Por Mauro Santayana, em seu blog:
Este é o país das gambiarras.
Das gambiarras técnicas.
Das gambiarras jurídicas.
Das gambiarras políticas e de marketing.
Mas, sobretudo, das gambiarras morais, já que, em suas motivações e justificativas, elas se sustentam, na maioria dos casos, pela cobiça, a hipocrisia, a manipulação e a mentira.
Este é o país em que helicópteros, alguns do tempo da guerra do Vietnã, com autorização apenas para filmagens e aerofotogrametria transportam regularmente passageiros.
No qual barragens de rejeitos minerais são construídas a montante, com o agravante da edificação de instalações e até mesmo de refeitórios para dezenas de pessoas a jusante, bem no caminho da lama.
Em que o colapso das barragens da Vale em Mariana e Brumadinho foi fruto de gambiarras técnicas, da mesma forma como as punições à empresa pelo primeiro acidente foram gambiarras jurídicas espetaculosas e inúteis, para não dizer contraproducentes, a julgar pelo seu resultado prático do ponto de vista da fiscalização de outras barragens semelhantes.
Afinal, depois da porta arrombada, nos dias e semanas que se seguem a esses “acidentes”, não falta quem queira aparecer e tirar sua casquinha, seus cinco minutos de fama, posando de implacável defensor do bem comum, com a imposição de multas e bloqueios gigantescos, imediatos, aleatórios, quando a intenção deveria ser punir a empresa e indenizar exemplarmente as vítimas, sim, mas, principalmente, estabelecer e fazer cumprir novos e concretos paradigmas de segurança, sem colocar em risco sua existência a médio e longo prazos, seus empregos e a geração de impostos e de riqueza que produz, dos quais dependem o próprio país e centenas de milhares de trabalhadores e investidores e suas famílias.
Para não repetir no setor de mineração o furor devastador da Lavajato, por exemplo, que simplesmente acabou com a grande engenharia nacional e interrompeu, destruiu e sucateou centenas de obras e negócios em todo o país, tornando setores inteiros da economia brasileira presas atraentes para sua aquisição ou eliminação, em negociatas, a preço de banana, por concorrentes estrangeiros.
Da mesma forma que a segunda condenação de Lula, ocorrida alguns dias antes, foi uma gambiarra jurídica, que não se sustentaria em nenhum lugar do mundo na descarada tentativa de ligar as reformas do sítio mambembe de Atibaia às bilionárias obras da Petrobras, e as barragens da Vale em Mariana e Brumadinho, como já dissemos, foram gigantescas gambiarras executadas a montante de forma que não se faz mais em nenhum lugar do planeta, o improvisado, para não dizer quase clandestino dormitório do Flamengo, feito de contêineres escondidos, sob telhas de lata, em um local em que constava haver um estacionamento - como ocorria até 2010 com certas prisões do Estado do Espírito Santo - abrigando seis pessoas em cada cubículo - já que não há outro nome para o lugar em que os meninos mortos dormiam - também não passou de uma gambiarra que não foi submetida a nenhum projeto ou teste de engenharia e a nenhuma fiscalização ou interdição direta por parte da prefeitura ou do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro.
Uma gambiarra que contrastava, antes de se transformar em cinzas, vergonhosamente, com as condições das 42 luxuosas suítes que fazem parte do complexo do centro de treinamento, que se encontravam, com certeza, todas elas, seguras, confortáveis e provavelmente desocupadas, enquanto meninos ardiam em chamas a poucos metros de distância, por ainda não serem atletas famosos mas apenas garotos pobres cheios de sonhos - vistos como uma espécie de "investimento" para o clube - que, como gerações de aprendizes de gladiadores nos subterrâneos do Coliseu em Roma, perseguiam, em seus corpos cansados, todas as noites, o anseio de dar um destino melhor a suas famílias, mergulhados em devaneios plenos de ilusões, de desafios e desejos de conquista.
Daqui a alguns meses, o que restará da memória das vítimas de 2019 do mau caratismo, da interessada e repentina hipocrisia holofótica, do "jeitinho brasileiro", do gambiarrismo generalizado e universal brasileiro?
O que sobrará dessas perdas irreparáveis e injustas que atingiram para sempre - como se fossem fruto de cataclismas naturais ou da suposta vontade de um deus dos humildes e dos incautos que tudo justifica - a existência de tantas famílias, e de quem conheceu e amou os trabalhadores de Brumadinho e os meninos do Ninho do Urubú?
É preciso que se separe algum dinheiro, das dezenas de bilhões de reais em multas e bloqueios, para cimentar com concreto o chão por onde passou o barro amassado pelo diabo com o rabo nas profundezas da piscina de dejetos da Vale, em Brumadinho, para que nada mais cresça em uma parcela simbólica daquele solo, a não ser as silhuetas evocativas, feitas de aço forjado com ferro arrancado do local, de cada um dos 313 mortos e desaparecidos no rompimento da barragem do Córrego do Feijão.
Assim como deveriam ser cobertos de concreto, como que para imobilizá-los no tempo, os escombros de casas e dos carros que, três anos depois, ainda afloram da paisagem lunar e vulcânica da pequena vila de Bento Rodrigues, sepultados pelos 55 milhões de toneladas de rejeitos da Barragem do Fundão, em Mariana, na mesma região
Se a Vale não o fizer, quem sabe o Inhotim não possa tomar a iniciativa, abrigando a memória das vítimas da insensatez e do cinismo nacional em Brumadinho em seu vasto patrimônio artístico, para que neste país de hipocrisia e de jeitinho as futuras gerações se envergonhem e deixem de repetir a mesma história, o mesmo sofrimento e, com pequenas variações - vide o incêndio da Boate Kiss e o agora já antigo naufrágio do Bateau Mouche - as mesmas tragédias de sempre, tecidas na trama de fatos encadeados e sucessivos, absurdos e inenarráveis.
Da mesma forma que, no Ninho do Urubú, o Flamengo deveria, se tivesse vergonha, substituir o monumento à desigualdade, à ganância, ao descaso, à criminosa irresponsabilidade, representado pelos restos calcinados dos contêineres que se abrigavam no estacionamento por trás das luxuosas instalações de seu CT de dezenas de milhões de reais, imortalizar o sonho dos futuros jogadores que perdeu, colocando aqueles 10 meninos, quase anônimos, que em alguns anos terão seus nomes esquecidos a não ser por suas famílias e amigos, para se exercitar para sempre, com a graça e a leveza de sua juventude e talento, em uma roda de bola forjada em bronze, em tamanho natural ou ainda maior, a ser montada sobre uma plataforma circular, como um marco à glória dos humildes.
À força e à determinação de milhares de garotos que, nos mais recônditos cantos deste país padrasto, sonham com um futuro melhor para si, seus país, mães e irmãos, em uma nação hipócrita, desigual e desumana, gravando seus nomes para sempre ao pé de suas estátuas, sob um arco de concreto encimando o conjunto, com a expressão OS 10 DE 2019.
Se o Flamengo não o fizer, já que até agora seus dirigentes se dedicam apenas a tirar o do clube da reta, quem sabe sua torcida apaixonada e anônima não se cotize, dividindo o amor ao esporte - e ao seu clube - com os heróis que não o foram e coloque esse monumento em área pública, do lado de fora do "ninho" que para as vítimas se transformou em túmulo, se lhes for negado o espaço que os viu queimar até a morte, no solo do pseudo estacionamento em que dormiam.
Das gambiarras técnicas.
Das gambiarras jurídicas.
Das gambiarras políticas e de marketing.
Mas, sobretudo, das gambiarras morais, já que, em suas motivações e justificativas, elas se sustentam, na maioria dos casos, pela cobiça, a hipocrisia, a manipulação e a mentira.
Este é o país em que helicópteros, alguns do tempo da guerra do Vietnã, com autorização apenas para filmagens e aerofotogrametria transportam regularmente passageiros.
No qual barragens de rejeitos minerais são construídas a montante, com o agravante da edificação de instalações e até mesmo de refeitórios para dezenas de pessoas a jusante, bem no caminho da lama.
Em que o colapso das barragens da Vale em Mariana e Brumadinho foi fruto de gambiarras técnicas, da mesma forma como as punições à empresa pelo primeiro acidente foram gambiarras jurídicas espetaculosas e inúteis, para não dizer contraproducentes, a julgar pelo seu resultado prático do ponto de vista da fiscalização de outras barragens semelhantes.
Afinal, depois da porta arrombada, nos dias e semanas que se seguem a esses “acidentes”, não falta quem queira aparecer e tirar sua casquinha, seus cinco minutos de fama, posando de implacável defensor do bem comum, com a imposição de multas e bloqueios gigantescos, imediatos, aleatórios, quando a intenção deveria ser punir a empresa e indenizar exemplarmente as vítimas, sim, mas, principalmente, estabelecer e fazer cumprir novos e concretos paradigmas de segurança, sem colocar em risco sua existência a médio e longo prazos, seus empregos e a geração de impostos e de riqueza que produz, dos quais dependem o próprio país e centenas de milhares de trabalhadores e investidores e suas famílias.
Para não repetir no setor de mineração o furor devastador da Lavajato, por exemplo, que simplesmente acabou com a grande engenharia nacional e interrompeu, destruiu e sucateou centenas de obras e negócios em todo o país, tornando setores inteiros da economia brasileira presas atraentes para sua aquisição ou eliminação, em negociatas, a preço de banana, por concorrentes estrangeiros.
Da mesma forma que a segunda condenação de Lula, ocorrida alguns dias antes, foi uma gambiarra jurídica, que não se sustentaria em nenhum lugar do mundo na descarada tentativa de ligar as reformas do sítio mambembe de Atibaia às bilionárias obras da Petrobras, e as barragens da Vale em Mariana e Brumadinho, como já dissemos, foram gigantescas gambiarras executadas a montante de forma que não se faz mais em nenhum lugar do planeta, o improvisado, para não dizer quase clandestino dormitório do Flamengo, feito de contêineres escondidos, sob telhas de lata, em um local em que constava haver um estacionamento - como ocorria até 2010 com certas prisões do Estado do Espírito Santo - abrigando seis pessoas em cada cubículo - já que não há outro nome para o lugar em que os meninos mortos dormiam - também não passou de uma gambiarra que não foi submetida a nenhum projeto ou teste de engenharia e a nenhuma fiscalização ou interdição direta por parte da prefeitura ou do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro.
Uma gambiarra que contrastava, antes de se transformar em cinzas, vergonhosamente, com as condições das 42 luxuosas suítes que fazem parte do complexo do centro de treinamento, que se encontravam, com certeza, todas elas, seguras, confortáveis e provavelmente desocupadas, enquanto meninos ardiam em chamas a poucos metros de distância, por ainda não serem atletas famosos mas apenas garotos pobres cheios de sonhos - vistos como uma espécie de "investimento" para o clube - que, como gerações de aprendizes de gladiadores nos subterrâneos do Coliseu em Roma, perseguiam, em seus corpos cansados, todas as noites, o anseio de dar um destino melhor a suas famílias, mergulhados em devaneios plenos de ilusões, de desafios e desejos de conquista.
Daqui a alguns meses, o que restará da memória das vítimas de 2019 do mau caratismo, da interessada e repentina hipocrisia holofótica, do "jeitinho brasileiro", do gambiarrismo generalizado e universal brasileiro?
O que sobrará dessas perdas irreparáveis e injustas que atingiram para sempre - como se fossem fruto de cataclismas naturais ou da suposta vontade de um deus dos humildes e dos incautos que tudo justifica - a existência de tantas famílias, e de quem conheceu e amou os trabalhadores de Brumadinho e os meninos do Ninho do Urubú?
É preciso que se separe algum dinheiro, das dezenas de bilhões de reais em multas e bloqueios, para cimentar com concreto o chão por onde passou o barro amassado pelo diabo com o rabo nas profundezas da piscina de dejetos da Vale, em Brumadinho, para que nada mais cresça em uma parcela simbólica daquele solo, a não ser as silhuetas evocativas, feitas de aço forjado com ferro arrancado do local, de cada um dos 313 mortos e desaparecidos no rompimento da barragem do Córrego do Feijão.
Assim como deveriam ser cobertos de concreto, como que para imobilizá-los no tempo, os escombros de casas e dos carros que, três anos depois, ainda afloram da paisagem lunar e vulcânica da pequena vila de Bento Rodrigues, sepultados pelos 55 milhões de toneladas de rejeitos da Barragem do Fundão, em Mariana, na mesma região
Se a Vale não o fizer, quem sabe o Inhotim não possa tomar a iniciativa, abrigando a memória das vítimas da insensatez e do cinismo nacional em Brumadinho em seu vasto patrimônio artístico, para que neste país de hipocrisia e de jeitinho as futuras gerações se envergonhem e deixem de repetir a mesma história, o mesmo sofrimento e, com pequenas variações - vide o incêndio da Boate Kiss e o agora já antigo naufrágio do Bateau Mouche - as mesmas tragédias de sempre, tecidas na trama de fatos encadeados e sucessivos, absurdos e inenarráveis.
Da mesma forma que, no Ninho do Urubú, o Flamengo deveria, se tivesse vergonha, substituir o monumento à desigualdade, à ganância, ao descaso, à criminosa irresponsabilidade, representado pelos restos calcinados dos contêineres que se abrigavam no estacionamento por trás das luxuosas instalações de seu CT de dezenas de milhões de reais, imortalizar o sonho dos futuros jogadores que perdeu, colocando aqueles 10 meninos, quase anônimos, que em alguns anos terão seus nomes esquecidos a não ser por suas famílias e amigos, para se exercitar para sempre, com a graça e a leveza de sua juventude e talento, em uma roda de bola forjada em bronze, em tamanho natural ou ainda maior, a ser montada sobre uma plataforma circular, como um marco à glória dos humildes.
À força e à determinação de milhares de garotos que, nos mais recônditos cantos deste país padrasto, sonham com um futuro melhor para si, seus país, mães e irmãos, em uma nação hipócrita, desigual e desumana, gravando seus nomes para sempre ao pé de suas estátuas, sob um arco de concreto encimando o conjunto, com a expressão OS 10 DE 2019.
Se o Flamengo não o fizer, já que até agora seus dirigentes se dedicam apenas a tirar o do clube da reta, quem sabe sua torcida apaixonada e anônima não se cotize, dividindo o amor ao esporte - e ao seu clube - com os heróis que não o foram e coloque esse monumento em área pública, do lado de fora do "ninho" que para as vítimas se transformou em túmulo, se lhes for negado o espaço que os viu queimar até a morte, no solo do pseudo estacionamento em que dormiam.
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