Por Aldo Fornazieri, no Jornal GGN:
As denúncias envolvendo os mal-feitos de Bolsonaro e de seus filhos representam a queda do último baluarte do golpismo. Em poucos meses, Bolsonaro virará quase nada. Ele foi o último refugio das hordas moralistas iradas que tomaram as ruas para derrubar a presidente Dilma. Foi, sem dúvida, um impressionante clamor por moralidade. Mas foi um movimento comandado por moralistas sem moral, por hipócritas de todas as espécies, por cínicos, por despudorados. Uns queriam o poder para se salvarem. Outros o queriam para continuar na senda do crime e da corrupção. Quase todos queriam bloquear e reduzir as parcas conquistas de direitos e de bem estar por parte dos mais pobres.
O resultado desse movimento comandado por moralistas sem moral foi a constituição de um governo cujo presidente é acusado duplamente de ser chefe de quadrilha. Todos os principais líderes do golpe - Temer, Aécio, Cunha, Romero Jucá e tantos outros - tombaram no lodo da história do qual não sairão limpos. Sérgio Moro revelou-se, não só um agente do golpe, um violador das leis e da Constituição, mas um amigo íntimo de corruptos assinalados, a exemplo de Temer e de Aécio.
Bolsonaro, o acolhido e albergado pelos golpistas, pelo PMDB e pelo PSDB, apoiado por radicais de extrema-direita, tentou construir a imagem de impoluto sobre os escombros morais dos governistas que foram apodrecendo à luz do sol e da decomposição do PSDB, que foi não só cúmplice, mas ator decisivo de uma grande farsa que resultou num violento ataque à democracia.
Se Bolsonaro não ruía pela notória prática da violência verbal machista, racista, homofóbica e agressão aos direitos humanos, aceita pela consciência conservadora de parte da sociedade, agora, ao aparecer com a marca de corrupto pregada na testa, está sendo destroçado por aqueles que o abrigaram ontem, nesta briga sem quartel em que está imerso o campo golpista.
O que sobrou de tudo isto, do golpe, são políticos e homens públicos vivos-mortos, condenados, não só pelo que fizeram, mas também pelo que representam em termos históricos. Ainda vivos em carne, estão mortos no espírito, na alma, e a história devorará sua espiritualidade doentia assim como os vermes devorarão os seus ossos. Poderão ainda persistir na maldade, pois vivemos numa Era do triunfo do mal. Mas não obrarão na dignidade humana.
Este ajuntamento informe e degradado de golpistas - governantes, ministros, senadores, deputados, juízes e outros oportunistas a eles agregados - se move pela pulsão da morte, por um narcisismo sádico que, por decrépito, nada tem a acrescentar à vida e à história. Estão ali apenas para enriquecerem mais a si mesmos, para enriquecer mais os ricos e para empobrecer mais os pobres. Não há nenhuma potência de dignidade e de vida nesse sadismo.
A potência de vida está em buscar dignidade e direitos aos pobres, aos necessitados, aos grupos sociais em risco, as trabalhadores, pois é ali que reside o sentido civilizatório da humanidade, é ali que reside o sentido universalizante dos valores da liberdade, da igualdade, da justiça, da solidariedade, semeados pelo republicanismo e pelo humanismo cívico. Esse grupo de narcisistas sádicos do qual fazem parte essas figuras das sombras como Temer, Cunha, Aécio, Moro e ao qual se juntaram pessoas que tinham um passado democrático, a exemplo de Fernando Henrique Cardoso e tantos outros, não têm mais nada a dizer para a posteridade, para as gerações futuras. São figuras cinzas, cobertas de cinza, que pronunciam palavras lúgubres e cinzentas.
Eles não estão suspensos sobre o abismo pela mão de um deus indeciso entre a misericórdia e a danação. Já despencaram para dentro dele, condenados a uma lembrança histórica abominável. Dominados por uma consciência perversa, é improvável que busquem algum tipo de penitência e de auto-resgate. Por vaidade e por maldade, não pensaram na condenação que os tempos poderiam trazer-lhe. A morte espiritual dessas pessoas, contudo, parece ser de tal magnitude que pouco se importam com essa condenação. Estão condenados, não por uma razão imanente à história, mas pelo narcisismo sádico perverso e anticivilizatório que esposaram.
Hora do confronto
A batalha que se travará nesta semana em torno do julgamento de Lula precisa ser vista como uma de tantas outras que virão pela frente após um período de derrotas e de certo imobilismo das forças progressistas e de esquerda. Para lutar é preciso ter moral elevada, espírito de combate, coragem e bandeiras justas. É preciso ter direção e comando, com virtude dos dirigentes e consciência e virtude dos ativistas e grupos sociais mobilizáveis. É preciso ter também disciplina.
Em face da degradação política e moral das forças golpistas, das violações das leis e da Constituição pelo STF, pelo juiz Moro e por outros setores do Judiciário, diante da ação persecutória de que é vítima o presidente Lula, diante do monstruoso ataque aos direitos dos trabalhadores e dos pobres perpetrado pelo condomínio de um governo corrupto e criminoso, hoje, as forças progressistas e democráticas estão com a moral e a disposição de luta elevadas e suas bandeiras e ações são cada vez mais aceitas por setores amplos da população. Mas este momento positivo, de ofensiva, se tornará pueril se não se formar, consolidar e ampliar força política e social organizada. É preciso encontrar um caminho de superação das derrotas históricas que essas forças tiveram no século passado e neste século.
Inserir-se na luta pelo direito de Lula ser candidato é inserir-se na luta pela democracia que se estenderá ao longo de todo o ano e terá repercussões no futuro. O que se nota é o amadurecimento de várias forças progressistas que, independentemente de partidos, declaram apoio a Lula e à democracia.
Qualquer que seja o resultado do julgamento de Lula, o juiz Moro será derrotado junto com tudo o que ele representa. Se Lula for condenado, ampliar-se-á a luta nacional e internacional em sua defesa e da democracia. Ampliar-se-á também a desmoralização e a deslegitimação de Moro e do Judiciário por serem persecutórios, parciais e por violarem as leis e a Constituição, julgando a partir de convicções ideológicas e partidárias. Se Lula for absolvido ficará patente o arbítrio de Moro. Por estas razões, independentemente do resultado, Lula sairá vitorioso. Condenado, será vítima de mais um arbítrio inaceitável. Absolvido, desmoronará um pilar do golpe.
A hora é de confronto contra aqueles que afrontam a democracia, rasgam as leis e a Constituição, violam o Estado Democrático de Direito, introduzem o fanatismo persecutório no Judiciário e protegem as quadrilhas criminosas de políticos corruptos, instaladas no poder pelo golpe. Quadrilhas que assaltam os cofres públicos e o bolso dos pobres com o desemprego, com a supressão de direitos e com a degola de políticas sociais.
O impeachment-golpe e toda a destruição que veio no seu rastro significou que as elites escolheram o caminho do confronto contra a democracia e contra o povo. Se a luta política e social deve ser uma constante, pois a liberdade, a justiça, a democracia e os direitos sempre são obras inacabadas, essa confrontação pela instauração da democracia no Brasil só deve arrefecer quando se assegurarem regras estáveis do jogo democrático, quando se reformar o sistema político e quando reformas fundamentais que instaurem condições de justiça e de redução da pobreza e da desigualdade forem implantadas.
* Aldo Fornazieri é professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP).
As denúncias envolvendo os mal-feitos de Bolsonaro e de seus filhos representam a queda do último baluarte do golpismo. Em poucos meses, Bolsonaro virará quase nada. Ele foi o último refugio das hordas moralistas iradas que tomaram as ruas para derrubar a presidente Dilma. Foi, sem dúvida, um impressionante clamor por moralidade. Mas foi um movimento comandado por moralistas sem moral, por hipócritas de todas as espécies, por cínicos, por despudorados. Uns queriam o poder para se salvarem. Outros o queriam para continuar na senda do crime e da corrupção. Quase todos queriam bloquear e reduzir as parcas conquistas de direitos e de bem estar por parte dos mais pobres.
O resultado desse movimento comandado por moralistas sem moral foi a constituição de um governo cujo presidente é acusado duplamente de ser chefe de quadrilha. Todos os principais líderes do golpe - Temer, Aécio, Cunha, Romero Jucá e tantos outros - tombaram no lodo da história do qual não sairão limpos. Sérgio Moro revelou-se, não só um agente do golpe, um violador das leis e da Constituição, mas um amigo íntimo de corruptos assinalados, a exemplo de Temer e de Aécio.
Bolsonaro, o acolhido e albergado pelos golpistas, pelo PMDB e pelo PSDB, apoiado por radicais de extrema-direita, tentou construir a imagem de impoluto sobre os escombros morais dos governistas que foram apodrecendo à luz do sol e da decomposição do PSDB, que foi não só cúmplice, mas ator decisivo de uma grande farsa que resultou num violento ataque à democracia.
Se Bolsonaro não ruía pela notória prática da violência verbal machista, racista, homofóbica e agressão aos direitos humanos, aceita pela consciência conservadora de parte da sociedade, agora, ao aparecer com a marca de corrupto pregada na testa, está sendo destroçado por aqueles que o abrigaram ontem, nesta briga sem quartel em que está imerso o campo golpista.
O que sobrou de tudo isto, do golpe, são políticos e homens públicos vivos-mortos, condenados, não só pelo que fizeram, mas também pelo que representam em termos históricos. Ainda vivos em carne, estão mortos no espírito, na alma, e a história devorará sua espiritualidade doentia assim como os vermes devorarão os seus ossos. Poderão ainda persistir na maldade, pois vivemos numa Era do triunfo do mal. Mas não obrarão na dignidade humana.
Este ajuntamento informe e degradado de golpistas - governantes, ministros, senadores, deputados, juízes e outros oportunistas a eles agregados - se move pela pulsão da morte, por um narcisismo sádico que, por decrépito, nada tem a acrescentar à vida e à história. Estão ali apenas para enriquecerem mais a si mesmos, para enriquecer mais os ricos e para empobrecer mais os pobres. Não há nenhuma potência de dignidade e de vida nesse sadismo.
A potência de vida está em buscar dignidade e direitos aos pobres, aos necessitados, aos grupos sociais em risco, as trabalhadores, pois é ali que reside o sentido civilizatório da humanidade, é ali que reside o sentido universalizante dos valores da liberdade, da igualdade, da justiça, da solidariedade, semeados pelo republicanismo e pelo humanismo cívico. Esse grupo de narcisistas sádicos do qual fazem parte essas figuras das sombras como Temer, Cunha, Aécio, Moro e ao qual se juntaram pessoas que tinham um passado democrático, a exemplo de Fernando Henrique Cardoso e tantos outros, não têm mais nada a dizer para a posteridade, para as gerações futuras. São figuras cinzas, cobertas de cinza, que pronunciam palavras lúgubres e cinzentas.
Eles não estão suspensos sobre o abismo pela mão de um deus indeciso entre a misericórdia e a danação. Já despencaram para dentro dele, condenados a uma lembrança histórica abominável. Dominados por uma consciência perversa, é improvável que busquem algum tipo de penitência e de auto-resgate. Por vaidade e por maldade, não pensaram na condenação que os tempos poderiam trazer-lhe. A morte espiritual dessas pessoas, contudo, parece ser de tal magnitude que pouco se importam com essa condenação. Estão condenados, não por uma razão imanente à história, mas pelo narcisismo sádico perverso e anticivilizatório que esposaram.
Hora do confronto
A batalha que se travará nesta semana em torno do julgamento de Lula precisa ser vista como uma de tantas outras que virão pela frente após um período de derrotas e de certo imobilismo das forças progressistas e de esquerda. Para lutar é preciso ter moral elevada, espírito de combate, coragem e bandeiras justas. É preciso ter direção e comando, com virtude dos dirigentes e consciência e virtude dos ativistas e grupos sociais mobilizáveis. É preciso ter também disciplina.
Em face da degradação política e moral das forças golpistas, das violações das leis e da Constituição pelo STF, pelo juiz Moro e por outros setores do Judiciário, diante da ação persecutória de que é vítima o presidente Lula, diante do monstruoso ataque aos direitos dos trabalhadores e dos pobres perpetrado pelo condomínio de um governo corrupto e criminoso, hoje, as forças progressistas e democráticas estão com a moral e a disposição de luta elevadas e suas bandeiras e ações são cada vez mais aceitas por setores amplos da população. Mas este momento positivo, de ofensiva, se tornará pueril se não se formar, consolidar e ampliar força política e social organizada. É preciso encontrar um caminho de superação das derrotas históricas que essas forças tiveram no século passado e neste século.
Inserir-se na luta pelo direito de Lula ser candidato é inserir-se na luta pela democracia que se estenderá ao longo de todo o ano e terá repercussões no futuro. O que se nota é o amadurecimento de várias forças progressistas que, independentemente de partidos, declaram apoio a Lula e à democracia.
Qualquer que seja o resultado do julgamento de Lula, o juiz Moro será derrotado junto com tudo o que ele representa. Se Lula for condenado, ampliar-se-á a luta nacional e internacional em sua defesa e da democracia. Ampliar-se-á também a desmoralização e a deslegitimação de Moro e do Judiciário por serem persecutórios, parciais e por violarem as leis e a Constituição, julgando a partir de convicções ideológicas e partidárias. Se Lula for absolvido ficará patente o arbítrio de Moro. Por estas razões, independentemente do resultado, Lula sairá vitorioso. Condenado, será vítima de mais um arbítrio inaceitável. Absolvido, desmoronará um pilar do golpe.
A hora é de confronto contra aqueles que afrontam a democracia, rasgam as leis e a Constituição, violam o Estado Democrático de Direito, introduzem o fanatismo persecutório no Judiciário e protegem as quadrilhas criminosas de políticos corruptos, instaladas no poder pelo golpe. Quadrilhas que assaltam os cofres públicos e o bolso dos pobres com o desemprego, com a supressão de direitos e com a degola de políticas sociais.
O impeachment-golpe e toda a destruição que veio no seu rastro significou que as elites escolheram o caminho do confronto contra a democracia e contra o povo. Se a luta política e social deve ser uma constante, pois a liberdade, a justiça, a democracia e os direitos sempre são obras inacabadas, essa confrontação pela instauração da democracia no Brasil só deve arrefecer quando se assegurarem regras estáveis do jogo democrático, quando se reformar o sistema político e quando reformas fundamentais que instaurem condições de justiça e de redução da pobreza e da desigualdade forem implantadas.
* Aldo Fornazieri é professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP).
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