Por Marlos Mello, no Observatório da Imprensa:
O Brasil esta se tornando um país de “comunicadores”. Essa é a tese geral do 2º Panorama da Comunicação, publicado em março de 2012. Os comunicadores são pessoas que, como você e eu, aprendem que há outros meios de expressarmos as nossas ideias e, principalmente, que a comunicação ocorre através da multiplicidade de opiniões.
Nos últimos anos, a experiência da comunicação tem deixado de ser profundamente técnica e absoluta. Nesse contexto, as ideias sobre a emergência da comunicação têm apontado os caminhos para uma cultura comunicacional cotidiana. Mas, concretamente, o que isso significa? No plano lógico, é possível imaginar o mundo sem os blogs? Sem as redes sociais? Sem a internet? Ora, na verdade, essas são as frentes que vieram para enfrentar o “mundo” do monopólio midiático da “última” palavra, daquela que seleciona o que pode e o que não pode ser dito e publicado. Este é o desafio e ao mesmo tempo a esperança daqueles que acreditam na possibilidade de existir uma comunicação livre dos monopólios.
Se a realidade do mundo não é mais confundida com o conteúdo da percepção dos monopólios, se a realidade passou a ser uma responsabilidade global perante os desafios contemporâneos, por que manter o direito à comunicação nas mãos de poucos? A razão dessa pergunta se deve ao contexto de crise mundial onde se revelam as fragilidades de uma posição cultural mergulhada no paternalismo conformista baseado na liberdade dos monopólios. Paternalismo conformista é aqui considerado o modelo alienante que de um lado garante o privatismo e de outro promove o protecionismo. Tal estratégia gerou uma ampliação do poder absoluto dos monopólios, em especial no que diz respeito aos quesitos clássicos ligados à estrutura econômica e política.
Investimentos do setor publicitário
Entretanto, a estratégia paternalista dos monopolistas foi além; por exemplo, a comunicação, que deveria ser um bem público, naturalizou-se como refém das grandes corporações e dos blocos hegemônicos que batalham para manter suas regalias à custa de todos. Isto porque as grandes empresas de comunicação estão legitimadas e pactuadas com os interesses particulares de fundir as duas estruturas, pública e privada, numa única fonte de arrecadação. Ou seja, o público passando a ser fonte de subsistência do setor privado.
Tratando apenas uma pequena parte do que está em questão, podemos sugerir o caso brasileiro que é permeado por uma comunicação que se consolidou no modelo privado de legitimação publicitária.
A massa monopolista brasileira dos grandes blocos econômicos ainda vigora nos espaços de excessiva visibilidade. Porém, não é apenas a legitimidade governamental que assegura esse poder. Ao analisarmos a composição dos processos de constituição e consolidação das empresas de comunicação brasileiras (televisão, rádios, jornais e internet) percebemos que a prevalência dessas indústrias da informação se dá pelo fluxo de investimentos do setor publicitário.
O ramo empresarial da comunicação é mantido pelo fluxo das regras oriundas do capitalismo que não concebe o bem social senão sob a forma da absorção das partes (política e econômica) numa centralização única. Dessa forma, numa análise superficial, a lógica corporativa funciona da seguinte forma: quanto maior for à capacidade de compra de espaços em jornais, revistas, internet e alugueis de horários em televisão e rádio, maior é a visibilidade da empresa que não poupa em investir na construção de uma imagem politicamente aceitável e economicamente consumível.
“De poucos para poucos”
Do ponto de vista estratégico, se seguirmos à risca a lógica da liberdade de imprensa (empresa), constataremos que não há nada de errado na supremacia do setor publicitário. Esta não é simplesmente a hegemonia encantadora, já que as pessoas tendem, num primeiro momento, a não concordar. Porém, a estratégia paternalista das empresas de comunicação (que através de entretenimento e demonstrações de cuidado e preocupação com o bem-estar)exerce um poder de influência sobre a formação da identidade das pessoas, tornando-as vulneráveis aos interesses publicitários.
O problema central, aqui, é que a abordagem paternalista das empresas de comunicação, simplesmente, impede que se questionem as relações de poder e os processos de diferenciação que, antes de tudo, produzem a identidade e a diferença. Em geral, o resultado é a produção de novas dicotomias, como a do dominante tolerante e do dominado tolerado ou a da identidade hegemônica, mas benevolente, e da identidade subalterna mas “respeitada”.
Contudo, o que é no mínimo questionável é que as empresas de comunicação se acham independentes de seus anunciantes, numa crença de que a liberdade de imprensa é uma liberdade intocável. Ora, já vimos vários exemplos e já discutimos em outros artigos que a regulamentação da comunicação empresarial por si mesma, ou seja, a autoregulamentação, não dá conta das necessidades de uma sociedade como a brasileira que é forjada em paradoxos de desigualdade social, racial, econômica, gênero etc..
Esse processo dissonante e controverso, de crer que a comunicação empresarial é autoregulável caminha contra todas as formas e garantias de participação da sociedade. Assim, no Brasil, a produção comunicacional ainda se encontra num terreno “de poucos/para poucos”. Essa barreira também é cultivada nas universidades e nos cursos profissionalizantes, no entanto, na contramão desses ensinamentos, a comunicação segue a sua raiz histórica e permanece sintonizada ao dia a dia das pessoas.
Comunicação universal
Muito já se escreveu sobre a história da comunicação, no entanto a história é sempre o recorte de um autor sobre um determinado assunto e, por isso, não nos aprofundaremos nessa questão. Deixaremos a história para os historiadores. Nosso interesse é questionar até que ponto a comunicação é fruto de uma construção individual e/ou coletiva.
Parece, pois, que existem muitas teorias que discutem e afirmam que foram os “entes das cavernas” que “descobriram” e “revelaram” ao mundo a necessidade de se comunicar. Entretanto, o contexto de origem da comunicação ninguém pode afirmar e nem queremos nos prender a isso. O que pretendemos mostrar é que a comunicação nasce e cresce em contraste a relação do ser com o ambiente monopolizante, ou seja, caracterizando-se pela plasticidade das suas motivações.
Explico: sendo a vida cotidiana dominada por motivações individuais, um fenômeno, que ainda necessita de maiores e melhores estudos, tem ocorrido nos últimos anos: a emancipação comunicacional. Trata-se de pessoas que estão deixando de acreditar que a comunicação pode ser ensinada e que apenas alguns, pelo conhecimento, têm o direito, ou seja, são legitimados como se tivessem nascido com um “dom” para poder emanar a “verdade”. De fato, se há um processo de emanação por parte de alguns que se acham donos da verdade, há também um processo de confrontação aos interesses de naturalização de uma única realidade.
Esse fenômeno de emancipação comunicacional está conectado à possibilidade de uma comunicação universal. Numa experiência real não seria a língua ou a linguagem que impediria a comunicação, mas, principalmente, o fato das pessoas não acreditarem ser possível se comunicar sem os métodos legitimamente reconhecidos.
Prova cabal
Notemos de imediato que a liberdade da comunicação não se garante por nenhuma harmonia preestabelecida. Ela se toma, ela se conquista e se perde somente pelo esforço de cada um. Por isso, não existe lei que garanta a democratização da comunicação se, de fato, as pessoas (os comunicadores) não acreditarem nessa possibilidade. No entanto, seria injusto não admitirmos que estamos vivendo, de toda a nossa trajetória republicana, a conjuntura mais rica em termos de oportunidades e possibilidades para se comunicar.
Na nossa percepção esse advento da comunicação livre evoluiu e cresceu com o fato dos blogueiros terem se assumido como uma rede de pessoas preocupadas e interessadas em lutar por garantias que permitam o acesso e o uso das tecnologias da informação e da comunicação. O Rio Grande do Sul, especialmente, tem inaugurado um novo momento no que se refere à comunicação e, principalmente, na construção de políticas públicas em prol da comunicação.
Nesse sentido, depois de vivenciarmos experiências que envolveram setores importantes da comunicação naufragar, algumas sem nem ter a oportunidade de nascer, e outras que faleceram “nas” e “pelas” mãos dos aliados, não temos dúvida de que as reflexões da comunicação estão direcionando os rumos das principais decisões políticas da República. Porém, esses são temas para outros artigos que iremos resgatar posteriormente.
O importante é que a comunicação esta se tornando uma importante pauta nas discussões políticas e, principalmente, no dia a dia das pessoas. Esse é um processo fecundo de desnaturalização de um tema importante que parecia “congelado” e “finalizado”. Congelado no sentido de que todos têm opiniões sobre os mais diversos assuntos, porém aceitávamos que só alguns tinham o direito e o espaço de publicar ou dizer aquilo que queriam.
A liberdade da comunicação não representa o fim dos monopólios, nem das grandes editoras, nem do fundamentalismo reacionário do setor publicitário, de fato, a democratização da comunicação representa o direito de você e eu termos a garantia da nossa vez de poder falar. Quase como aquele ato antigo e saudoso de levantar o dedo e pedir a palavra. Mas, para que esse ato de pedir a palavra tenha sentido é necessário mantermos acesa a chama da comunicação, que é a prova cabal do respeito de uma sociedade para com os seus. De toda a forma, a comunicação parece ainda ser um dos principais tabus da democracia brasileira.
Nos últimos anos, a experiência da comunicação tem deixado de ser profundamente técnica e absoluta. Nesse contexto, as ideias sobre a emergência da comunicação têm apontado os caminhos para uma cultura comunicacional cotidiana. Mas, concretamente, o que isso significa? No plano lógico, é possível imaginar o mundo sem os blogs? Sem as redes sociais? Sem a internet? Ora, na verdade, essas são as frentes que vieram para enfrentar o “mundo” do monopólio midiático da “última” palavra, daquela que seleciona o que pode e o que não pode ser dito e publicado. Este é o desafio e ao mesmo tempo a esperança daqueles que acreditam na possibilidade de existir uma comunicação livre dos monopólios.
Se a realidade do mundo não é mais confundida com o conteúdo da percepção dos monopólios, se a realidade passou a ser uma responsabilidade global perante os desafios contemporâneos, por que manter o direito à comunicação nas mãos de poucos? A razão dessa pergunta se deve ao contexto de crise mundial onde se revelam as fragilidades de uma posição cultural mergulhada no paternalismo conformista baseado na liberdade dos monopólios. Paternalismo conformista é aqui considerado o modelo alienante que de um lado garante o privatismo e de outro promove o protecionismo. Tal estratégia gerou uma ampliação do poder absoluto dos monopólios, em especial no que diz respeito aos quesitos clássicos ligados à estrutura econômica e política.
Investimentos do setor publicitário
Entretanto, a estratégia paternalista dos monopolistas foi além; por exemplo, a comunicação, que deveria ser um bem público, naturalizou-se como refém das grandes corporações e dos blocos hegemônicos que batalham para manter suas regalias à custa de todos. Isto porque as grandes empresas de comunicação estão legitimadas e pactuadas com os interesses particulares de fundir as duas estruturas, pública e privada, numa única fonte de arrecadação. Ou seja, o público passando a ser fonte de subsistência do setor privado.
Tratando apenas uma pequena parte do que está em questão, podemos sugerir o caso brasileiro que é permeado por uma comunicação que se consolidou no modelo privado de legitimação publicitária.
A massa monopolista brasileira dos grandes blocos econômicos ainda vigora nos espaços de excessiva visibilidade. Porém, não é apenas a legitimidade governamental que assegura esse poder. Ao analisarmos a composição dos processos de constituição e consolidação das empresas de comunicação brasileiras (televisão, rádios, jornais e internet) percebemos que a prevalência dessas indústrias da informação se dá pelo fluxo de investimentos do setor publicitário.
O ramo empresarial da comunicação é mantido pelo fluxo das regras oriundas do capitalismo que não concebe o bem social senão sob a forma da absorção das partes (política e econômica) numa centralização única. Dessa forma, numa análise superficial, a lógica corporativa funciona da seguinte forma: quanto maior for à capacidade de compra de espaços em jornais, revistas, internet e alugueis de horários em televisão e rádio, maior é a visibilidade da empresa que não poupa em investir na construção de uma imagem politicamente aceitável e economicamente consumível.
“De poucos para poucos”
Do ponto de vista estratégico, se seguirmos à risca a lógica da liberdade de imprensa (empresa), constataremos que não há nada de errado na supremacia do setor publicitário. Esta não é simplesmente a hegemonia encantadora, já que as pessoas tendem, num primeiro momento, a não concordar. Porém, a estratégia paternalista das empresas de comunicação (que através de entretenimento e demonstrações de cuidado e preocupação com o bem-estar)exerce um poder de influência sobre a formação da identidade das pessoas, tornando-as vulneráveis aos interesses publicitários.
O problema central, aqui, é que a abordagem paternalista das empresas de comunicação, simplesmente, impede que se questionem as relações de poder e os processos de diferenciação que, antes de tudo, produzem a identidade e a diferença. Em geral, o resultado é a produção de novas dicotomias, como a do dominante tolerante e do dominado tolerado ou a da identidade hegemônica, mas benevolente, e da identidade subalterna mas “respeitada”.
Contudo, o que é no mínimo questionável é que as empresas de comunicação se acham independentes de seus anunciantes, numa crença de que a liberdade de imprensa é uma liberdade intocável. Ora, já vimos vários exemplos e já discutimos em outros artigos que a regulamentação da comunicação empresarial por si mesma, ou seja, a autoregulamentação, não dá conta das necessidades de uma sociedade como a brasileira que é forjada em paradoxos de desigualdade social, racial, econômica, gênero etc..
Esse processo dissonante e controverso, de crer que a comunicação empresarial é autoregulável caminha contra todas as formas e garantias de participação da sociedade. Assim, no Brasil, a produção comunicacional ainda se encontra num terreno “de poucos/para poucos”. Essa barreira também é cultivada nas universidades e nos cursos profissionalizantes, no entanto, na contramão desses ensinamentos, a comunicação segue a sua raiz histórica e permanece sintonizada ao dia a dia das pessoas.
Comunicação universal
Muito já se escreveu sobre a história da comunicação, no entanto a história é sempre o recorte de um autor sobre um determinado assunto e, por isso, não nos aprofundaremos nessa questão. Deixaremos a história para os historiadores. Nosso interesse é questionar até que ponto a comunicação é fruto de uma construção individual e/ou coletiva.
Parece, pois, que existem muitas teorias que discutem e afirmam que foram os “entes das cavernas” que “descobriram” e “revelaram” ao mundo a necessidade de se comunicar. Entretanto, o contexto de origem da comunicação ninguém pode afirmar e nem queremos nos prender a isso. O que pretendemos mostrar é que a comunicação nasce e cresce em contraste a relação do ser com o ambiente monopolizante, ou seja, caracterizando-se pela plasticidade das suas motivações.
Explico: sendo a vida cotidiana dominada por motivações individuais, um fenômeno, que ainda necessita de maiores e melhores estudos, tem ocorrido nos últimos anos: a emancipação comunicacional. Trata-se de pessoas que estão deixando de acreditar que a comunicação pode ser ensinada e que apenas alguns, pelo conhecimento, têm o direito, ou seja, são legitimados como se tivessem nascido com um “dom” para poder emanar a “verdade”. De fato, se há um processo de emanação por parte de alguns que se acham donos da verdade, há também um processo de confrontação aos interesses de naturalização de uma única realidade.
Esse fenômeno de emancipação comunicacional está conectado à possibilidade de uma comunicação universal. Numa experiência real não seria a língua ou a linguagem que impediria a comunicação, mas, principalmente, o fato das pessoas não acreditarem ser possível se comunicar sem os métodos legitimamente reconhecidos.
Prova cabal
Notemos de imediato que a liberdade da comunicação não se garante por nenhuma harmonia preestabelecida. Ela se toma, ela se conquista e se perde somente pelo esforço de cada um. Por isso, não existe lei que garanta a democratização da comunicação se, de fato, as pessoas (os comunicadores) não acreditarem nessa possibilidade. No entanto, seria injusto não admitirmos que estamos vivendo, de toda a nossa trajetória republicana, a conjuntura mais rica em termos de oportunidades e possibilidades para se comunicar.
Na nossa percepção esse advento da comunicação livre evoluiu e cresceu com o fato dos blogueiros terem se assumido como uma rede de pessoas preocupadas e interessadas em lutar por garantias que permitam o acesso e o uso das tecnologias da informação e da comunicação. O Rio Grande do Sul, especialmente, tem inaugurado um novo momento no que se refere à comunicação e, principalmente, na construção de políticas públicas em prol da comunicação.
Nesse sentido, depois de vivenciarmos experiências que envolveram setores importantes da comunicação naufragar, algumas sem nem ter a oportunidade de nascer, e outras que faleceram “nas” e “pelas” mãos dos aliados, não temos dúvida de que as reflexões da comunicação estão direcionando os rumos das principais decisões políticas da República. Porém, esses são temas para outros artigos que iremos resgatar posteriormente.
O importante é que a comunicação esta se tornando uma importante pauta nas discussões políticas e, principalmente, no dia a dia das pessoas. Esse é um processo fecundo de desnaturalização de um tema importante que parecia “congelado” e “finalizado”. Congelado no sentido de que todos têm opiniões sobre os mais diversos assuntos, porém aceitávamos que só alguns tinham o direito e o espaço de publicar ou dizer aquilo que queriam.
A liberdade da comunicação não representa o fim dos monopólios, nem das grandes editoras, nem do fundamentalismo reacionário do setor publicitário, de fato, a democratização da comunicação representa o direito de você e eu termos a garantia da nossa vez de poder falar. Quase como aquele ato antigo e saudoso de levantar o dedo e pedir a palavra. Mas, para que esse ato de pedir a palavra tenha sentido é necessário mantermos acesa a chama da comunicação, que é a prova cabal do respeito de uma sociedade para com os seus. De toda a forma, a comunicação parece ainda ser um dos principais tabus da democracia brasileira.
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