Por Tereza Cruvinel, em seu blog:
O pacote neoliberal de Paulo Guedes, se for ou fosse aprovado na íntegra, seria a mais ampla alteração da Constituição de 1988 e de seu espírito cidadão.
Em condições normais, tamanha reforma exigiria a convocação de nova assembleia constituinte.
Dificilmente, porém, o Congresso, apesar de seu pendor reformista-conservador, engolirá o pacote a seco, devendo regurgitar os pontos politicamente mais sensíveis, que não são poucos.
O futuro de Guedes, e do governo Bolsonaro, dependem muito de quando e quais pontos serão aprovados.
A rigor, podemos dizer que as três propostas de emendas constitucionais atacam os problemas fiscais mais urgentes (PEC emergencial) da União, Estados e Municípios, as regras fiscais disciplinares de longo prazo e o destino dos fundos constitucionais e seus recursos hoje represados.
Assim falando, parece bem e bonito.
O Brasil precisa mesmo de enfrentar seu problema fiscal mas como fazer isso, produzindo crescimento econômico, é que são elas.
Guedes propõe um “ato institucional”, uma reforma constitucional profunda da qual resultará o sonhado Estado mínimo dos neoliberais e a radicalização da austeridade, ignorando os problemas sociais, a pobreza e a desigualdade que, no Brasil, ainda exige atenção do Estado (inclusive para ampliar o mercado de consumo, e por tabela o crescimento).
Numa ditadura, ia bem. Mas passando pelo Congresso, o pacote será desembrulhado por partidos e congressistas levando em conta seus interesses regionais, políticos e eleitorais.
Começando esta avaliação pelo tempo de aprovação, dificilmente o pacote, ainda que mutilado, sai do Congresso antes das eleições municipais do ano que vem. Aprovar alguns pontos antes delas é briga certa com os prefeitos e candidatos a prefeito, dos quais dependem os parlamentes, clientes eleitorais.
Outra dificuldade virá do fato de terem sido propostas três distintas PECs: serão três comissões especiais em cada casa, três passagens pela CCJ e três relatores, exigindo uma articulação política e uma base parlamentar orgânica que o atual governo não tem.
O momento pré-eleitoral conspira fortemente contra a proposta que é politicamente mais bizarra e inconveniente, a de supressão dos municípios que não gerem mais de 10% dos recursos que consomem.
É verdade que houve uma grande proliferação de municípios, criados após aprovação do desmembramento em plebiscito. Noves fora a banana para a vontade popular, cada novo município criou uma elite política local que negocia votos com parlamentares federais e não aceitará o retrocesso. Isso dificilmente passa.
Mas é na PEC emergencial que o pacote endurece mais, estabelecendo uma série de proibições em situações de desajuste fiscal da União ou dos entes federados.
E quem vive com superávit no Brasil de hoje?
Esta PEC o governo quer aprovar este ano: para não desrespeitar a regra, além do crédito suplementar orçamentário antes previsto, serão agora impostas agora várias medidas de austeridade.
Será proibido reajustar salários de servidores, realizar concursos, criar cargos e funções que gerem despesa nova, criar novas vantagens e penduricalhos, criar novas despesas obrigatórias e conceder incentivos fiscais.
A garantia de reajuste anual dos servidores sairá da Constituição.
O BNDES também terá reduzidos os recursos oriundos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).
Ou seja, seca-se a principal fonte de financiamento de investimentos de longo prazo. Isso não ajuda o crescimento, pelo contrário.
O teto dos gastos, aprovado no governo Temer, para a União, passa a valer também para estados e municípios. É a aposta total na austeridade, fundamento do neoliberalismo.
O pacote tem muito da receita chilena, que está dando no que se passa por lá.
O problema desta concepção é que tanta austeridade deprime o consumo, não havendo renda nem folga salarial para ninguém. E não havendo consumo, nada de crescimento.
Na vertente oposta estão as políticas anti-cíclicas, pelas quais nestas horas de estagnação ou recessão o Estado tem que atuar para dinamizar o ambiente econômico, garantindo crédito e realizando investimentos.
O Congresso, naturalmente, tem uma maioria alinhada ao pensamento de Guedes mas tem também suas conveniências políticas. Aceitará, por exemplo, o fim do socorro da União a estados endividados e falidos?
Se não há socorro, vão simplesmente quebrar?
Aceitará o Congresso o fim das operações de crédito entre a União e os outros entes, vale dizer, o fim dos empréstimos para a realização de obras que jamais poderiam ser feitas sem ajuda federal, ainda que o empréstimo tenha de ser pago? Duvido.
Aceitará o Congresso, entre as medidas emergenciais, o corte de 25% da carga horária e dos salários dos servidores? E se o assunto bater no STF, será considerado constitucional?
Outra PEC, a do pacto federativo, promete mais recursos para estados e municípios.
Verbalmente, Guedes falou em R$ 400 bilhões oriundos do leilão do pré-sal, que hoje já não foi o sucesso prometido. Só dois blocos foram arrematados, e por R$ 70 bilhões, não pelos esperados R$ 100 bilhões.
Aqui tem coisas que também não serão bem digeridas pelo Congresso.
Por exemplo, a fusão dos pisos para saúde (15% das receitas) e para educação (25%) numa só rubrica, podendo o governante decidir como aplicar.
E se houver um surto de uma doença infeciosa, o prefeito vai fechar escolas para atender aos doentes?
Por fim, a terceira PEC acaba com boa parte dos fundos públicos, criados com finalidades específicas.
É verdade que eles são muitos e captam recursos que ficam em muitos casos parados.
Existiriam mais de R$ 200 bilhões represados, que agora iriam para o pagamento da dívida pública.
Quase todos foram criados por iniciativa do Congresso. Os governos é que dificultaram a aplicação dos recursos na destinação prevista. Por alguns, o Congresso vai brigar.
Enfim, são muitos os espinhos que o Congresso vai cuspir fora.
E, sobretudo, dificilmente aprovará o que aceitar no tempo esperado por Guedes.
O que ele fará se a tramitação se alongar demais, e ele não colher os bons resultados econômicos prometidos, tão essenciais para garantir dividendos políticos a um presidente que deseja a reeleição, está com a popularidade em queda, enfrenta fogo alto em várias frentes e levou o pais ao isolamento internacional?
Pode pegar o boné, acusando o Congresso de sabotagem. E de Bolsonaro sem Guedes, o que será?
Como está claríssimo, a elite nacional só atura Bolsonaro por causa de Guedes e seu projeto bastante condensado neste pacote.
O pacote neoliberal de Paulo Guedes, se for ou fosse aprovado na íntegra, seria a mais ampla alteração da Constituição de 1988 e de seu espírito cidadão.
Em condições normais, tamanha reforma exigiria a convocação de nova assembleia constituinte.
Dificilmente, porém, o Congresso, apesar de seu pendor reformista-conservador, engolirá o pacote a seco, devendo regurgitar os pontos politicamente mais sensíveis, que não são poucos.
O futuro de Guedes, e do governo Bolsonaro, dependem muito de quando e quais pontos serão aprovados.
A rigor, podemos dizer que as três propostas de emendas constitucionais atacam os problemas fiscais mais urgentes (PEC emergencial) da União, Estados e Municípios, as regras fiscais disciplinares de longo prazo e o destino dos fundos constitucionais e seus recursos hoje represados.
Assim falando, parece bem e bonito.
O Brasil precisa mesmo de enfrentar seu problema fiscal mas como fazer isso, produzindo crescimento econômico, é que são elas.
Guedes propõe um “ato institucional”, uma reforma constitucional profunda da qual resultará o sonhado Estado mínimo dos neoliberais e a radicalização da austeridade, ignorando os problemas sociais, a pobreza e a desigualdade que, no Brasil, ainda exige atenção do Estado (inclusive para ampliar o mercado de consumo, e por tabela o crescimento).
Numa ditadura, ia bem. Mas passando pelo Congresso, o pacote será desembrulhado por partidos e congressistas levando em conta seus interesses regionais, políticos e eleitorais.
Começando esta avaliação pelo tempo de aprovação, dificilmente o pacote, ainda que mutilado, sai do Congresso antes das eleições municipais do ano que vem. Aprovar alguns pontos antes delas é briga certa com os prefeitos e candidatos a prefeito, dos quais dependem os parlamentes, clientes eleitorais.
Outra dificuldade virá do fato de terem sido propostas três distintas PECs: serão três comissões especiais em cada casa, três passagens pela CCJ e três relatores, exigindo uma articulação política e uma base parlamentar orgânica que o atual governo não tem.
O momento pré-eleitoral conspira fortemente contra a proposta que é politicamente mais bizarra e inconveniente, a de supressão dos municípios que não gerem mais de 10% dos recursos que consomem.
É verdade que houve uma grande proliferação de municípios, criados após aprovação do desmembramento em plebiscito. Noves fora a banana para a vontade popular, cada novo município criou uma elite política local que negocia votos com parlamentares federais e não aceitará o retrocesso. Isso dificilmente passa.
Mas é na PEC emergencial que o pacote endurece mais, estabelecendo uma série de proibições em situações de desajuste fiscal da União ou dos entes federados.
E quem vive com superávit no Brasil de hoje?
Esta PEC o governo quer aprovar este ano: para não desrespeitar a regra, além do crédito suplementar orçamentário antes previsto, serão agora impostas agora várias medidas de austeridade.
Será proibido reajustar salários de servidores, realizar concursos, criar cargos e funções que gerem despesa nova, criar novas vantagens e penduricalhos, criar novas despesas obrigatórias e conceder incentivos fiscais.
A garantia de reajuste anual dos servidores sairá da Constituição.
O BNDES também terá reduzidos os recursos oriundos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).
Ou seja, seca-se a principal fonte de financiamento de investimentos de longo prazo. Isso não ajuda o crescimento, pelo contrário.
O teto dos gastos, aprovado no governo Temer, para a União, passa a valer também para estados e municípios. É a aposta total na austeridade, fundamento do neoliberalismo.
O pacote tem muito da receita chilena, que está dando no que se passa por lá.
O problema desta concepção é que tanta austeridade deprime o consumo, não havendo renda nem folga salarial para ninguém. E não havendo consumo, nada de crescimento.
Na vertente oposta estão as políticas anti-cíclicas, pelas quais nestas horas de estagnação ou recessão o Estado tem que atuar para dinamizar o ambiente econômico, garantindo crédito e realizando investimentos.
O Congresso, naturalmente, tem uma maioria alinhada ao pensamento de Guedes mas tem também suas conveniências políticas. Aceitará, por exemplo, o fim do socorro da União a estados endividados e falidos?
Se não há socorro, vão simplesmente quebrar?
Aceitará o Congresso o fim das operações de crédito entre a União e os outros entes, vale dizer, o fim dos empréstimos para a realização de obras que jamais poderiam ser feitas sem ajuda federal, ainda que o empréstimo tenha de ser pago? Duvido.
Aceitará o Congresso, entre as medidas emergenciais, o corte de 25% da carga horária e dos salários dos servidores? E se o assunto bater no STF, será considerado constitucional?
Outra PEC, a do pacto federativo, promete mais recursos para estados e municípios.
Verbalmente, Guedes falou em R$ 400 bilhões oriundos do leilão do pré-sal, que hoje já não foi o sucesso prometido. Só dois blocos foram arrematados, e por R$ 70 bilhões, não pelos esperados R$ 100 bilhões.
Aqui tem coisas que também não serão bem digeridas pelo Congresso.
Por exemplo, a fusão dos pisos para saúde (15% das receitas) e para educação (25%) numa só rubrica, podendo o governante decidir como aplicar.
E se houver um surto de uma doença infeciosa, o prefeito vai fechar escolas para atender aos doentes?
Por fim, a terceira PEC acaba com boa parte dos fundos públicos, criados com finalidades específicas.
É verdade que eles são muitos e captam recursos que ficam em muitos casos parados.
Existiriam mais de R$ 200 bilhões represados, que agora iriam para o pagamento da dívida pública.
Quase todos foram criados por iniciativa do Congresso. Os governos é que dificultaram a aplicação dos recursos na destinação prevista. Por alguns, o Congresso vai brigar.
Enfim, são muitos os espinhos que o Congresso vai cuspir fora.
E, sobretudo, dificilmente aprovará o que aceitar no tempo esperado por Guedes.
O que ele fará se a tramitação se alongar demais, e ele não colher os bons resultados econômicos prometidos, tão essenciais para garantir dividendos políticos a um presidente que deseja a reeleição, está com a popularidade em queda, enfrenta fogo alto em várias frentes e levou o pais ao isolamento internacional?
Pode pegar o boné, acusando o Congresso de sabotagem. E de Bolsonaro sem Guedes, o que será?
Como está claríssimo, a elite nacional só atura Bolsonaro por causa de Guedes e seu projeto bastante condensado neste pacote.
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