Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
"Os americanos mostram-se sempre complicados," escreve ele no recém lançado "O Brasil não cabe no quintal de ninguém, "livro que retrata sua experiência internacional. "Comportam-se, em geral, de maneira prepotente, consideram-se líderes natos e hereditários. Não sabem trabalhar em aliança. Coisa curiosa: com os americanos, é difícil cooperar mesmo quando há concordância de posições. Passei por isso mais de uma vez nos oito anos em que tive contato regulares com as delegações dos EUA no G20 e a diretoria desse país nos FMI".
No mesmo trecho, o economista anuncia "um aviso aos navegantes: os americanos desprezam visceralmente comportamentos subservientes. Quantas vezes testemunhei a indiferença e, não raro, os maus tratos dispensados a seus satélites, especialmente latino-americanos".
São palavras sob medida para se compreender o ambiente de decepção gerado pela revelação de que a Casa Branca acabara de comunicar, reservadamente, seu esforço para emplacar dois parceiros prioritários a ingressar na OCDE -- a Argentina e a Romenia.
A decepção e mal-estar que a notícia produziu entre os aliados de Bolsonaro levou a Embaixada norte-americana, em Brasília, a divulgar uma nota na qual reafirma seu apoio ao ingresso brasileiro na OCDE -- uma declaração de intenções, genérica, sem compromissos maiores nem medidas concretas.
Os aliados de um governo que se tornou o grande saco de pancadas da cena internacional, como se viu na última Conferência da ONU e nos frequentes confrontos com o presidente da França, Emmanuel Macron, que voltou a ganhar pontos junto ao eleitorado de seus francês de ataques disparados contra as tolices do colega brasileiro, reagiram como maridos traidos diante da opção por Buenos Aires. Compreende-se.
Num país onde ideias de altivez e soberania, expressas na obra de Paulo Nogueira Batista Jr, são marginalizadas, a postura subserviente tornou-se marca registrada e já denunciada por diplomatas de várias escolas, como Rubens Ricúpero, de impecáveis credenciais tucanas.
Com Bolsonaro, o Brasil tornou-se o único país do mundo a possuir, no comando de sua diplomacia, um personagem como Ernesto Araújo, capaz de escrever uma artigo ( "Trump e o Ocidente"), num tom descaradamente bajulatório, como nunca se viu entre nações soberanas.
Em palavras que ajudaram a pavimentar sua escolha para o ministério sem jamais ter ocupado numa única Embaixada, Araujo define a atuação internacional de Donald Trump como um esforço para "submeter o Ocidente a uma terapia de recuperação da personalidade perdida " na qual procura "o reestabelecimento do contato com o próprio inconsciente". Alguns parágrafos adiante, sempre no tom de dependência, o futuro chanceler refere-se a "um Deus por quem os ocidentais anseiam ou deveriam ansiar, o Deus de Trump".
Com este espírito Bolsonaro e Araújo viajaram para os Estados Unidos em março e, conforme relatado num comunicado oficial da visita, assinado pelos dois governos, ali conversaram sobre o ingresso do país na OCDE. "O Presidente Trump manifestou seu apoio para que o Brasil inicie o processo de acessão com vistas a tornar-se membro pleno da OCDE", diz o texto.
Referindo-se ao presidente brasileiro com palavras especialmente gentis, atribuindo-lhe um "status de líder global", o comunicado deixa registrado que Bolsonaro já começava a fazer concessões diplomáticas nessa direção, antes mesmo do país receber qualquer benefício concreto. Assim, o cidadão com "status de líder global" concordou que "começará a abrir mão do tratamento especial e diferenciado nas negociações da Organização Mundial do Comércio, em linha com a proposta dos Estados Unidos." Em português claro: num universo de guerra comercial no qual todo tratamento preferencial é uma vantagem da qual ninguém abre mão sem contrapartidas compensadoras, Bolsonaro deixou claro que estava já começaria a fazer concessões -- antes de receber a mercadoria, postura sob medida para ser atingido por diplomatas de Washington, que "desprezam visceralmente comportamentos subservientes".
Há uma grande ironia nesta história, contudo. O saldo é bom para nosso país. Do ponto de vista das necessidades do país, o Brasil não tem o menor interesse econômico nem diplomático de ingressar na OCDE.
Criada sob liderança dos Estados Unidos nos tempos da Guerra Fria, a instituição é um braço utilizado por Washington e demais países de PIB avantajado para monitorar o crescimento das nações médias, impondo normas e restrições de acordo com os interesses das economias centrais. Não por acaso, até aqui o único governo brasileiro a demonstrar interesse efetivo para ingressar na OCDE foi Michel Temer, que chegou a instalar um embaixador em Paris, sede da organização, para tentar uma vaga de qualquer maneira.
Basta consultar o mapa do mundo para reparar que nações como China, Rússia e Índia estão fora da OCDE e jamais viram qualquer vantagem real em bater a sua porta. Foram estes países que, ao lado do Brasil, constituíram os Brics, um polo alternativo e mais adequado a seu grau de desenvolvimento e características socioeconômicas.
Cedo ou tarde, quando for possível livrar-se de um governo ruinoso como Bolsonaro-Paulo Guedes, é nesta direção que o Brasil deve caminhar.
Alguma dúvida?
Com a experiência de quem passou oito anos entre o Fundo Monetário Internacional e o banco de desenvolvimento criado pelos BRICS, o bloco econômico-diplomático formado por Brasil, Russia, Índia, China e Africa do Sul, o economista Paulo Nogueira Batista Jr. deixou um registro sob medida para se prever o fiasco produzido pela diplomacia subserviente de Jair Bolsonaro e Ernesto Araújo , que nos últimos meses alimentou a ilusão de que o país estava com ingresso garantido na OCDE, a organização que desde a Guerra Fria reúne as economias dos país alinhados com Washington.
"Os americanos mostram-se sempre complicados," escreve ele no recém lançado "O Brasil não cabe no quintal de ninguém, "livro que retrata sua experiência internacional. "Comportam-se, em geral, de maneira prepotente, consideram-se líderes natos e hereditários. Não sabem trabalhar em aliança. Coisa curiosa: com os americanos, é difícil cooperar mesmo quando há concordância de posições. Passei por isso mais de uma vez nos oito anos em que tive contato regulares com as delegações dos EUA no G20 e a diretoria desse país nos FMI".
No mesmo trecho, o economista anuncia "um aviso aos navegantes: os americanos desprezam visceralmente comportamentos subservientes. Quantas vezes testemunhei a indiferença e, não raro, os maus tratos dispensados a seus satélites, especialmente latino-americanos".
São palavras sob medida para se compreender o ambiente de decepção gerado pela revelação de que a Casa Branca acabara de comunicar, reservadamente, seu esforço para emplacar dois parceiros prioritários a ingressar na OCDE -- a Argentina e a Romenia.
A decepção e mal-estar que a notícia produziu entre os aliados de Bolsonaro levou a Embaixada norte-americana, em Brasília, a divulgar uma nota na qual reafirma seu apoio ao ingresso brasileiro na OCDE -- uma declaração de intenções, genérica, sem compromissos maiores nem medidas concretas.
Os aliados de um governo que se tornou o grande saco de pancadas da cena internacional, como se viu na última Conferência da ONU e nos frequentes confrontos com o presidente da França, Emmanuel Macron, que voltou a ganhar pontos junto ao eleitorado de seus francês de ataques disparados contra as tolices do colega brasileiro, reagiram como maridos traidos diante da opção por Buenos Aires. Compreende-se.
Num país onde ideias de altivez e soberania, expressas na obra de Paulo Nogueira Batista Jr, são marginalizadas, a postura subserviente tornou-se marca registrada e já denunciada por diplomatas de várias escolas, como Rubens Ricúpero, de impecáveis credenciais tucanas.
Com Bolsonaro, o Brasil tornou-se o único país do mundo a possuir, no comando de sua diplomacia, um personagem como Ernesto Araújo, capaz de escrever uma artigo ( "Trump e o Ocidente"), num tom descaradamente bajulatório, como nunca se viu entre nações soberanas.
Em palavras que ajudaram a pavimentar sua escolha para o ministério sem jamais ter ocupado numa única Embaixada, Araujo define a atuação internacional de Donald Trump como um esforço para "submeter o Ocidente a uma terapia de recuperação da personalidade perdida " na qual procura "o reestabelecimento do contato com o próprio inconsciente". Alguns parágrafos adiante, sempre no tom de dependência, o futuro chanceler refere-se a "um Deus por quem os ocidentais anseiam ou deveriam ansiar, o Deus de Trump".
Com este espírito Bolsonaro e Araújo viajaram para os Estados Unidos em março e, conforme relatado num comunicado oficial da visita, assinado pelos dois governos, ali conversaram sobre o ingresso do país na OCDE. "O Presidente Trump manifestou seu apoio para que o Brasil inicie o processo de acessão com vistas a tornar-se membro pleno da OCDE", diz o texto.
Referindo-se ao presidente brasileiro com palavras especialmente gentis, atribuindo-lhe um "status de líder global", o comunicado deixa registrado que Bolsonaro já começava a fazer concessões diplomáticas nessa direção, antes mesmo do país receber qualquer benefício concreto. Assim, o cidadão com "status de líder global" concordou que "começará a abrir mão do tratamento especial e diferenciado nas negociações da Organização Mundial do Comércio, em linha com a proposta dos Estados Unidos." Em português claro: num universo de guerra comercial no qual todo tratamento preferencial é uma vantagem da qual ninguém abre mão sem contrapartidas compensadoras, Bolsonaro deixou claro que estava já começaria a fazer concessões -- antes de receber a mercadoria, postura sob medida para ser atingido por diplomatas de Washington, que "desprezam visceralmente comportamentos subservientes".
Há uma grande ironia nesta história, contudo. O saldo é bom para nosso país. Do ponto de vista das necessidades do país, o Brasil não tem o menor interesse econômico nem diplomático de ingressar na OCDE.
Criada sob liderança dos Estados Unidos nos tempos da Guerra Fria, a instituição é um braço utilizado por Washington e demais países de PIB avantajado para monitorar o crescimento das nações médias, impondo normas e restrições de acordo com os interesses das economias centrais. Não por acaso, até aqui o único governo brasileiro a demonstrar interesse efetivo para ingressar na OCDE foi Michel Temer, que chegou a instalar um embaixador em Paris, sede da organização, para tentar uma vaga de qualquer maneira.
Basta consultar o mapa do mundo para reparar que nações como China, Rússia e Índia estão fora da OCDE e jamais viram qualquer vantagem real em bater a sua porta. Foram estes países que, ao lado do Brasil, constituíram os Brics, um polo alternativo e mais adequado a seu grau de desenvolvimento e características socioeconômicas.
Cedo ou tarde, quando for possível livrar-se de um governo ruinoso como Bolsonaro-Paulo Guedes, é nesta direção que o Brasil deve caminhar.
Alguma dúvida?
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