Por Marcos Coimbra, na revista CartaCapital:
A respeito de Joaquim Barbosa podem-se discutir várias coisas. Suas motivações, por exemplo: o que teria levado um jovem frustrado no sonho de ser diplomata a jogar para o alto a carreira e querer se tornar promotor? Era mesmo a Justiça seu objetivo? Podem-se discutir os atos e comportamentos como ministro e presidente do Supremo Tribunal Federal. Depois do anúncio da aposentadoria precoce, diversos especialistas o fizeram. Se há, entre eles, quem tenha aprovado a “obra” de Barbosa, ficou calado.
O máximo que se obtém é uma defesa entortada: “Agiu errado, mas queria o bem”. Era mesmo o bem o seu norte?
Suas motivações são assunto para psicanalistas. As coisas que fez e deixou de fazer como magistrado devem ser interpretadas por quem entende de Direito. Mas de uma coisa podemos estar certos: foi sábia a decisão dos examinadores do Instituto Rio Branco que o consideraram inapto para a diplomacia. Alguém calcula as confusões que teria aprontado se viesse a ser embaixador?
Podemos também discutir as consequências de sua passagem pelo primeiro plano de nossa sociedade. Não foi longa, mas acabou por se tornar relevante. Merece ser avaliada.
Sua trajetória, está claro, só teve efeitos mais amplos por ele ter sido transformado, com visível satisfação, em instrumento das oposições ao “lulopetismo”, especialmente de seu braço midiático. Caso não tivessem celebrado um casamento de conveniências, o impacto seria outro.
Sem o “julgamento do mensalão” ou na hipótese de que ele só ocorresse depois da eleição deste ano, Barbosa seria de utilidade limitada. Apenas mais um ministro do STF, sem nada que o destacasse.
O braço mais radical da mídia conservadora ofereceu-lhe o posto de herói em troca da realização de uma tarefa. Seria recompensado se fizesse a parte dele e punido se recusasse o papel. Que o digam as vaias encomendadas contra Ricardo Lewandowski.
A cada vez que retribuía os carinhos recebidos ganhava novos mimos. Tudo nele se tornou elogiável: a mise-en-scène, o modo de dizer o texto, a expressão corporal, o figurino. Ganhou capas de revista, longas e laudatórias reportagens na tevê, belas manchetes. Virou “o menino pobre que mudou o Brasil”, o “responsável pela transformação do País”, e por aí afora. Em troca, deu muitos presentes, nenhum tão vistoso quanto a prisão dos condenados em 15 de novembro de 2013, levados a Brasília como troféus da “limpeza ética” à sua moda. Naquele dia foi autor, roteirista e diretor de espetáculo.
Seria exagero dizer que Barbosa trouxe o ódio, a truculência e a intolerância para a política brasileira. Ou que foi ele quem fez nascer esses sentimentos em uma parcela importante de nossa população. A emersão de sua figura, fabricada por ele e a mídia conservadora, é inegável, acompanhou e incentivou uma deplorável mudança em nossa cultura política. Tornamo-nos um país onde alguns acham “normal” odiar um adversário e sentir raiva de tudo, inclusive do próprio Brasil.
A violência saiu dos guetos neonazistas e das fanfarronices de skinheads, espalhou-se e se achou legítima. Por que não seria válido odiar se uma figura tão elevada da República não escondia seu rancor? Por que um black bloc não poderia manifestar sua raiva quebrando coisas, se regras “erradas” podiam ser rompidas por ele?
Há quem pense ter sido Barbosa importante no processo de valorização da identidade negra no Brasil. Que poderá ser uma referência para crianças e jovens negros, ensinando-os a enfrentar limitações e preconceitos. Pena, mas é improvável. Nada há de construtivo no seu protagonismo. O que poderia ter havido foi tragado pelo espírito de vingança, que, com o histrionismo, tornou-se sua marca.
Resta a ilusão dos menos informados de que, “mal ou bem”, Barbosa teria trazido uma contribuição moralizadora à política brasileira, fazendo com que, “depois do julgamento do mensalão”, as coisas se regenerassem. Nada menos verdadeiro. Nem antes, nem durante, nem após o julgamento algo mudou, em qualquer partido ou nível de poder.
Ele não deixa qualquer legado que mereça tal definição.
A respeito de Joaquim Barbosa podem-se discutir várias coisas. Suas motivações, por exemplo: o que teria levado um jovem frustrado no sonho de ser diplomata a jogar para o alto a carreira e querer se tornar promotor? Era mesmo a Justiça seu objetivo? Podem-se discutir os atos e comportamentos como ministro e presidente do Supremo Tribunal Federal. Depois do anúncio da aposentadoria precoce, diversos especialistas o fizeram. Se há, entre eles, quem tenha aprovado a “obra” de Barbosa, ficou calado.
O máximo que se obtém é uma defesa entortada: “Agiu errado, mas queria o bem”. Era mesmo o bem o seu norte?
Suas motivações são assunto para psicanalistas. As coisas que fez e deixou de fazer como magistrado devem ser interpretadas por quem entende de Direito. Mas de uma coisa podemos estar certos: foi sábia a decisão dos examinadores do Instituto Rio Branco que o consideraram inapto para a diplomacia. Alguém calcula as confusões que teria aprontado se viesse a ser embaixador?
Podemos também discutir as consequências de sua passagem pelo primeiro plano de nossa sociedade. Não foi longa, mas acabou por se tornar relevante. Merece ser avaliada.
Sua trajetória, está claro, só teve efeitos mais amplos por ele ter sido transformado, com visível satisfação, em instrumento das oposições ao “lulopetismo”, especialmente de seu braço midiático. Caso não tivessem celebrado um casamento de conveniências, o impacto seria outro.
Sem o “julgamento do mensalão” ou na hipótese de que ele só ocorresse depois da eleição deste ano, Barbosa seria de utilidade limitada. Apenas mais um ministro do STF, sem nada que o destacasse.
O braço mais radical da mídia conservadora ofereceu-lhe o posto de herói em troca da realização de uma tarefa. Seria recompensado se fizesse a parte dele e punido se recusasse o papel. Que o digam as vaias encomendadas contra Ricardo Lewandowski.
A cada vez que retribuía os carinhos recebidos ganhava novos mimos. Tudo nele se tornou elogiável: a mise-en-scène, o modo de dizer o texto, a expressão corporal, o figurino. Ganhou capas de revista, longas e laudatórias reportagens na tevê, belas manchetes. Virou “o menino pobre que mudou o Brasil”, o “responsável pela transformação do País”, e por aí afora. Em troca, deu muitos presentes, nenhum tão vistoso quanto a prisão dos condenados em 15 de novembro de 2013, levados a Brasília como troféus da “limpeza ética” à sua moda. Naquele dia foi autor, roteirista e diretor de espetáculo.
Seria exagero dizer que Barbosa trouxe o ódio, a truculência e a intolerância para a política brasileira. Ou que foi ele quem fez nascer esses sentimentos em uma parcela importante de nossa população. A emersão de sua figura, fabricada por ele e a mídia conservadora, é inegável, acompanhou e incentivou uma deplorável mudança em nossa cultura política. Tornamo-nos um país onde alguns acham “normal” odiar um adversário e sentir raiva de tudo, inclusive do próprio Brasil.
A violência saiu dos guetos neonazistas e das fanfarronices de skinheads, espalhou-se e se achou legítima. Por que não seria válido odiar se uma figura tão elevada da República não escondia seu rancor? Por que um black bloc não poderia manifestar sua raiva quebrando coisas, se regras “erradas” podiam ser rompidas por ele?
Há quem pense ter sido Barbosa importante no processo de valorização da identidade negra no Brasil. Que poderá ser uma referência para crianças e jovens negros, ensinando-os a enfrentar limitações e preconceitos. Pena, mas é improvável. Nada há de construtivo no seu protagonismo. O que poderia ter havido foi tragado pelo espírito de vingança, que, com o histrionismo, tornou-se sua marca.
Resta a ilusão dos menos informados de que, “mal ou bem”, Barbosa teria trazido uma contribuição moralizadora à política brasileira, fazendo com que, “depois do julgamento do mensalão”, as coisas se regenerassem. Nada menos verdadeiro. Nem antes, nem durante, nem após o julgamento algo mudou, em qualquer partido ou nível de poder.
Ele não deixa qualquer legado que mereça tal definição.
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