Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:
Os profissionais de comunicação corporativa costumam dizer que gestão de crise é o conjunto de ações para evitar que piore tudo que já está ruim. Trata-se, portanto, de conter o fluxo de notícias e opiniões negativas e, se possível, ocupar o tempo e o espaço com conteúdos positivos, ou, no mínimo, neutros.
A tarefa fica mais difícil quando o núcleo do sistema de mídia, ou seja, os principais jornais e os noticiários de maior audiência na televisão, desenvolvem um viés negativo em relação à reputação que se pretende preservar ou recuperar.
Por outro lado, quando a matriz do sistema midiático demonstra estar a favor de tal objeto, o único trabalho a ser feito é o de criar factoides capazes de manter o assunto indigesto longe da pauta dos jornalistas. Nesse caso, tudo se resume a cultivar relações de simpatia com a mídia, para continuar contando com a boa vontade dos jornalistas em comprar o que se vende.
Sem uma imprensa crítica, os gerenciadores de crise precisam apenas alimentar a pauta com boas distrações, porque a defesa de seu cliente é feita pela própria mídia.
Certamente o melhor caso brasileiro de sucesso nas relações com a imprensa é o do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin: mesmo com todas as evidências de que tem prevaricado na administração de serviços essenciais à população, ele passa incólume pelo noticiário, sem ser incomodado pelos jornalistas.
O governador que assumiu seu primeiro mandato em 2001, portanto, há mais de duas décadas, apresenta uma coleção de problemas que vão da educação à violência policial, mas a joia de sua coroa é o colapso no sistema de abastecimento de água.
A região metropolitana de São Paulo está à beira de uma crise humanitária sem precedentes, e uma consulta aos atos e declarações do chefe do governo paulista mostra uma verdadeira enciclopédia de platitudes, desde sua declarada disposição de rezar para São Pedro por chuvas abundantes, em 2013, até seu mais recente aforismo, aquele segundo o qual os cortes no fornecimento não configuram um racionamento de água, mas "restrição hídrica".
Canos furados
Diga-se, a favor da imprensa, que ela não consegue esconder a gravidade da situação: tem que fazer a contabilidade da escassez com relatos quase diários sobre o nível dos reservatórios.Por exemplo, na quarta-feira (21/1), o Estado de S. Paulo informa que o déficit de água chega a 2,5 bilhões de litros por dia nos principais mananciais, ou seja, nem a redução da pressão na rede, providência recente da Sabesp, nem a diminuição do consumo feita espontaneamente pela população, têm sido capazes de estabilizar o sistema.
O que a imprensa faz é omitir a responsabilidade do governador, ao afirmar que a crise hídrica começou em janeiro de 2014: na verdade, o problema foi anunciado há mais de dez anos, mas nada de efetivo aconteceu desde então. Segundo um ex-diretor da Sabesp, os principais projetos para melhorar o sistema são do tempo do falecido governador Mario Covas. Há, portanto, uma responsabilidade a ser cobrada, no mesmo padrão com que se exige probidade e eficiência, por exemplo, do governo federal e da administração municipal da capital do estado.
A tentativa de manipular os fatos chega a ser patética, na edição de quarta-feira da Folha de S. Paulo, que traz uma ampla reportagem sobre o desperdício de água tratada em todo o Brasil. O leitor atento haverá de questionar, por exemplo, com que critérios o editor compara São Paulo com o Amapá, onde a população tem acesso a uma enorme fartura de água em estado natural e onde a falta de água encanada é um problema incalculavelmente menor.
Segundo dados oficiais, a Sabesp desperdiça 30% de toda a água tratada, ou seja, perde-se todos os dias na região metropolitana da capital paulista um volume igual ao que é captado diariamente do sistema Cantareira, que abastece 6,5 milhões de pessoas. Isso quer dizer que o ponto mais grave da crise não é a redução da oferta, mas a incapacidade de conduzir essa água até as casas dos consumidores.
Quando se revela que o desastre é iminente, o que fazem os jornais? Exploram o corte de energia feito preventivamente na segunda-feira (19/1), em manchetes que insinuam a ocorrência de um "apagão", tentando desviar para o plano federal a atenção dos leitores.
O caso de amor entre a imprensa e o governador de São Paulo beira a pornografia.
A tarefa fica mais difícil quando o núcleo do sistema de mídia, ou seja, os principais jornais e os noticiários de maior audiência na televisão, desenvolvem um viés negativo em relação à reputação que se pretende preservar ou recuperar.
Por outro lado, quando a matriz do sistema midiático demonstra estar a favor de tal objeto, o único trabalho a ser feito é o de criar factoides capazes de manter o assunto indigesto longe da pauta dos jornalistas. Nesse caso, tudo se resume a cultivar relações de simpatia com a mídia, para continuar contando com a boa vontade dos jornalistas em comprar o que se vende.
Sem uma imprensa crítica, os gerenciadores de crise precisam apenas alimentar a pauta com boas distrações, porque a defesa de seu cliente é feita pela própria mídia.
Certamente o melhor caso brasileiro de sucesso nas relações com a imprensa é o do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin: mesmo com todas as evidências de que tem prevaricado na administração de serviços essenciais à população, ele passa incólume pelo noticiário, sem ser incomodado pelos jornalistas.
O governador que assumiu seu primeiro mandato em 2001, portanto, há mais de duas décadas, apresenta uma coleção de problemas que vão da educação à violência policial, mas a joia de sua coroa é o colapso no sistema de abastecimento de água.
A região metropolitana de São Paulo está à beira de uma crise humanitária sem precedentes, e uma consulta aos atos e declarações do chefe do governo paulista mostra uma verdadeira enciclopédia de platitudes, desde sua declarada disposição de rezar para São Pedro por chuvas abundantes, em 2013, até seu mais recente aforismo, aquele segundo o qual os cortes no fornecimento não configuram um racionamento de água, mas "restrição hídrica".
Canos furados
Diga-se, a favor da imprensa, que ela não consegue esconder a gravidade da situação: tem que fazer a contabilidade da escassez com relatos quase diários sobre o nível dos reservatórios.Por exemplo, na quarta-feira (21/1), o Estado de S. Paulo informa que o déficit de água chega a 2,5 bilhões de litros por dia nos principais mananciais, ou seja, nem a redução da pressão na rede, providência recente da Sabesp, nem a diminuição do consumo feita espontaneamente pela população, têm sido capazes de estabilizar o sistema.
O que a imprensa faz é omitir a responsabilidade do governador, ao afirmar que a crise hídrica começou em janeiro de 2014: na verdade, o problema foi anunciado há mais de dez anos, mas nada de efetivo aconteceu desde então. Segundo um ex-diretor da Sabesp, os principais projetos para melhorar o sistema são do tempo do falecido governador Mario Covas. Há, portanto, uma responsabilidade a ser cobrada, no mesmo padrão com que se exige probidade e eficiência, por exemplo, do governo federal e da administração municipal da capital do estado.
A tentativa de manipular os fatos chega a ser patética, na edição de quarta-feira da Folha de S. Paulo, que traz uma ampla reportagem sobre o desperdício de água tratada em todo o Brasil. O leitor atento haverá de questionar, por exemplo, com que critérios o editor compara São Paulo com o Amapá, onde a população tem acesso a uma enorme fartura de água em estado natural e onde a falta de água encanada é um problema incalculavelmente menor.
Segundo dados oficiais, a Sabesp desperdiça 30% de toda a água tratada, ou seja, perde-se todos os dias na região metropolitana da capital paulista um volume igual ao que é captado diariamente do sistema Cantareira, que abastece 6,5 milhões de pessoas. Isso quer dizer que o ponto mais grave da crise não é a redução da oferta, mas a incapacidade de conduzir essa água até as casas dos consumidores.
Quando se revela que o desastre é iminente, o que fazem os jornais? Exploram o corte de energia feito preventivamente na segunda-feira (19/1), em manchetes que insinuam a ocorrência de um "apagão", tentando desviar para o plano federal a atenção dos leitores.
O caso de amor entre a imprensa e o governador de São Paulo beira a pornografia.
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