Por Izaías Almada, no Blog da Boitempo:
A foto ao lado, que ilustra o artigo, poderia ter sido mais emblemática se as cinco damas globais tivessem tomado emprestadas, dos cinco juízes que votaram desconhecendo as leis e a constituição brasileira, as suas togas negras. Seria o corolário natural de quem se deixa levar pelo “efeito manada”.
Senhoras atrizes: se pudéssemos reduzir a grandeza da história do teatro universal a apenas três períodos de sua rica e inesgotável criatividade, penso que não estaríamos faltando à verdade citando os trágicos gregos, o teatro elisabetano e o teatro alemão entre guerras, destacando-se – para ilustrar esse artigo – as figuras de Sófocles, Shakespeare e Bertolt Brecht.
Usando o binóculo do conhecimento histórico e especulando sobre o espaço poético de tais autores no tempo em que viveram, vamos nos deparar – entre outras – com a grandeza de personagens como Antígona (resistência ao autoritarismo), Lady Macbeth (a ambição pelo poder) e Mãe Coragem (o amor maternal contra a ignomínia das guerras). Três símbolos ou mitos se quiserem, de figuras femininas que, de uma ou de outra maneira marcaram o imaginário coletivo, contribuindo para a reflexão sobre a participação das mulheres em momentos emblemáticos da história da humanidade: a antiguidade clássica, o renascimento e a idade moderna com suas duas violentas guerras mundiais.
A alvorada do século XXI tem sido pródiga em mostrar a todos nós como a história do homem se repete ciclicamente, mas sempre renovada e retemperada pelos avanços da ciência, pelos novos e ao mesmo tempo eternos embates religiosos, pelas conquistas sociais, pelo domínio do processo produtivo, pelo poder político, pela difusão e também pela manipulação das ideias, pelos arquétipos de organizações da sociedade que se chocam e, sobretudo, pela luta de classes que se intensifica quando o homem, inúmeras vezes na contramão do progresso que conquista, procura ser cada vez mais o algoz do próprio homem.
Dentro desse cenário conturbado e pleno de contradições, o convívio entre povos e nações se torna cada vez mais sensível, por um lado à preservação sadia do meio ambiente e, por outro, ao desarmamento do espírito belicista e dominador com que alguns desses povos e dessas nações se colocam diante das demais. Em outras palavras: o mundo parece iniciar uma nova fase de reorganização geopolítica em que nações emergentes acumulam riquezas e poder de persuasão diante de nações que “dominaram” o planeta nos últimos duzentos, duzentos e cinquenta anos. Toda transição é difícil, todo novo parto uma incógnita…
O Brasil procura se adaptar, ainda como país emergente, a essa nova geopolítica, com seus erros e acertos, com mazelas seculares para resolver, mas com a vontade e a determinação de muitos de seus cidadãos, alguns deles pagando o alto preço da incompreensão, da inveja, do cinismo, dos moralistas de ocasião, dos analistas do nada, dos filósofos de alcova, da soberba e da arrogância praticadas à esquerda e à direita do nosso espectro político.
O já emblemático julgamento da AP 470, que ultrapassou os limites de sobriedade, de discernimento e de competência de boa parte dos ministros togados, vai escancarando para o país a arapuca em que se meteu o Supremo Tribunal Federal ao criminalizar a ação de um partido político e alguns de seus principais integrantes, enfiando goela abaixo da nação, com o apoio e a conivência da imprensa, a noção de que é preciso punir exemplarmente “o maior caso de corrupção na história política do país”. E assim, qualquer ação nesse sentido, mesmo a mais inescrupulosa, vale a pena. A ambição de Lady Macbeth subiu a algumas cabeças mais conservadoras…
Contudo, consoante os ensinamentos aristotélicos sobre a tragédia, a obsessão leva inevitavelmente a uma falha trágica e esta, como se poderá verificar no vídeo abaixo, fica por demais evidente na atuação e no comportamento dos ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, provocando a reação de Antígonas que vão surgindo aqui e ali à procura da justiça.
Uso o exemplo e a metáfora teatral por saber que, como boas atrizes que são, conhecem com alguma propriedade a estrutura das grandes tragédias. E vivemos uma no Brasil de hoje.
O lado obscuro da democracia a que me refiro no título não se confunde apenas com aqueles que procuram usar as liberdades democráticas para “impor” quase que autoritariamente os seus pontos de vista, nesse paradoxo tão ao gosto das almas oportunistas. Refiro-me também a uma parte da esquerda brasileira que, como Pilatos, tem lavado as mãos há quase dez anos diante da crucificação e execração pública de antigos companheiros.
Alguém já disse há dois mil anos, alguém que foi escolhido para morrer no lugar de Barrabás, o ladrão: aquele que não tem pecados, que atire a primeira pedra. O homem e suas contradições devem sempre ser vistos numa perspectiva histórica de transformação. Quando perdemos o sentido dessa perspectiva corremos o risco de nos agarrarmos a valores estratificados. E a moral burguesa é um desses “valores”. Brecht demonstrou isso com enorme clareza. Sua Mãe Coragem é um hino ao contraditório.
Senhoras atrizes: se pudéssemos reduzir a grandeza da história do teatro universal a apenas três períodos de sua rica e inesgotável criatividade, penso que não estaríamos faltando à verdade citando os trágicos gregos, o teatro elisabetano e o teatro alemão entre guerras, destacando-se – para ilustrar esse artigo – as figuras de Sófocles, Shakespeare e Bertolt Brecht.
Usando o binóculo do conhecimento histórico e especulando sobre o espaço poético de tais autores no tempo em que viveram, vamos nos deparar – entre outras – com a grandeza de personagens como Antígona (resistência ao autoritarismo), Lady Macbeth (a ambição pelo poder) e Mãe Coragem (o amor maternal contra a ignomínia das guerras). Três símbolos ou mitos se quiserem, de figuras femininas que, de uma ou de outra maneira marcaram o imaginário coletivo, contribuindo para a reflexão sobre a participação das mulheres em momentos emblemáticos da história da humanidade: a antiguidade clássica, o renascimento e a idade moderna com suas duas violentas guerras mundiais.
A alvorada do século XXI tem sido pródiga em mostrar a todos nós como a história do homem se repete ciclicamente, mas sempre renovada e retemperada pelos avanços da ciência, pelos novos e ao mesmo tempo eternos embates religiosos, pelas conquistas sociais, pelo domínio do processo produtivo, pelo poder político, pela difusão e também pela manipulação das ideias, pelos arquétipos de organizações da sociedade que se chocam e, sobretudo, pela luta de classes que se intensifica quando o homem, inúmeras vezes na contramão do progresso que conquista, procura ser cada vez mais o algoz do próprio homem.
Dentro desse cenário conturbado e pleno de contradições, o convívio entre povos e nações se torna cada vez mais sensível, por um lado à preservação sadia do meio ambiente e, por outro, ao desarmamento do espírito belicista e dominador com que alguns desses povos e dessas nações se colocam diante das demais. Em outras palavras: o mundo parece iniciar uma nova fase de reorganização geopolítica em que nações emergentes acumulam riquezas e poder de persuasão diante de nações que “dominaram” o planeta nos últimos duzentos, duzentos e cinquenta anos. Toda transição é difícil, todo novo parto uma incógnita…
O Brasil procura se adaptar, ainda como país emergente, a essa nova geopolítica, com seus erros e acertos, com mazelas seculares para resolver, mas com a vontade e a determinação de muitos de seus cidadãos, alguns deles pagando o alto preço da incompreensão, da inveja, do cinismo, dos moralistas de ocasião, dos analistas do nada, dos filósofos de alcova, da soberba e da arrogância praticadas à esquerda e à direita do nosso espectro político.
O já emblemático julgamento da AP 470, que ultrapassou os limites de sobriedade, de discernimento e de competência de boa parte dos ministros togados, vai escancarando para o país a arapuca em que se meteu o Supremo Tribunal Federal ao criminalizar a ação de um partido político e alguns de seus principais integrantes, enfiando goela abaixo da nação, com o apoio e a conivência da imprensa, a noção de que é preciso punir exemplarmente “o maior caso de corrupção na história política do país”. E assim, qualquer ação nesse sentido, mesmo a mais inescrupulosa, vale a pena. A ambição de Lady Macbeth subiu a algumas cabeças mais conservadoras…
Contudo, consoante os ensinamentos aristotélicos sobre a tragédia, a obsessão leva inevitavelmente a uma falha trágica e esta, como se poderá verificar no vídeo abaixo, fica por demais evidente na atuação e no comportamento dos ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, provocando a reação de Antígonas que vão surgindo aqui e ali à procura da justiça.
Uso o exemplo e a metáfora teatral por saber que, como boas atrizes que são, conhecem com alguma propriedade a estrutura das grandes tragédias. E vivemos uma no Brasil de hoje.
O lado obscuro da democracia a que me refiro no título não se confunde apenas com aqueles que procuram usar as liberdades democráticas para “impor” quase que autoritariamente os seus pontos de vista, nesse paradoxo tão ao gosto das almas oportunistas. Refiro-me também a uma parte da esquerda brasileira que, como Pilatos, tem lavado as mãos há quase dez anos diante da crucificação e execração pública de antigos companheiros.
Alguém já disse há dois mil anos, alguém que foi escolhido para morrer no lugar de Barrabás, o ladrão: aquele que não tem pecados, que atire a primeira pedra. O homem e suas contradições devem sempre ser vistos numa perspectiva histórica de transformação. Quando perdemos o sentido dessa perspectiva corremos o risco de nos agarrarmos a valores estratificados. E a moral burguesa é um desses “valores”. Brecht demonstrou isso com enorme clareza. Sua Mãe Coragem é um hino ao contraditório.
2 comentários:
Por falar em repetição de ciclos, lembro que estudos informam que o planeta Terra já passou por sete fases de extinção.Sobrevivendo, os homens mostraram que os ciclos históricos se repetem "como farsa ou como tragédia". A tragédia é que essas atrizes e os cinco membros do STF expressam a democracia unicamente como farsa. Com isso afirmam a tragédia da história. Vem bem a calhar o aparecimento do cometa Ison, cuja trajetória é uma incógnita. Ameaçadora.
Um reparo ao bom artigo, as madamas globais não são Antígonas em busca de um autor. São antigonas mesmo.
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