Há dois movimentos caminhando juntos neste momento, em velocidades diferentes: a delação dos dirigentes da Odebrecht e o esforço do bloco de Temer para acelerar o ato final do impeachment da presidente Dilma, de modo que ele ocorra antes das revelações da empreiteira. Se elas tiverem a força e o alcance esperados, revelando todos os participantes do esquema “ilegal e ilegítimo de financiamento do sistema partidário-eleitoral do país”, como disse a empresa na nota de março, ao anunciar que faria uma “colaboração definitiva”, as condições para a condenação de Dilma podem ser definitivamente comprometidas. Elas já se deterioraram muito por conta das bizarrices do próprio governo interino, ameaçando a consecução dos 54 votos necessários.
Nunca faltou sincronia entre os passos da Lava Jato e o acirramento da crise política com vistas à derrubada do governo Dilma, principalmente na fase em que o PT era a o alvo principal, sobrando um pouco para o PP. Com a posse de Temer e as gravações de Sergio Machado, PMDB e PSDB entraram na linha de fogo. A delação da Odebrecht, entretanto, pode ir muito além do quatro maiores partidos, realizando o sonho do juiz Sergio Moro, de “deslegitimar todo o sistema partidário”, tal como sua inspiradora Mãos Limpas na Itália. Uma amostra do que pode revelar a Odebrecht foi a lista de 300 nomes, de 22 partidos, apreendida em uma de suas unidades em março. Depois, com o argumento de que poderia conter doações legais e ilegais misturadas, puseram uma pedra em cima e a lista sumiu de cena.
Não se tem notícia oficial da delação que envolverá o presidente da holding, Marcelo Odebrecht, ainda preso, seu pai Emilio Odebrecht e outros executivos. Não se sabe oficialmente se depoimentos já foram colhidos ou quando o serão. Mas ela terá de vir, mais cedo ou mais tarde, e o pulo do gato neste momento é o controle deste momento em relação ao relógio político. Se vier antes, pode comprometer a condenação de Dilma. Por isso a pressa, a antecipação do prazo pela comissão especial, contra a qual recorreu a oposição. Caberá ao presidente do STF, Ricardo Lewandowski, homologar esta antecipação, do início de agosto para meados de julho.
A preocupação do governo Temer com a perda de votos no Senado é clara, embora Temer tenha dito, na entrevista a Kennedy Alencar no SBT, que o governo tem 59 ou 60 votos pela condenação da titular da chapa pela qual foi eleito. As contas, entretanto, não mostram esta folga.
São pelo menos três os senadores que, chocados com as gravações de Machado e decepcionados com o governo, admitem votar contra a condenação de Dilma no julgamento final: Cristóvam Buarque (PPS), Romário (PSB) e Acir Gurgacz (PDT). Como o governo teve 55 votos para o afastamento em maio, perdendo os três ficaria com 52. Mas dois senadores não votaram na primeira decisão. Eduardo Braga, ex-ministro de Dilma, e Jáder Barbalho, muito prestigiado por ela com a indicação de seu filho para ministro da Pesca. Se os dois votarem pela condenação, o bloco de Temer recompõe os 54 votos necessários. E isso contando com a hipótese de que seja admitida a participação de Romero Jucá, depois das confissões que fez a Sergio Machado sobre o sentido do impeachment, o de porta de fuga da Lava Jato para a classe política carcomida. E contando ainda com que Renan Calheiros mantenha a decisão de não votar. Neste cenário, o governo não teria um só voto de folga. Teria exatos 54. Se Dilma conquistar mais um, será absolvida. E aí, talvez a classe política tenha que pactuar outra saída, como a das eleições.
Mas se a votação ocorre antes da delação da Odebrecht, sob o argumento de que a interinidade é prejudicial ao país (embora Temer tenha feito tudo o que quer), o panorama pode mudar completamente, dependendo de quem for atingido, e com que força.
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