Por Luiz Gonzaga Belluzzo, na revista CartaCapital:
Resilient Dynamism é o tema proposto aos participantes pelos organizadores do Fórum Econômico Mundial que ora se realiza em Davos. Nos últimos cinco anos, o conclave dos ricos, famosos e bem-sucedidos do mundo, anda murcho, lamurioso, pessimista e, como revela o tema escolhido, enigmático. Resilient Dynamism: soa bem, mas pode significar qualquer coisa. O jornal inglês The Guardian do dia 23 de janeiro espetou sua maldade no painel dos inconformados. Sugeriu que seria mais apropriado We got it wrong. A tradução livre: Não entendemos nada.
Resilient Dynamism é o tema proposto aos participantes pelos organizadores do Fórum Econômico Mundial que ora se realiza em Davos. Nos últimos cinco anos, o conclave dos ricos, famosos e bem-sucedidos do mundo, anda murcho, lamurioso, pessimista e, como revela o tema escolhido, enigmático. Resilient Dynamism: soa bem, mas pode significar qualquer coisa. O jornal inglês The Guardian do dia 23 de janeiro espetou sua maldade no painel dos inconformados. Sugeriu que seria mais apropriado We got it wrong. A tradução livre: Não entendemos nada.
O jornal New York Times publicou, na sexta 18 de janeiro deste ano corrente, a cronologia das reuniões do Federal Open Market Comittee (Fomc) de 2007. As transcrições mostram que os membros do Comitê de Política Monetária tampouco atinaram, já em agosto de 2007, com o tamanho da coisa. Dois gigantes do crédito imobiliário balançavam à beira do precipício.
Talvez, escovado por seus estudos sobre a Grande Depressão, Bernanke revelou incômodo com os sinais do mercado, mas seus pares demoraram a ouvir os passos da caminhada da economia para a recessão. Não foram poucos os membros do Fomc que temiam um repique da inflação e recomendaram uma elevação dos juros. Outros, como William Poole, apostaram no caráter passageiro das turbações financeiras: “Aposto que nada vai mudar fundamentalmente na economia real”. Rezava o comunicado da reunião do comitê publicado em 7 de agosto: “Ainda que os riscos de uma desaceleração do crescimento tenham aumentado em alguma medida, a preocupação maior do comitê é com o risco de a inflação não moderar o seu ritmo como esperado”.
Com essa sensibilidade, é claro que tampouco os sábios anteciparam a violência deflacionária da reversão de um ciclo expansivo apoiado no crédito fácil e no enriquecimento fictício das famílias.
Lambendo as feridas causadas por sua incúria e imprevisão, diante do massacre imposto a seus esgares presunçosos, os potentados do mundo dos negócios cuidam de lamentar a hostilidade das maiorias descontentes com os rumos da economia global. O CEO do JP Morgan, Jamie Dimon, queixou-se, em Davos, das acusações e dos ataques lançados contra os bancos pelos reguladores e pelo público em geral. Em sua opinião os bancos foram um “porto seguro” para governos, empresas e famílias “durante a tempestade”.
Ainda mais seguros foram os diques construídos pelos bancos centrais mediante a compra de papéis ilíquidos que contaminavam as carteiras das instituições. Os sábios da finança que sustentavam suas posições superalavancadas com a grana dos mercados atacadistas de dinheiro. Aí dormitavam as aplicações de curto prazo de empresas e famílias. Quando esses mercados desapareceram tangidos pelo pânico, os colegas do senhor Dimon foram socorridos, em meio à tempestade, pelos salva-vidas lançados pelos governos.
Para acrescentar vergonha à infâmia, o supracitado New York Times revelou, em sua edição de 23 de janeiro, outra proeza dos Senhores do Universo. Em 16 março de 2007, funcionários do Morgan Stanley discutiam o nome de mais um pacote de ativos tóxicos que preparavam para lançar no mercado. As sugestões eram realmente sugestivas: “Derretimento subprime”, “Holocausto nuclear”, “Porrada do Mike Tyson” ou “Um saco de excremento”.
Entre outras trapalhadas, as camadas dirigentes – os especialistas da academia e as autoridades de plantão aceitaram a viseira de modelos mais tolos do que inúteis que rezavam o refrão da impossibilidade de acontecer o que estava acontecendo, concluindo que nada havia a fazer. Despejadas das moradias recém-adquiridas e impagáveis, as famílias devedoras descarregam a ira nos banqueiros excessivamente espertos e reguladores demasiado negligentes.
Essa busca e (improvável) captura de culpados revela a precariedade histórica e analítica que se apoderou do debate contemporâneo sobre as origens da crise. O espírito do tempo, atoleimado com o advento das informações instantâneas, da mídia de massa e de suas ramificações ciberespaciais, sempre inchadas de sábios de duas frases e cinco palavras, se encarregou do resto do serviço: simplificar os problemas e massacrar a inteligência alheia com caganifâncias e vulgaridades.
George Monbiot, o celebrado articulista do Guardian não deixa barato: “A crise demonstra que o pensamento neoliberal é uma fraude de alto a baixo. As demandas dos ultrarricos foram vestidas com os adornos de uma teoria econômica sofisticada. Mas o completo fracasso dessa experiência à escala mundial não impede a sua repetição. Isso nada tem a ver com economia. É uma questão de poder”.
Talvez, escovado por seus estudos sobre a Grande Depressão, Bernanke revelou incômodo com os sinais do mercado, mas seus pares demoraram a ouvir os passos da caminhada da economia para a recessão. Não foram poucos os membros do Fomc que temiam um repique da inflação e recomendaram uma elevação dos juros. Outros, como William Poole, apostaram no caráter passageiro das turbações financeiras: “Aposto que nada vai mudar fundamentalmente na economia real”. Rezava o comunicado da reunião do comitê publicado em 7 de agosto: “Ainda que os riscos de uma desaceleração do crescimento tenham aumentado em alguma medida, a preocupação maior do comitê é com o risco de a inflação não moderar o seu ritmo como esperado”.
Com essa sensibilidade, é claro que tampouco os sábios anteciparam a violência deflacionária da reversão de um ciclo expansivo apoiado no crédito fácil e no enriquecimento fictício das famílias.
Lambendo as feridas causadas por sua incúria e imprevisão, diante do massacre imposto a seus esgares presunçosos, os potentados do mundo dos negócios cuidam de lamentar a hostilidade das maiorias descontentes com os rumos da economia global. O CEO do JP Morgan, Jamie Dimon, queixou-se, em Davos, das acusações e dos ataques lançados contra os bancos pelos reguladores e pelo público em geral. Em sua opinião os bancos foram um “porto seguro” para governos, empresas e famílias “durante a tempestade”.
Ainda mais seguros foram os diques construídos pelos bancos centrais mediante a compra de papéis ilíquidos que contaminavam as carteiras das instituições. Os sábios da finança que sustentavam suas posições superalavancadas com a grana dos mercados atacadistas de dinheiro. Aí dormitavam as aplicações de curto prazo de empresas e famílias. Quando esses mercados desapareceram tangidos pelo pânico, os colegas do senhor Dimon foram socorridos, em meio à tempestade, pelos salva-vidas lançados pelos governos.
Para acrescentar vergonha à infâmia, o supracitado New York Times revelou, em sua edição de 23 de janeiro, outra proeza dos Senhores do Universo. Em 16 março de 2007, funcionários do Morgan Stanley discutiam o nome de mais um pacote de ativos tóxicos que preparavam para lançar no mercado. As sugestões eram realmente sugestivas: “Derretimento subprime”, “Holocausto nuclear”, “Porrada do Mike Tyson” ou “Um saco de excremento”.
Entre outras trapalhadas, as camadas dirigentes – os especialistas da academia e as autoridades de plantão aceitaram a viseira de modelos mais tolos do que inúteis que rezavam o refrão da impossibilidade de acontecer o que estava acontecendo, concluindo que nada havia a fazer. Despejadas das moradias recém-adquiridas e impagáveis, as famílias devedoras descarregam a ira nos banqueiros excessivamente espertos e reguladores demasiado negligentes.
Essa busca e (improvável) captura de culpados revela a precariedade histórica e analítica que se apoderou do debate contemporâneo sobre as origens da crise. O espírito do tempo, atoleimado com o advento das informações instantâneas, da mídia de massa e de suas ramificações ciberespaciais, sempre inchadas de sábios de duas frases e cinco palavras, se encarregou do resto do serviço: simplificar os problemas e massacrar a inteligência alheia com caganifâncias e vulgaridades.
George Monbiot, o celebrado articulista do Guardian não deixa barato: “A crise demonstra que o pensamento neoliberal é uma fraude de alto a baixo. As demandas dos ultrarricos foram vestidas com os adornos de uma teoria econômica sofisticada. Mas o completo fracasso dessa experiência à escala mundial não impede a sua repetição. Isso nada tem a ver com economia. É uma questão de poder”.
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