Por Altamiro Borges
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Vozes da moralidade
Janio de Freitas
Taradinhos do impeachment e remanescentes do governo FHC preservam o presidente da Câmara, Eduardo Cunha
A situação pessoal embaraçosa, com o presumido risco de perder milhões de dólares resguardados no exterior para não os perder, deve ter mexido com a frieza de Eduardo Cunha. Mas Eduardo Cunha exagera, supondo-se "execrado". Muito ao contrário. Eduardo Cunha não está sozinho, não foi abandonado por causa de acusações. E tanto conta com fraternidades espontâneas, como dispõe de armas para produzir interessados em não o incomodar. Ou só fazê-lo em último desespero de causa.
A verdadeira atitude do PSDB, até ontem (10), de benevolência quando as provas contra Eduardo Cunha já levam a pedidos de sua cassação, provém de duas vertentes. Os taradinhos do impeachment preservam o presidente da Câmara porque esperam dele que instale a ação para a derrubada de Dilma e não têm pudor de dizê-lo. Aécio Neves não foi sugerir a Eduardo Cunha que se licenciasse coisa nenhuma, se nem disfarçou o desejo de que seja poupado para encaminhar o processo. O "aquilo" em que esses taradinhos só pensam não é aquilo, é o impeachment.
A outra vertente de proteção peessedebista a Eduardo Cunha veio dos mais velhos que ainda influem no partido. São remanescentes do governo Fernando Henrique. Ou seja, do escândalo das privatizações causado por grampos telefônicos que levaram à saída forçada de ministros e de outros do governo, comprometidos com fraudulências surpreendidas pelas gravações.
Confrontado de repente com uma pergunta sobre a origem das fitas, o general Alberto Cardoso, da Casa Militar, disse que foram encontradas sob um viaduto em Brasília. A verdade era outra. A maior parte dos procedimentos para as privatizações transcorreu no Rio, sede das empresas e do BNDES, além das extensões de ministérios também envolvidos, como Indústria e Fazenda. Tudo se passava, portanto, nos domínios territoriais e operacionais de Eduardo Cunha, presidente da Telerj, a telefônica estatal do Rio, no governo Collor e até a posse de Itamar Franco.
Logo, nada de extraordinário que, pelas investigações ou por dedução, o circuito fechado do governo Fernando Henrique desse as gravações como obra de Eduardo Cunha, que em anos recentes já fora dado como responsável por grampos em série. No seu "diário" de presidente, Fernando Henrique refere-se a Eduardo Cunha deste modo, transcrito da revista "piauí" pelaFolha: "O Eduardo Cunha foi presidente da Telerj, nós o tiramos de lá no tempo do Itamar porque ele tinha trapalhadas, ele veio da época do Collor". Esse "nós" é invenção da vaidade. Fernando Henrique estava indo para Relações Exteriores e nada teve com a exoneração rápida de Eduardo Cunha, decidida e feita por Itamar. Sem sequer considerar trapalhadas, mas, como muitas outras demissões, por ser ligado a PC Farias.
Gravações clandestinas não começam no exato momento comprometedor da conversa. Quem as instalou pode fazer coleções de conversas, personagens e assuntos. E quem sabe que gravações podem trazer-lhe complicações, diretas ou indiretas, não ousa contra o possível colecionador. A não ser quando o veja batido, esvaído, inerte. Como muitos têm esperado ver Eduardo Cunha, para lembrar-se de que são grandes defensores da moralidade. Privada e pública.
Mas não só de grampeamentos se fazem coleções biográficas. Como ex-presidente da Telerj, Eduardo Cunha sabe – e ninguém duvide de que também comprove– que a estatal dava dinheiro a políticos. Quantias fixas. Mês a mês. Por nada.
E Eduardo Cunha não só investigou. Também pagou. Se vai cobrar, ainda não se sabe.
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Apesar da sinistra história do lobista Eduardo Cunha, a mídia privada e o seu dispositivo partidário (PSDB, DEM, PPS e SD) deram total apoio ao presidente da Câmara Federal na sua insana cruzada para desgastar o governo Dilma. Agora, porém, os velhos oportunistas afirmam que desconheciam as suas práticas e anunciam, como ratos, o desembarque do navio à deriva. Temem que o ventilador no esgoto respingue na sua falsa imagem "ética". O tal "afastamento", que virou manchete nos jornalões deste domingo (11), chega a ser patético. Nesta tragicomédia, certas figuras assumem os papéis mais ridículos. É o caso do fascista mirim Kimzinho Kataguiri, líder do alienígena Movimento Brasil Livre (MBL), e do pragmático negocista Paulinho da Força, chefão da sigla Solidariedade (SD).
O mentor infantil dos golpistas, que adora selfies e frases ocas, deu inúmeras declarações de amor ao presidente da Câmara Federal. Ficou famosa a sua foto, todo sorridente, ao lado de Eduardo Cunha após a "marcha da liberdade" a Brasília no final de maio. Seus seguidores, que promoveram neste ano três atos pelo impeachment de Dilma e pela volta dos militares ao poder, carregaram faixas com os dizeres "Somos todos Cunha". Até quando surgiram as primeiras provas das contas suíças do lobista, Kimzinho Kataguiri afirmou, em entrevista à Folha, que não havia nada de concreto contra seu amigo golpista. Agora, para surpresa de seus admiradores, ele anuncia o rompimento com Eduardo Cunha. Cruel, ele chega a ironizar nas redes sociais o papel relevante da primeira-dama, Cláudia Cruz.
Já o insuspeito Paulinho da Força - antes satanizado pela mídia e hoje tão blindado em sua biografia - carregou o lobista para vários cantos. Ele garantiu o palanque para o carrasco dos trabalhadores - que votou às pressas o projeto de terceirização e outros golpes contra os direitos trabalhistas - no ato do 1º de Maio da Força Sindical em São Paulo. Não satisfeito, ele promoveu um ato de apoio ao presidente da Câmara Federal, em agosto, o que gerou duras críticas de vários sindicalistas da Força - inclusive com o pedido do seu afastamento da direção da entidade. Já neste sábado (10), Paulinho da Força foi um dos mentores do documento dos partidos da direita que pedem a renúncia de Eduardo Cunha.
O que explica a trairagem?
O que explica esta cruel trairagem de Kimzinho, Paulinho e de outros diminutivos da política nativa? Todos já conheciam a trajetória sinistra de Eduardo Cunha e nunca cobraram atestado de pureza ao velho achacador. Pelo contrário. Sempre o incentivaram na sua cavalgada incendiária. Até a semana passada, os líderes da oposição udenista ainda davam declarações de apoio ao presidente da Câmara. Carlos Sampaio, líder do PSDB metido a xerife - mas que até hoje não explicou as suas práticas de nepotismo -, chegou a dizer que as provas das contas secretas na Suíça não desabonavam o milionário correntista. Na prática, Kimzinho, Paulinho e outros "inhos" apostavam em Eduardo Cunha como o pivô da abertura do processo de impeachment contra Dilma. Os fins justificavam os meios.
Agora, porém, o presidente da Câmara Federal perdeu qualquer legitimidade para levar adiante este golpe contra a democracia. Como lamentou a Folha tucana neste domingo (11), "os oposicionistas avaliaram não ser possível pedir saída de Dilma sem posicionamento sobre contas de deputado". Ou seja: joga-se no lixo o bagaço de Eduardo Cunha para garantir a continuidade do processo golpista contra a presidenta eleita pela maioria dos brasileiros em outubro do ano passado. A oposição ainda faz cálculos oportunistas sobre os estragos na sua imagem - dane-se o presidente da Câmara Federal.
"Os líderes do PSDB, PSB, DEM, PPS e SD passaram o dia calculando o impacto político de segurar o apoio público a Cunha até a semana que vem. A saída encontrada foi uma nota curta, defendendo 'o afastamento do cargo de presidente até mesmo para que ele possa exercer de forma adequada seu direito constitucional à ampla defesa'", relata a Folha, que ainda acrescenta que o jogo foi combinado. "Cunha foi avisado do teor do texto antes da divulgação... Mesmo com o gesto da oposição, a expectativa é de que Cunha mantenha o roteiro programado para dar fôlego ao pedido de impeachment de Dilma".
Os taradinhos do impeachment
Os fascistas mirins também participam deste jogo de cena. "Um dos principais grupos que apoiam o impeachment de Dilma, o Movimento Brasil Livre atacou o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, a quem cabe encaminhar eventual processo de afastamento da petista. Montagem publicada pelo MBL em rede social na sexta (9) mostra o peemedebista com dólares guardados na cueca enquanto joga tênis. A imagem é uma referência a documentos do Ministério Público da Suíça que indicam que o dinheiro no exterior atribuído a Cunha foi usado para pagar aulas da mulher dele em uma academia de tênis na Flórida (EUA)".
Na prática, Kimzinho trai Eduardo Cunha para tentar evitar deserções na sua cruzada golpista contra Dilma. Vai que algum seguidor perceba que o discurso anticorrupção era bravata dos "taradinhos do impeachment" - segundo excelente definição de Janio de Freitas em artigo publicado neste domingo:
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Vozes da moralidade
Janio de Freitas
Taradinhos do impeachment e remanescentes do governo FHC preservam o presidente da Câmara, Eduardo Cunha
A situação pessoal embaraçosa, com o presumido risco de perder milhões de dólares resguardados no exterior para não os perder, deve ter mexido com a frieza de Eduardo Cunha. Mas Eduardo Cunha exagera, supondo-se "execrado". Muito ao contrário. Eduardo Cunha não está sozinho, não foi abandonado por causa de acusações. E tanto conta com fraternidades espontâneas, como dispõe de armas para produzir interessados em não o incomodar. Ou só fazê-lo em último desespero de causa.
A verdadeira atitude do PSDB, até ontem (10), de benevolência quando as provas contra Eduardo Cunha já levam a pedidos de sua cassação, provém de duas vertentes. Os taradinhos do impeachment preservam o presidente da Câmara porque esperam dele que instale a ação para a derrubada de Dilma e não têm pudor de dizê-lo. Aécio Neves não foi sugerir a Eduardo Cunha que se licenciasse coisa nenhuma, se nem disfarçou o desejo de que seja poupado para encaminhar o processo. O "aquilo" em que esses taradinhos só pensam não é aquilo, é o impeachment.
A outra vertente de proteção peessedebista a Eduardo Cunha veio dos mais velhos que ainda influem no partido. São remanescentes do governo Fernando Henrique. Ou seja, do escândalo das privatizações causado por grampos telefônicos que levaram à saída forçada de ministros e de outros do governo, comprometidos com fraudulências surpreendidas pelas gravações.
Confrontado de repente com uma pergunta sobre a origem das fitas, o general Alberto Cardoso, da Casa Militar, disse que foram encontradas sob um viaduto em Brasília. A verdade era outra. A maior parte dos procedimentos para as privatizações transcorreu no Rio, sede das empresas e do BNDES, além das extensões de ministérios também envolvidos, como Indústria e Fazenda. Tudo se passava, portanto, nos domínios territoriais e operacionais de Eduardo Cunha, presidente da Telerj, a telefônica estatal do Rio, no governo Collor e até a posse de Itamar Franco.
Logo, nada de extraordinário que, pelas investigações ou por dedução, o circuito fechado do governo Fernando Henrique desse as gravações como obra de Eduardo Cunha, que em anos recentes já fora dado como responsável por grampos em série. No seu "diário" de presidente, Fernando Henrique refere-se a Eduardo Cunha deste modo, transcrito da revista "piauí" pelaFolha: "O Eduardo Cunha foi presidente da Telerj, nós o tiramos de lá no tempo do Itamar porque ele tinha trapalhadas, ele veio da época do Collor". Esse "nós" é invenção da vaidade. Fernando Henrique estava indo para Relações Exteriores e nada teve com a exoneração rápida de Eduardo Cunha, decidida e feita por Itamar. Sem sequer considerar trapalhadas, mas, como muitas outras demissões, por ser ligado a PC Farias.
Gravações clandestinas não começam no exato momento comprometedor da conversa. Quem as instalou pode fazer coleções de conversas, personagens e assuntos. E quem sabe que gravações podem trazer-lhe complicações, diretas ou indiretas, não ousa contra o possível colecionador. A não ser quando o veja batido, esvaído, inerte. Como muitos têm esperado ver Eduardo Cunha, para lembrar-se de que são grandes defensores da moralidade. Privada e pública.
Mas não só de grampeamentos se fazem coleções biográficas. Como ex-presidente da Telerj, Eduardo Cunha sabe – e ninguém duvide de que também comprove– que a estatal dava dinheiro a políticos. Quantias fixas. Mês a mês. Por nada.
E Eduardo Cunha não só investigou. Também pagou. Se vai cobrar, ainda não se sabe.
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