registrado. De qualquer forma, foram realizadas por um governo eleito, que alguma legitimidade ainda tinha. Agora, o que dizer de privatizações feitas à toque de caixa, sem nenhuma transparência, e por um governo advindo de um golpe e seguramente um dos mais corruptos da história da República?
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