Set. 2021: Marcha neonazista em Madri contra a comunidade LGBTQ+. Foto: Olmo Calvo |
Enquanto todos os olhos estão voltados para a guerra que a OTAN tenta fazer de conta que não é entre a OTAN e a Rússia, tendo a Ucrânia como palco e os ucranianos como bucha-de-canhão, outro importante fenômeno político acontece no continente.
Trata-se do "cordão sanitário" ou "cordão democrático" que se forma em vários países para isolar preventivamente os partidos de extrema-direita que conseguiram avançar alguns passos nas eleições locais ou nacionais nos últimos anos. Depois de muita tolerância com esses agrupamentos, que agem provocativamente e utilizam o discurso de ódio aos imigrantes, aos negros, e a outras "minorias", tanto as esquerdas como partidos de centro e até da direita tradicional estão despertando: não há como dar oxigênio a grupos que buscam, por palavras e atos, destruir a Democracia pelo lado de dentro.
Protegidos pelas garantias democráticas, partidos como o espanhol Vox, o alemão AfD, o norueguês Partido do Progresso ou o austríaco Partido da Liberdade poderão continuar existindo e defendendo seus programas radicais e racistas, mas terão cada vez menos espaços de decisão, mesmo nos parlamentos em que consigam estar representados.
É um desafio para as instituições democráticas, e especialmente para os partidos. Ele precisam abrir mão de ambições eleitorais imediatas, em benefício da manutenção do jogo democrático. Por exemplo, o Partido Popular espanhol, de direita, teria que deixar de governar algumas localidades onde foi o mais votado, mas precisaria de dois ou três votos do Vox para atingir a maioria absoluta. Ou o PP terá que aliar-se a esquerda, ou ficará fora do poder, para manter-se fiel aos princípios democráticos. Isso é que os cientistas políticos europeus estão chamando de "visão histórica", e os espanhóis de "mirada alta".
Outro ponto que ainda exige muita discussão é o perigo de fazer-se regras (escritas ou não) que amanhã possam voltar-se contra os setores democráticos, caso a extrema-direita um dia obtenha maioria. Ela poderia barrar também os partidos de esquerda, restringindo seus direitos obtidos nas urnas?
Outro ponto que ainda exige muita discussão é o perigo de fazer-se regras (escritas ou não) que amanhã possam voltar-se contra os setores democráticos, caso a extrema-direita um dia obtenha maioria. Ela poderia barrar também os partidos de esquerda, restringindo seus direitos obtidos nas urnas?
Linha vermelha
Os debates ainda acadêmicos em vários países indicam que só há um meio de impor barreiras aos partidos ultra: exigir que aqueles que não se comprometam aberta e firmemente com os Direitos Humanos não sejam objeto de diálogo com nenhuma outra força. E por Direitos Humanos se entende nenhum tipo de discriminação por raça, nacionalidade, opção sexual ou religiosa.
Esta seria a linha vermelha que jamais poderia ser ultrapassada. Na Alemanha, a CDU, da ex-chanceler Angela Merkel, já aprovou uma moção em 2018, que proíbe o partido de dialogar com os 83 deputados da AfD, quinta força política no Parlamento alemão.
Na Espanha, o radical Vox só tem o quarto vice-presidente do Congresso de Deputados, e administra apenas uma pequena localidade no interior. Mesmo onde ele apoia alcaides do PP, seus membros não são admitidos na administração ou em cargos de Mesa do Legislativo.
Na França fala-se numa "frente republicana" que una todos os democratas, de esquerda, centro e direita, contra os ultradireitistas. Há só dois partidos ultra na Assembleia Nacional, com um deputado cada, e oito eleitos pela Agrupação Nacional de Marine Le Pen, num universo de 577 cadeiras...
Muitos especialistas acham que a questão está sendo tratada com atraso, e que tais partidos deveriam ter sido coibidos anos atrás, desde que anunciaram suas intenções muito próximas 'as do Nazismo e do Fascismo. "Já estão na nossa cozinha, agora á tarde", lamenta Joaquín Úrias, professor de Direito Constitucional da Universidade de Sevilha. E a ousadia dos ultra aumenta: há poucos dias, sua candidata a Assembleia regional de Madri acabou com um debate na TV, ao dizer que não acredita que seu concorrente Pablo Iglesias de centro-esquerda, tenha recebido ameaças de morte. Indignado, ele retirou-se do estúdio, sendo depois seguido por dois outros candidatos que também não suportaram as provocações e o cinismo da radical de direita, que não poupou nem a mediadora do que seria o primeiro debate importante da campanha.
Dias antes, o ministro do Interior, a diretora da Guarda Nacional e Iglesias receberam cartas com ameaças de morte. O envelope para Iglesias continha quatro cartuchos de balas, uma para ele, e outras para seu pai, sua mãe e sua esposa...
* Antonio Barbosa Filho é jornalista, autor de "Audálio, deputado" e coordenador do núcleo regional do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé no Vale do Paraíba.
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