A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na tarde de quinta-feira (05/05) suspendendo o exercício do mandato parlamentar de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e, consequentemente, afastando-o da presidência da Câmara, ainda que atendendo uma vontade quase unanime da sociedade brasileira, guarda mistérios e contradições, que só o tempo mostrará a que serviram e porque foram adotado.
Aparentemente, a primeira e, provavelmente a maior das possíveis contradições estaria no fato de o ministro Teori Zavascki esperar cinco meses para conceder uma liminar. Para a demora, há muitas explicações sendo uma delas a de que ele temia levar ao plenário o afastamento de Cunha, antes de a admissibilidade do processo do impeachment passar pela Câmara, sob o risco de ver seus colegas do STF não o apoiarem na decisão. Já a opção por uma liminar, pode esconder um jogo de bastidores.
É preciso, inicialmente, registrar que os ministros mudaram sua posição, a se considerar o que narrou a reportagem de Carolina Brígido – Afastamento de Cunha ainda está longe de ser julgado no STF –, em O Globo, aqui abordada, em 22 de abril, na reportagem STF cruza os braços e Cunha pode estar armando sua absolvição. Nela, a jornalista especializada na cobertura do STF admitiu que
“os ministros não se convenceram de que existe um motivo jurídico forte o suficiente para tirá-lo da cadeira. Adiar a análise do caso foi a solução encontrada para não precisar declarar oficialmente que Cunha pode permanecer no cargo. Uma decisão desse tipo daria ainda mais poderes ao parlamentar nesse momento de crise – e isso o tribunal quer evitar“.
Logo, se houve a decisão de afastar Cunha, adotada por unanimidade, pode-se concluir que mudanças ocorreram no pensamento da corte. O mais provável é que a repercussão no exterior, com as criticas ao golpe que está sendo armado para derrubar uma presidente eleita pelo voto popular que não cometeu crime de responsabilidade. tenha acordado os ministro, que permaneciam em uma situação de expectativa. Basta ver o que disse Zavascki:
"O estado de suspeição que paira sobre a figura do atual ocupante da presidência da Casa Legislativa – formalmente acusado por infrações penais e disciplinares – contracena negativamente com todas essas responsabilidades, principalmente quando há, como há, ponderáveis elementos indiciários a indicar que ele articulou uma rede de obstrução contra as instâncias de apuração dos pretensos desvios de conduta que lhe são imputadas".
Mônica Bérgamo, jornalista talentosa e bem informada, na sua coluna de quinta-feira (05/05), na Folha de S. Paulo – Teori ficou enfurecido com decisão de Lewandowski e decidiu dar liminar – noticiou que Zavascki “enfurecido com o anúncio feito nesta quarta-feira (4) pelo presidente da corte, Ricardo Lewandowski, de que pautaria nesta quinta a ação da Rede que pedia o afastamento de Eduardo Cunha do cargo de presidente da Câmara”, decidira dar a liminar no pedido que estava na gaveta há cinco meses. A ação do partido de Marina Silva foi colocada na pauta a pedido do relator da matéria, ministro Marco Aurélio Mello.
Nesta sexta-feira, outros jornais seguem nesta direção. Há, porém, uma versão dos bastidores do Supremo que explicaria a liminar, cinco meses depois de pedida, quando o plenário poderia, após todo este tempo, analisar de imediato o mérito do assunto.
A ação de Mello, proposta pela Rede, levada a plenário, poderia não ter o efeito necessário, isto é, o afastamento de Cunha. Bastava, por exemplo, que um ministro pedisse vista do processo e sentasse em cima. Gilmar Mendes já fez isto várias vezes.
É aí que entra Zavascki concedendo uma liminar pela manhã e levando a julgamento o caso à tarde. Mesmo que alguém pedisse vista do processo, a liminar estava concedida e Cunha afastado de presidência da Casa. Por esta tese, que o tempo poderá ou não confirmar, Zavascki não se conflitou com Mello e Lewandowski. Jogou junto.
A suspensão do mandato
Há um segundo detalhe que pode parecer contradição. Cunha, na verdade, sofreu a mesma acusação feita em novembro ao senador Delcídio do Amaral: obstrução da Justiça. No caso do presidente da Câmara afastado, pesou também a tentativa de obstruir o Conselho de Ética.
Em novembro, Zavascki, assumindo as dores dos seus colegas que se sentiram atingidos nas falas do senador gravadas por Bernardo, filho de Nestor Cerveró, determinou a prisão dele, depois confirmada a unanimidade pela 2ª Turma. Mas não houve suspensão do mandato. Tanto assim que o ex-preso permanece senador até que seus próprios colegas do parlamento o cassem. Cunha não foi preso, mas como resume o acórdão do julgamento:
“O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, referendou o deferimento da medida requerida, determinando a suspensão do exercício do mandato de deputado federal do requerido, Eduardo Cosentino da Cunha, e, por consequência, da função de Presidente da Câmara dos Deputados. O Tribunal também determinou que se notifique o Primeiro-Vice-Presidente da Câmara dos Deputados, ou, na sua ausência, o Segundo-Vice-Presidente (art. 18 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados), do inteiro teor da presente decisão, a fim de que a cumpra e faça cumprir, nos termos regimentais próprios”.
Teoricamente, o Supremo poderia ter apenas afastado Cunha da presidência, cassando-o do cargo por não poder exercer o papel de presidente das República interino, como prevê a Constituição já que pela função é o segundo na linha sucessória. Afinal, responde a processo no próprio STF e, como tal, não pode ocupar a presidência da República.
Com isso, como lembrou o Jornal GGN, “apesar de estar afastado do exercício de seu mandato como deputado federal, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) mantém seu salário e outros benefícios dados aos deputados, em um total de mais de R$ 160 mil mensais. Além disso, ele continua com garantias previstas para um presidente da Câmara, como a residência oficial, carro oficial e ter à sua disposição um jato da Força Aérea Brasileira e uma equipe de segurança. Isso ocorre porque Cunha foi suspenso temporariamente do cargo, e não perdeu seu cargo”.
Mas, se o afastasse do cargo, ele continuaria deputado e, como tal, seus processos no Supremo deixariam de ser analisados pelo plenário e passariam para a 2ª Turma, onde políticos são julgados nos processos da Lava Jato. Ali, como explicamos na já citada matéria de abril - STF cruza os braços e Cunha pode estar armando sua absolvição - Cunha poderia contar com o beneplácito de, pelo menos, dois ministros, para acabar absolvido das acusações. Bastaria ser julgado na ausência de um dos ministros da turma; ocorrendo o empate, ele favoreceria o réu, como falamos em abril.
Assim, ao destoar totalmente da jurisprudência do próprio STF que jamais suspendeu mandatos de políticos, Zavascki fez isto para, certamente, ao manter Cunha como deputado e presidente da Casa suspenso, garantir que seus casos sejam analisados no plenário, afastando-se o risco dele ser inocentado.
Divergências internas
Em novembro, Zavascki, assumindo as dores dos seus colegas que se sentiram atingidos nas falas do senador gravadas por Bernardo, filho de Nestor Cerveró, determinou a prisão dele, depois confirmada a unanimidade pela 2ª Turma. Mas não houve suspensão do mandato. Tanto assim que o ex-preso permanece senador até que seus próprios colegas do parlamento o cassem. Cunha não foi preso, mas como resume o acórdão do julgamento:
“O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, referendou o deferimento da medida requerida, determinando a suspensão do exercício do mandato de deputado federal do requerido, Eduardo Cosentino da Cunha, e, por consequência, da função de Presidente da Câmara dos Deputados. O Tribunal também determinou que se notifique o Primeiro-Vice-Presidente da Câmara dos Deputados, ou, na sua ausência, o Segundo-Vice-Presidente (art. 18 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados), do inteiro teor da presente decisão, a fim de que a cumpra e faça cumprir, nos termos regimentais próprios”.
Teoricamente, o Supremo poderia ter apenas afastado Cunha da presidência, cassando-o do cargo por não poder exercer o papel de presidente das República interino, como prevê a Constituição já que pela função é o segundo na linha sucessória. Afinal, responde a processo no próprio STF e, como tal, não pode ocupar a presidência da República.
Com isso, como lembrou o Jornal GGN, “apesar de estar afastado do exercício de seu mandato como deputado federal, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) mantém seu salário e outros benefícios dados aos deputados, em um total de mais de R$ 160 mil mensais. Além disso, ele continua com garantias previstas para um presidente da Câmara, como a residência oficial, carro oficial e ter à sua disposição um jato da Força Aérea Brasileira e uma equipe de segurança. Isso ocorre porque Cunha foi suspenso temporariamente do cargo, e não perdeu seu cargo”.
Mas, se o afastasse do cargo, ele continuaria deputado e, como tal, seus processos no Supremo deixariam de ser analisados pelo plenário e passariam para a 2ª Turma, onde políticos são julgados nos processos da Lava Jato. Ali, como explicamos na já citada matéria de abril - STF cruza os braços e Cunha pode estar armando sua absolvição - Cunha poderia contar com o beneplácito de, pelo menos, dois ministros, para acabar absolvido das acusações. Bastaria ser julgado na ausência de um dos ministros da turma; ocorrendo o empate, ele favoreceria o réu, como falamos em abril.
Assim, ao destoar totalmente da jurisprudência do próprio STF que jamais suspendeu mandatos de políticos, Zavascki fez isto para, certamente, ao manter Cunha como deputado e presidente da Casa suspenso, garantir que seus casos sejam analisados no plenário, afastando-se o risco dele ser inocentado.
Divergências internas
As informações que nos chegaram é que na véspera do afastamento de Cunha, ou seja, na quarta-feira, “o pau quebrou” entre alguns ministros. A confirmar-se tal fato, mostra que há uma divisão interna. A mesma fonte fala de uma ala dos ministros do STF que estaria disposta a”zerar o processo de impeachment”.
O que pode acontecer até quarta-feira, quando o plenário do Senado decide sobre a abertura do processo. A tese está no voto de Zavascki, o “desvio de função de Cunha”.
Nada impede, também, que seja uma decisão tomada mais tarde, respaldada, por exemplo, em alguma “ilegalidade”.
Sabe-se que os três ministros acima citados, Zavascki, Mello e Lewandowski, têm uma linha de pensamento a favor da legalidade. Faltariam três votos, para somar maioria. Ou dois, no caso da ausência, intencional ou não, de um dos ministros. O empate, no caso, favoreceria o réu, no caso, Dilma.
Cabe lembrar que, embora tenha ditado o rito deste processo no Congresso, o Supremo não debateu o mérito do mesmo. Luís Nassif, no Jornal GGN, aborda esta possibilidade de o STF melar o processo do impeachment, embora alerte que é muito difícil, na reportagem: Respingos da queda de Cunha no impeachment de Dilma, Vale transcrever trechos:
Assim, os governistas têm duas alternativas: ou uma atuação independente de Waldir Maranhão, aprovando o retorno do processo à Câmara, ou a expectativa de uma medida “contra o tempo” do Judiciário, com o Supremo mais uma vez assegurando as linhas democráticas do processo.
Apesar de viáveis, nenhuma das duas opções são fáceis. A iniciativa do STF, mais especificamente do ministro Teori Zavascki, de agir pelo afastamento de Cunha – uma figura já timbrada pela população como corrupto e também pouco afeito dos grandes meios de comunicação, já foi traduzida na sessão desta quinta-feira (05) como algo completamente “excepcional” e destoante.
Uma decisão que interferisse no andamento do impeachment, que constitucionalmente é de responsabilidade do Legislativo, é vista pelos ministros com temor. Apesar de em seus julgamentos, o presidente do STF Ricardo Lewandowski destacar que a Corte está atenta aos acontecimentos e a serviço da democracia, dificilmente a decisão alcançaria a maioria dos posicionamentos do Supremo.
Ou seja, plagiando Roberto Carlos, certamente ainda viveremos “fortes emoções”.
O que pode acontecer até quarta-feira, quando o plenário do Senado decide sobre a abertura do processo. A tese está no voto de Zavascki, o “desvio de função de Cunha”.
Nada impede, também, que seja uma decisão tomada mais tarde, respaldada, por exemplo, em alguma “ilegalidade”.
Sabe-se que os três ministros acima citados, Zavascki, Mello e Lewandowski, têm uma linha de pensamento a favor da legalidade. Faltariam três votos, para somar maioria. Ou dois, no caso da ausência, intencional ou não, de um dos ministros. O empate, no caso, favoreceria o réu, no caso, Dilma.
Cabe lembrar que, embora tenha ditado o rito deste processo no Congresso, o Supremo não debateu o mérito do mesmo. Luís Nassif, no Jornal GGN, aborda esta possibilidade de o STF melar o processo do impeachment, embora alerte que é muito difícil, na reportagem: Respingos da queda de Cunha no impeachment de Dilma, Vale transcrever trechos:
Assim, os governistas têm duas alternativas: ou uma atuação independente de Waldir Maranhão, aprovando o retorno do processo à Câmara, ou a expectativa de uma medida “contra o tempo” do Judiciário, com o Supremo mais uma vez assegurando as linhas democráticas do processo.
Apesar de viáveis, nenhuma das duas opções são fáceis. A iniciativa do STF, mais especificamente do ministro Teori Zavascki, de agir pelo afastamento de Cunha – uma figura já timbrada pela população como corrupto e também pouco afeito dos grandes meios de comunicação, já foi traduzida na sessão desta quinta-feira (05) como algo completamente “excepcional” e destoante.
Uma decisão que interferisse no andamento do impeachment, que constitucionalmente é de responsabilidade do Legislativo, é vista pelos ministros com temor. Apesar de em seus julgamentos, o presidente do STF Ricardo Lewandowski destacar que a Corte está atenta aos acontecimentos e a serviço da democracia, dificilmente a decisão alcançaria a maioria dos posicionamentos do Supremo.
Ou seja, plagiando Roberto Carlos, certamente ainda viveremos “fortes emoções”.
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