Tem se tornado comum ouvir, e a gente mesmo dizer, que 2020 podia terminar antes do combinado, ou ainda recomeçar. Mas será que as perspectivas para 2021 são melhores? Mais animadoras? Com certeza, esperamos não ser tão atacados e mortos pelo coronavírus como fomos até aqui. Esperamos que, se não vacinas eficazes, entrem em cena ao menos tratamentos com melhores resultados. E, quem sabe, possamos voltar aos poucos a um convívio social mais próximo.
A má notícia é que, do ponto de vista do orçamento federal proposto por este governo, não só nossa saúde, mas nossa educação, nossas ações de assistência social e nossa segurança alimentar vão piorar assustadoramente.
Montemos o cenário por nós mesmos:
1- A Saúde
O Sistema Único de Saúde (SUS), que, segundo o Conselho Nacional de Saúde, já perdeu R$ 22,5 bilhões com a emenda do Teto de Gastos, perderá, em 2021, R$ 35 bilhões em relação a 2020. Diz a Nota Técnica da Coalizão Direitos Valem Mais:
“Os efeitos negativos da EC 95 [Emenda do Teto de Gastos] estão presentes no gasto em Saúde por pessoa, que caiu de R$ 594,00 (em 2017) para R$ 583,00 (em 2019). O cálculo em porcentagem da receita corrente líquida também caiu de 15,77% para 13,54%, e só estamos no terceiro ano posterior à aprovação desta emenda.”
2- A Educação
A educação, que teve um orçamento, excluídas as despesas de pessoal, de R$ 115 bilhões em 2015, contará com R$ 71 bilhões em 2021. O gráfico abaixo mostra o desmoronamento de um dos potenciais pilares para o desenvolvimento da nação.
3- A Assistência Social
Um contingente de 3,4 milhões de brasileiros passou para a extrema pobreza. Esse é o resultado da queda de renda pela recessão e por desajustes no Programa Bolsa Família (não correção pela inflação dos benefícios e exclusão de mais 1 milhão de famílias do programa).
“Entre 2014 e 2018, a renda dos 5% mais pobres no Brasil caiu 39% e, como consequência, o contingente da população em extrema pobreza aumentou em 71,8% neste ínterim com incorporação de cerca de 3.4 milhões de novos pobres extremos”, afirmou nota do FGV Social.
Marcelo Neri, Diretor do FGV Social, salientou que “os desajustes no Bolsa Família dos últimos 5 anos significaram um ajuste fiscal nos ombros dos mais pobres que quase não contribuiu para o acerto das contas públicas do país e ainda desprotegeu os brasileiros mais vulneráveis durante um período de crise econômica”.
4- Segurança Alimentar e Nutricional
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) teve sua execução orçamentária reduzida em quase 20%, passando de R$ 4,9 bilhões, em 2014, para R$ 4 bilhões em 2019.
“A alimentação escolar é fundamental para a proteção do Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas, uma vez que a refeição feita na escola é muitas vezes a única alimentação de crianças em situações de maior vulnerabilidade. (…) O PNAE deve ser percebido como um instrumento estratégico de combate à fome, por sua capilaridade nacional, especialmente em um contexto pós pandemia e de interrupção do auxílio emergencial”, reforça a Nota Técnica da Coalizão Direitos Valem Mais.
A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2017-2018, divulgada em setembro de 2020, revela que:
“A insegurança alimentar grave esteve presente no lar de 10,3 milhões de pessoas ao menos em alguns momentos entre 2017 e 2018. Dos 68,9 milhões de domicílios do país, 36,7% estavam com algum nível de insegurança alimentar, atingindo, ao todo, 84,9 milhões de pessoas.”
A Coalizão Direitos Valem Mais
Como o único recurso que cabe a este ataque sistemático aos direitos social é a mobilização dos que lutam por uma sociedade mais igualitária e se indignam com o descaso a que estão relegadas parcelas enormes dos brasileiros e brasileiras, a Coalizão Direito Valem Mais mais apresenta sua contribuição:
“As duzentas associações e consórcios de gestores públicos; organizações, fóruns, redes,plataformas da sociedade civil; conselhos nacionais de direitos; entidades sindicais; associações de juristas e economistas e instituições de pesquisa acadêmica que integram a Coalizão Direitos Valem Mais vêm apresentar esta nota técnica ao Congresso Nacional e à sociedade brasileira com um conjunto de propostas visando fortalecer a Lei de Diretrizes Orçamentárias e a Lei Orçamentária Anual 2021 como instrumentos para o enfrentamento do dramático contexto da pandemia e de suas consequências nas condições de vida da população.”
Uma lacuna de R$ 290 bilhões
Ao avaliar as necessidades das áreas de saúde, educação, assistência social e segurança alimentar os integrantes da Coalizão concluíram que o mínimo necessário para garantir esses direitos, na sequência da pandemia, em 2021, deve ter o valor de R$ 665 bilhões. O projeto do governo aponta para R$ 374,5 bilhões, uma lacuna de R$ 290 bilhões.
“A proposta contida nesta nota técnica de piso mínimo emergencial no Projeto de Lei Orçamentária Anual – PLOA 2021, para suprir a necessidade dos direitos à saúde, educação, assistência social e segurança alimentar e nutricional para 2021, totaliza o valor de 665 bilhões de reais.
O valor previsto no PLOA 2021,apresentado pelo governo federal para essas áreas, totaliza 374,5 bilhões, montante que corresponde apenas a 58% do piso mínimo emergencial para a garantia desses direitos essenciais, muito distante das necessidades urgentes ampliadas pela pandemia.”
“A EC 95 é definida pela ONU como a medida econômica mais drástica contra direitos sociais do planeta.” Só a mobilização junto aos membros do Congresso Nacional poderá virar esse jogo.
0 comentários:
Postar um comentário