Por Umberto Martins, no site Vermelho:
A radicalização da luta de classes e dos conflitos internacionais é a marca mais saliente do momento histórico que vivemos. Transparece na guerra civil da Ucrânia, por trás da qual há uma guerra ainda fria entre EUA e Rússia; nas lutas sociais e políticas que sacodem a Europa; nas tensões no Mar da China; nos conflitos instigados pelo imperialismo no Oriente Médio e também na ofensiva das forças conservadoras na Venezuela, no Brasil e na Argentina.
O pano de fundo deste fenômeno é a crise mundial do capitalismo, que a meu ver tem dois aspectos fundamentais, diferentes, mas profundamente entrelaçados. Primeiro, embora não por ordem de importância, vem a crise econômica, iniciada no final de 2007 (quando a recessão teve ingresso nos EUA) e que se arrasta, com altos e baixos, até o presente, afetando hoje principalmente países como Rússia, Brasil, Venezuela e Argentina.
Interligada às perturbações econômicas e em convergência com elas, desenvolve-se uma crise geopolítica originária da decomposição da ordem internacional remanescente dos acordos de Bretton Woods hegemonizada pelos Estados Unidos e emergência de um novo arranjo geopolítico, liderado pela China e com crescente protagonismo do Brics. Também podemos caracterizá-la como crise da hegemonia estadunidense.
Uma convergência crítica
Produto do desenvolvimento desigual das nações e do parasitismo econômico do Ocidente a crise de hegemonia é o corolário do declínio da liderança econômica dos EUA e UE e da ascensão da China e, menor medida, dos países que compõem o Brics. Não restam dúvidas de que a crise econômica acelerou este processo. A economia chinesa, embora afetada, continuou crescendo em ritmo surpreendente e desigual (agora a 7% ao ano) e foi justamente ao longo dos últimos anos que ocorreu a criação (2009) e consolidação do Brics e a rápida multiplicação dos investimentos chineses na África, Ásia e América Latina. É visível a convergência entre as crises econômica e geopolítica do capitalismo.
O cenário de instabilidade é agravado pela crise ambiental, hídrica e energética, que amadureceu em função das relações predatórias que o capitalismo estabelece com a natureza, desafiando a sustentabilidade dos recursos naturais que ancoram o processo produtivo e evidenciando a irracionalidade do modo e das relações de produção burguesas, que insensíveis aos anseios de bem-estar social e ao equilíbrio ecológico visam exclusivamente a maximização dos lucros.
A necessidade de uma nova ordem mundial ganha corpo e força nas iniciativas lideradas pelo Brics (como a criação do Novo Banco de Desenvolvimento e do Arranjo Contingencial de Reservas, instituições alternativas ao Banco Mundial e ao FMI) e pelo governo chinês (criação de um banco asiático de infraestrutura contra a vontade do império, por exemplo) e, em nossa região, pelos governos progressistas - criação da Alba, da Unasul e da Celac, bem como a rejeição da Alca, que em conjunto configuram um processo de transição para um novo arranjo geopolítico.
A ascensão da China à condição de potência financeira vem ao encontro desta transição latino-americana e caribenha para uma nova ordem regional, respaldando-a. O apoio financeiro dos comunistas chineses a Cuba, Venezuela, Equador, Bolívia, Argentina, Brasil e outros países da Nossa América, tem se revelado fundamental no cenário de crise e constitui inegável e forte contribuição à sustentação dos governos progressistas, tornando-os menos vulneráveis aos humores instáveis do combalido sistema financeiro ocidental, bem como às chantagens e sanções do império.
O império contra-ataca
A reação dos EUA e da Europa contra este movimento histórico é uma das principais causas dos conflitos políticos na Ucrânia, no Mar da China e também por aqui, na América Latina. Por trás da onda conservadora em curso, explorando debilidades políticas e a crise econômica, percebem-se os dedos do império, a ação para desestabilizar os governos progressistas, interromper e reverter o novo ciclo político deflagrado após a primeira eleição de Hugo Chávez na Venezuela.
Embora em franco declínio na esfera econômica os EUA ainda mantêm a hegemonia militar e forte influência política e ideológica sobre as classes dominantes e parcelas expressivas das populações locais. A ligação entre o imperialismo e as forças conservadoras nos países latino-americanos não é fenômeno novo. Há muito acompanha a conturbada história das relações da Nossa América com o valentão do Norte, cabendo lembrar neste sentido o papel ativo de Tio Sam nos golpes de 1964 no Brasil, 1973 no Chile, 2009 em Honduras e 2012 no Paraguai, além das iniciativas golpistas na Venezuela em 2002/2003 e 2014 contra os governos Chávez e Maduro, na Bolívia (2008) e Equador (2010).
Em meio à ofensiva conservadora é também notável e preocupante o avanço das forças de extrema direita em todo o globo, a exemplo do que ocorreu nos anos 30 do século passado como desdobramento da Grande Depressão e do infame Tratado de Versalhes. A crise, conforme observou Engels, é expressão da explosão das contradições inerentes ao sistema capitalista e imperialista. Enquanto não encontra um desfecho é natural e inevitável que resulte na elevação da temperatura da luta de classes e acirramento dos conflitos políticos e militares entre as nações.
A conjuntura instável e as tensões em crescimento no mundo e no Brasil projetam um futuro de sombras e embutem um risco iminente de conflagrações ainda mais violentas e retrocesso para a classe trabalhadora e a civilização humana. Mas a crise também pode se transformar em oportunidade de mudança, favorecendo a transição para uma nova ordem mundial efetivamente multilateral e democrática, assim como a luta pela superação do capitalismo e construção de uma nova sociedade, socialista.
A polarização crescente sugere que escassez de espaço para soluções intermediárias e a conciliação de classes. As portas para uma saída reformista estão sendo fechadas não pela classe trabalhadora, mas pela própria burguesia, que dobra a aposta no neoliberalismo e promove o acirramento da luta de classes, conforme notou o economista Luiz Carlos Bresser Pereira. Será preciso energia revolucionária para deter a onda conservadora e o avanço do neofascismo e construir uma saída progressista para a crise do capitalismo.
A radicalização da luta de classes e dos conflitos internacionais é a marca mais saliente do momento histórico que vivemos. Transparece na guerra civil da Ucrânia, por trás da qual há uma guerra ainda fria entre EUA e Rússia; nas lutas sociais e políticas que sacodem a Europa; nas tensões no Mar da China; nos conflitos instigados pelo imperialismo no Oriente Médio e também na ofensiva das forças conservadoras na Venezuela, no Brasil e na Argentina.
O pano de fundo deste fenômeno é a crise mundial do capitalismo, que a meu ver tem dois aspectos fundamentais, diferentes, mas profundamente entrelaçados. Primeiro, embora não por ordem de importância, vem a crise econômica, iniciada no final de 2007 (quando a recessão teve ingresso nos EUA) e que se arrasta, com altos e baixos, até o presente, afetando hoje principalmente países como Rússia, Brasil, Venezuela e Argentina.
Interligada às perturbações econômicas e em convergência com elas, desenvolve-se uma crise geopolítica originária da decomposição da ordem internacional remanescente dos acordos de Bretton Woods hegemonizada pelos Estados Unidos e emergência de um novo arranjo geopolítico, liderado pela China e com crescente protagonismo do Brics. Também podemos caracterizá-la como crise da hegemonia estadunidense.
Uma convergência crítica
Produto do desenvolvimento desigual das nações e do parasitismo econômico do Ocidente a crise de hegemonia é o corolário do declínio da liderança econômica dos EUA e UE e da ascensão da China e, menor medida, dos países que compõem o Brics. Não restam dúvidas de que a crise econômica acelerou este processo. A economia chinesa, embora afetada, continuou crescendo em ritmo surpreendente e desigual (agora a 7% ao ano) e foi justamente ao longo dos últimos anos que ocorreu a criação (2009) e consolidação do Brics e a rápida multiplicação dos investimentos chineses na África, Ásia e América Latina. É visível a convergência entre as crises econômica e geopolítica do capitalismo.
O cenário de instabilidade é agravado pela crise ambiental, hídrica e energética, que amadureceu em função das relações predatórias que o capitalismo estabelece com a natureza, desafiando a sustentabilidade dos recursos naturais que ancoram o processo produtivo e evidenciando a irracionalidade do modo e das relações de produção burguesas, que insensíveis aos anseios de bem-estar social e ao equilíbrio ecológico visam exclusivamente a maximização dos lucros.
A necessidade de uma nova ordem mundial ganha corpo e força nas iniciativas lideradas pelo Brics (como a criação do Novo Banco de Desenvolvimento e do Arranjo Contingencial de Reservas, instituições alternativas ao Banco Mundial e ao FMI) e pelo governo chinês (criação de um banco asiático de infraestrutura contra a vontade do império, por exemplo) e, em nossa região, pelos governos progressistas - criação da Alba, da Unasul e da Celac, bem como a rejeição da Alca, que em conjunto configuram um processo de transição para um novo arranjo geopolítico.
A ascensão da China à condição de potência financeira vem ao encontro desta transição latino-americana e caribenha para uma nova ordem regional, respaldando-a. O apoio financeiro dos comunistas chineses a Cuba, Venezuela, Equador, Bolívia, Argentina, Brasil e outros países da Nossa América, tem se revelado fundamental no cenário de crise e constitui inegável e forte contribuição à sustentação dos governos progressistas, tornando-os menos vulneráveis aos humores instáveis do combalido sistema financeiro ocidental, bem como às chantagens e sanções do império.
O império contra-ataca
A reação dos EUA e da Europa contra este movimento histórico é uma das principais causas dos conflitos políticos na Ucrânia, no Mar da China e também por aqui, na América Latina. Por trás da onda conservadora em curso, explorando debilidades políticas e a crise econômica, percebem-se os dedos do império, a ação para desestabilizar os governos progressistas, interromper e reverter o novo ciclo político deflagrado após a primeira eleição de Hugo Chávez na Venezuela.
Embora em franco declínio na esfera econômica os EUA ainda mantêm a hegemonia militar e forte influência política e ideológica sobre as classes dominantes e parcelas expressivas das populações locais. A ligação entre o imperialismo e as forças conservadoras nos países latino-americanos não é fenômeno novo. Há muito acompanha a conturbada história das relações da Nossa América com o valentão do Norte, cabendo lembrar neste sentido o papel ativo de Tio Sam nos golpes de 1964 no Brasil, 1973 no Chile, 2009 em Honduras e 2012 no Paraguai, além das iniciativas golpistas na Venezuela em 2002/2003 e 2014 contra os governos Chávez e Maduro, na Bolívia (2008) e Equador (2010).
Em meio à ofensiva conservadora é também notável e preocupante o avanço das forças de extrema direita em todo o globo, a exemplo do que ocorreu nos anos 30 do século passado como desdobramento da Grande Depressão e do infame Tratado de Versalhes. A crise, conforme observou Engels, é expressão da explosão das contradições inerentes ao sistema capitalista e imperialista. Enquanto não encontra um desfecho é natural e inevitável que resulte na elevação da temperatura da luta de classes e acirramento dos conflitos políticos e militares entre as nações.
A conjuntura instável e as tensões em crescimento no mundo e no Brasil projetam um futuro de sombras e embutem um risco iminente de conflagrações ainda mais violentas e retrocesso para a classe trabalhadora e a civilização humana. Mas a crise também pode se transformar em oportunidade de mudança, favorecendo a transição para uma nova ordem mundial efetivamente multilateral e democrática, assim como a luta pela superação do capitalismo e construção de uma nova sociedade, socialista.
A polarização crescente sugere que escassez de espaço para soluções intermediárias e a conciliação de classes. As portas para uma saída reformista estão sendo fechadas não pela classe trabalhadora, mas pela própria burguesia, que dobra a aposta no neoliberalismo e promove o acirramento da luta de classes, conforme notou o economista Luiz Carlos Bresser Pereira. Será preciso energia revolucionária para deter a onda conservadora e o avanço do neofascismo e construir uma saída progressista para a crise do capitalismo.
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