Por Joana Rozowykwiat, no site Vermelho:
Quando o ex-presidente Lula foi condenado pelo TRF-4, os veículos de comunicação alardearam que o “mercado” estava em festa - o dólar caiu e a bolsa subiu. Mas, nessa segunda-feira (9), primeiro dia útil após a prisão do petista, o bom humor parece ter sido substituído pela cautela. O Ibovespa, principal índice de ações da bolsa brasileira, fechou em queda, e a moeda norte-americana, em alta. Analistas culpam as incertezas no cenário político.
O Ibovespa recuou 1,75%, e o dólar encerrou em alta de 1,57%, cotado a R$3,42, o maior patamar desde dezembro de 2016. Além das questões internas, o mercado foi influenciado ainda pelo aumento de tensões comerciais entre as duas maiores economias do mundo, Estados Unidos e China
Mas, se a euforia de outrora era explicada pelo fato que a condenação de Lula o deixava mais longe de concorrer à Presidência, o desânimo de agora se dá pelo óbvio: sua detenção gera ainda mais instabilidade no Brasil e deixa turvo o horizonte das eleições.
Lula e o mercado
O mercado quer eleger um candidato que tenha compromisso com a agenda neoliberal, que coloca o Orçamento público e as políticas governamentais a serviço de seus interesses.
Em primeiro lugar nas pesquisas, Lula - apesar de ter feito um governo que ampliou os lucros de empresários e rentistas - tem dito que é preciso mudar a política econômica vigente.
Propõe rever medidas adotas pelo presidente Michel Temer, a exemplo do teto de gastos e da reforma trabalhista, e também questiona a reforma da Previdência proposta pelo governo, além de ser contrário às privatizações de setores estratégicos. Uma pauta que em nada agrada aos donos do dinheiro.
A prisão de Lula limita suas chances de disputar o Planalto, mas o que esperar de um país dividido, com instituições em frangalhos e uma economia cambaleante, e cujo resultado das urnas é uma completa incógnita?
Mercado sem candidato competitivo
O jornal Valor Econômico destacou, numa matéria nesta segunda-feira (9), que os agentes financeiros estão preocupados porque não há “sinais de força de um candidato que represente os anseios do mercado” e “ os dados de atividade confirmam que há uma recuperação num ritmo mais lento do que o esperado”.
Tanto Temer quanto seu ex-ministro da Fazenda, Henrique Meirelles – dois emedebistas que desejam concorrer – têm 1% das intenções de votos. O tucano Geraldo Alckmin – que se esforça para se apresentar como candidato de centro, embora sua plataforma e seu histórico o empurrem para a direita – aparece nas pesquisas com 7%.
Num cenário sem Lula, contudo, Jair Bolsonaro lidera as sondagens. Apesar de suas tentativas de aproximação com o mercado financeiro, materializadas na escolha do economista liberal Paulo Guedes para sua equipe, dificilmente o polêmico postulante será capaz de fornecer a credibilidade e ambiente seguro que esperam os investidores.
Há receios de que próximo líder do país seja um nome pouco tradicional da política e há dúvidas quanto à sua governabilidade e capacidade política de fazer aprovar as reformas desejadas pelos financistas.
“Analistas destacam que pesa cada vez mais a percepção de que a campanha eleitoral corre o risco de ficar ainda mais fragmentada, cenário que dilui votos e torna mais imprevisível o desempenho de candidatos de centro-direita, vistos como pró-reformas”, afirma o Valor. A disputa para a Presidência da República já tem 15 pré-candidatos.
O “mercado” também teme alguns desdobramentos jurídicos, com impacto nos destinos de Lula. Não só há recursos contra a prisão do petista, como o Supremo Tribunal Federal ainda deverá se pronunciar sobre a execução da pena após condenação em segunda instância, o que pode mudar o atual entendimento sobre o tema.
Incerteza e instabilidade
Para Christopher Garman, diretor-executivo para as Américas da consultoria Eurasia, os analistas não estão vendo que "aumentou a possibilidade de votos mais unidos em torno da esquerda".
No fundo, a prisão de Lula, cuja legalidade é questionada dentro e fora do país, findou por mergulhar o Brasil em ainda mais incerteza e instabilidade, afastando as chances de retomada de investimentos e volta de um ciclo vigoroso de crescimento.
Além de tudo, a julgar pelo que se viu a partir da resistência em São Bernardo do Campo, a revolta com a condenação sem provas cindiu o país e só faz crescer. E o desfecho dessa história pode não ser aquele que mais agrada aos interesses do tal “mercado”, que agora não parece mais tão bem-humorado.
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