domingo, 2 de agosto de 2020

Ricos não pagam quase nada de impostos

Por Jair de Souza

Nenhuma sociedade pode existir dignamente sem a existência de impostos. Todos os serviços públicos dependem de impostos para funcionar. De nossas inúmeras necessidades, todos aspiramos a uma escola pública de qualidade, a um atendimento médico público eficiente, a um transporte público digno e a um sistema de segurança que realmente nos proteja. Mas, como ter acesso a isso sem recursos para bancar os custos? Os ricos só se preocupam com os serviços públicos de repressão policial e com o judiciário, porque são os que lhes servem melhor para conter a rebeldia popular e os protestos dos trabalhadores e dos pobres em geral. Porém, eles não dão a mínima para as necessidades básicas do povo trabalhador.

Como os ricos têm dinheiro, eles preferem pagar escolas particulares para seus filhos a contribuir para manter escolas públicas de qualidade para os filhos dos trabalhadores. O mesmo se dá em relação com a saúde, pois, como os ricos têm como pagar por clínicas e hospitais particulares, estão contra o financiamento público da assistência médica destinada ao povo. Por isso, eles não querem pagar impostos. Mas, para angariar simpatia e apoio político na sociedade, tratam de fazer com que os pobres e a classe média também acreditem que o pagamento de impostos são ruins para a sociedade como um todo. Nada disso! Os impostos são fundamentais. No entanto, quem deveria arcar com o maior peso dos impostos são aqueles que ganham mais, e não os que ganham pouco. No Brasil, os ricos quase não pagam impostos. São os trabalhadores os que arcam com a maior parte da carga tributária.

Enquanto nos países desenvolvidos da Europa, nos Estados Unidos e no Japão, por exemplo, a carga tributária direta é muito mais rigorosa e vai se elevando conforme o nível dos rendimentos, chegando a ultrapassar os 50%, no Brasil a alíquota máxima se congela em 27,5. Ou seja, um assalariado de classe média que ganhe R$ 15.000,00 por mês, vai pagar os mesmos 27,5% que um super-executivo que receba R$ 500.000,00. Precisamos acabar com isto. O exemplo dado a seguir tem a intenção de expor a injustiça da tributação existente no Brasil, onde o imposto direto sobre a renda dos ricos é insignificante, ao passo que o grosso da arrecadação se dá através do imposto sobre os bens de consumo.

Para tornar mais inteligível a questão da tributação injusta, elaborei um cálculo tomando um Brasil hipotético onde existem 100 milhões de pessoas contribuintes. Destes, 80 milhões são trabalhadores que recebem em média 2500 reais por mês, e outros 20 milhões de ricos que ganham em média 50.000 reais. Estou fazendo também a suposição realística de que os trabalhadores gastam todo seu rendimento em bens de consumo, e que cada rico gasta em bens de consumo uma média 4 vezes maior do que a de cada trabalhador. Além disso, vamos imaginar que neste Brasil hipotético toda a tributação se faça apenas através da taxação dos bens de consumo e que a alíquota média cobrada seja de 25% sobre seu valor de mercado. Este é um exemplo simplificado, só para facilitar sua compreensão, ainda que bem ilustrativo da essência do problema. Na realidade, a situação é ainda pior.

- Renda total do país = R$ 1.200.000.000.000,00, sendo R$ 200.000.000.000,00 (trabalhadores) + R$ 1.000.000.000.000,00 (ricos).

- 80.000.000 trabalhadores x 2.500 reais = R$ 200.000.000.000,00.

- Gastos no consumo por trabalhador = R$ 2.500,00. Imposto por trabalhador (25% de 2.500) = 625,00. Total de impostos = R$ 50.000.000.000,00,

Ou seja, os trabalhadores pagam de impostos 25% do que ganham, que significa R$ 50.000.000.000,00.

- 20.000.000 de ricos x 50.000 reais = R$ 1.000.000.000.000,00.

- Gastos de consumo por rico = R$ 10.000,00. Imposto por rico (25% de 10.000,00) = 2.500,00. Total de impostos = R$ 50.000.000.000,00

Ou seja, os ricos pagam de impostos 5% do que ganham.

No final, da carga tributária total (R$ 100.000.000.000,00), o conjunto dos trabalhadores arcam com 50%, apesar de receberem tão somente 16,66% dos rendimentos.

É por isso que os ricos só aceitam sem reclamar a tributação em cima dos bens de consumo, e não a tributação direta em cima dos rendimentos.

Acabar com esta tremenda injustiça não vai ser tarefa fácil. Devemos nos preparar para desmascarar aqueles que desejam manter os privilégios dos eternos apaniguados e tratam de fazer terrorismo toda vez que se levanta a necessidade de taxação sobre os mais ricos. Precisamos nos esforçar para que o conjunto do povo trabalhador (incluindo a classe média) venha a entender que para haver justiça social que beneficie a todos (inclusive aos próprios ricos), é fundamental que seja feita uma profunda reforma tributária que obrigue aos mais privilegiados a cumprir com seus deveres sociais.

* Jair de Souza é economista formado pela UFRJ; mestre em linguística também pela UFRJ.

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