A normalidade da disputa política – que pode ser estridente, mas dentro das regras do jogo – começou a ser quebrada no Brasil poucos dias antes das eleições.
Até ali, assistimos à parcialidade escandalosa da mídia, o que não chega a ser uma novidade em nosso país.
Mas quando a Veja valeu-se da declaração de um criminoso contumaz, que jamais chegou sequer perto de Lula e de Dilma Rousseff para afirmar que “eles sabiam” dos casos de corrupção na Petrobras, sem nada mais senão uma declaração marota, genérica de um bandido.
Daí em diante, com o “aperto eleitoral” que esta ação produziu, a sublevação da direita contra o resultado eleitoral, o bombardeio incessante da mídia, a exploração sobre as contas de campanha, a greve dos caminhoneiros, a falta de capacidade de gradualismo e de comunicação de um governo mudo e, afinal, o país coberto por uma camada de ódio e fanatismo que gera o impensável.
Os presidentes da Câmara e do Senado, atingidos pelas denúncias do Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, precisam, desesperadamente, de demonstrações de poder e força que os imunizem das acusações.
Nada melhor para isso que bater num governo que se enfraqueceu, pela ofensiva alheia e por suas próprias incapacidades, sobretudo, certamente, a de (re)construir alianças.
O resultado foi que o país passou a viver uma onda conservadora absolutamente contraditória com a manifestação eleitoral do final de outubro.
A aprovação da discussão sobre a redução da maioridade penal e o início da – ainda duvidosa – terceirização “livre e liberada” dos vínculos profissionais são exemplos disso e devem ser enfrentadas com inteligência, para que não se tornem monstruosas como pretende boa parte da direita brasileira.
Esta semana, pela primeira vez, o governo demonstrou esta inteligência, embora muita gente de esquerda tenha torcido o nariz à entrada de Michel Temer na articulação política do Governo.
Se alguém tem alguma dúvida do que isso representa em termos de reequilíbrio de forças políticas, leia o post de hoje de meu velho companheiro de encrencas jornalísticas, Tales Faria, no IG, onde ele nara as perplexidades de alguns deputados “cunhistas” e já “ex-cunhistas”.
As instituições “republicanas” no Brasil – depois do massacre intensivo dos partidos políticos – são assim, o varejo de interesses.
Embora acusada impiedosamente, foi o que Dilma tentou deixar de lado em seu primeiro mandato e os resultados políticos não precisam ser descritos, estão sendo vistos.
Não existe tarefa mais urgente para a esquerda que restaurar a normalidade da disputa política.
Ou, como disse outro dia o médico Ion de Andrade, no GGN, praticar o “exercício ostensivo da normalidade institucional”.
Porque a falta dela é, hoje, o principal obstáculo à recuperação da normalidade econômica, que é seu fundamento.
Esta, mais que qualquer outra coisa, é o que isola a direita e a contém no ódio da Avenida Paulista.
E para que isso aconteça, é essencial que o governo, tão ocupado em garantir os meios do tal “ajuste fiscal”, sinalize bem claramente como e porque isso é útil ao povão, e ao Brasil.
E, até agora, isso não foi nem ensaiado, quanto mais executado.
Sair da tempestade, se exige reduzir as velas, exige também firmeza no leme e olhos na bússola.
E um capitão, visível e ativo.
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