Por Luis Nassif, no Jornal GGN:
O fato novo, que surgiu no fim da noite de ontem, foi a provável inabilitação de Michel Temer para as próximas eleições, como efeito de sua condenação em segunda instância pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de São Paulo. É mais uma peça nesse nosso xadrez absolutamente imprevisível. Não afeta seu mandato atual, mas o impedirá de se candidatar em 2018.
Acompanhe os próximos lances.
1. A Lava Jato chega ao seu objetivo final: inabilitar Lula.
No dia 14 de outubro passado, no post “Como a Lava Jato foi pensada como operação de Guerra” (http://migre.me/tGjEx), analisei a operação, à luz do trabalho de 2004 de Sérgio Moro sobre a Operação Mãos Limpas.
“Fica claro, para o Grupo de Trabalho da Lava Jato, que o Bettino Craxi a se mirar, o Rei a ser derrubado, é o ex-presidente Lula. O vazamento sistemático de informações, sem nenhum filtro, é peça central dessa estratégia”.
Com sua decisão ontem, o Procurador Geral da República (PGR) Rodrigo Janot completa o ciclo, e com requintes: além de Lula, propõe abertura de inquérito contra a própria presidente Dilma Rousseff, provavelmente para não permitir nenhuma possibilidade de reversão do impeachment no Senado. E ainda inclui o ex-Ministro José Eduardo Cardozo no menu, tido e havido como pessoa de suas relações pessoais. A inclusão das principais lideranças petistas no governo visa o segundo objetivo: a inablitação final do PT.
Aliás, Cardozo teve papel central para manter Dilma na ilusão de que a Lava Jato jamais a atingiria. Levará pouco tempo para que todos os capítulos da história sejam revelados. E, provavelmente, uma eternidade até que Dilma e Cardozo se deem conta do que aconteceu.
O óbolo pago por Janot foi o pedido de abertura de inquérito contra Aécio Neves.
Para nosso xadrez de hoje interessa saber que 2018 já começou a ser jogado. Nele, Lula terá papel de liderança, sim, mas dificilmente de candidato. Se não for inabilitado pela Lava Jato, será pelo PGR com o aval do STF (Supremo Tribunal Federal). Por lá, há três espécies de magistrados: os que conspiram, os que não toleram Lula e os que julgam que só haverá paz quando Lula sair do jogo.
Portanto, a política terá que conviver com a ideia de que o último personagem central do período de redemocratização estará doravante fora do jogo, como candidato, mas não como liderança.
2. O fator Michel Temer
A estratégia de Temer teria três tempos, não fosse o julgamento pelo TRE paulista, que será explicado a seguir.
O primeiro, nos próximos seis meses, em que tentará firmar sua imagem e superar a de golpista. A segunda, de atuar até 2018 se preparando para ser candidato. Se bem-sucedida, arriscaria a terceira, em 2018.
Os fatos não parecem corroborara a estratégia. Se o impeachment passar, Temer assumirá com a imagem de golpista, montando o Ministério mais fisiológico da história.
Nos primeiros meses, será beneficiado pela herança tardia de Joaquim Levy: inflação cedendo, taxas de juros acompanhando, e uma recuperação ainda que tímida do nível de atividade. De certa forma permitirá algum contraponto à má qualidade de seu ministério.
Sua ideia é que, consolidado o governo nesse período, poderia ousar voos maiores. Dificilmente isso ocorrerá. Passado o período da graça, Temer terá pouco a mostrar.
Sua base de apoio, extremamente fluida, o limitará nas seguintes questões:
1. Dificultará o pacto maior com o PSDB.
2. Obrigará a alianças com os grupos mais retrógrados do Congresso.
3. Este ano haverá eleições municipais e dificilmente o Congresso concordará com uma agenda negativa.
4. Não terá como se livrar da CPMF.
3. Temer ficha suja
Ontem, surgiu o fato novo no horizonte: por unanimidade, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de São Paulo condenou Michel Temer por irregularidade na campanha de 2014 (http://migre.me/tGkms). Temer teria declarado rendimentos de R$ 839.924,46 em 2013, e doado R$ 100.000,00 na campanha de 2014. A legislação define limite de doação de 10% do valor declarado pelo doador no ano anterior e, no caso, o valor chega a 12%.
A Lei da Ficha Limpa, em seu artigo 1o, paragrafo j, reza:
j) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação do registro ou do diploma, pelo prazo de 8 (oito) anos a contar da eleição.
Segundo o procurador eleitoral Rodrigo Tenório, a condenação por doação acima do limite não interfere no mandato atual. Mas será discutida no pedido de registro de candidatura nas eleições de 2018, segundo o artigo 22, XIV:
XIV – julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar;
Por aí, portanto, é possível que Temer também seja inabilitado por 8 anos, o que o afastaria das eleições de 2018.
4. O fator 2018
O jogo começa com os dois principais partidos – PT e PSDB – afetados por desgastes históricos. Ao mesmo tempo, uma polarização política inédita, na pós-redemocratização, com as ruas divididas entre militantes de esquerda e direita, mas com escassa definição programática.
Há nitidez na pauta social e na defesa das minorias. Mas uma enorme confusão conceitual em torno do papel do Estado, com a direita propondo seu esvaziamento total e a esquerda com dificuldades para superar alguns dogmas históricos, como os dissídios coletivos e a proibição a qualquer forma de terceirização.
No tempo anterior de jogo, o PT se sobressaiu com sua pauta social, mas jamais conseguiu definir adequadamente uma estratégia econômica e de país. Criou políticas relevantes de inovação, educação, de compras públicas. Mas, no campo macroeconômico, deixou-se amarrar à ilusão do câmbio apreciado e dos juros elevados. A não ser por um breve tempo, com Dilma Rousseff, ousou aproximar-se das taxas de juros internacionais e da redução de spread. Mas o esforço foi por água abaixo no episódio que marcou a inflexão final do governo Dilma: a elevação da taxa Selic.
Nos próximos tempos, o PT terá que se reinventar e terá que surgir uma nova esquerda alicerçando a pauta social em ideias econômicas mais claras, que consigam casar a flexibilidade dos tempos modernos, tanto no mercado de trabalho como no de capital, com projetos de nação e de inclusão social.
O nacional-desenvolvimentismo terá que sofrer um upgrade para torna-lo mais contemporâneo.
Por outro lado, se quiser ser politicamente competitiva, a direita terá que adaptar seu discurso de demonização do Estado para uma realidade social diversa, na qual não se admitirá o recuo de conquistas sociais e trabalhistas.
A sociedade moderna não comporta mais grandes partidos monolíticos. Mas, também, não poderá avançar se não houver confluência de tendências, criando massa crítica para a governabilidade.
A cada dia que passa, sindicatos e movimentos sociais passam a conviver com formas modernas de associação, os coletivos e suas coordenações horizontais, ao arrepio de qualquer hierarquização.
Por outro lado, posições de esquerda e direita estão muito amarradas a conceitos simples. De um lado, os valores da solidariedade; do outro, o culto ao mérito individual. É muito pouco. O que leva a confusão de manifestantes defendendo menos Estado e mais educação e saúde gratuitas.
Esses momentos costumam abrir espaço para figuras providenciais, com seus discursos salvadores.
O fato novo, que surgiu no fim da noite de ontem, foi a provável inabilitação de Michel Temer para as próximas eleições, como efeito de sua condenação em segunda instância pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de São Paulo. É mais uma peça nesse nosso xadrez absolutamente imprevisível. Não afeta seu mandato atual, mas o impedirá de se candidatar em 2018.
Acompanhe os próximos lances.
1. A Lava Jato chega ao seu objetivo final: inabilitar Lula.
No dia 14 de outubro passado, no post “Como a Lava Jato foi pensada como operação de Guerra” (http://migre.me/tGjEx), analisei a operação, à luz do trabalho de 2004 de Sérgio Moro sobre a Operação Mãos Limpas.
“Fica claro, para o Grupo de Trabalho da Lava Jato, que o Bettino Craxi a se mirar, o Rei a ser derrubado, é o ex-presidente Lula. O vazamento sistemático de informações, sem nenhum filtro, é peça central dessa estratégia”.
Com sua decisão ontem, o Procurador Geral da República (PGR) Rodrigo Janot completa o ciclo, e com requintes: além de Lula, propõe abertura de inquérito contra a própria presidente Dilma Rousseff, provavelmente para não permitir nenhuma possibilidade de reversão do impeachment no Senado. E ainda inclui o ex-Ministro José Eduardo Cardozo no menu, tido e havido como pessoa de suas relações pessoais. A inclusão das principais lideranças petistas no governo visa o segundo objetivo: a inablitação final do PT.
Aliás, Cardozo teve papel central para manter Dilma na ilusão de que a Lava Jato jamais a atingiria. Levará pouco tempo para que todos os capítulos da história sejam revelados. E, provavelmente, uma eternidade até que Dilma e Cardozo se deem conta do que aconteceu.
O óbolo pago por Janot foi o pedido de abertura de inquérito contra Aécio Neves.
Para nosso xadrez de hoje interessa saber que 2018 já começou a ser jogado. Nele, Lula terá papel de liderança, sim, mas dificilmente de candidato. Se não for inabilitado pela Lava Jato, será pelo PGR com o aval do STF (Supremo Tribunal Federal). Por lá, há três espécies de magistrados: os que conspiram, os que não toleram Lula e os que julgam que só haverá paz quando Lula sair do jogo.
Portanto, a política terá que conviver com a ideia de que o último personagem central do período de redemocratização estará doravante fora do jogo, como candidato, mas não como liderança.
2. O fator Michel Temer
A estratégia de Temer teria três tempos, não fosse o julgamento pelo TRE paulista, que será explicado a seguir.
O primeiro, nos próximos seis meses, em que tentará firmar sua imagem e superar a de golpista. A segunda, de atuar até 2018 se preparando para ser candidato. Se bem-sucedida, arriscaria a terceira, em 2018.
Os fatos não parecem corroborara a estratégia. Se o impeachment passar, Temer assumirá com a imagem de golpista, montando o Ministério mais fisiológico da história.
Nos primeiros meses, será beneficiado pela herança tardia de Joaquim Levy: inflação cedendo, taxas de juros acompanhando, e uma recuperação ainda que tímida do nível de atividade. De certa forma permitirá algum contraponto à má qualidade de seu ministério.
Sua ideia é que, consolidado o governo nesse período, poderia ousar voos maiores. Dificilmente isso ocorrerá. Passado o período da graça, Temer terá pouco a mostrar.
Sua base de apoio, extremamente fluida, o limitará nas seguintes questões:
1. Dificultará o pacto maior com o PSDB.
2. Obrigará a alianças com os grupos mais retrógrados do Congresso.
3. Este ano haverá eleições municipais e dificilmente o Congresso concordará com uma agenda negativa.
4. Não terá como se livrar da CPMF.
3. Temer ficha suja
Ontem, surgiu o fato novo no horizonte: por unanimidade, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de São Paulo condenou Michel Temer por irregularidade na campanha de 2014 (http://migre.me/tGkms). Temer teria declarado rendimentos de R$ 839.924,46 em 2013, e doado R$ 100.000,00 na campanha de 2014. A legislação define limite de doação de 10% do valor declarado pelo doador no ano anterior e, no caso, o valor chega a 12%.
A Lei da Ficha Limpa, em seu artigo 1o, paragrafo j, reza:
j) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado da Justiça Eleitoral, por corrupção eleitoral, por captação ilícita de sufrágio, por doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou por conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem cassação do registro ou do diploma, pelo prazo de 8 (oito) anos a contar da eleição.
Segundo o procurador eleitoral Rodrigo Tenório, a condenação por doação acima do limite não interfere no mandato atual. Mas será discutida no pedido de registro de candidatura nas eleições de 2018, segundo o artigo 22, XIV:
XIV – julgada procedente a representação, ainda que após a proclamação dos eleitos, o Tribunal declarará a inelegibilidade do representado e de quantos hajam contribuído para a prática do ato, cominando-lhes sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos 8 (oito) anos subsequentes à eleição em que se verificou, além da cassação do registro ou diploma do candidato diretamente beneficiado pela interferência do poder econômico ou pelo desvio ou abuso do poder de autoridade ou dos meios de comunicação, determinando a remessa dos autos ao Ministério Público Eleitoral, para instauração de processo disciplinar, se for o caso, e de ação penal, ordenando quaisquer outras providências que a espécie comportar;
Por aí, portanto, é possível que Temer também seja inabilitado por 8 anos, o que o afastaria das eleições de 2018.
4. O fator 2018
O jogo começa com os dois principais partidos – PT e PSDB – afetados por desgastes históricos. Ao mesmo tempo, uma polarização política inédita, na pós-redemocratização, com as ruas divididas entre militantes de esquerda e direita, mas com escassa definição programática.
Há nitidez na pauta social e na defesa das minorias. Mas uma enorme confusão conceitual em torno do papel do Estado, com a direita propondo seu esvaziamento total e a esquerda com dificuldades para superar alguns dogmas históricos, como os dissídios coletivos e a proibição a qualquer forma de terceirização.
No tempo anterior de jogo, o PT se sobressaiu com sua pauta social, mas jamais conseguiu definir adequadamente uma estratégia econômica e de país. Criou políticas relevantes de inovação, educação, de compras públicas. Mas, no campo macroeconômico, deixou-se amarrar à ilusão do câmbio apreciado e dos juros elevados. A não ser por um breve tempo, com Dilma Rousseff, ousou aproximar-se das taxas de juros internacionais e da redução de spread. Mas o esforço foi por água abaixo no episódio que marcou a inflexão final do governo Dilma: a elevação da taxa Selic.
Nos próximos tempos, o PT terá que se reinventar e terá que surgir uma nova esquerda alicerçando a pauta social em ideias econômicas mais claras, que consigam casar a flexibilidade dos tempos modernos, tanto no mercado de trabalho como no de capital, com projetos de nação e de inclusão social.
O nacional-desenvolvimentismo terá que sofrer um upgrade para torna-lo mais contemporâneo.
Por outro lado, se quiser ser politicamente competitiva, a direita terá que adaptar seu discurso de demonização do Estado para uma realidade social diversa, na qual não se admitirá o recuo de conquistas sociais e trabalhistas.
A sociedade moderna não comporta mais grandes partidos monolíticos. Mas, também, não poderá avançar se não houver confluência de tendências, criando massa crítica para a governabilidade.
A cada dia que passa, sindicatos e movimentos sociais passam a conviver com formas modernas de associação, os coletivos e suas coordenações horizontais, ao arrepio de qualquer hierarquização.
Por outro lado, posições de esquerda e direita estão muito amarradas a conceitos simples. De um lado, os valores da solidariedade; do outro, o culto ao mérito individual. É muito pouco. O que leva a confusão de manifestantes defendendo menos Estado e mais educação e saúde gratuitas.
Esses momentos costumam abrir espaço para figuras providenciais, com seus discursos salvadores.
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