Editorial do sítio Vermelho:
Os procuradores do Ministério Público Federal que denunciam o coronel da reserva do Exército Sebastião Curió Rodrigues de Moura (o cruel “Major Curió” que agiu contra a Guerrilha do Araguaia na década de 1970) pelo sequestro de cinco combatentes que, desde então, constam das listas de desaparecidos políticos, abrem uma porta para a justiça e o restabelecimento da verdade em relação às perseguições políticas, sequestros, torturas e assassinatos cometidos pela repressão da ditadura militar.
É uma luz no fim do túnel. A Lei de Anistia de 1979, feita sob pressão democrática e popular pelo último governo da ditadura dirigido pelo general João Figueiredo, cometeu o erro de beneficiar também os torturadores e criminosos que agiram em nome da ditadura na repressão política, e criou um obstáculo jurídico para o julgamento e condenação daqueles crimes.
Mas não há crimes perfeitos. Eles não puderam – nem poderiam – incluir naquele artefato jurídico a figura do crime continuado constituído pelo sequestro seguido de assassinato político e ocultação dos cadáveres de suas vítimas. Incluir um tal ponto seria uma confissão do crime.
Deixaram, assim, a janela que permite, agora, a ação judicial contra o malfeitor Curió e abre a perspectiva de novas ações contra crimes semelhantes que não estão cobertos pela Lei de Anistia.
As reações dos militares reacionários e dos setores conservadores que não se pejam de assinar um manifesto em companhia de um notório torturador, o coronel da reserva do Exército Carlos Alberto Brilhante Ulstra, manifestando o forte medo da verdade que os une – indica o caminho árduo que a iniciativa dos procuradores vai percorrer.
Oficiais hoje na reserva com estrelas de general nos ombros alegam que há a intenção de “tumultuar” a democracia ao reabrir uma questão “discutida e encerrada”, como alegou um deles. Declaração que mal esconde a vontade de interferir no processo legal e democrático, contra o avanço da Justiça. O caso vai, certamente, parar no Supremo Tribunal Federal, a quem caberá novamente dar a última palavra.
Nesta eventualidade, caso sua decisão permaneça nos marcos jurídicos da questão, apoiando o seguimento da ação criminal contra o sequestrador do Araguaia, ganha a democracia e a Justiça. Curió pode pegar entre dois a 40 anos de prisão pelos crimes que cometeu e acobertou. Se a decisão for “política”, pode estender o véu que acoberta a verdade; perde a democracia e ganha a direita mais conservadora e feroz.
O argumento de crime continuado, usado recentemente para extraditar torturadores da ditadura argentina presos no território brasileiro, cria jurisprudência. São "crimes permanentes, cuja consumação encontra-se em curso", justificou um dos autores da ação criminal contra Curió.
O argumento tem relevância por dois aspectos que merecem ser considerados. O primeiro é passivo e se refere ao ocultamento dos cadáveres, dando consistência à acusação de sequestro que ainda não terminou três décadas depois (o sequestro termina ou com a libertação dos sequestrados ou com o aparecimento de seus cadáveres). Outro é ativo e se desdobra em atividades criminosas cometidas para acobertar a verdade, multiplicando, na região do Araguaia onde foram cometidos os crimes apontados, as intimidações e ameaças contra testemunhas dos sequestros ocorridos na década de 1970 sob o comando do Major Curió. Um mateiro que colaborava com as investigações foi assassinado em 2011 e pelo menos quatro pessoas denunciaram ter sido ameaçadas de morte, entre elas o tesoureiro da Associação dos Torturados na Guerrilha do Araguaia, Sezostrys Alves da Costa, que representa o PCdoB no grupo de trabalho do Ministério da Defesa para localizar os restos mortais dos assassinados pela repressão comandada, entre outros, por Curió.
O argumento alegando que a questão já foi muito discutida tem parte de razão: de fato o debate é intenso e multilateral; de um lado os democratas buscam frestas na lei para julgar os torturadores e assassinos da ditadura. Por outro lado, os conservadores e a direita tentam fortalecer a muralha jurídica que protege aqueles criminosos. Este argumento falha, contudo, quando diz que a questão já foi decidida. Não foi. Só estará decidida quando a nação conhecer a verdade sobre os crimes da ditadura e puder identificar seus autores e agentes. Isto ainda está faltando.
Os procuradores do Ministério Público Federal que denunciam o coronel da reserva do Exército Sebastião Curió Rodrigues de Moura (o cruel “Major Curió” que agiu contra a Guerrilha do Araguaia na década de 1970) pelo sequestro de cinco combatentes que, desde então, constam das listas de desaparecidos políticos, abrem uma porta para a justiça e o restabelecimento da verdade em relação às perseguições políticas, sequestros, torturas e assassinatos cometidos pela repressão da ditadura militar.
É uma luz no fim do túnel. A Lei de Anistia de 1979, feita sob pressão democrática e popular pelo último governo da ditadura dirigido pelo general João Figueiredo, cometeu o erro de beneficiar também os torturadores e criminosos que agiram em nome da ditadura na repressão política, e criou um obstáculo jurídico para o julgamento e condenação daqueles crimes.
Mas não há crimes perfeitos. Eles não puderam – nem poderiam – incluir naquele artefato jurídico a figura do crime continuado constituído pelo sequestro seguido de assassinato político e ocultação dos cadáveres de suas vítimas. Incluir um tal ponto seria uma confissão do crime.
Deixaram, assim, a janela que permite, agora, a ação judicial contra o malfeitor Curió e abre a perspectiva de novas ações contra crimes semelhantes que não estão cobertos pela Lei de Anistia.
As reações dos militares reacionários e dos setores conservadores que não se pejam de assinar um manifesto em companhia de um notório torturador, o coronel da reserva do Exército Carlos Alberto Brilhante Ulstra, manifestando o forte medo da verdade que os une – indica o caminho árduo que a iniciativa dos procuradores vai percorrer.
Oficiais hoje na reserva com estrelas de general nos ombros alegam que há a intenção de “tumultuar” a democracia ao reabrir uma questão “discutida e encerrada”, como alegou um deles. Declaração que mal esconde a vontade de interferir no processo legal e democrático, contra o avanço da Justiça. O caso vai, certamente, parar no Supremo Tribunal Federal, a quem caberá novamente dar a última palavra.
Nesta eventualidade, caso sua decisão permaneça nos marcos jurídicos da questão, apoiando o seguimento da ação criminal contra o sequestrador do Araguaia, ganha a democracia e a Justiça. Curió pode pegar entre dois a 40 anos de prisão pelos crimes que cometeu e acobertou. Se a decisão for “política”, pode estender o véu que acoberta a verdade; perde a democracia e ganha a direita mais conservadora e feroz.
O argumento de crime continuado, usado recentemente para extraditar torturadores da ditadura argentina presos no território brasileiro, cria jurisprudência. São "crimes permanentes, cuja consumação encontra-se em curso", justificou um dos autores da ação criminal contra Curió.
O argumento tem relevância por dois aspectos que merecem ser considerados. O primeiro é passivo e se refere ao ocultamento dos cadáveres, dando consistência à acusação de sequestro que ainda não terminou três décadas depois (o sequestro termina ou com a libertação dos sequestrados ou com o aparecimento de seus cadáveres). Outro é ativo e se desdobra em atividades criminosas cometidas para acobertar a verdade, multiplicando, na região do Araguaia onde foram cometidos os crimes apontados, as intimidações e ameaças contra testemunhas dos sequestros ocorridos na década de 1970 sob o comando do Major Curió. Um mateiro que colaborava com as investigações foi assassinado em 2011 e pelo menos quatro pessoas denunciaram ter sido ameaçadas de morte, entre elas o tesoureiro da Associação dos Torturados na Guerrilha do Araguaia, Sezostrys Alves da Costa, que representa o PCdoB no grupo de trabalho do Ministério da Defesa para localizar os restos mortais dos assassinados pela repressão comandada, entre outros, por Curió.
O argumento alegando que a questão já foi muito discutida tem parte de razão: de fato o debate é intenso e multilateral; de um lado os democratas buscam frestas na lei para julgar os torturadores e assassinos da ditadura. Por outro lado, os conservadores e a direita tentam fortalecer a muralha jurídica que protege aqueles criminosos. Este argumento falha, contudo, quando diz que a questão já foi decidida. Não foi. Só estará decidida quando a nação conhecer a verdade sobre os crimes da ditadura e puder identificar seus autores e agentes. Isto ainda está faltando.
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