sábado, 11 de outubro de 2014

O "estarrecimento" hipócrita de Aécio

Por Paulo Nogueira, no blog Diário do Centro do Mundo:

Dilma e Aécio se disseram hoje estarrecidos.

Dilma por ver vazarem sem provas, num momento crucial da disputa pela presidência, depoimentos que incriminam o PT no caso Petrobras.

Aécio, num jogo de palavras em resposta a Dilma, pelo teor dos depoimentos.

Aécio foi espirituoso, é verdade – mas o que ele disse simplesmente não faz sentido.

Pelo seguinte: onde estão as provas? Quem garante que os depoimentos são verdadeiros?

Mais ainda: por que agora, às vésperas do turno final? Repare: já se incorporou ao calendário político nacional uma denúncia espetacular contra o PT quando os brasileiros se preparam para ir às urnas.

Por que não antes? Por que não depois? Por que – sempre – na hora do voto?

A lista das perguntas poderia esticar-se. Por que nunca alguma denúncia contra o PSDB recebe destaque, apenas para variar? Por que a mídia mal cobriu o escândalo do Metrô de SP, ou o aeroporto de Aécio, para não falar da compra de votos no Congresso para a reeleição de FHC?

Aécio se estarrece sempre que lê alguma denúncia, ou isso só acontece quando seus adversários são atingidos?

Ela ficou estarrecido com a conta de alguns milhões de dólares de um cacique tucano bloqueada na Suíça por ter sido gerada por propinas na construção do Metrô de São Paulo?

Ficou estarrecido com o fato de o cacique em questão pertencer, desde os tempos de Covas, ao Tribunal de Contas de São Paulo, órgão fiscalizador das contas do governo paulista?

Ficou estarrecido com a permanência desse cacique no cargo mesmo depois do bloqueio de sua conta feito pelas autoridades suíças?

Claro que o aeroporto de Claudio não haveria de estarrecê-lo. Estarreceu-o, isso sim, Luciana Genro ter trazido o assunto a um debate presidencial.

O pecado nada é, segundo essa maneira de ver as coisas. O problema é a publicação do pecado, como notou Machado de Assis.

É muito cinismo e muita hipocrisia para um candidato só. Aécio deve ter os brasileiros na conta de idiotas, se acha que eles vão acreditar em seus estarrecimentos seletivos.

Dilma, ao comentar os vazamentos do caso Petrobras, disse uma coisa que merece ampla reflexão da sociedade.

A impunidade, afirmou ela, começa quando as acusações não são sustentadas por provas.

Perfeito.

Numa sociedade avançada, você só pode publicar acusações se puder comprová-las.

Antes disso, não. A sociedade tem que estar protegida, a não ser que o entendimento seja o de que você é culpado até prova em contrário.

Ainda assim, é uma lógica perversa que deve valer para todos. FHC, por exemplo, teria que provar que é inocente da acusação de compra de votos no Congresso.

Todo mundo topa?

Vivemos uma aberração na mídia e na política, um vale-tudo cujo único interesse é a manutenção das mamatas e privilégios daquela turma de sempre.

Vou ser didático.

Imagine que o irmão de Obama diz a você, editor, que ele tem uma conta milionária num paraíso fiscal e que, na juventude, costumava colocar em si mesmo supositórios de cocaína.

Você publica e, quando instado a provar, diz que quem falou foi o irmão de Obama? Você triunfalmente, passa às autoridades uma fita com as “revelações” do irmão de Obama e acha que está tudo resolvido?

Experimente fazer isso nos Estados Unidos. Você não apenas vai para a cadeia como terá que pagar uma multa milionária – a não ser que tenha provas.

No Brasil, você sai ileso, e até aclamado por amigos de destaque na mídia, em nome da “liberdade de expressão”.

Você destrói irresponsavelmente reputações, ou até vidas, e é condecorado.

É uma situação que só é boa para a mídia e seus amigos – numa palavra, a plutocracia.

A pergunta doída para o PT é por que, em doze anos, nem Lula e nem Dilma enfrentaram essa tragédia nacional.

Medo, pânico, falta de visão?

O lado irônico de tudo é que nestes doze anos o PT financiou a mídia que tenta tirá-lo do poder na marra.

Sem os 600 milhões de reais anuais de propaganda federal a Globo seria, forçosamente, muito menor do que é – sem sequer a necessidade de regulamentar a mídia para evitar monopólios e oligopólios.

Não haveria como sustentar Jabores, Mervais, Noblats, Kamels e tantas outras figuras abertamente dedicadas a minar Lula e, agora, Dilma.

Bastaria decidir que propaganda oficial é só para assuntos de interesse público, como temporadas de vacinação e coisas do gênero.

Quer mais um pouco para moralizar o quadro e cortar as garras dos agressores? Bastaria impedir que empresas de mídia pudessem vender livros para o governo, outra atividade que ao longo dos tempos tem carregado torrencialmente dinheiro públicos para mãos privadas.

Nada disso foi feito.

Agora, a falta de ação cobra seu preço – e a única coisa que resta ao PT é expor uma deformação que caberia a ele erradicar no poder, e torcer para que os eleitores não caiam no velho truque que no passado tragou Getúlio e Jango.

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