Por Luís Nassif, no jornal GGN:
Quem assistiu “Queda Livre”, o documentário da Netflix sobre a Boeing, entendeu, de cara, a tragédia do apagão que atingiu 22 estados brasileiros.
O jogo é o mesmo.
A Boeing era o orgulho americano, em termos de segurança e responsabilidade para com o público, mas tinha o controle diluído. Houve a fusão com a Douglas, empresa menor, mas com controle concentrado.
Com suas ações, a Douglas assumiu o controle da Boeing e deu início a um profundo processo de enxugamento de pessoal, visando exclusivamente melhorar os dividendos.
Reduziu em todos os níveis, especialmente em manutenção. Acabou com a área de desenvolvimento de novos produtos, relançou velhos produtos com algumas implementações tecnológicas.
Essas implementações necessitavam de treinamento para os pilotos, mas significaria aumento de custos. Não houve o treinamento e o resultado foram dois acidentes fatais que mataram mais de 300 pessoas.
O caso Eletrobras é idêntico.
Na gestão de Michel Temer teve início a negociata, que resultou na transferência do controle da empresa para a 3G – de Jorge Paulo Lehman, Beto Sicupira e Marcel Telles, também com ligações com a Equatorial.
O comando foi entregue a WIlson Ferreira Jr, que já dirigira a CPFL em São Paulo.
Desde que assumiu a Eletrobras, a palavra de ordem de Wilson Ferreira Jr foi o corte de custos.
Em 2017, estimava em 40% o que denominava de “cargos inúteis” na Eletrobras.
Segundo ele, o PMSO (custos com Pessoal, Materiais e Serviços) teriam que ser menores que R$ 7,1 bilhões por ano, mas em 2015 ficaram em R$ 10,4 bilhões. Por isso, segundo seus cálculos, houve um estouro de 45%.
Havia também plano de desmobilização, incluindo a venda de 3 mil km de linhas de transmissão.
Prometia reduzir apenas o quadro administrativo. Entraram NAS DEMISSÕES os quadros técnicos.
Segundo a Reuters, a meta de Ferreira Jr era de uma redução de R$ 1,5 bilhão anual com pessoal. A meta final era reduzir o número de funcionários de 17 mil para 12 mil.
Quando houve vandalismo em torres de transmissão, em janeiro deste ano, a Eletrobras foi obrigada a retardar a saída de quadros técnicos experientes. Foi admitido pelo próprio Ferreira Jr em teleconferência com analistas sobre dados do segundo trimestre.
Em 12 de julho passado, Ferreira Jr estimava que “só em transmissão podemos adicionar R$ 1,1 bilhão em receitas”.
Houve a aquisição de novas linhas de transmissão, graças aos ganhos de eficiência operacional e financeira, no qual elemento central foram os PDVs (Programas de Demissão Voluntária).
Em agosto, o próprio Ministério das Minas e Energia solicitou a interrupção dos desligamentos de pessoal, até que pudesse avaliar melhor as consequências para a companhia. A carta, de 8 de agosto, foi assinada pelo secretário-executivo do MME, Efrain Cruz,
Dizia ele:
“Ministério de Minas e Energia é responsável por zelar pelo equilíbrio entre a oferta e a demanda de energia elétrica e, considerando a importância da Eletrobras na disponibilização da oferta de energia elétrica, externo a minha preocupação com o desligamento de um número expressivo de funcionário e com as suas consequências para a manutenção da confiabilidade do suprimento de energia elétrica”.
No final, solicitava a Wilson Ferreira Junior suspender o PDV até que o ministério pudesse examinar dois documentos pedidos à Eletrobras: o plano de ação considerando a existência do PDV e o plano de investimentos para os próximos anos, nos segmentos de Geração e Transmissão, e como será possível executar o planejado sem a força de trabalho desligada através do PDV.
Nada foi feito. Repetiu-se o padrão 3G da Light, do Rio Grande do Sul, com resultados absolutamente precoces, mostrando a extraordinária inabilidade de Ferreira Jr.
Foi demitido um dia antes do apagão, e substituído por um financeiro em estado puro, enquanto a 3G disparava sua assessoria para plantar notícias em jornalistas menos interessados em cobrir fatos, mostrando o papel extraordinariamente deletério do jornalismo ideológico.
Um dia antes do blackout Ferreira Jr pediu demissão, ou foi demitido. Sabia-se já o que vinha pela frente.
O apagão durou 6 horas, mas foi fundamental para se analisar os riscos em que se coloca todo o país, deixando um insumo estratégico, a energia, nas mãos dos chamados “piranhas financeiras” – termo, aliás, que nem é da esquerda, é de Augusto Pinochet quando percebeu, em plena ditadura chilena, a voracidade dos supostos “modernizadores” do país.
Agora, é hora de analisar a maior negociata da história moderna do país, a venda do maior ativo público tendo na ponta compradora o grupo de financistas que quebrou as Americanas e a Light, e na ponta vendedora, financistas, seus parceiros, que se apossaram do governo.
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