Por Marcus Ianoni, na revista Teoria e Debate:
Eu tenho escrito em coluna no Jornal do Brasil que há dois grandes campos políticos em disputa no Brasil, o social-desenvolvimentista e o neoliberal. Na esfera político-institucional, isso se expressa na oposição entre PT e PSDB, os dois principais partidos de cada um desses respectivos campos. Na verdade, trata-se de dois modelos de capitalismo. Além das tendências estruturais da economia internacional, a área de política fundamental para a conformação desses dois modelos é a política macroeconômica, pois, por meio dela, o governo tenta influenciar o comportamento de agregados econômicos, como crescimento, emprego, renda, inflação e balanço de pagamentos. Três áreas são muito importantes na macroeconomia, na perspectiva da ação governamental: as políticas monetária, cambial e fiscal.
O coordenador do programa econômico de Aécio Neves é Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso, investidor e executivo do setor financeiro. O núcleo de assessores de Marina é composto por André Lara Resende e Eduardo Gianetti da Fonseca (economistas liberais) e Neca Setubal (bilionária do Grupo Itaú). A aproximação da assessoria dessas duas candidaturas em relação à coalizão de rentistas e financistas parece ser evidente. As propostas de ambos caminham no sentido de confirmar essa hipótese.
Os dois enfatizam uma política monetária mais austera, visando, em um primeiro momento, alcançar o centro da meta de inflação, hoje em 4,5%, e, em seguida, diminuir ainda mais. O instrumento de combate inflacionário que o sistema de metas de inflação dispõe para a ação política do Banco Central é a taxa de juros. A proposta desses dois candidatos, portanto, implica uma elevação acentuada da taxa de juros, que favorece rentistas e financistas.
Ambos também propõem uma medida defendida pela coalizão entre rentistas e financistas: a formalização da independência ou da autonomia do Banco Central, a depender de como cada um denomina esse objetivo. Mas não parece haver descontrole inflacionário no país. Veja-se o que diz matéria recente da Folha de S.Paulo: “A média da inflação anual no período de Armínio Fraga foi de 8,78%. No período Lula, foi de 5,79% nos dois mandatos. Sob Dilma, a inflação média deve ficar acima de 6%”.
Por outro lado, como o aperto monetário impacta nas despesas com a dívida pública, ou seja, no pagamento aos credores do Estado (rentistas e financistas), a proposta de ambos enfatiza uma maior arrecadação de superávit primário, a reserva orçamentária para pagar os juros. Em relação à política de valorização permanente do salário mínimo, que implica benefícios sociais e custos para os cofres públicos, Eduardo Gianetti da Fonseca disse o seguinte: “Corrigir o salário mínimo pelo crescimento de dois anos atrás e o IPCA do ano anterior não tem o menor sentido. Também é complicado reajustar o benefício previdenciário pelo salário mínimo. Atrelar perpetuamente ao salário mínimo não faz sentido” (Folha de S.Paulo, 21/10/2013). Ocorre que a dívida líquida do setor público vem baixando ano a ano. Em dezembro de 2002, era de 60,4% do PIB e caiu para 33,6% do PIB em dezembro de 2013. Durante esse período, a taxa Selic, que é a taxa básica de juros da economia, tem-se mantido em patamares compatíveis com a redução dos custos da dívida pública.
Em relação ao câmbio, um preço fundamental da economia, a convergência liberal das duas propostas aposta na mera flutuação cambial, não mencionando um problema muito sério: a valorização da moeda brasileira resultante da entrada maciça de dólares. O programa de Marina Silva, por exemplo, diz que vai “manter a taxa de câmbio livre, sem intervenção do Banco Central”. Embora uma desvalorização muito acentuada da moeda não seja recomendável, pelo impacto no aumento da inflação, a mera flutuação cambial, sem alguns instrumentos administrativos de controle (operações de compra e venda de dólares no mercado aberto, IOF etc.), pode apreciar muito a moeda e agravar tendências à vulnerabilidade externa, a crises cambiais e a ataques especulativos. Temos convivido desde 1994 com uma tendência de apreciação da taxa de câmbio e de vulnerabilidade externa, e as políticas neoliberais têm muita responsabilidade nisso. Retirar mecanismos de controle administrativo da autoridade monetária reforçará a tendência à sobreapreciação.
Enfim, há uma convergência liberal nos principais candidatos de oposição ao governo federal. Ela é evidente nas propostas de política macroeconômica, a principal área de política que distingue os dois grandes modelos de capitalismo em disputa, o social-desenvolvimentista e o neoliberal.
* Marcus Ianoni é professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense.
Por outro lado, como o aperto monetário impacta nas despesas com a dívida pública, ou seja, no pagamento aos credores do Estado (rentistas e financistas), a proposta de ambos enfatiza uma maior arrecadação de superávit primário, a reserva orçamentária para pagar os juros. Em relação à política de valorização permanente do salário mínimo, que implica benefícios sociais e custos para os cofres públicos, Eduardo Gianetti da Fonseca disse o seguinte: “Corrigir o salário mínimo pelo crescimento de dois anos atrás e o IPCA do ano anterior não tem o menor sentido. Também é complicado reajustar o benefício previdenciário pelo salário mínimo. Atrelar perpetuamente ao salário mínimo não faz sentido” (Folha de S.Paulo, 21/10/2013). Ocorre que a dívida líquida do setor público vem baixando ano a ano. Em dezembro de 2002, era de 60,4% do PIB e caiu para 33,6% do PIB em dezembro de 2013. Durante esse período, a taxa Selic, que é a taxa básica de juros da economia, tem-se mantido em patamares compatíveis com a redução dos custos da dívida pública.
Em relação ao câmbio, um preço fundamental da economia, a convergência liberal das duas propostas aposta na mera flutuação cambial, não mencionando um problema muito sério: a valorização da moeda brasileira resultante da entrada maciça de dólares. O programa de Marina Silva, por exemplo, diz que vai “manter a taxa de câmbio livre, sem intervenção do Banco Central”. Embora uma desvalorização muito acentuada da moeda não seja recomendável, pelo impacto no aumento da inflação, a mera flutuação cambial, sem alguns instrumentos administrativos de controle (operações de compra e venda de dólares no mercado aberto, IOF etc.), pode apreciar muito a moeda e agravar tendências à vulnerabilidade externa, a crises cambiais e a ataques especulativos. Temos convivido desde 1994 com uma tendência de apreciação da taxa de câmbio e de vulnerabilidade externa, e as políticas neoliberais têm muita responsabilidade nisso. Retirar mecanismos de controle administrativo da autoridade monetária reforçará a tendência à sobreapreciação.
Enfim, há uma convergência liberal nos principais candidatos de oposição ao governo federal. Ela é evidente nas propostas de política macroeconômica, a principal área de política que distingue os dois grandes modelos de capitalismo em disputa, o social-desenvolvimentista e o neoliberal.
* Marcus Ianoni é professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense.
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