Por Antonio Barbosa Filho
Na sua recente entrevista aos blogueiros independentes, a presidenta Dilma Rousseff nos convidou (desafiou?) a promover a tão reclamada democratização da mídia, necessidade vital para a própria democracia brasileira. Seria mais fácil dizer que o governo acovardou-se, ou melhor, continua acovardado, neste tema basilar. Prefiro tomar as palavras da presidenta como um desafio e também uma liberação para que nós, jornalistas, blogueiros, consumidores de informação, conduzamos este processo ao nosso modo. A montanha não vai parir nada, a sociedade terá que alcançar a sonhada vitória, talvez até enfrentando a resistência de setores do próprio governo.
É claro que não podemos abrir mão da cobrança radical por algumas medidas que são atribuição exclusiva do governo. O ministro Berzoini já mencionou uma delas: distribuição mais justa das verbas publicitárias oficiais. Parece que ele determinou estudos sobre o “critério técnico”, já superado pela realidade da mídia digital, a queda de audiência dos meios tradicionais, e até algumas anomalias como os bônus de volume, que virou meio de coagir as agências a direcionarem suas campanhas e verbas.
Mas, já que Dilma nos passou a bola, cabe a nós discutir, elaborar e depois levar (quase escrevi “impor”, que ousadia!) a pauta da sociedade ao governo que neste ínterim estará cuidando de coisas mais urgentes (como a campanha aberta de certa mídia sobre o Congresso e o Judiciário por um irracional “impeachment”).
Caberá a nós, comunicadores e consumidores de informação, mostrarmos à sociedade o quão distorcida é esta área da nossa organização sócio-política. A concentração de poder nas mãos de meia-dúzia de grupos econômicos coloca 200 milhões de pessoas à mercê de um filtro que é ideológico e negocial. Nenhum desses grupos é controlado por profissionais da informação: são todos empresários de vários setores, com interesses financeiros variados, desde o dono de jornal que cria galinhas ou gado, até o dono de TV que acumula latifúndios. Sem falar nos que vendem carnês, móveis, perfumes, pedaços do Paraíso.
Todos eles cometem um crime explícito, condenado pelas leis já em vigor (aqui não se trata de fazer nenhuma lei nova, mas de regulamentar a Constituição): a propriedade cruzada. A Fox TV, emissora da extrema-direita norte-americana cujo dono teve que fechar jornal na Grã-Bretanha por crimes éticos, não possui jornal nos EUA, nem revista, nem gravadora ou editora. No Brasil, a Globo, por exemplo, possui tudo isso na mesma cidade, o que é explicitamente proibido pela chamada Lei Maior! O jornal de maior tiragem no Brasil, que eu saiba, é de uma igreja universalista e dirigido pelo controlador de uma rede de TV.
Mas, do que está errado os leitores estão cansados de saber.
A questão que devemos encarar de frente, com abertura de pensamento e valorizando o que já foi feito, como as conclusões da primeira Confecom, as muitas atividades do Centro Barão de Itararé e organizações semelhantes, os debates do Observatório da Imprensa e de tantos laboratórios de debates na universidade e na internet, é o que podemos fazer de concreto, que extrapole a mera expectativa e a cobrança de atos oficiais. Ou seja: somos capazes de competir e equilibrar o jogo da informação por nossos próprios meios, contando pouco com qualquer apoio do governo federal?
Por exemplo: como anda a imprensa sindical no Brasil? Qual é o jornal de maior tiragem entre todos os órgãos sindicais, obviamente em relação à suas bases? Seria sonhar muito imaginar que as centrais tivessem jornais que atingissem toda a comunidade? Seria muito utópico sonhar que o PT, ou o PDT, ou qualquer outro partido democrático tivessem um “L’Humanité” ou um “L’Unitá”? Sei: ambos vivem crise, e voltam-se para a internet, abandonando o papel.
Então falemos de rádio: quantos sindicatos compram horários nas emissoras comerciais, talvez usando 10% do dinheiro empregado em congressos sobre a democratização da mídia?
Ou a TV: quantos pedidos de concessão existem, de sindicatos, tramitando no Ministério responsável? A TVT é a única experiência do tipo, e só começou no final do governo Lula! É fantástica, mas é muito pouco.
Antes que objetem que estou fixado em meios arcaicos,vou tratar brevemente da blogosfera - sem menosprezar o fato de que a direita use muito bem os velhos jornais, revistas, TVs e rádios, meios que eu jamais abandonaria a médio prazo.
Parece-me que o Luiz Carlos Azenha e outros batalhadores pela mídia democrática já cogitaram de um amplo debate, não daqueles intermináveis a que estamos habituados, em torno da criação de um grande Portal de esquerda, plural, e com capacidade para atingir grandes audiências. Uma soma de esforços com variados formatos. Os hangouts obtém grande resultado - Olavo de Carvalho que o diga. Deixo a cargo dos especialistas que abundam em nosso meio, propostas mais eficientes e praticáveis.
Não tenho respostas: como Dilma, quero provocar os companheiros para uma formulação rápida, intensa e qualificada de meios da sociedade para que as vozes democráticas e progressistas disputem o espaço hoje dominado pela direita. E nada tenho contra a direita poder expressar-se. Tenho convicção de que ela perde qualquer debate e jamais convencerá a maioria do povo brasileiro a recolocá-la no poder político. A menos que continue sendo a única matriz ideológica a poder falar com a maioria dos brasileiros….
O que nos fadiga é esta busca por caminhos sem qualquer amparo de quem deveria defender a democracia midiática em primeiro lugar: o Governo que jamais teria sido eleito e reeleito sem nosso esforço disperso, amador, sacrificado, voluntário.
Quando a presidenta Dilma afirma que “no momento não há a menor condição de abrir essa discussão, por conta de toda a situação”, ela nos abre a possibilidade de mostrar a que viemos, o que pretendemos sobre uma Comunicação a serviço do povo. Nem digo popular, porque esta nunca deixou de existir, nas suas mais autênticas maneiras. Nossa cancha é a Comunicação tecnológica, impressa, radiodifusora ou virtual.
Vamos matar no peito?
* Antonio Barbosa Filho é jornalista, vive em Taubaté-SP e Delft/Países-Baixos, autor de “A Bolívia de Evo Morales” e “A Imprensa versus Lula”.
Na sua recente entrevista aos blogueiros independentes, a presidenta Dilma Rousseff nos convidou (desafiou?) a promover a tão reclamada democratização da mídia, necessidade vital para a própria democracia brasileira. Seria mais fácil dizer que o governo acovardou-se, ou melhor, continua acovardado, neste tema basilar. Prefiro tomar as palavras da presidenta como um desafio e também uma liberação para que nós, jornalistas, blogueiros, consumidores de informação, conduzamos este processo ao nosso modo. A montanha não vai parir nada, a sociedade terá que alcançar a sonhada vitória, talvez até enfrentando a resistência de setores do próprio governo.
É claro que não podemos abrir mão da cobrança radical por algumas medidas que são atribuição exclusiva do governo. O ministro Berzoini já mencionou uma delas: distribuição mais justa das verbas publicitárias oficiais. Parece que ele determinou estudos sobre o “critério técnico”, já superado pela realidade da mídia digital, a queda de audiência dos meios tradicionais, e até algumas anomalias como os bônus de volume, que virou meio de coagir as agências a direcionarem suas campanhas e verbas.
Mas, já que Dilma nos passou a bola, cabe a nós discutir, elaborar e depois levar (quase escrevi “impor”, que ousadia!) a pauta da sociedade ao governo que neste ínterim estará cuidando de coisas mais urgentes (como a campanha aberta de certa mídia sobre o Congresso e o Judiciário por um irracional “impeachment”).
Caberá a nós, comunicadores e consumidores de informação, mostrarmos à sociedade o quão distorcida é esta área da nossa organização sócio-política. A concentração de poder nas mãos de meia-dúzia de grupos econômicos coloca 200 milhões de pessoas à mercê de um filtro que é ideológico e negocial. Nenhum desses grupos é controlado por profissionais da informação: são todos empresários de vários setores, com interesses financeiros variados, desde o dono de jornal que cria galinhas ou gado, até o dono de TV que acumula latifúndios. Sem falar nos que vendem carnês, móveis, perfumes, pedaços do Paraíso.
Todos eles cometem um crime explícito, condenado pelas leis já em vigor (aqui não se trata de fazer nenhuma lei nova, mas de regulamentar a Constituição): a propriedade cruzada. A Fox TV, emissora da extrema-direita norte-americana cujo dono teve que fechar jornal na Grã-Bretanha por crimes éticos, não possui jornal nos EUA, nem revista, nem gravadora ou editora. No Brasil, a Globo, por exemplo, possui tudo isso na mesma cidade, o que é explicitamente proibido pela chamada Lei Maior! O jornal de maior tiragem no Brasil, que eu saiba, é de uma igreja universalista e dirigido pelo controlador de uma rede de TV.
Mas, do que está errado os leitores estão cansados de saber.
A questão que devemos encarar de frente, com abertura de pensamento e valorizando o que já foi feito, como as conclusões da primeira Confecom, as muitas atividades do Centro Barão de Itararé e organizações semelhantes, os debates do Observatório da Imprensa e de tantos laboratórios de debates na universidade e na internet, é o que podemos fazer de concreto, que extrapole a mera expectativa e a cobrança de atos oficiais. Ou seja: somos capazes de competir e equilibrar o jogo da informação por nossos próprios meios, contando pouco com qualquer apoio do governo federal?
Por exemplo: como anda a imprensa sindical no Brasil? Qual é o jornal de maior tiragem entre todos os órgãos sindicais, obviamente em relação à suas bases? Seria sonhar muito imaginar que as centrais tivessem jornais que atingissem toda a comunidade? Seria muito utópico sonhar que o PT, ou o PDT, ou qualquer outro partido democrático tivessem um “L’Humanité” ou um “L’Unitá”? Sei: ambos vivem crise, e voltam-se para a internet, abandonando o papel.
Então falemos de rádio: quantos sindicatos compram horários nas emissoras comerciais, talvez usando 10% do dinheiro empregado em congressos sobre a democratização da mídia?
Ou a TV: quantos pedidos de concessão existem, de sindicatos, tramitando no Ministério responsável? A TVT é a única experiência do tipo, e só começou no final do governo Lula! É fantástica, mas é muito pouco.
Antes que objetem que estou fixado em meios arcaicos,vou tratar brevemente da blogosfera - sem menosprezar o fato de que a direita use muito bem os velhos jornais, revistas, TVs e rádios, meios que eu jamais abandonaria a médio prazo.
Parece-me que o Luiz Carlos Azenha e outros batalhadores pela mídia democrática já cogitaram de um amplo debate, não daqueles intermináveis a que estamos habituados, em torno da criação de um grande Portal de esquerda, plural, e com capacidade para atingir grandes audiências. Uma soma de esforços com variados formatos. Os hangouts obtém grande resultado - Olavo de Carvalho que o diga. Deixo a cargo dos especialistas que abundam em nosso meio, propostas mais eficientes e praticáveis.
Não tenho respostas: como Dilma, quero provocar os companheiros para uma formulação rápida, intensa e qualificada de meios da sociedade para que as vozes democráticas e progressistas disputem o espaço hoje dominado pela direita. E nada tenho contra a direita poder expressar-se. Tenho convicção de que ela perde qualquer debate e jamais convencerá a maioria do povo brasileiro a recolocá-la no poder político. A menos que continue sendo a única matriz ideológica a poder falar com a maioria dos brasileiros….
O que nos fadiga é esta busca por caminhos sem qualquer amparo de quem deveria defender a democracia midiática em primeiro lugar: o Governo que jamais teria sido eleito e reeleito sem nosso esforço disperso, amador, sacrificado, voluntário.
Quando a presidenta Dilma afirma que “no momento não há a menor condição de abrir essa discussão, por conta de toda a situação”, ela nos abre a possibilidade de mostrar a que viemos, o que pretendemos sobre uma Comunicação a serviço do povo. Nem digo popular, porque esta nunca deixou de existir, nas suas mais autênticas maneiras. Nossa cancha é a Comunicação tecnológica, impressa, radiodifusora ou virtual.
Vamos matar no peito?
* Antonio Barbosa Filho é jornalista, vive em Taubaté-SP e Delft/Países-Baixos, autor de “A Bolívia de Evo Morales” e “A Imprensa versus Lula”.
1 comentários:
Governar com a mídia tucana no calcanhar não deve ser fácil.
Gostei do texto. Antonio Barbosa Filho
é jornalista sem cabresto, não cede, não vende e não empresta sua consciência.
Postar um comentário