Foto: AFP/Leo La Valle |
Estes têm sido dias especiais. Talvez pela primeira vez em onze anos, senti que não estava no “meu lugar”. Terça foi um dia de “catarse coletiva” na Argentina (como um amigo chamou) e eu estava no Brasil. Não consigo parar de postar coisas no facebook sobre Guido Carlotto, o neto da presidenta das Abuelas [Avós] de Plaza de Mayo, sequestrado pelos militares durante a ditadura e agora encontrado. Foi um dia de enorme alegria e reflexão.
Alegria das mais simples: porque uma avó encontrou seu neto e eu, sendo mãe, consegui sentir isso na pele. Alegria, porque, como Estela de Carlotto falou, vai conseguir dar um abraço no seu neto antes de morrer – porque as Abuelas estão velhinhas. Alegria pelo resultado da persistência, no tempo das coisas efêmeras.
Estes dias também me fizeram pensar muito também nos debates atuais no movimento por direitos humanos. Senti que fiz uma volta de 360 graus, dei a volta inteira para voltar no meu lugar original, mas aprendi muito no caminho.
Andava pensando em inovação, em como as organizações de direitos humanos precisam se renovar e aí percebi que grandes lições vieram de uma organização de senhoras de mais de oitenta anos. Elas desenvolveram as estratégias mais inovadoras no uso de métodos científicos, no litígio, nas políticas públicas e na comunicação.
Foram as Abuelas as que pediram para que cientistas desenvolvessem o teste deabuelidad ou “avoíce”, que permitem agora saber quem é neto de quem.
Foram as Abuelas as que conseguiram que o Estado criasse o Banco de DNA, onde todas elas deixaram seus registros genéticos, para que, por muitos anos, as pessoas com dúvidas sobre sua identidade possam descobrir se são ou não filhos de um desaparecido.
Foram as Abuelas as que com, o litigio abriram as primeiras brechas na impunidade e conseguiram levar os militares à Justiça.
Foram as Abuelas as que se aproximaram dos artistas e criaram uma companhia de teatro (Teatro pela Identidade) e um seriado de TV sobre as histórias dos netos apropriados na TV aberta.
Foram as Abuelas que, uns dias atrás, fizeram um spot na TV com a seleção nacional de futebol, incluindo o Messi, chamando os jovens com dúvidas sobre sua identidade a ir ao Banco de Dados Genéticos.
Foram as Abuelas e as Madres as que sempre lutaram pelas vias institucionais, e apagaram de nosso léxico e imaginário a ideia de vingança pelas próprias mãos. E esperaram, com muita paciência, a Justiça chegar e aos poucos esta foi chegando. Não devolveu os filhos. Mas terça-feira devolveu um neto, e já são 114 os netos encontrados. Parabéns, Abuelas!
* Juana Kweitel, advogada argentina, é diretora de Programas de Conectas Direitos Humanos
1 comentários:
Parabéns a todas as abuelas,desde a
primeira até hoje.Um abraço imenso
para esses dois.Como mãe e avó fico
só pensando a emoção deles.Que Deus
os abençoe e ilumine sempre.
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