Por Murilo Cleto, na revista Fórum:
O governo Temer, ao menos o provisório, já é questão de dias. Chega ao fim um longo ciclo que teve início no dia seguinte à reeleição de Dilma e que contou com forte engajamento partidário, social e empresarial na luta, segundo a alegação, por um país livre da corrupção e do desemprego.
E há, evidentemente, quem tenha embarcado na caravana do impeachment com expectativas genuínas como estas. Mas o desenrolar dos fatos tem demonstrado que a realidade tem tudo para sair bem diferente da expectativa. E uma reflexão sobre cada uma destas expectativas é necessária, à medida que se anuncia um novo Brasil.
Expectativa: unir o país num momento histórico de ruptura, como nas Diretas Já e no impeachment de Collor.
Realidade: ao contrário do que se previa e do que sugeriram alguns dos maiores periódicos do país, o impeachment de Dilma não acontece sem resistência. Quando Collor estava prestes a cair, convocou os brasileiros a saírem às ruas em verde e amarelo. E nenhuma alma o fez. Em 1984, à exceção de alguns poucos parlamentares fortemente ligados ao regime, ninguém teve coragem de se opor de modo claro ao fim do ciclo militar no poder. Com Dilma não foi nada disso. E não adianta recorrer à tese dos movimentos cooptados. Foi às ruas – e em número equiparado à oposição – uma multidão que reconhecia a legitimidade do mandato petista, composta inclusive por quem não havia depositado seu voto nele. Como bem destacou o historiador Luiz Antonio Simas, o que se tem aqui é apenas o PMDB deixando de ser governo para continuar sendo governo.
Expectativa: desenvolvimento econômico.
Realidade: não é mentira que o impeachment pode representar ao menos uma chance de o país sair da recessão. Não é por acaso: o mercado decidiu ser fiador do impeachment no momento em que a Ponte para o Futuro se apresentou como alternativa ao modelo petista de política econômica. Logo, nada mais justo que o mercado reaja positivamente à ascensão de Temer. Mas não sem um custo, claro: além da compressão do espaço para programas sociais, a agenda neoliberal do PMDB também prevê “privatização de tudo o que for possível”, a ampliação dos “arranjos institucionais público-privados” e a “atualização” das regras trabalhistas. Ontem (3) veio a público o documento A Travessia Social, elaborado pela Fundação Ulysses Guimarães, que detalha o projeto. Todos os sinais indicam que a tal ponte para o futuro deve nos levar de 2016 direto para os anos 1990.
Expectativa: diminuição e otimização do Estado.
Realidade: entre os defensores do impeachment, é recorrente o discurso de que a máquina pública no Brasil está inchada e que a solução para o problema da alta carga tributária passa também pela diminuição do número de ministérios, utilizados para abrigar aliados políticos em detrimento da qualidade técnica na condução de políticas públicas. A princípio Temer havia cogitado reduzir o número de ministérios a 20, mas o cálculo subiu para 27 e agora, pressionado pela base, o vice-presidente já admite simplesmente adiar o corte. Pelo impeachment, o peemedebista Sandro Mabel ofereceu 142 cargos comissionados por deputado do PP. A conta da admissibilidade na Câmara dos Deputados já chegou e o Ministério da Educação deve parar nas mãos do DEM, assim como o da Cultura nas de Roberto Freire, do PPS. O PRB, que abriga lideranças da Igreja Universal do Reino de Deus, deve ficar com o Ministério da Ciência e Tecnologia. Marcos Pereira, bispo licenciado, é o indicado para chefiar a pasta. Isso, claro, sem contar o PSDB, que anunciou oficialmente ontem o apoio ao governo Temer. José Serra já negocia há tempos com o vice-presidente.
Expectativa: fim da corrupção.
Realidade: como já era de se esperar, a acomodação de aliados que viabilizaram a ida de Michel Temer ao Planalto também prevê a participação de algumas figuras carimbadas em diferentes esquemas de corrupção. É o caso de Romero Jucá, senador peemedebista investigado nas operações Lava Jato e Zelotes, cotado para o Ministério do Planejamento. O próprio PP, que hospeda 32 dos 51 políticos investigados na Lava Jato, deve ocupar o Ministério da Saúde. Isso sem contar Paulinho da Força e Eduardo Cunha, também réus no Supremo Tribunal Federal, que, decisivos no impeachment e fortes aliados do vice-presidente, não vão ficar de fora deste novo governo. Aos defensores da tese “primeiro a Dilma, depois o resto”, todos os recados já foram dados: se cair Temer, não será por livre e espontânea vontade do Parlamento.
Enquanto o STF dorme com o pedido de afastamento de Cunha, que em breve será o presidente em exercício, deputados já falam abertamente em anistia-lo. Um deles, Osmar Serraglio, é o novo presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal.
A realidade terá pelo menos algo da expectativa? Quem viver verá.
O governo Temer, ao menos o provisório, já é questão de dias. Chega ao fim um longo ciclo que teve início no dia seguinte à reeleição de Dilma e que contou com forte engajamento partidário, social e empresarial na luta, segundo a alegação, por um país livre da corrupção e do desemprego.
E há, evidentemente, quem tenha embarcado na caravana do impeachment com expectativas genuínas como estas. Mas o desenrolar dos fatos tem demonstrado que a realidade tem tudo para sair bem diferente da expectativa. E uma reflexão sobre cada uma destas expectativas é necessária, à medida que se anuncia um novo Brasil.
Expectativa: unir o país num momento histórico de ruptura, como nas Diretas Já e no impeachment de Collor.
Realidade: ao contrário do que se previa e do que sugeriram alguns dos maiores periódicos do país, o impeachment de Dilma não acontece sem resistência. Quando Collor estava prestes a cair, convocou os brasileiros a saírem às ruas em verde e amarelo. E nenhuma alma o fez. Em 1984, à exceção de alguns poucos parlamentares fortemente ligados ao regime, ninguém teve coragem de se opor de modo claro ao fim do ciclo militar no poder. Com Dilma não foi nada disso. E não adianta recorrer à tese dos movimentos cooptados. Foi às ruas – e em número equiparado à oposição – uma multidão que reconhecia a legitimidade do mandato petista, composta inclusive por quem não havia depositado seu voto nele. Como bem destacou o historiador Luiz Antonio Simas, o que se tem aqui é apenas o PMDB deixando de ser governo para continuar sendo governo.
Expectativa: desenvolvimento econômico.
Realidade: não é mentira que o impeachment pode representar ao menos uma chance de o país sair da recessão. Não é por acaso: o mercado decidiu ser fiador do impeachment no momento em que a Ponte para o Futuro se apresentou como alternativa ao modelo petista de política econômica. Logo, nada mais justo que o mercado reaja positivamente à ascensão de Temer. Mas não sem um custo, claro: além da compressão do espaço para programas sociais, a agenda neoliberal do PMDB também prevê “privatização de tudo o que for possível”, a ampliação dos “arranjos institucionais público-privados” e a “atualização” das regras trabalhistas. Ontem (3) veio a público o documento A Travessia Social, elaborado pela Fundação Ulysses Guimarães, que detalha o projeto. Todos os sinais indicam que a tal ponte para o futuro deve nos levar de 2016 direto para os anos 1990.
Expectativa: diminuição e otimização do Estado.
Realidade: entre os defensores do impeachment, é recorrente o discurso de que a máquina pública no Brasil está inchada e que a solução para o problema da alta carga tributária passa também pela diminuição do número de ministérios, utilizados para abrigar aliados políticos em detrimento da qualidade técnica na condução de políticas públicas. A princípio Temer havia cogitado reduzir o número de ministérios a 20, mas o cálculo subiu para 27 e agora, pressionado pela base, o vice-presidente já admite simplesmente adiar o corte. Pelo impeachment, o peemedebista Sandro Mabel ofereceu 142 cargos comissionados por deputado do PP. A conta da admissibilidade na Câmara dos Deputados já chegou e o Ministério da Educação deve parar nas mãos do DEM, assim como o da Cultura nas de Roberto Freire, do PPS. O PRB, que abriga lideranças da Igreja Universal do Reino de Deus, deve ficar com o Ministério da Ciência e Tecnologia. Marcos Pereira, bispo licenciado, é o indicado para chefiar a pasta. Isso, claro, sem contar o PSDB, que anunciou oficialmente ontem o apoio ao governo Temer. José Serra já negocia há tempos com o vice-presidente.
Expectativa: fim da corrupção.
Realidade: como já era de se esperar, a acomodação de aliados que viabilizaram a ida de Michel Temer ao Planalto também prevê a participação de algumas figuras carimbadas em diferentes esquemas de corrupção. É o caso de Romero Jucá, senador peemedebista investigado nas operações Lava Jato e Zelotes, cotado para o Ministério do Planejamento. O próprio PP, que hospeda 32 dos 51 políticos investigados na Lava Jato, deve ocupar o Ministério da Saúde. Isso sem contar Paulinho da Força e Eduardo Cunha, também réus no Supremo Tribunal Federal, que, decisivos no impeachment e fortes aliados do vice-presidente, não vão ficar de fora deste novo governo. Aos defensores da tese “primeiro a Dilma, depois o resto”, todos os recados já foram dados: se cair Temer, não será por livre e espontânea vontade do Parlamento.
Enquanto o STF dorme com o pedido de afastamento de Cunha, que em breve será o presidente em exercício, deputados já falam abertamente em anistia-lo. Um deles, Osmar Serraglio, é o novo presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara Federal.
A realidade terá pelo menos algo da expectativa? Quem viver verá.
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