terça-feira, 19 de abril de 2016

Golpe ganha primeira batalha. O que fazer?

Por Miguel do Rosário, no blog O Cafezinho:

Por incrível que pareça, não estou triste com a derrota. Não gostei dela, claro. Acho que a democracia sofreu um revés. Mas não carrego em meu coração, neste momento, nenhum sentimento de tristeza ou ressentimento.

Ao contrário, sinto-me alegre, sereno e disposto a continuar lutando, porque entendo que a luta é o que dá sentido à nossa vida.

Permitam-me algumas frases de darwinista de botequim.

A luta contra a opressão é uma luta eterna, quiçá de milhões de anos, porque é uma luta contra a morte, contra todos os elementos contrários à vida e à liberdade.

A luta da raça humana contra os arbítrios do capital, contra o conservadorismo, é a luta da nossa evolução biológica contra todos os elementos que pretendiam nos manter eternamente em estado de protozoários.

A derrota faz parte da luta. Então quem gosta de luta precisa aprender a transformar as derrotas políticas em vitórias morais, o que, aliás, foi justamente o que aconteceu ontem.

Tenho dado até risadas da ingenuidade dos coxinhas e trolls que invadem o blog, vomitando seus clichês idiotas.

Perdendo ou ganhando, O Cafezinho emerge dessas batalhas cada vez mais forte, porque é no exercício da luta, e não em seu resultado, que os músculos ganham densidade.

Dito isto, vamos à análise dos fatos.

O julgamento do impeachment acontecerá em 180 dias, mais ou menos junto às eleições municipais deste ano.

Haverá uma total contaminação entre o impeachment, Lava Jato e o processo eleitoral.

Teremos quatro fatores políticos determinantes até o fechamento das urnas em outubro de 2016. Os quatro irão se entrelaçar o tempo inteiro.

1) A discussão do impeachment no Senado, onde o governo terá muito mais tempo e muito mais chance de se defender do que teve na Câmara, onde o processo foi inteiramente atropelado pelos arbítrios de Eduardo Cunha.

2) A Lava Jato. A operação comandada pelo juiz Sergio Moro continua o principal ativo do golpe, porque não passa pela política, onde mal ou bem, ainda conseguimos travar a batalha de opinião. Com a aprovação do impeachment pela Câmara, Sergio Moro se sentirá empoderado para avançar em sua louca cavalgada, promovendo conduções coercitivas ilegais, abusando de prisões preventivas, torturando delatores, vazando seletivamente para a imprensa. A Lava Jato é essencial para produzir o "clima" do golpe, e será mais ainda na votação do Senado. Ela é o principal instrumento de chantagem contra os senadores contrários ao impeachment e contra qualquer agente político.

3) O processo eleitoral. Os setores golpistas da sociedade estarão mobilizados para derrotar a esquerda nas urnas. A esquerda, para resistir, precisará se organizar melhor, se unir em torno de valores e programas, pôr de lado suas divergências, construir plataformas de comunicação. O impeachment e a Lava Jato serão usados, naturalmente, para contaminar o processo eleitoral.

4) As ruas. Depois de anos fora das ruas, e com uma visão confusa e contraditória em relação às jornadas de junho de 2013, a esquerda finalmente se reconciliou com os espaços públicos. Aliás, desde 2013, o país vive um processo intenso de politização, que é positivo, mesmo que, num primeiro momento, a direita pareça ter levado vantagem. As ruas voltaram a ser ocupadas de maneira criativa e permanente pela esquerda.

*****

É preciso entender que o golpe não é apenas o impeachment. Ele ganhou força através da ação partidária do judiciário, e da manipulação sistemática das notícias por parte da imprensa.

Vários fatores pró-golpe não podem ser mudados da noite para o dia. Não conseguiremos mudar o judiciário tão cedo. Mas ele vai mudar um dia para melhor, espero eu.

As mídias tradicionais, por sua vez, são um fator contraditório para o golpe. O envolvimento delas na campanha pró-impeachment é o seu canto do cisne, a sua melancólica despedida.

Elas nasceram golpistas e agora estão morrendo golpistas.

O seu golpismo ajuda a criar, no imaginário coletivo, uma nova mística para os movimentos de mídia livre (Ninja, Jornalistas Livres, blogs progressistas, ativistas da informação).

Os movimentos de mídia livre ganharam a mística de defensores da liberdade e da democracia.

É uma mística que transcende a questão ideológica de esquerda ou direita, porque não atrai apenas a velha esquerda tradicional, mas também liberais, libertários e defensores da Constituição.

Entramos, definitivamente, numa nova era do jornalismo brasileiro.

Surgiu uma dinâmica fatal para a imprensa tradicional: quanto mais ela se afunda nesse golpismo degenerado, mais a audiência migra para meios alternativos de informação.

Para muitas pessoas, os canais de mídia livre nem mais podem ser chamados de "alternativos": eles se tornaram seu principal canal de informação.

Há um outro fator, porém, que tem ajudado muito o golpe: o apagão político do governo. Este apagão é uma das principais causas da situação em que vivemos hoje. Ele teve início no dia 1 do primeiro governo Dilma.

Nesta primeira etapa da luta contra o golpe, que antecedeu a votação na Câmara, todos minimizaram as críticas ao governo, entendendo o que ainda está em jogo: a legalidade democrática, a soberania do sufrágio universal, a luta contra o fascismo e a intolerância.

Nesta segunda etapa da luta, porém, podemos retomar algumas das críticas que vínhamos fazendo, quase que repetitivamente, ao governo federal.

A crítica mais importante, a meu ver, é o inacreditável provincianismo e incompetência do governo em matéria de comunicação.

O governo Dilma nunca teve um porta-voz, nunca teve uma estratégia de comunicação para fazer frente ao massacre diário que sofre na imprensa.

Nenhum governo do mundo pode sobreviver a tantos ataques sem uma estratégia de defesa e contra-ataque.

O governo é uma instituição política que precisa defender sua imagem, em nome de si mesmo e daqueles que o elegeram.

A falta de comunicação do Planalto é um insulto a todos que lutam contra o golpe.

A comunicação é a principal arma de qualquer agente político, sobretudo num ambiente de normalidade democrática, onde o uso da violência é monopolizado pelo Estado e regulado pela Constituição.

Comunicação não é - definitivamente - fazer propaganda política, de obras, bolsa família ou minha casa minha vida, como ainda parece pensar o governo.

Comunicação não é pintar um quadro maravilhoso de uma recuperação econômica que ainda não está vindo.

A comunicação do governo tem de ser menos... governamental e ser mais política, mais moderna, mais jovem, mais sincera, mais dinâmica, mais... comunicativa.

Comunicação é interferir na narrativa. Nomear ministros surpreendentes. Ter porta-voz. Usar as redes de maneira sistemática, 24 horas por dia. Ter uma marca, mas uma marca que tenha consistência e coerência política. Falar dos problemas econômicos com franqueza, sem medo de críticas, propor soluções, ouvir o eleitorado. Ter uma comunicação criativa e moderna. Fugir de clichês, fugir da burocracia, fugir do protocolo. Divulgar vídeos pequenos (inclusive com legendas em inglês e outras línguas, ou mesmo dublados), para divulgação em redes fechadas e abertas. Oferecer uma narrativa diferente à imprensa estrangeira.

Comunicação também é mudar o foco da política econômica. Durante todo o primeiro ano, o governo teve uma narrativa única: ajuste fiscal. Este é o resultado: não teve ajuste nenhum, aumentou o desemprego e abriu-se o flanco para um golpe de Estado.

O governo tem de responder às denúncias e acusações. Tem de montar uma infra-estrutura para isso. E tem de bancar politicamente, corajosamente, essa estrutura: ela tem de vir diretamente do Planalto.

Tem mais, o governo deve se preparar, desde já, a fazer o embate político contra o golpismo judicial. Não é justo que a comunidade que defende o mandato constitucional de Dilma Rousseff seja violentada por mentiras e manipulações acertadas entre Sergio Moro e Globo.

Será que nem um golpe de Estado convencerá o governo a apostar numa comunicação mais forte? Não pode fazer uma mísera reforma no blog do Planalto?

O Planalto apostou demais em ministros e caciques políticos que o esfaquearam pelas costas, ao invés de apostar numa comunicação direta com a sociedade, que permitisse combater o clima de golpe e, com isso, influenciar a opinião pública e o parlamento.

É preciso valorizar as amplas e esclarecidas parcelas da população que estão ao lado da legalidade. É precisar usar o governo para construir estruturas de comunicação que ofereçam narrativas diferentes à opinião pública.

Estruturas públicas, privadas e cooperativas.

Dilma deu uma coletiva à imprensa internacional. Mas não adianta muito fazê-lo apenas uma vez. A comunicação, voltada para o Brasil e para o mundo, tem de ser uma constante do governo.

A presidenta tem que dar coletivas à imprensa internacional diariamente!

O governo tem de oferecer à imprensa internacional, 24 horas por dia, a sua própria narrativa. Este é um dever moral e político do governo. E deve fazê-lo não apenas em momentos de crise, mas de maneira sistemática.

12 comentários:

Carlos disse...

Quanta bobagem...

Anônimo disse...

Pois é, o que fazer ???

Douglas Otaviani Tôrres disse...

Lembro quando Dilma foi eleita pela primeira vez e foi aos rega bifes da velha midia,Ana Maria Braga,aniversario da Folha.Houve uma divisão feroz,entre quem apoiava estas atitudes como estrategia,e os que criticavam(eu neste lado),que a midia era canalha e tinha espirito de escorpião,o que se confirmou.No Blog do Nassif,quase como agora,havis uma furiaa para quem pensava criticamente da atitude de Dilma.Fiquei sem frequentar o Blog por algum tempo,e mais uns 3 (em que fui chamado de burro).Alem da falta de visão politica,a presidente foi se cercando por um staff que alem de tambem serem desastrosos politicamente,até por egos,impediam de vizes discordantes chegarem ao planalto.Lula entrou neste naufragio ja na prorrogação.Espero que o PT agora,da maneira mais dura aprenda a nunca se distanciar de suas bases,de sua identidade,pous isto éo qu mantem vivo e quase salvou o governo.

Humberto de Oliveira disse...

Muito caro Miguel
É sempre um prazer ler seu texto que se mantém carregado de compaixão pelo mundo e pleno de esperança. Coragem e alegria e vamos tentar mostrar o que já nem mais se esconde por traz do falso e tosco moralismo que tenta dar a pauta das discussões nesta hora. A luta de classes está mais viva e forte do que nunca!

Antonio.Celso disse...

Texto Perfeito, como sempre. Espero que alguém do governo Dilma leia isso. Porque faltou só desenhar para que entendam o que está acontecendo. O governo Dilma tem um problema de retardamento... o inicio da reação chegou com quase dois anos de atraso. Esse governo não tem agilidade é pesado nas reações.Também quem manteve o Zé da Justiça e o Mercadante como principais assessores quer que aconteça o que?

Unknown disse...

Prezado Miguel,
Muito lúcida a tua intervenção e, concordo plenamente contigo quando diz que o governo se comunica muito mal. Há tempos que percebo isso.

Daniela disse...

Eu só vejo uma saída para esse Governo nesse momento: fazer uma auditoria da dívida, como propõe há muito tempo a equipe do "Auditoria Cidadã da Dívida".

Mas essa é uma das enganações que esse governo, junto com o Lula fizeram ao Brasil né?

A dívida só cresce.

Se a auditoria da dívida e outras medidas tivessem sido tomadas desde o governo Lula, hoje o quadro político seria outro, favorável.

Imaginem o que seria o Brasil fazer igual ao Equador, o quanto de dinheiro teria para o desenvolvimento do nosso país, e o legado social desse governo ainda seria maior.

Mas eles - tanto Dilma, quanto Lula - preferiram continuar seguindo a cartilha dos banqueiros, agradando-os. Deu no que deu.

Muito do que está acontecendo hoje é resultado da incompetência do PT e dos dois governos Lula e Dilma, que deixaram a situação chegar ao insustentável.

Desculpem, mas essa é minha opinião. O PT e os governos Dilma e Lula foram incompetentes, amadores ao pensarem que a direita, a mídia, nunca iria mostrar as garras golpistas.

Daniela disse...

Imaginem um partido político de esquerda, chegando ao governo federal, após anos de ditadura, após o que aconteceu nas eleições de 89 com Lula sendo atacado da forma que foi, a forma como Collor venceu aquela eleição.

Posteriormente, um governo FHC, do partido oficial do neoliberalismo no Brasil, com compra de votos para se reeleger, tudo o que se sucedeu nesse governo FHC.

Vocês acham que, depois de tudo isso e de outros fatos - incluindo-se Colégio eleitoral 1985 e seus desdobramentos, incluindo como foi o Acordão do Tancredo Neves para se eleger também...Aliás, ninguém questiona como o Sarney foi vice do Tancredo né?

Gostaria de ver os coxinhas explicando como isso aconteceu, os desdobramentos para se chegar a janeiro de 1985.

Esse link é bem interessante para quem quer saber mais sobre a política brasileira:

http://www.pstu.org.br/node/21264

Depois de tudo o que vemos na política brasileira até o final da Era FHC, como o PT chega ao poder achando que "a Globo é nossa.", que não vai acontecer nada, que vão deixar eles governarem no Palácio do Planalto igual o príncipe da privataria governou?

Será que eles acharam que, depois do que o FHC fez para se reeleger, eles não seriam capazes de alçar planos ainda maiores para conseguirem voltar ao poder?

Quem começou a ferrar o PT foi o Palocci, já em meados de 1994, 1995. O PT não viu que ele já estava estragando o partido, iniciando uma privatização em uma empresa de telefonia em Ribeirão Preto / SP?

Deixaram Palocci com a corda solta. Deu no que deu. O que se seguiu com ele nos governos Lula e Dilma, foi só o desfecho.

Se a gente for analisar, o PT, ao assumir com o Lula em 2003, deveria ter sido bem mais precavido, deveria estar mais atento ao que poderia acontecer, dada a história política do nosso país.

Enfim, não é por acaso esse golpe que vemos agora. O próprio PT, de quando assumiu o poder, também caiu no neoliberalismo, transformando-se em um partido de centro-direita, e não mais de esquerda, como seria o correto.

O Palocci foi o que começou a dar forma a esse novo perfil petista.

O PT precisa juntar os cacos, ajudar a Dilma de verdade, rever sua própria trajetória, se reconstruir.

Anônimo disse...

Faça-nos um favor Miguel, envie este "post" para Dilma e o PT. Qualquer estagiário da área de comunicação sabe da importância de "mandar o recado aos quatro cantos" menos a Presidenta e seu partido, são amadores. Por favor, faça isso!

Daniela disse...

Falo da questão da dívida porque esse seria o principal problema a ser equacionado pelos governos que se dizem trabalhistas. Mas o PT governo federal não foi exatamente isso também.

Lula mentiu sobre a dívida. E é uma mentira grave, que envolve o principal problema do nosso país. Qualquer governante, ao assumir um mandato, precisa ir ao ponto aonde tem que jorrar o dinheiro para se governar.

https://pt-br.facebook.com/notes/revela-brasil/a-grande-mentira-do-pagamento-da-d%C3%ADvida-externa/560605500652239/

Eu gosto do Lula e da Dilma, sou totalmente contra esse impeachment, um absurdo, um golpe de Estado, mas eles mentiram e agiram de forma muito desfavorável ao país, pois continuaram a fazer a mesma política econômica que o FHC fazia.

Minha esperança é que o PSOL cresça e se fortaleça, tenha um candidato com reais condições de disputar a presidência em 2018.

Daniela disse...

Quando eu digo que o Lula e a Dilma também enganaram o povo brasileiro, vejam sobre a dívida:

https://www.facebook.com/auditoriacidada.pagina/

http://www.auditoriacidada.org.br/

Eles - tanto Lula, quanto Dilma, não poderiam ao menos ter chamado a Maria Lúcia Fatorelli para conversar?

O governo do Equador requisitou os serviços dela, que tem profundos conhecimentos sobre o assunto.

Eu não quero o impeachment, mas também me sinto enganada pelos dois, Lula e Dilma.

Daniela disse...

Então, para concluir - desculpem se falei demais -, deixo claro meu NÃO ao impeachment, mas em 2018, quero algo melhor para o país.


Chega de PT, PSDB, PMDB, PP, Bolsonaro, Marina Silva. E chega também de Lula. Só voto nele se não tiver jeito, se não tiver outra opção melhor.

Obrigada pelo espaço.