Por Paulo Moreira Leite, na coluna Vamos combinar:
Debora Bergamasco publica uma entrevista muito instrutiva com Osmar Serraglio, o deputado que foi relator da CPI dos Correios, a primeira em três que investigaram o mensalão.
Serraglio afirma:
“Faltou muita coisa, muito do que eles ficam batendo agora que ‘não tá provado isso, não tá provado aquilo’ é porque a gente estava amarrado, não tínhamos liberdade. Hoje, por exemplo, o José Dirceu fala que ele não tem nada a ver com isso. Nós poderíamos ter feito provas muito mais contundentes em relação à evidente ascendência que ele tinha”, diz Serraglio.
Ele também diz que na CPI os petistas agiam para dirigir as investigações para o terreno em que lhes interessava. Por exemplo: pressionavam para que se procurasse pela origem do dinheiro que Delúbio Soares e Marcos Valério distribuíam e não pelo seu destino.
O depoimento é instrutivo pelo que diz e também pelo que dá a entender. Ao admitir que “faltou muita coisa” o deputado reconhece que apesar de todo o esforço realizado na época, não se conseguiu avançar na produção de provas contra Dirceu e outros acusados.
O argumento de que a liderança política de Dirceu atrapalhou a investigação faz sentido. Também acredito que os deputados da bancada governista não ajudaram a investigar seu próprio governo. Mas eu acho que isso sempre faz parte do jogo em toda CPI, desde a Idade das Cavernas, não é mesmo?
Seja pelo motivo que for, a alegação de Serraglio coloca um problema para a acusação. Equivale ao reconhecimento de que tem dificuldade para apresentar provas para o julgamento.
Essa avaliação não é nova.
Num texto que publiquei aqui, semanas atrás, dizia que a tese principal do mensalão, como um sistema de compra de votos no Congresso, não estava demonstrado no inquérito da Polícia Federal sobre o caso.
Não fui o primeiro a sustentar isso. O jornalista Lucas Figueiredo, autor de O Operador, sobre Marcos Valério, que fez várias revelações importantes sobre o caso, mostra que o mensalão “não foi provado”—Lucas já dizia isso em 2006.
Jânio de Freitas, um dos grandes mestres do jornalismo, escreveu na segunda-feira que é possível sustentar que Dirceu é o chefe do mensalão com a mesma consistência que se poderia dizer que o chefe era Antonio Palocci, pois não há prova alguma contra nenhum dos dois neste caso.
Esta é a questão. Muito do que se disse não se provou. Por que?
Se você conversar com a bancada do PT, irá concluir que não se provou porque não havia o que deveria ser provado. O mensalão era o nome para os conhecidos esquemas de financiamento de campanhas eleitorais.
Mas há explicações técnicas que ajudam a entender porque as investigações não avançaram mais, evitando a constatação de que faltou muita coisa,” como diz Serraglio.
Uma observação possível é que faltou um acordo para a delação premiada. Roberto Jefferson deu grandes entrevistas e fez ótimos discursos, mas, como disse Fernando Henrique Cardoso, ele “teatralizou o mensalão.”
Um delegado me assegura que tudo teria sido muito diferente se Marcos Valério, em vez de perseguido de modo implacável, tivesse recebido a oferta de salvar a própria pele na hora certa – e passado a agir como aliado das investigações, em vez de proteger-se como acusado.
O que ele poderia contar? Aquilo que a oposição espera? Aquilo que o governo sustenta? Não se sabe. Seja como for, é tarde demais.
O Supremo irá julgar o mensalão com aquilo que está nos autos. Será um julgamento técnico e político.
Técnico, porque não se trata de uma corte de aloprados. E político, porque o STF tem a função de defender a Constituição – e essa missão é política.
Quando se fala no aspecto político, pode-se pensar em várias hipóteses. Uma delas, a que parece mais óbvia, seria atender a um clamor contra a corrupção e contra a impunidade.
Mas também é uma atitude política considerar que, apesar deste clamor, convém afirmar outro valor, de que é preciso julgar com isenção, a partir de provas claras e bem fundamentadas. Este é o debate real no julgamento.
Leia meu artigo anterior sobre o mensalão:
http://colunas.revistaepoca.globo.com/paulomoreiraleite/2012/05/30/verdades-incomodas-sobre-o-mensalao/
Leia a entrevista de Serraglio no Estadão
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,blindagem-a-dirceu-impediu-producao-de-provas-do-mensalao-na-cpi-dos-correios-,905584,0.htm
Serraglio afirma:
“Faltou muita coisa, muito do que eles ficam batendo agora que ‘não tá provado isso, não tá provado aquilo’ é porque a gente estava amarrado, não tínhamos liberdade. Hoje, por exemplo, o José Dirceu fala que ele não tem nada a ver com isso. Nós poderíamos ter feito provas muito mais contundentes em relação à evidente ascendência que ele tinha”, diz Serraglio.
Ele também diz que na CPI os petistas agiam para dirigir as investigações para o terreno em que lhes interessava. Por exemplo: pressionavam para que se procurasse pela origem do dinheiro que Delúbio Soares e Marcos Valério distribuíam e não pelo seu destino.
O depoimento é instrutivo pelo que diz e também pelo que dá a entender. Ao admitir que “faltou muita coisa” o deputado reconhece que apesar de todo o esforço realizado na época, não se conseguiu avançar na produção de provas contra Dirceu e outros acusados.
O argumento de que a liderança política de Dirceu atrapalhou a investigação faz sentido. Também acredito que os deputados da bancada governista não ajudaram a investigar seu próprio governo. Mas eu acho que isso sempre faz parte do jogo em toda CPI, desde a Idade das Cavernas, não é mesmo?
Seja pelo motivo que for, a alegação de Serraglio coloca um problema para a acusação. Equivale ao reconhecimento de que tem dificuldade para apresentar provas para o julgamento.
Essa avaliação não é nova.
Num texto que publiquei aqui, semanas atrás, dizia que a tese principal do mensalão, como um sistema de compra de votos no Congresso, não estava demonstrado no inquérito da Polícia Federal sobre o caso.
Não fui o primeiro a sustentar isso. O jornalista Lucas Figueiredo, autor de O Operador, sobre Marcos Valério, que fez várias revelações importantes sobre o caso, mostra que o mensalão “não foi provado”—Lucas já dizia isso em 2006.
Jânio de Freitas, um dos grandes mestres do jornalismo, escreveu na segunda-feira que é possível sustentar que Dirceu é o chefe do mensalão com a mesma consistência que se poderia dizer que o chefe era Antonio Palocci, pois não há prova alguma contra nenhum dos dois neste caso.
Esta é a questão. Muito do que se disse não se provou. Por que?
Se você conversar com a bancada do PT, irá concluir que não se provou porque não havia o que deveria ser provado. O mensalão era o nome para os conhecidos esquemas de financiamento de campanhas eleitorais.
Mas há explicações técnicas que ajudam a entender porque as investigações não avançaram mais, evitando a constatação de que faltou muita coisa,” como diz Serraglio.
Uma observação possível é que faltou um acordo para a delação premiada. Roberto Jefferson deu grandes entrevistas e fez ótimos discursos, mas, como disse Fernando Henrique Cardoso, ele “teatralizou o mensalão.”
Um delegado me assegura que tudo teria sido muito diferente se Marcos Valério, em vez de perseguido de modo implacável, tivesse recebido a oferta de salvar a própria pele na hora certa – e passado a agir como aliado das investigações, em vez de proteger-se como acusado.
O que ele poderia contar? Aquilo que a oposição espera? Aquilo que o governo sustenta? Não se sabe. Seja como for, é tarde demais.
O Supremo irá julgar o mensalão com aquilo que está nos autos. Será um julgamento técnico e político.
Técnico, porque não se trata de uma corte de aloprados. E político, porque o STF tem a função de defender a Constituição – e essa missão é política.
Quando se fala no aspecto político, pode-se pensar em várias hipóteses. Uma delas, a que parece mais óbvia, seria atender a um clamor contra a corrupção e contra a impunidade.
Mas também é uma atitude política considerar que, apesar deste clamor, convém afirmar outro valor, de que é preciso julgar com isenção, a partir de provas claras e bem fundamentadas. Este é o debate real no julgamento.
Leia meu artigo anterior sobre o mensalão:
http://colunas.revistaepoca.globo.com/paulomoreiraleite/2012/05/30/verdades-incomodas-sobre-o-mensalao/
Leia a entrevista de Serraglio no Estadão
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,blindagem-a-dirceu-impediu-producao-de-provas-do-mensalao-na-cpi-dos-correios-,905584,0.htm
3 comentários:
"Nós poderíamos ter feito provas muito mais contundentes " e "não se conseguiu avançar na produção de provas contra Dirceu e outros acusados"?
O que ele quer dizer com isso? Que queria produzir provas? Mas provas existem ou não existem, não se produz provas, se encontra provas e se não existem, se "produz"? Tá explicado. Queriam xeretar a vida do indiciado para juntar umas coisinhas aqui e outras ali, misturar tudo e pronto, provas, "produzidas".
O PIG está tentando, desde já, desacretidar o resultado do julgamento do "mensalão", caso o resultado não o satisfaça. A bem da verdade, o PIG só ficaria satisfeito se o resultado do julgamento fosse uma sentença de morte às principais lideranças do PT e do conjunto do partido dos trabalhadores. Esse é o significado de ter ressuscitado o canastão Serraglio.
Poucos acusados tem condições legais de serem julgados pelo Supremo, indicio de ser um julgamento político, outros casos semelhantes ficarem na geladeira e esse não, indicio de ser um julgamento político. E assim por diante...tem muita cooisa para ser considerado um julgamento político
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