Foto: Roberto Stuckert Filho/PR |
A reação de movimentos sindicais e sociais em defesa da legalidade e contra o golpismo dos derrotados na eleição presidencial de 2014 começou com o abraço ao Instituto Lula no último dia 7 e ganhou força na última quarta-feira com a Marcha das Margaridas, em Brasília.
A Polícia Militar, como era previsível, inverteu o que faz nos protestos contra o governo Dilma. Em vez de inflar o número de manifestantes divulgou número bem inferior ao que a organização do ato público anunciou – foram 35 mil para a PM e 70 mil para os manifestantes.
A massa se reuniu com a presidente Dilma no Estádio Mané Garrincha em meio a palavras de apoio e aplausos.
A mídia deu pouco destaque para o ato das Margaridas, mas o fato é que esse e outros atos de apoio à legalidade democrática que irão ocorrer antes e depois dos protestos golpistas de domingo próximo revelarão que haverá reações a qualquer tentativa de ruptura democrática no país.
O apoio a Dilma e contra o golpismo foi mais do que explícito durante o ato das Margaridas, como mostra a foto no alto da página. No domingo (16), CUT e o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC farão vigília no Instituto Lula e a expectativa é a de que haverá um número muito maior de manifestantes do que no dia 7.
No dia 20, a CUT e vários movimentos sociais prometem sair à rua “Em defesa dos direitos sociais, da liberdade e da democracia, contra a ofensiva da direita e por saídas populares para a crise”.
Abaixo, a relação de forças políticas que apoiarão esse ato.
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) /
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) /
Central Única dos Trabalhadores (CUT) /
Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) /
Intersindical – Central da Classe Trabalhadora/ Federação Única dos Petroleiros (FUP) /
União Nacional dos Estudantes (UNE) /
União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) /
Rua – Juventude Anticapitalista /
Fora do Eixo /
Mídia Ninja /
União da Juventude Socialista (UJS) /
Juntos /
Juventude Socialismo e Liberdade (JSOL) /
Associação Nacional de Pós Graduandos (ANPG) /
Federação Nacional dos Estudantes do Ensino Técnico (Fenet) /
União da Juventude Rebelião (UJR) /
Uneafro /
Unegro /
Círculo Palmarino /
União Brasileira das Mulheres (UBM) /
Coletivo de Mulheres Rosas de Março /
Coletivo Ação Crítica /
Coletivo Cordel /
Serviço Franciscano de Solidariedade (Sefras) /
Igreja Povo de Deus em Movimento (IPDM)/
Recentemente, o Blog ouviu representantes desse movimento. Segundo disseram, o protesto do dia 20 não irá se declarar abertamente contra o golpe, mas, ao se dizer “Em defesa dos direitos sociais, da liberdade e da democracia, contra a ofensiva da direita”, o movimento já deixa claro que, caso o golpismo avance mais, irá reagir, sim, em defesa da legalidade.
É óbvio que, em termos de público, será impossível rivalizar com os atos fascistas do próximo domingo, pois, além da convocação pelos grandes grupos de mídia, esses manifestantes de classe média alta arrastam para as ruas suas famílias e até seus empregados.
Nos atos públicos dos movimentos sindicais e sociais não se vê pessoas que nem sabem por que estão se manifestando, como nos atos fascistas. Entre movimentos e sindicatos são todos militantes que sabem muito bem por que estão na rua.
O que garante que esses movimentos sociais e sindicatos defenderão o mandato de Dilma, caso necessário, é que sabem muito bem que a única possibilidade de diálogo que têm com o governo reside na premissa de que a presidente mantenha seu mandato. Se ascender um governo de direita, essa esquerda sabe que não haverá mais diálogo.
O único erro das forças progressistas é o de estar esperando demais. Se houver uma ruptura democrática, o governo ilegítimo que ascenderá mandará as forças de repressão do Estado espancar nas ruas os que forem protestar.
Contudo, se o país chegar a esse ponto a direita e o capital sabem que haverá perdas imensas para a economia, com forte aumento do desemprego e da atividade econômica, gerando uma situação de conflagração social de resultados imprevisíveis.
É por isso, aliás, que a mídia tem pegado leve com o governo, de uns dias para cá, como revelou edição do Jornal Nacional da semana passada que espantou a muitos pelo nível de cordialidade com Dilma Rousseff e com críticas aos tucanos e a Eduardo Cunha por estarem sabotando a economia.
É o capital dizendo que pode ser louco a ponto de levar o país a esse ponto, mas não é burro a ponto de deixar o barco afundar, pois irá junto.
Ao mesmo tempo em que as forças progressistas e democráticas vão se preparando para a luta contra o golpe – que, infelizmente, pode se dar após esse golpe ter acontecido devido à boa e velha falta de juízo da esquerda –, Dilma vai mostrando sua fibra.
Na noite de quarta-feira, após fazer um discurso corajoso no Estádio Mané Garrincha para as Margaridas – dizendo que verga, mas não quebra –, a presidente concedeu entrevista ao jornalista Kennedy Alencar, no SBT, na qual mandou recados aos fascistas que irão às ruas no domingo pedindo golpe.
A Dilma que deu essa entrevista mostrou-se segura, equilibrada e fez alertas que, por certo, calarão fundo entre os mais sensatos.
Ao dizer que respeita o direito de manifestação, mas que esse não inclui o nível de intolerância que tem sido visto, a presidente alertou para a divisão do país e o risco de tudo isso desencadear – ainda mais – a violência, que já vai mostrando a cara em episódios como o atentado a bomba no Instituto Lula, no último dia 30 de julho.
Dilma remeteu o nível de intolerância e violência no país ao que havia durante a ditadura militar, ainda que não tenha dito com essas palavras. E, para completar, colocou o termo “fascista” na roda, ainda que tenha dito que não acredita em um “Brasil fascista”.
Dilma ainda fez outra comparação entre o momento atual e outros momentos de ruptura democrática, lembrando frase de Carlos Lacerda, em primeiro de junho de 1950, no jornal Tribuna da Imprensa, sobre uma eventual vitória de Getúlio Vargas na eleição presidencial:
“O senhor Getúlio Vargas, senador, não deve ser candidato à Presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar”
Dilma citou esse episódio de nossa história política antes de dizer, em alto e bom som, que não “cogita” renunciar e qualificou as tentativas de derrubá-la como “insipientes”. E que o respeito ao voto popular não é só para ela, mas para os governantes que virão depois dela, pois não é cabível que se queira jogar fora mais de 50 milhões de votos que a elegeram com base em pesquisas de opinião.
Dilma e Alencar citaram várias vezes a palavra “golpe” enquanto que a presidente afirmou que “a cultura do golpe ainda existe no país”.
Não é pouco.
Dilma ainda afirmou que não cometeu estelionato eleitoral simplesmente porque a conjuntura econômica do país era uma durante a campanha do ano passado e, hoje, é outra muito diferente.
Ou seja: além de explicar que após a campanha eleitoral houve piora no cenário econômico internacional, insinuou que a política, tal como vem sendo feita pela oposição, piorou as condições econômicas do país, obrigando-a a tomar medidas que não pretendia tomar.
Como este Blog vem dizendo há muito tempo, a presidente também explicou a questão da energia elétrica. A redução do valor das contas de luz em 2012 ocorreu porque venceram os contratos das concessionárias de geração de energia e estes continham acréscimo de valor nas tarifas devido ao custo de amortização da construção das hidrelétricas.
Dilma explicou que como a construção das usinas já estava amortizada, havia que tirar das tarifas esse custo de amortização. Porém, com a seca – que, inclusive, fez subir o custo da água em Estados como São Paulo – foi necessário aumentar tarifas.
Além disso, ao comentar as “pautas-bomba” no Congresso a presidente dividiu com a Câmara a responsabilidade pela situação econômica do país. Por certo fez muita gente pensar no que representa para a sua vida que o Legislativo atue na contramão do interesse público.
Sobre a possibilidade de perda do selo de “bom pagador” que o Brasil tem junto às agências de classificação de risco, Alencar afirmou que a dívida pública estaria hoje em 65% do PIB enquanto que, em 2013, estava em 53%. Dilma respondeu lembrando que nossa dívida pública ainda é uma das “menores do mundo”.
Nesse momento, a presidente anunciou que o Brasil retomará o crescimento em 2016, o que talvez seja a primeira boa notícia de peso que ela pôde dar ao país desde o início do ano.
Dilma chamou de “irresponsabilidade” e “teoria do quanto pior, melhor” o comportamento de setores do Legislativo, introduzindo no imaginário da população a hipótese de que a oposição assumida e a enrustida estão jogando contra o país.
Sobre as manobras de Eduardo Cunha para abrir caminho para votação um pedido de impeachment ao ter colocado em votação as contas dos presidentes anteriores de forma a que a Câmara possa deliberar – e, eventualmente, rejeitar – as contas da atual presidente, ela, descontraída, recusou-se a dizer se teria força no Congresso para barrar esse golpe, mas afirmou que “quando” e “se” esse processo for desencadeado sua base de apoio dará a resposta.
Contudo, foi ao falar sobre corrupção que Dilma mais ficou bem na foto. Com a anuência do entrevistador, disse que, como presidente, tem cuidado de garantir que as investigações prossigam, do que é prova ter reconduzido o Procurador Geral da República ao cargo.
E por aí ficou a entrevista.
É óbvio que as ponderações da presidente não mudarão em nada a disposição golpista da oposição, de setores da mídia e muito menos dos tarados que irão à rua no próximo domingo pedir um golpe, mas o Brasil não se resume a esse tipo de gente.
Entre a maioria silenciosa por certo haverá muita gente disposta a refletir, raciocinar e que poderá entender que o caminho golpista, que a intolerância e o fascismo não ajudarão o país a sair de uma crise criada artificialmente, pois se não houvesse problemas como os atuais na política o Brasil já poderia estar se reerguendo.
Tudo o que este post contém mostra que dar um golpe “constitucional” não será o passeio que muitos pensam que seria.
O governo Dilma e o próprio PT têm base social e política. Enquanto ficarmos no criticismo, nos protestos de rua e nas especulações sobre o golpe, essas forças políticas tentarão pressionar o governo para contemplar suas agendas. Mas só até que o golpe se torne uma possibilidade real.
Quantos brasileiros querem mesmo ver o circo pegar fogo? Quantos se recusarão a refletir até que seja tarde demais?
Mesmo que seja um erro trágico dos movimentos sociais e sindicais – e da esquerda como um todo – esperar até a undécima hora para reagirem, essas reações, caso o golpe avance, serão tonitruantes e por certo jogarão o país em um clima de confronto que irá afundá-lo, bem como às vidas de todos.
Nesse aspecto, a reação de Dilma e o recado dos movimentos sociais e sindicais podem, sim, fazer com que muita gente que tem condescendido com o golpe, reflita. Há que comemorar, pois, as reações dela e dos movimentos. O golpismo perdeu força na quarta-feira.
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