sábado, 13 de outubro de 2018

Fake news impulsionaram fascismo na eleição

Por Cynara Menezes, no blog Socialista Morena:

As mentiras nas redes sociais, as chamadas fake news, foram o fator mais importante na ascensão do candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro e seus aliados nas eleições de domingo. Foram as notícias falsas, espalhadas sobretudo pelo whatsapp, que impulsionaram a “onda” bolsonarista às vésperas da eleição, e não o “antipetismo” da sociedade. E a maior evidência disso são as derrotas inesperadas de Dilma Rousseff e Eduardo Suplicy na disputa para o Senado em Minas e São Paulo.

Tanto Dilma quanto Suplicy foram alvos de boatos compartilhados por milhares de perfis de extrema-direita nas redes sociais e perderam intenções de votos na reta final. Em uma das mensagens que mais bombaram no aplicativo em Minas, a petista era acusada de ser, ao lado de Lula, responsável por um rombo de 400 bilhões no BNDES que nunca existiu.

Mas a mentira contra Dilma que mais circulou no whatsapp foi a acusação de que ela teria matado pessoalmente o soldado Mário Kozel Filho quando militou na luta armada durante a ditadura. Dilma de fato integrou a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), mas suas funções sempre foram burocráticas, nunca pegou em armas.

Na mensagem mentirosa, compartilhada freneticamente pelo aplicativo na semana anterior à eleição, a suposta mãe de Mário Kozel, que teria hoje quase 90 anos (se ainda for viva), diz que “nunca mais teve paz” após a explosão que matou seu filho, em 1968. Mas a imagem da senhora que aparece na mensagem é do atentado ocorrido durante a maratona de Boston, nos EUA, em 2015, como você pode conferir neste link.

O “meme” que originou a notícia falsa partiu, ao que tudo indica, do site de extrema-direita Política & Direito, que publicou a montagem em junho de 2017. A campanha de Dilma não respondeu porque nem chegou a tomar conhecimento de que a postagem estava circulando. O boato foi uma das razões, senão a maior delas, para que Dilma despencasse de primeiro para quarto lugar na votação.

Sobre o vereador e candidato ao Senado Eduardo Suplicy, como não tinham nada para atacar no seu passado, recorreram à idade: um boato que se espalhou como pólvora nas redes dizia que ele está velho e não iria conseguir terminar o mandato, e que seu lugar seria ocupado por “um comunista”, o sindicalista Chicão, do PCdoB. O texto que circulava pelo whatsapp e que também foi compartilhado pelo facebook “alertava”:

“Repassem para seus contatos:

O Suplicy tem 77 anos. O mandato de senador é de 8 anos. Ao final de seu mandato ele terá 85 anos. Claro que uma pessoa pode estar em ‘plena forma’ com essa idade, mas, se ele tiver qualquer problema (não estou ‘secando’!!!), assume o seu suplente. Vocês se deram ao trabalho de descobrir quem é o suplente dele ? Eu tive esse trabalho. Trata-se de um sindicalista chamado Eduardo Annunciato, vulgo Chicão, do PCdoB!!!! E ele não foi escolha do Suplicy. Foi escolha do partido. Ele só ficou conhecendo o Chicão no dia da convenção do PT (tudo isso está no UOL Notícias). Então, quem votar no SUPLICY pode estar elegendo o“conhecidíssimo” Chicão para senador.”


O mesmo texto circulou em formato de memes:





O maior beneficiado com a derrota de Suplicy foi justamente o candidato de Bolsonaro, Major Olímpio, que disparou às vésperas da eleição, ultrapassando o vereador petista e Mara Gabrilli, do PSDB. O próprio Olímpio criou uma fake news em seu twitter sobre Suplicy, afirmando que em 20 anos de Senado ele apenas tinha “defendido o PT e a corrupção”. O TRE ordenou a exclusão do tweet, mas o estrago estava feito.



Durante a eleição norte-americana, quando Donald Trump, o Bolsonaro dos EUA, pavimentou seu caminho à base de notícias falsas ao mesmo tempo que berrava fake news! para os outros, apenas três boatos foram capazes de levar Hillary Clinton à derrota, de acordo com um estudo da Universidade de Ohio. Um deles era bem parecido com o que usaram para atacar Suplicy: disseram que Hillary estava seriamente doente, com mal de Parkinson.

No início do mês, o site Nexo publicou uma reportagem mostrando as ligações de Bolsonaro e o guru de Donald Trump, Steve Bannon, hoje considerado o mentor intelectual da extrema-direita no mundo. O filho de Bolsonaro, Eduardo, recém-eleito deputado federal por São Paulo, esteve com Bannon em agosto em Nova York.

Um levantamento da Agência Lupa sobre as dez postagens falsas mais compartilhadas nas redes durante o primeiro turno mostra que todas elas beneficiam Bolsonaro. E o alvo principal das fakes news que mais circularam no facebook na eleição, rede onde as agências de checagem atuam, eram políticos do PT. Ou fake news “positiva” para o próprio candidato, como no caso de um “ato de apoio à saúde de Bolsonaro em Campinas” que era, na verdade, a imagem da torcida durante o jogo Brasil X Sérvia na Copa da Rússia. O fato de os bolsonaristas usarem a camiseta da CBF em suas manifestações facilita que qualquer agrupamento de torcedores da seleção vire marcha pró-Bolsonaro.

No domingo, o jornalista Leandro Beguoci revelou no twitter que, no ano passado, Jair Bolsonaro fez dois projetos de lei que envolvem o aplicativo, algo que nunca o havia interessado antes. Em um deles, apresentado em agosto de 2017, estabelece que apenas o Supremo Tribunal Federal pode suspender aplicativos de troca de informação pela internet. Vale a pena ler os tweets [aqui].

Algum dia os especialistas se debruçarão sobre a influência do whatsapp, espécie de terra-sem-lei das redes sociais, nas eleições brasileiras em 2018. Em entrevista nesta segunda-feira ao Jornal Nacional, Bolsonaro deu a senha para o que está por vir. Ao mesmo tempo que, como Trump, acusou os outros de atiçar notícias falsas contra ele, tocou nos pontos em que virão as fake news em seu benefício daqui para frente: temas morais, principalmente em relação às crianças. “Que a inocência da criança em sala de aula esteja acima de tudo”

Tudo indica que as fake news sobre “kit gays” inexistentes e bizarrices de todo tipo insinuando pedofilia, como a distribuição de mamadeiras com bico de piroca em creche, se multiplicarão para atingir Fernando Haddad. O PT precisa, urgente, encontrar uma vacina contra esta estratégia ou perderá a eleição como Dilma e Suplicy.

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