Por Tereza Cruvinel, em seu blog:
O flerte de Geddel Vieira Lima com a delação premiada foi só mais um sinal de que o Brasil ainda pode se livrar de Temer antes do final de seu mandato, em decorrência de complicações maiores em sua situação jurídico-político. Se vier uma terceira denúncia em plena campanha eleitoral, não haverá quem convença a maioria dos deputados a salvar Temer mais uma vez. Ele pode ser afastado pela aprovação da denúncia ou até mesmo renunciar, invocando problemas de saúde, não sem antes garantir o foro especial para ex-presidentes. Hoje estas hipóteses podem parecer delirantes mas há uma questão que lhes confere plausibilidade: o substituto seria o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que poderia disputar a reeleição no cargo, com apoio do Centrão e de boa parte do mercado-empresariado. Ou seja, a direita, e o não os brasileiros, é que ganhariam com uma queda tardia de Temer, depois de todos os retrocessos e malvadezas já cometidos.
“Vejo hoje que amigos, pessoas, de longa data me lançaram ao degredo, ao vale dos leprosos”, disse Geddel em depoimento nesta terça-feira, 6. Como ele, antes de ser preso, mandou avisos de que não perdoaria traições, a frase cheira a tentativa de acordo para uma delação. Se acontecer, ela pode implicar a cúpula do MDB e o próprio Temer. Os dois foram unha e carne durante muitos anos. Por indicação de Temer, Geddel ocupou cargos cada vez mais altos no governo federal, desde a era PT.
Mas não só por isso a situação de Temer vem se complicando na Justiça, enquanto ele finge que faz um grande esforço para aprovar a reforma previdenciária, que a base governista também finge que deseja votar. No STF, esgotou-se o prazo para o encerramento das investigações pedidas pela Procuradora-Geral Raquel Dodge sobre o famigerado decreto dos portos. O relator, ministro Roberto Barroso, ainda não devolveu o inquérito por conta de mais e mais indícios do envolvimento de Temer que a Polícia Federal é obrigada a investigar, gerando pedidos de dilatação do prazo.
Ontem, o amigo e operador do presidente, coronel da PM João Batista Lima, foi novamente intimado a prestar depoimento mas deve escapar recorrendo, como tem feito, ao atestado médico. No inquérito, a PF anexou mensagens telefônicas trocadas entre Lima e uma certa Maria Helena, a quem ele diz: “Amiga, nessas condições ainda tenho esperança de receber as 'gorjetas' que você não me deu”. Já com o desconhecido Miguel de Oliveira o coronel comenta: “Recebeu pouco. Nas minhas contas deveria ter recebido R$ 120 mil. Estão 'garfando' o coitado”. A PF quer saber quem é “o coitado” e de que trata este recebimento.
Mas quando receber o inquérito de volta, Dodge deve deter-se principalmente nas gravações que envolvem o executivo da JBS Ricardo Saud, o homem da mala, Rocha Loures, e o diretor da Rodrimar Ricardo Mesquita. A empresa, concessionária de terminal no porto de Santos, foi favorecida pelo decreto de Temer, que admitiu a renovação das concessões por “até 35 anos”, não podendo ultrapassar 70. Presentaço. Numa conversa entre Loures e Mesquita, gravada acidentalmente por Saud, o diretor da Rodrimar diz que, se o decreto sair conforme estão querendo, Loures seria “reconhecido”.
No dia 4 de dezembro passado, Antônio Celso Grecco, sócio da Rodrimar, afirmou em depoimento à Polícia Federal que esteve três vezes com Temer, uma delas levado por seu então assessor Rocha Loures. Celso Grecco também disse que o decreto publicado pelo presidente no ano passado, mudando regras do setor, pode beneficiar com ampliação de prazo uma das três concessões portuárias da Rodrimar.
Já Michel Temer, ao responder agora em janeiro a uma das 50 perguntas da Policia Federal, no âmbito do mesmo inquérito, deu mostras de sua sagacidade. Em todas as respostas ele negaceou, tergiversou, respondeu pela metade ou fingiu não entender a pergunta. E em certo momento, reclamou do caráter “ofensivo” delas. Pergunta o questionário:
8. Vossa Excelência conhece Antônio Celso Grecco, presidente do grupo Rodrimar? Se sim, qual relação de Vossa Excelência com ele? Já se encontrou com ele para tratar de concessões de terminais portuários para o grupo Rodrimar? Quando? Qual orientação foi repassada por Vossa Excelência?
Resposta: Estive com ele, rapidamente, em duas ou três oportunidades, sendo que jamais tratei de concessões para o setor portuário.
“Em duas ou três oportunidades”, diz Temer vagamente, sem com isso esclarecer as circunstâncias em que se deram os encontros. Mas, também, sem desmentir o que disse Grecco.
Fato é que a própria Raquel Dodge já declarou, quando pediu o inquérito, que em função das investigações poderia apresentar uma denúncia ou pedir o arquivamento do caso. Pelo que já se sabe, será difícil ele fingir que não encontrou elementos para uma nova denúncia no inquérito.
Se ela for apresentada, Temer estará em situação bem diferente daquela em que, comprando votos com emendas e cargos, conseguiu a rejeição das duas flechas lançadas pelo ex-PGR Rodrigo Janot. Sua base governista fez bastante água depois daquelas votações desgastantes e agora a eleição estará bem mais próxima. Deputados estarão tratando de salvar a pele, vale dizer, o mandato e o foro especial que ele propicia. Não terão a menor disposição para enfrentarem uma nova denúncia, com todo o desgaste que isso representaria em data próxima do pleito. E depois, o que tinham para ganhar de Temer, já levaram. Este é o último orçamento que ele está executando mas as verbas que importavam, com vistas às eleições deste ano, já foram liberadas.
Se tal situação se configurar, podemos ter alguns desdobramentos: aprovação da denúncia, com decorrente afastamento de Temer; não-votação, deixando “o paciente com a barriga aberta no centro cirúrgico”, como definiu Rodrigo Maia antes da votação da segunda denúncia; ou ainda a capitulação de Temer, pela renúncia, num acordo que lhe garantisse o foro privilegiado e a cadeira de presidente para Rodrigo Maia, que poderia se transformar no candidato do sistema vencedor do golpe.
O Brasil, ou melhor, os brasileiros, nada ganhariam com esta queda tardia. Todo o mal que Temer poderia fazer, em troca do cargo que lhe deram com o golpe, já foi feito. E a reforma previdenciária, o mal em pauta, dificilmente passará.
A direita, na verdade, é que ganharia mais com isso, garantindo vantagens para um candidato seu na disputa. Ainda mais se Lula tiver sido mesmo impedido, situação que favoreceria os hoje nanicos candidatos da centro-direita.
O flerte de Geddel Vieira Lima com a delação premiada foi só mais um sinal de que o Brasil ainda pode se livrar de Temer antes do final de seu mandato, em decorrência de complicações maiores em sua situação jurídico-político. Se vier uma terceira denúncia em plena campanha eleitoral, não haverá quem convença a maioria dos deputados a salvar Temer mais uma vez. Ele pode ser afastado pela aprovação da denúncia ou até mesmo renunciar, invocando problemas de saúde, não sem antes garantir o foro especial para ex-presidentes. Hoje estas hipóteses podem parecer delirantes mas há uma questão que lhes confere plausibilidade: o substituto seria o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que poderia disputar a reeleição no cargo, com apoio do Centrão e de boa parte do mercado-empresariado. Ou seja, a direita, e o não os brasileiros, é que ganhariam com uma queda tardia de Temer, depois de todos os retrocessos e malvadezas já cometidos.
“Vejo hoje que amigos, pessoas, de longa data me lançaram ao degredo, ao vale dos leprosos”, disse Geddel em depoimento nesta terça-feira, 6. Como ele, antes de ser preso, mandou avisos de que não perdoaria traições, a frase cheira a tentativa de acordo para uma delação. Se acontecer, ela pode implicar a cúpula do MDB e o próprio Temer. Os dois foram unha e carne durante muitos anos. Por indicação de Temer, Geddel ocupou cargos cada vez mais altos no governo federal, desde a era PT.
Mas não só por isso a situação de Temer vem se complicando na Justiça, enquanto ele finge que faz um grande esforço para aprovar a reforma previdenciária, que a base governista também finge que deseja votar. No STF, esgotou-se o prazo para o encerramento das investigações pedidas pela Procuradora-Geral Raquel Dodge sobre o famigerado decreto dos portos. O relator, ministro Roberto Barroso, ainda não devolveu o inquérito por conta de mais e mais indícios do envolvimento de Temer que a Polícia Federal é obrigada a investigar, gerando pedidos de dilatação do prazo.
Ontem, o amigo e operador do presidente, coronel da PM João Batista Lima, foi novamente intimado a prestar depoimento mas deve escapar recorrendo, como tem feito, ao atestado médico. No inquérito, a PF anexou mensagens telefônicas trocadas entre Lima e uma certa Maria Helena, a quem ele diz: “Amiga, nessas condições ainda tenho esperança de receber as 'gorjetas' que você não me deu”. Já com o desconhecido Miguel de Oliveira o coronel comenta: “Recebeu pouco. Nas minhas contas deveria ter recebido R$ 120 mil. Estão 'garfando' o coitado”. A PF quer saber quem é “o coitado” e de que trata este recebimento.
Mas quando receber o inquérito de volta, Dodge deve deter-se principalmente nas gravações que envolvem o executivo da JBS Ricardo Saud, o homem da mala, Rocha Loures, e o diretor da Rodrimar Ricardo Mesquita. A empresa, concessionária de terminal no porto de Santos, foi favorecida pelo decreto de Temer, que admitiu a renovação das concessões por “até 35 anos”, não podendo ultrapassar 70. Presentaço. Numa conversa entre Loures e Mesquita, gravada acidentalmente por Saud, o diretor da Rodrimar diz que, se o decreto sair conforme estão querendo, Loures seria “reconhecido”.
No dia 4 de dezembro passado, Antônio Celso Grecco, sócio da Rodrimar, afirmou em depoimento à Polícia Federal que esteve três vezes com Temer, uma delas levado por seu então assessor Rocha Loures. Celso Grecco também disse que o decreto publicado pelo presidente no ano passado, mudando regras do setor, pode beneficiar com ampliação de prazo uma das três concessões portuárias da Rodrimar.
Já Michel Temer, ao responder agora em janeiro a uma das 50 perguntas da Policia Federal, no âmbito do mesmo inquérito, deu mostras de sua sagacidade. Em todas as respostas ele negaceou, tergiversou, respondeu pela metade ou fingiu não entender a pergunta. E em certo momento, reclamou do caráter “ofensivo” delas. Pergunta o questionário:
8. Vossa Excelência conhece Antônio Celso Grecco, presidente do grupo Rodrimar? Se sim, qual relação de Vossa Excelência com ele? Já se encontrou com ele para tratar de concessões de terminais portuários para o grupo Rodrimar? Quando? Qual orientação foi repassada por Vossa Excelência?
Resposta: Estive com ele, rapidamente, em duas ou três oportunidades, sendo que jamais tratei de concessões para o setor portuário.
“Em duas ou três oportunidades”, diz Temer vagamente, sem com isso esclarecer as circunstâncias em que se deram os encontros. Mas, também, sem desmentir o que disse Grecco.
Fato é que a própria Raquel Dodge já declarou, quando pediu o inquérito, que em função das investigações poderia apresentar uma denúncia ou pedir o arquivamento do caso. Pelo que já se sabe, será difícil ele fingir que não encontrou elementos para uma nova denúncia no inquérito.
Se ela for apresentada, Temer estará em situação bem diferente daquela em que, comprando votos com emendas e cargos, conseguiu a rejeição das duas flechas lançadas pelo ex-PGR Rodrigo Janot. Sua base governista fez bastante água depois daquelas votações desgastantes e agora a eleição estará bem mais próxima. Deputados estarão tratando de salvar a pele, vale dizer, o mandato e o foro especial que ele propicia. Não terão a menor disposição para enfrentarem uma nova denúncia, com todo o desgaste que isso representaria em data próxima do pleito. E depois, o que tinham para ganhar de Temer, já levaram. Este é o último orçamento que ele está executando mas as verbas que importavam, com vistas às eleições deste ano, já foram liberadas.
Se tal situação se configurar, podemos ter alguns desdobramentos: aprovação da denúncia, com decorrente afastamento de Temer; não-votação, deixando “o paciente com a barriga aberta no centro cirúrgico”, como definiu Rodrigo Maia antes da votação da segunda denúncia; ou ainda a capitulação de Temer, pela renúncia, num acordo que lhe garantisse o foro privilegiado e a cadeira de presidente para Rodrigo Maia, que poderia se transformar no candidato do sistema vencedor do golpe.
O Brasil, ou melhor, os brasileiros, nada ganhariam com esta queda tardia. Todo o mal que Temer poderia fazer, em troca do cargo que lhe deram com o golpe, já foi feito. E a reforma previdenciária, o mal em pauta, dificilmente passará.
A direita, na verdade, é que ganharia mais com isso, garantindo vantagens para um candidato seu na disputa. Ainda mais se Lula tiver sido mesmo impedido, situação que favoreceria os hoje nanicos candidatos da centro-direita.
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