Por Marcio Pochmann, no site Outras Palavras:
Amparada na teoria do realismo periférico que advoga a incapacidade do protagonismo soberano na globalização capitalista conduzida pelos Estados Unidos, parte importante dos ricos, poderosos e privilegiados optou pela desistência histórica do Brasil, começando pelo “abraço de afogado” estabelecido com a extrema direita internacional para promover as jornadas de junho de 2013 que abriram caminho para a desestabilização final do governo Dilma, três anos depois. (Escudé, 2012)
O condomínio de interesses dos ricos, poderosos e privilegiados que passou a comandar o país desde o golpe de 2016 em direção à vassalagem externa e à destruição nacional se mostrou exitoso na obtenção dos seus objetivos. Embora o país tenha se tornado pária internacional, encaminhando-se para o oitavo ano sem crescimento da renda per capita, os enriquecidos não têm do que reclamar.
Não somente cresceu a participação do capital no Produto Interno Bruto, embalado pela expansão da margem de lucro das empresas, como o número dos bilionários também aumentou no Brasil. Além disso, as mínimas restrições “civilizadas” para a exploração capitalista seguem sendo desconstituídas desde 2016 pelas deformas trabalhista e previdenciária, pela liberalização da degradação ambiental ao neoextrativismo, pela entrega do setor público estatal ao lúmpen empresarial, pelo desmonte do Estado de bem-estar e pela regressão para o final do século 20 dos recursos orçamentários para a educação e ciência e tecnologia.
Além disso, os interesses dos ricos, poderosos e privilegiados no Brasil têm sido muito bem-sucedidos na trajetória de validação eleitoral do golpe de 2016. O acúmulo de vitórias por parte dos partidos que sustentam politicamente o condomínio predileto dos enriquecidos se apresenta inequívoco nas eleições tanto municipais de 2016 e 2020 como presidenciais de 2018.
Tanto assim que o legislativo federal, dominado por bancadas parlamentares denominadas por boi, bíblia e bala, aprova o que o condomínio dos ricos desejar, sendo atendido, em troca, o conjunto de requisitos necessários para a sua própria sustentação eleitoral. Com isso, o político se metamorfoseia da condição de “representante do povo” para a de “influencer digital” e de gestor de recursos públicos a bel-prazer.
Na atual legislatura, por exemplo, cada parlamentar detém como emenda individual impositiva ao orçamento federal, a quantia de mais de 16 milhões de reais para aplicar em seus “distritos eleitorais”. Além disso, cada uma das 27 bancadas dos partidos políticos com representação no Congresso Nacional possui quase 250 milhões em emendas ao orçamento federal, perfazendo o total de R$ 6,7 bilhões. Sem falar, ainda, na gestão dos recursos públicos atrelados ao fundo partidário de quase um bilhão de reais em 2021 e ao fundo eleitoral para 2022 no valor de R$ 5,7 bilhões.
Mesmo assim, o condomínio dos ricos começou a vislumbrar obstáculos crescentes e mais robustos à manutenção dos seus próprios interesses. Diante da possível inviabilidade eleitoral do canhestro governo Bolsonaro, parcelas dos ricos passaram a ficar atônitos, almejando uma terceira via, sem sucesso aparente.
Em contrapartida, o mandato de Bolsonaro partiu para a experimentação da via do “golpe dentro do golpe”, como se estivesse tentando revitalizar 1968. A rápida explicitação da inaptidão para a administração pública civil da elite das Forças Armadas que aderiu ao governo atual se combinou, mais recentemente, com indícios de corrupção, fazendo lembrar os diversos escândalos de desonestidade e suborno durante os 21 anos dos governos autoritários (1964-1985).
Nessa via sem saída, Bolsonaro deu meia volta e abraçou “os profissionais” da política brasileira. Enquanto os militares no governo parecem perder protagonismo, o fisiologismo de direita reascende, na busca de procurar manter, pelo menos respirando sem aparelhos, o paciente até o ano que vem, sempre em nome do condomínio de ricos, poderosos e privilegiados.
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