Por Antônio Augusto de Queiroz, na revista Teoria e Debate:
Em meio à confusão política pouco se falou da gravidade da Proposta de Emenda à Constituição nº 241/2016, encaminhada ao Congresso, ainda durante a interinidade do governo Michel Temer, com o objetivo de congelar, em termos reais, o gasto público pelo período de vinte anos.
Denunciar as consequências catastróficas dessa iniciativa para o futuro do país e para o povo brasileiro é tarefa dos partidos de oposição e dos movimentos sociais. Sua eventual aprovação, além dos malefícios decorrentes da redução do orçamento público, obrigará a realização de outras reformas com redução de direitos, com destaque para a seguridade social (previdência, saúde e assistência social).
Apenas a título de ilustração, levantamos algumas dessas possíveis consequências, todas de interesse direto e imediato do mercado, notadamente o mercado financeiro, o principal financiador do golpe que resultou no impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
A primeira consequência será a limitação ou o direcionamento do papel do Estado apenas para garantir o direito de propriedade, assegurar o cumprimento de acordos e honrar os compromissos com os credores das dívidas interna e externa, já que não poderá mais criar novos programas nem ampliar investimentos.
A segunda será a retirada do controle do Poder Executivo, do Congresso e da sociedade sobre o tamanho do orçamento, que ficará automaticamente engessado por vinte anos, independentemente de haver crescimento econômico ou aumento de arrecadação.
A terceira será o acirramento do conflito distributivo, com os diversos setores da sociedade lutando para ver quem perde menos com os cortes, considerando que a prioridade é economizar nas despesas de custeio e investimento para assegurar o pagamento dos encargos da dívida mobiliária.
A quarta será o desmonte do Estado enquanto instrumento de prestação se serviços, com uma forte reforma administrativa voltada à desvalorização dos servidores, com corte de direitos e de reajustes, além da proibição de novas contratações, mediante a vedação de novos concursos públicos nos próximos vinte anos.
A quinta será a inevitabilidade de uma reforma ou ajuste com viés fiscal na seguridade social e na educação, já que o congelamento não se sustenta sem um drástico corte de despesas na previdência e assistência social, na saúde e na educação.
Para exemplificar o retrocesso que ela representa, basta dizer que se as regras da PEC 241 já estivessem em vigor desde 2003, início do primeiro mandato do presidente Lula, o salário mínimo, atualmente de R$ 880, seria equivalente, no melhor cenário, a R$ 509. O gasto com saúde e educação seria a metade do que é hoje.
O mesmo argumento vale para a previdência e assistência social, o maior programa de distribuição de renda do planeta e responsável pela paz social no Brasil, cuja expansão teria sido duplamente interditada, tanto na quantidade de beneficiários quanto em relação ao valor dos benefícios. Com tal rigor fiscal, a desvinculação de suas prestações do salário mínimo teria sido inevitável, levando o valor dos benefícios, especialmente os de natureza assistencial, a valores muito próximos dos que são pagos hoje a título de Bolsa Família. E será isso o que acontecerá caso a PEC seja aprovada nos termos em que foi apresentada.
O raciocínio é simples. Se há um valor fixo, que já está comprometido com uma despesa, o atendimento a novos beneficiários só será possível se o valor que atende aos atuais for reduzido. Na previdência, por exemplo, existe uma regra de reajuste que continuará a ser aplicada apenas se não houver nenhuma nova aposentadoria. Como novas aposentadorias surgirão, ou se aumenta o valor (o que a PEC proíbe) ou se suprime o reajuste. A última hipótese, combinada com o corte de direitos, é que será colocada em prática, segundo a visão do governo.
Pode parecer exagerado, mas a verdade é que o congelamento do gasto público obriga o corte de direitos dos atuais beneficiários para permitir o acesso a esses direitos de novas pessoas, afinal a população não para de crescer, as pessoas preenchem os requisitos para requerer aposentadoria ou solicitar o benefício assistencial, há demanda por mais saúde e educação, e isso só acontecerá se houver aumento do investimento nesses segmentos ou redução dos benefícios de quem já os vinha usufruindo.
O governo Michel Temer fez uma opção política de não aumentar tributo dos mais ricos e economizar em cima dos mais pobres. Com a PEC 241, a prioridade é o pagamento da dívida, já que essa não está sujeita a nenhum tipo de congelamento. Ou reagimos e denunciamos que a presidenta foi cassada para viabilizar a implementação dessa agenda regressiva, inclusive pressionando o Congresso para rejeitar essa PEC, ou o retrocesso nos direitos será inevitável.
* Antônio Augusto de Queiroz é jornalista é analista político e diretor de Documentação do Diap.
Em meio à confusão política pouco se falou da gravidade da Proposta de Emenda à Constituição nº 241/2016, encaminhada ao Congresso, ainda durante a interinidade do governo Michel Temer, com o objetivo de congelar, em termos reais, o gasto público pelo período de vinte anos.
Denunciar as consequências catastróficas dessa iniciativa para o futuro do país e para o povo brasileiro é tarefa dos partidos de oposição e dos movimentos sociais. Sua eventual aprovação, além dos malefícios decorrentes da redução do orçamento público, obrigará a realização de outras reformas com redução de direitos, com destaque para a seguridade social (previdência, saúde e assistência social).
Apenas a título de ilustração, levantamos algumas dessas possíveis consequências, todas de interesse direto e imediato do mercado, notadamente o mercado financeiro, o principal financiador do golpe que resultou no impeachment da presidenta Dilma Rousseff.
A primeira consequência será a limitação ou o direcionamento do papel do Estado apenas para garantir o direito de propriedade, assegurar o cumprimento de acordos e honrar os compromissos com os credores das dívidas interna e externa, já que não poderá mais criar novos programas nem ampliar investimentos.
A segunda será a retirada do controle do Poder Executivo, do Congresso e da sociedade sobre o tamanho do orçamento, que ficará automaticamente engessado por vinte anos, independentemente de haver crescimento econômico ou aumento de arrecadação.
A terceira será o acirramento do conflito distributivo, com os diversos setores da sociedade lutando para ver quem perde menos com os cortes, considerando que a prioridade é economizar nas despesas de custeio e investimento para assegurar o pagamento dos encargos da dívida mobiliária.
A quarta será o desmonte do Estado enquanto instrumento de prestação se serviços, com uma forte reforma administrativa voltada à desvalorização dos servidores, com corte de direitos e de reajustes, além da proibição de novas contratações, mediante a vedação de novos concursos públicos nos próximos vinte anos.
A quinta será a inevitabilidade de uma reforma ou ajuste com viés fiscal na seguridade social e na educação, já que o congelamento não se sustenta sem um drástico corte de despesas na previdência e assistência social, na saúde e na educação.
Para exemplificar o retrocesso que ela representa, basta dizer que se as regras da PEC 241 já estivessem em vigor desde 2003, início do primeiro mandato do presidente Lula, o salário mínimo, atualmente de R$ 880, seria equivalente, no melhor cenário, a R$ 509. O gasto com saúde e educação seria a metade do que é hoje.
O mesmo argumento vale para a previdência e assistência social, o maior programa de distribuição de renda do planeta e responsável pela paz social no Brasil, cuja expansão teria sido duplamente interditada, tanto na quantidade de beneficiários quanto em relação ao valor dos benefícios. Com tal rigor fiscal, a desvinculação de suas prestações do salário mínimo teria sido inevitável, levando o valor dos benefícios, especialmente os de natureza assistencial, a valores muito próximos dos que são pagos hoje a título de Bolsa Família. E será isso o que acontecerá caso a PEC seja aprovada nos termos em que foi apresentada.
O raciocínio é simples. Se há um valor fixo, que já está comprometido com uma despesa, o atendimento a novos beneficiários só será possível se o valor que atende aos atuais for reduzido. Na previdência, por exemplo, existe uma regra de reajuste que continuará a ser aplicada apenas se não houver nenhuma nova aposentadoria. Como novas aposentadorias surgirão, ou se aumenta o valor (o que a PEC proíbe) ou se suprime o reajuste. A última hipótese, combinada com o corte de direitos, é que será colocada em prática, segundo a visão do governo.
Pode parecer exagerado, mas a verdade é que o congelamento do gasto público obriga o corte de direitos dos atuais beneficiários para permitir o acesso a esses direitos de novas pessoas, afinal a população não para de crescer, as pessoas preenchem os requisitos para requerer aposentadoria ou solicitar o benefício assistencial, há demanda por mais saúde e educação, e isso só acontecerá se houver aumento do investimento nesses segmentos ou redução dos benefícios de quem já os vinha usufruindo.
O governo Michel Temer fez uma opção política de não aumentar tributo dos mais ricos e economizar em cima dos mais pobres. Com a PEC 241, a prioridade é o pagamento da dívida, já que essa não está sujeita a nenhum tipo de congelamento. Ou reagimos e denunciamos que a presidenta foi cassada para viabilizar a implementação dessa agenda regressiva, inclusive pressionando o Congresso para rejeitar essa PEC, ou o retrocesso nos direitos será inevitável.
* Antônio Augusto de Queiroz é jornalista é analista político e diretor de Documentação do Diap.
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