Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
Art. 403. Não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido, serão oferecidas alegações finais orais por 20 (vinte) minutos, respectivamente, pela acusação e pela defesa, prorrogáveis por mais 10 (dez), proferindo o juiz, a seguir, sentença. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
É isso aí. Ao contrário do que ocorreu em inúmeros julgamentos da Lava Jato, uma questão resolvida de modo cristalino quando o Brasil se encontrava sob o Estado Novo de Vargas, e não sofreu qualquer emenda ou alteração substantiva desde então, até agora esteve embaralhada de forma a prejudicar o fundamento essencial das democracias - o direito de defesa.
Podemos admitir que, até a aparição do advogado Alberto Zacarias Toron, na sessão do STF que julgou um recurso de Aldemir Bendine, em 27 de agosto, ninguém tivesse reparado nessa contradição espantosa entre a ordem das alegações finais em muitas decisão da Lava Jato -- e aquilo que está definido num Codigo que deve ser cumprido por todos os tribunais brasileiros, em qualquer instância.
Depois que o STF anulou a sentença contra Bendine, justamente em função disso, o espantoso não é que um grande número de condenados possam fazer fila no Judiciário para recuperar direitos previstos em lei.
O surpreendente é que, dentro e fora do Supremo, uma questão como essa, resolvida de modo claro e explícito, ainda possa gerar dúvidas nas autoridades que têm a obrigação de fazer cumprir as leis em vigor no país.
A mais tentativa de impedir a correta aplicação do artigo 403 do Código Penal e enfraquecer o direito de defesa consiste em apagar as diferenças entre os réus que se transformaram em delatores e aqueles que enfrentam uma denuncia.
Sabemos que, num julgamento, os papéis de réus e delatores são mais que diferentes. São opostos. Os delatores não só negociaram - previamente - um perdão judicial e até 2/3 da redução da pena privativa de liberdade, mas também já chegam ao tribunal com uma missão definida: reforçar e até agravar a condenação dos demais. É assim que garantem e até ampliam os próprios benefícios. Ainda que não tenham esse título formal, é uma questão de simples honestidade reconhecer que sua função é ajudar a acusação.
Ao embaralhar a ordem dos depoimentos, os julgamentos da Lava Jato criaram uma dificuldade suplementar ao direito de defesa, pois os réus nem sempre podiam estar informados daquilo que eram acusados nas alegações finais, aquelas que marcam o encerramento dos debates entre as partes.
Apesar do placar de 7 a 3, obtido na ausência de Marco Aurélio de Mello, que poderia ter cravado um probabilíssimo oitavo voto, o caso só estará resolvido em novo debate, marcado para a próxima semana. Há um novo risco aí.
Com o nome técnico de "modulação", pretende-se aplicar o velho casuísmo jurídico para impedir que um direito cristalino possa beneficiar a todos aqueles que tiveram suas garantias mutiladas pela Lava Jato -- a começar por Lula.
As propostas já sugeridas seriam até divertidas, se não fossem destituídas de lógica e bom senso. Uma delas seria só aplicar o novo entendimento após o STF sacramentar a decisão de ontem - decisão inaceitável, quando se trata de uma regra reconhecida em lei há quase 80 anos.
Outra possibilidade é só reconhecer o artigo 403 e anular as penas indevidas quando a defesa já tiver apresentado recurso, durante o julgamento em primeira instância. O inaceitável, aqui, é pretender punir um réu por um eventual erro de seu advogado - em vez de corrigir um erro, mesmo tardiamente.
A ideia da modulação é clara: fazer um brinde ao direito de defesa, mas impedir que seja acessível a todo brasileiro e toda brasileira, independente de origem, religião ou opinião política.
Alguma dúvida?
Se alguém está em dúvida sobre os fundamentos da decisão tomada ontem por 7 a 3 ministros do STF, que definiu a ordem das alegações finais, sugiro a leitura do artigo 403 do Código de Processo Penal, em vigor desde 1941 - ou seja, há 78 anos. Diz o texto, publicado quando nenhum dos atuais ministros sequer havia nascido:
Art. 403. Não havendo requerimento de diligências, ou sendo indeferido, serão oferecidas alegações finais orais por 20 (vinte) minutos, respectivamente, pela acusação e pela defesa, prorrogáveis por mais 10 (dez), proferindo o juiz, a seguir, sentença. (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
É isso aí. Ao contrário do que ocorreu em inúmeros julgamentos da Lava Jato, uma questão resolvida de modo cristalino quando o Brasil se encontrava sob o Estado Novo de Vargas, e não sofreu qualquer emenda ou alteração substantiva desde então, até agora esteve embaralhada de forma a prejudicar o fundamento essencial das democracias - o direito de defesa.
Podemos admitir que, até a aparição do advogado Alberto Zacarias Toron, na sessão do STF que julgou um recurso de Aldemir Bendine, em 27 de agosto, ninguém tivesse reparado nessa contradição espantosa entre a ordem das alegações finais em muitas decisão da Lava Jato -- e aquilo que está definido num Codigo que deve ser cumprido por todos os tribunais brasileiros, em qualquer instância.
Depois que o STF anulou a sentença contra Bendine, justamente em função disso, o espantoso não é que um grande número de condenados possam fazer fila no Judiciário para recuperar direitos previstos em lei.
O surpreendente é que, dentro e fora do Supremo, uma questão como essa, resolvida de modo claro e explícito, ainda possa gerar dúvidas nas autoridades que têm a obrigação de fazer cumprir as leis em vigor no país.
A mais tentativa de impedir a correta aplicação do artigo 403 do Código Penal e enfraquecer o direito de defesa consiste em apagar as diferenças entre os réus que se transformaram em delatores e aqueles que enfrentam uma denuncia.
Sabemos que, num julgamento, os papéis de réus e delatores são mais que diferentes. São opostos. Os delatores não só negociaram - previamente - um perdão judicial e até 2/3 da redução da pena privativa de liberdade, mas também já chegam ao tribunal com uma missão definida: reforçar e até agravar a condenação dos demais. É assim que garantem e até ampliam os próprios benefícios. Ainda que não tenham esse título formal, é uma questão de simples honestidade reconhecer que sua função é ajudar a acusação.
Ao embaralhar a ordem dos depoimentos, os julgamentos da Lava Jato criaram uma dificuldade suplementar ao direito de defesa, pois os réus nem sempre podiam estar informados daquilo que eram acusados nas alegações finais, aquelas que marcam o encerramento dos debates entre as partes.
Apesar do placar de 7 a 3, obtido na ausência de Marco Aurélio de Mello, que poderia ter cravado um probabilíssimo oitavo voto, o caso só estará resolvido em novo debate, marcado para a próxima semana. Há um novo risco aí.
Com o nome técnico de "modulação", pretende-se aplicar o velho casuísmo jurídico para impedir que um direito cristalino possa beneficiar a todos aqueles que tiveram suas garantias mutiladas pela Lava Jato -- a começar por Lula.
As propostas já sugeridas seriam até divertidas, se não fossem destituídas de lógica e bom senso. Uma delas seria só aplicar o novo entendimento após o STF sacramentar a decisão de ontem - decisão inaceitável, quando se trata de uma regra reconhecida em lei há quase 80 anos.
Outra possibilidade é só reconhecer o artigo 403 e anular as penas indevidas quando a defesa já tiver apresentado recurso, durante o julgamento em primeira instância. O inaceitável, aqui, é pretender punir um réu por um eventual erro de seu advogado - em vez de corrigir um erro, mesmo tardiamente.
A ideia da modulação é clara: fazer um brinde ao direito de defesa, mas impedir que seja acessível a todo brasileiro e toda brasileira, independente de origem, religião ou opinião política.
Alguma dúvida?
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