Por João Paulo Cunha, no jornal Brasil de Fato:
O que Aécio Neves, Sarney Filho, Collor de Mello, Agripino Maia, Jader Barbalho e Tasso Jereissati têm em comum, além de não ser o tipo de pessoa que você convidaria para tomar uma cerveja? Resposta rápida: não respeitam a Constituição Federal. E não é de hoje. Os políticos acima, juntamente com outros 34 parlamentares, entre senadores e deputados, fazem parte da lista de proprietários de concessões de rádio e TV, o que é explicitamente vedado pelo artigo 54 da lei maior. Procuradores dos estados de origem de suas excelências estão ajuizando ações em todo o Brasil, com o patrocínio do Ministério Público Federal, a partir de mobilização da sociedade civil, capitaneada pelo Coletivo Intervozes. Demorou.
Comunicação no Brasil é um tabu. Tudo que se faz em direção ao controle público, regulação, direito de resposta, democratização e proteção contra o monopólio é logo traduzido como ameaça à liberdade de imprensa. O caso da propriedade de concessão de serviços públicos, como a radiodifusão, no entanto, segue em outra direção. Não se pode acusar quem defende a cassação dessas concessões de atentar contra o livre mercado de ideias. Trata-se exatamente do contrário: a concentração de duas dimensões de poder – o político e o simbólico – nas mãos da mesma pessoa ou grupo político. A resposta dos coronéis eletrônicos sobre o caso tem sido menos ideológica e mais cínica: eles não se metem pessoalmente nos negócios.
As rádios e emissoras de TVs de políticos são como lobisomem: metade empresa, metade garantia de monopólio do discurso em suas áreas de abrangência. De um lado, concentram poder econômico como propriedade rentável, recebida quase sempre em recompensa a apoios políticos explícitos. De outro, garantem vocalização de apenas uma fatia do espectro ideológico e social, vedando uma das funções primordiais da imprensa, que é a abertura ao diálogo e à pluralidade de opiniões. No momento em que se debate a proibição de doações empresariais para campanhas, a posse de um veículo de comunicação se torna um ativo ainda mais valioso.
A presença de Aécio Neves na lista mostra que ele, além da contumaz arrogância blasé de se furtar a cumprir a lei – mesmo as mais consensuais, como não dirigir depois de beber – é atravessado por uma confusão teratogênica entre o público e o privado. O senador mineiro parece desconhecer os valores mais básicos de uma democracia, como o respeito ao resultado das urnas; e os princípios mais pétreos da República, como a separação entre os interesses pessoais e o bem comum. Além de manter sob sua administração emissoras de rádio, o que é inconstitucional, dirigiu a sua empresa de comunicação verbas públicas de propaganda do governo de Minas. Promoveu assim uma dupla alienação do sentido da lei: usou o poder político para garantir vantagens econômicas e lançou mão de financiamento público para defender interesses políticos pessoais.
A sobreposição entre público e privado tem história na elite brasileira. Usar patrimônio do Estado para auferir vantagens particulares tem sido uma prática convencional e abusiva. Recentemente, o senador tucano se viu envolvido numa polêmica em torno da construção de um aeroporto que beneficiava sua propriedade e que foi instalado na fazenda de um tio. A chave do cadeado que dava acesso à área, mesmo desapropriada, era mantida sob a guarda familiar. Como avião parece ser obsessão e símbolo de status, caronas nas aeronaves do Governo de Minas fizeram parte do cardápio de gentilezas de Aécio com seus amigos, parceiros de ideias, companheiros de lazer e parentes, como atesta documento oficial recentemente divulgado. Parece haver uma cegueira moral que o impede de discernir poder de uso de uso do poder.
Quanto aos 40 coronéis da mídia acionados pelo Ministério Público Federal, são, certamente, apenas uma fração do sistema que sempre soube escorregar as responsabilidades para laranjas e testas-de-ferro. Já os lobisomens que enriquecem e se eternizam como candidatos com palanque eletrônico garantido à custa de concessões auferidas em jogo de cartas marcadas, estes estão vivos e chutando a democracia. O coronel e o lobisomem podem até merecer o folclore, mas não deveriam jamais habitar a história.
O que Aécio Neves, Sarney Filho, Collor de Mello, Agripino Maia, Jader Barbalho e Tasso Jereissati têm em comum, além de não ser o tipo de pessoa que você convidaria para tomar uma cerveja? Resposta rápida: não respeitam a Constituição Federal. E não é de hoje. Os políticos acima, juntamente com outros 34 parlamentares, entre senadores e deputados, fazem parte da lista de proprietários de concessões de rádio e TV, o que é explicitamente vedado pelo artigo 54 da lei maior. Procuradores dos estados de origem de suas excelências estão ajuizando ações em todo o Brasil, com o patrocínio do Ministério Público Federal, a partir de mobilização da sociedade civil, capitaneada pelo Coletivo Intervozes. Demorou.
Comunicação no Brasil é um tabu. Tudo que se faz em direção ao controle público, regulação, direito de resposta, democratização e proteção contra o monopólio é logo traduzido como ameaça à liberdade de imprensa. O caso da propriedade de concessão de serviços públicos, como a radiodifusão, no entanto, segue em outra direção. Não se pode acusar quem defende a cassação dessas concessões de atentar contra o livre mercado de ideias. Trata-se exatamente do contrário: a concentração de duas dimensões de poder – o político e o simbólico – nas mãos da mesma pessoa ou grupo político. A resposta dos coronéis eletrônicos sobre o caso tem sido menos ideológica e mais cínica: eles não se metem pessoalmente nos negócios.
As rádios e emissoras de TVs de políticos são como lobisomem: metade empresa, metade garantia de monopólio do discurso em suas áreas de abrangência. De um lado, concentram poder econômico como propriedade rentável, recebida quase sempre em recompensa a apoios políticos explícitos. De outro, garantem vocalização de apenas uma fatia do espectro ideológico e social, vedando uma das funções primordiais da imprensa, que é a abertura ao diálogo e à pluralidade de opiniões. No momento em que se debate a proibição de doações empresariais para campanhas, a posse de um veículo de comunicação se torna um ativo ainda mais valioso.
A presença de Aécio Neves na lista mostra que ele, além da contumaz arrogância blasé de se furtar a cumprir a lei – mesmo as mais consensuais, como não dirigir depois de beber – é atravessado por uma confusão teratogênica entre o público e o privado. O senador mineiro parece desconhecer os valores mais básicos de uma democracia, como o respeito ao resultado das urnas; e os princípios mais pétreos da República, como a separação entre os interesses pessoais e o bem comum. Além de manter sob sua administração emissoras de rádio, o que é inconstitucional, dirigiu a sua empresa de comunicação verbas públicas de propaganda do governo de Minas. Promoveu assim uma dupla alienação do sentido da lei: usou o poder político para garantir vantagens econômicas e lançou mão de financiamento público para defender interesses políticos pessoais.
A sobreposição entre público e privado tem história na elite brasileira. Usar patrimônio do Estado para auferir vantagens particulares tem sido uma prática convencional e abusiva. Recentemente, o senador tucano se viu envolvido numa polêmica em torno da construção de um aeroporto que beneficiava sua propriedade e que foi instalado na fazenda de um tio. A chave do cadeado que dava acesso à área, mesmo desapropriada, era mantida sob a guarda familiar. Como avião parece ser obsessão e símbolo de status, caronas nas aeronaves do Governo de Minas fizeram parte do cardápio de gentilezas de Aécio com seus amigos, parceiros de ideias, companheiros de lazer e parentes, como atesta documento oficial recentemente divulgado. Parece haver uma cegueira moral que o impede de discernir poder de uso de uso do poder.
Quanto aos 40 coronéis da mídia acionados pelo Ministério Público Federal, são, certamente, apenas uma fração do sistema que sempre soube escorregar as responsabilidades para laranjas e testas-de-ferro. Já os lobisomens que enriquecem e se eternizam como candidatos com palanque eletrônico garantido à custa de concessões auferidas em jogo de cartas marcadas, estes estão vivos e chutando a democracia. O coronel e o lobisomem podem até merecer o folclore, mas não deveriam jamais habitar a história.
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