Por Paulo Donizetti de Souza, na Rede Brasil Atual:
A Maria Alice Setúbal, a Neca, diz que não é do sistema financeiro, que o negócio dela é educação...
Se alguém quiser acreditar nisso, acredite. Mas veja o programa de governo da Marina, como reflete tudo o que os bancos defendem: terceirização, superávit primário (sobra de caixa destinada a pagamento de juros), abrir mão da gestão do câmbio, BC independente... o programa abre mão até do controle sobre a condução da política fiscal. A gente já vem discutindo isso com os bancos há muito tempo, e eles defendem com todas as letras o PL 4330 (projeto de lei do deputado Sandro Mabel, PMDB-GO, que liberara a terceirização em todas as atividades). E está lá no programa da Marina. E uma das coordenadoras é a Neca Setúbal, mas não é só ela. É o Roberto Setúbal. É o Itaú. São os bancos que estão incluindo essa pauta. BC independente, a quem interessa? Independente de quem? Dos interesses da sociedade? É isso que significa um BC independente: o governo abrir mão de fazer a política, e deixar a tarefa de regulação dos juros, dos preços, do ritmo de crescimento e da proteção da moeda para o sistema financeiro privado fazer.
O programa prevê também acabar com a política de crédito direcionado, aquele que estabelece regras para o financiamento imobiliário; que determina que uma parte dos depósitos dos correntistas e poupadores que estão nos bancos seja destinada ao trabalhador que vai comprar sua casa própria; ou a operações de microcrédito, de empreendedorismo, de crédito rural etc. É o que possibilita taxas de juros menores e prazos maiores para atividades produtivas. Eliminar o crédito direcionado significa reduzir as oportunidades e deixá-las à mercê dos juros ditados pelo mercado bancário.
Hoje, no Banco do Brasil predomina o crédito rural e na Caixa Federal predomina o habitacional. E os bancos públicos acabam puxando os privados. Porque ou eles usam essa fatia reservada da poupança e do compulsório para esses fins, ou não podem usar para outros fins. Então, o ideal é que o direcionamento do crédito seja ainda maior para estimular outras atividades produtivas, quer criem empregos e renda. Se acabar, ficar tudo por conta do crédito livre, vai diminuir a oferta, e as taxas de juros vão ser muito maiores.
Aliás, também faz parte do programa de governo da Marina diminuir o papel dos bancos públicos. Se você pega o período depois da crise de 2008, foram os bancos públicos que seguraram a oferta de crédito, e acabaram puxando os banco privados. Isso foi fundamental para proteger o mercado interno e os empregos, enfim, para que o trabalhador brasileiro não tivesse de pagar a conta da crise financeira internacional, como estão pagando os europeus.
E por que a Marina entrou tão forte na disputa, mesmo sem nunca ter apresentado claramente seus projetos de governo?
Isso tem a ver com a insatisfação das pessoas com a política, e com a criminalização da política feita por parte da imprensa nos últimos anos. É criminalização com desinformação. A verdadeira mudança não é uma única pessoa que vai fazer. O que precisa mudar é o conjunto de regras que compõem o sistema político. Não adianta você chegar e dizer “eu sou o novo”, “eu vou mudar a política”. O “novo” que prevê terceirização? Redução do papel dos bancos públicos? Diminuição do crédito? Da importância do pré-sal, de onde vai sair receita para mudar o financiamento da educação e da saúde? Isso não é novo. A gente já viveu há muito tempo e foi muito ruim para o Brasil. Interromper a política de distribuição de renda é o velho. O povo brasileiro quer mudança, e essa mudança passa por mudar um monte de coisas. Financiamento de campanhas, por exemplo, tem de mudar, senão a maioria do Congresso vai continuar sempre subordinada aos interesses de quem financia as campanhas. É isso que tem sido ruim para o Brasil.
Como o sindicato vê essa campanha do plebiscito pela Constituinte exclusiva para fazer reforma política?
É o caminho. Estamos passando em todos os locais de trabalho colhendo votos e levando esse debate. É uma proposta muito viável, e a população tem de compreender que para mudar as coisas na política é preciso mudar um conjunto de regras, e também mudar a postura das pessoas, acompanhar mais os movimentos, candidaturas, governos, entender os programas de governo para escolher com qual se identifica, e eleger que vai tocar esses programas. Não adianta votar numa pessoa e depois não acompanhar se ele vai cumprir o que está naquele programa. Enfim, uma pessoa que diz que vai mudar as coisas não vai mudar nada, não vai trazer o novo, se o seu programa está repleto do velho. Volta no tempo e acolhe o descompromisso dos bancos com o país.
Para a presidenta do Sindicato dos Bancários de São Paulo, Juvandia Moreira, o programa de governo da candidata do PSB à presidência da República, Marina Silva, privilegia interesses do sistema financeiro. O texto tem entre seus coordenadores economistas ligados à era FHC e Neca Setúbal, do Itaú: “Não adianta você chegar e dizer ‘eu sou o novo’, ‘eu vou mudar a política’. O novo que prevê terceirização? Redução do papel dos bancos públicos? Diminuição do crédito? Da importância do pré-sal? De onde vai sair receita para mudar o financiamento da educação e da saúde? Isso não é novo. A gente já viveu há muito tempo e foi muito ruim para o Brasil”, diz a sindicalista.
Nos últimos anos houve uma mudança na condução da economia do país. Com mais gente incluída no trabalho formal, com renda em alta, aumenta também o número de pessoas com conta corrente efazendo poupança. Os bancos não deveriam estar satisfeitos com a economia do país?
Deveriam, porque eles ganharam muito dinheiro, como sempre, mas tiveram de trabalhar mais, por exemplo, para ampliar a oferta de crédito. Para emprestar mais cobrando menos juros, os bancos, de um jeito ou de outro, tiveram de ampliar o quadro de funcionários. Se você compara com dez anos atrás, aumentou o número de bancários. Agora, o setor voltou a apresentar redução do nível de postos de trabalho. Eles preferem ganhar o dinheiro mais fácil, com títulos da dívida pública pagando juros maiores, sem ter de aumentar o quadro. No momento em que a Dilma fez a redução da taxa Selic, isso desagradou completamente o mercado. Eles ganham dinheiro com crescimento ou com recessão, mas no crescimento eles têm que trabalhar mais, têm que ampliar o quadro, têm que expandir a capacidade de atendimento, com margem menor nos juros, precisam emprestar mais para manter a rentabilidade alta. E vêm mantendo.
Quando o governo Dilma assumiu em janeiro de 2011, a Selic estava em 11,25% ao ano. Entre 2012 e 2013, chegou ao piso histórico de 7,25%. Mas voltou a subir. Está em 11% há quatro reuniões do Copom e estima-se que acabe o ano assim. Se mesmo com juros mais baixos a receita com operações de crédito cresceu, por que parou aquela queda-de-braço que o governo teve com os bancos?
Os bancos fizeram inclusive campanha internacional contra o Brasil, fizeram uma queda-de-braço porque reduzir muito a Selic para eles é ruim, aumentar o crédito para eles é ruim. Eles continuariam a ganhar, mas teriam de ampliar a escala. Reduzir a margem de lucro para que todos ganhem – a população também – não é com eles. Parecem não se importar se o setor produtivo perde, se a população perde. É a cultura dos bancos sobre a sociedade.
Nos últimos anos houve uma mudança na condução da economia do país. Com mais gente incluída no trabalho formal, com renda em alta, aumenta também o número de pessoas com conta corrente efazendo poupança. Os bancos não deveriam estar satisfeitos com a economia do país?
Deveriam, porque eles ganharam muito dinheiro, como sempre, mas tiveram de trabalhar mais, por exemplo, para ampliar a oferta de crédito. Para emprestar mais cobrando menos juros, os bancos, de um jeito ou de outro, tiveram de ampliar o quadro de funcionários. Se você compara com dez anos atrás, aumentou o número de bancários. Agora, o setor voltou a apresentar redução do nível de postos de trabalho. Eles preferem ganhar o dinheiro mais fácil, com títulos da dívida pública pagando juros maiores, sem ter de aumentar o quadro. No momento em que a Dilma fez a redução da taxa Selic, isso desagradou completamente o mercado. Eles ganham dinheiro com crescimento ou com recessão, mas no crescimento eles têm que trabalhar mais, têm que ampliar o quadro, têm que expandir a capacidade de atendimento, com margem menor nos juros, precisam emprestar mais para manter a rentabilidade alta. E vêm mantendo.
Quando o governo Dilma assumiu em janeiro de 2011, a Selic estava em 11,25% ao ano. Entre 2012 e 2013, chegou ao piso histórico de 7,25%. Mas voltou a subir. Está em 11% há quatro reuniões do Copom e estima-se que acabe o ano assim. Se mesmo com juros mais baixos a receita com operações de crédito cresceu, por que parou aquela queda-de-braço que o governo teve com os bancos?
Os bancos fizeram inclusive campanha internacional contra o Brasil, fizeram uma queda-de-braço porque reduzir muito a Selic para eles é ruim, aumentar o crédito para eles é ruim. Eles continuariam a ganhar, mas teriam de ampliar a escala. Reduzir a margem de lucro para que todos ganhem – a população também – não é com eles. Parecem não se importar se o setor produtivo perde, se a população perde. É a cultura dos bancos sobre a sociedade.
Os bancos têm se posicionado no ambiente eleitoral. Teve o episódio do Santander, que associou valorização na Bolsa de Valores à queda de Dilma nas pesquisas. Sócios do Itaú estão na campanha da Marina Silva. O que explica isso se o país vive um ambiente tão saudável para o sistema financeiro?
Tem o mercado que especula com ações, aquele que monitora a queda de preços de ações para vender na baixa e depois compra na alta. E tem o mercado que especula com juros altos. Investir no setor produtivo, para que mais atividades saiam ganhando com o fortalecimento da economia, não é a praia deles. A presidenta Dilma representa a continuidade da política de crescer apostando no mercado interno, com distribuição de renda, tanto com programas sociais que estimulam economias locais com o estímulo ao mercado de trabalho aquecido, com baixo desemprego. Isso incomoda quem prefere o caminho da especulação. Eu vejo com tristeza e preocupação o programa de governo da Marina porque prevê um sistema financeiro mais descomprometido com o crescimento do país. Prevê a legalização das terceirizações que tão mal fazem ao mundo do trabalho. Isso é a pauta do Itaú. Há mais de um ano o economista-chefe do Itaú vive dando entrevista pondo isso em pauta.
O mercado financeiro sempre argumentou que a valorização do salário mínimo e o mercado de trabalho aquecido causam inflação. Uma bobagem, porque a inflação jamais ultrapassou o teto da meta nos últimos dez anos. Para a população, essa política é muito importante, garantia de renda. Com mercado de trabalho estável e aquecido, mais de 90% dos acordos salariais vêm conseguindo aumentos acima da inflação – porque esse ambiente favorece o trabalhador nas negociações. O Itaú defende a interrupção dessa política, o mercado financeiro defende uma política de aperto. Que o governo gaste menos e economize mais para pagar juros. E que a inflação seja combatida com falta de dinheiro no bolso das pessoas, ou seja, com arrocho e desemprego, como era nos anos FHC. Isso já aparecia no programa do Aécio Neves e está no da Marina. A independência do Banco Central está lá, o que significa dizer “eu sou eleita e abro mão de controlar a inflação, de controlar a moeda, o câmbio, para entregar para os banqueiros controlarem”. É temerário.
Tem o mercado que especula com ações, aquele que monitora a queda de preços de ações para vender na baixa e depois compra na alta. E tem o mercado que especula com juros altos. Investir no setor produtivo, para que mais atividades saiam ganhando com o fortalecimento da economia, não é a praia deles. A presidenta Dilma representa a continuidade da política de crescer apostando no mercado interno, com distribuição de renda, tanto com programas sociais que estimulam economias locais com o estímulo ao mercado de trabalho aquecido, com baixo desemprego. Isso incomoda quem prefere o caminho da especulação. Eu vejo com tristeza e preocupação o programa de governo da Marina porque prevê um sistema financeiro mais descomprometido com o crescimento do país. Prevê a legalização das terceirizações que tão mal fazem ao mundo do trabalho. Isso é a pauta do Itaú. Há mais de um ano o economista-chefe do Itaú vive dando entrevista pondo isso em pauta.
O mercado financeiro sempre argumentou que a valorização do salário mínimo e o mercado de trabalho aquecido causam inflação. Uma bobagem, porque a inflação jamais ultrapassou o teto da meta nos últimos dez anos. Para a população, essa política é muito importante, garantia de renda. Com mercado de trabalho estável e aquecido, mais de 90% dos acordos salariais vêm conseguindo aumentos acima da inflação – porque esse ambiente favorece o trabalhador nas negociações. O Itaú defende a interrupção dessa política, o mercado financeiro defende uma política de aperto. Que o governo gaste menos e economize mais para pagar juros. E que a inflação seja combatida com falta de dinheiro no bolso das pessoas, ou seja, com arrocho e desemprego, como era nos anos FHC. Isso já aparecia no programa do Aécio Neves e está no da Marina. A independência do Banco Central está lá, o que significa dizer “eu sou eleita e abro mão de controlar a inflação, de controlar a moeda, o câmbio, para entregar para os banqueiros controlarem”. É temerário.
A Maria Alice Setúbal, a Neca, diz que não é do sistema financeiro, que o negócio dela é educação...
Se alguém quiser acreditar nisso, acredite. Mas veja o programa de governo da Marina, como reflete tudo o que os bancos defendem: terceirização, superávit primário (sobra de caixa destinada a pagamento de juros), abrir mão da gestão do câmbio, BC independente... o programa abre mão até do controle sobre a condução da política fiscal. A gente já vem discutindo isso com os bancos há muito tempo, e eles defendem com todas as letras o PL 4330 (projeto de lei do deputado Sandro Mabel, PMDB-GO, que liberara a terceirização em todas as atividades). E está lá no programa da Marina. E uma das coordenadoras é a Neca Setúbal, mas não é só ela. É o Roberto Setúbal. É o Itaú. São os bancos que estão incluindo essa pauta. BC independente, a quem interessa? Independente de quem? Dos interesses da sociedade? É isso que significa um BC independente: o governo abrir mão de fazer a política, e deixar a tarefa de regulação dos juros, dos preços, do ritmo de crescimento e da proteção da moeda para o sistema financeiro privado fazer.
O programa prevê também acabar com a política de crédito direcionado, aquele que estabelece regras para o financiamento imobiliário; que determina que uma parte dos depósitos dos correntistas e poupadores que estão nos bancos seja destinada ao trabalhador que vai comprar sua casa própria; ou a operações de microcrédito, de empreendedorismo, de crédito rural etc. É o que possibilita taxas de juros menores e prazos maiores para atividades produtivas. Eliminar o crédito direcionado significa reduzir as oportunidades e deixá-las à mercê dos juros ditados pelo mercado bancário.
Hoje, no Banco do Brasil predomina o crédito rural e na Caixa Federal predomina o habitacional. E os bancos públicos acabam puxando os privados. Porque ou eles usam essa fatia reservada da poupança e do compulsório para esses fins, ou não podem usar para outros fins. Então, o ideal é que o direcionamento do crédito seja ainda maior para estimular outras atividades produtivas, quer criem empregos e renda. Se acabar, ficar tudo por conta do crédito livre, vai diminuir a oferta, e as taxas de juros vão ser muito maiores.
Aliás, também faz parte do programa de governo da Marina diminuir o papel dos bancos públicos. Se você pega o período depois da crise de 2008, foram os bancos públicos que seguraram a oferta de crédito, e acabaram puxando os banco privados. Isso foi fundamental para proteger o mercado interno e os empregos, enfim, para que o trabalhador brasileiro não tivesse de pagar a conta da crise financeira internacional, como estão pagando os europeus.
E por que a Marina entrou tão forte na disputa, mesmo sem nunca ter apresentado claramente seus projetos de governo?
Isso tem a ver com a insatisfação das pessoas com a política, e com a criminalização da política feita por parte da imprensa nos últimos anos. É criminalização com desinformação. A verdadeira mudança não é uma única pessoa que vai fazer. O que precisa mudar é o conjunto de regras que compõem o sistema político. Não adianta você chegar e dizer “eu sou o novo”, “eu vou mudar a política”. O “novo” que prevê terceirização? Redução do papel dos bancos públicos? Diminuição do crédito? Da importância do pré-sal, de onde vai sair receita para mudar o financiamento da educação e da saúde? Isso não é novo. A gente já viveu há muito tempo e foi muito ruim para o Brasil. Interromper a política de distribuição de renda é o velho. O povo brasileiro quer mudança, e essa mudança passa por mudar um monte de coisas. Financiamento de campanhas, por exemplo, tem de mudar, senão a maioria do Congresso vai continuar sempre subordinada aos interesses de quem financia as campanhas. É isso que tem sido ruim para o Brasil.
Como o sindicato vê essa campanha do plebiscito pela Constituinte exclusiva para fazer reforma política?
É o caminho. Estamos passando em todos os locais de trabalho colhendo votos e levando esse debate. É uma proposta muito viável, e a população tem de compreender que para mudar as coisas na política é preciso mudar um conjunto de regras, e também mudar a postura das pessoas, acompanhar mais os movimentos, candidaturas, governos, entender os programas de governo para escolher com qual se identifica, e eleger que vai tocar esses programas. Não adianta votar numa pessoa e depois não acompanhar se ele vai cumprir o que está naquele programa. Enfim, uma pessoa que diz que vai mudar as coisas não vai mudar nada, não vai trazer o novo, se o seu programa está repleto do velho. Volta no tempo e acolhe o descompromisso dos bancos com o país.
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