Por Renata Mielli, no site do FNDC:
*****
Editorial do jornal O Estado de São Paulo
‘Debate’ como eles gostam
O jornal O Estado de São Paulo tem uma obsessão contra a democracia. Está no seu DNA. É um veículo de comunicação que historicamente defendeu os interesses da elite econômica e lhe causa profunda repulsa iniciativas, movimentos e posições que buscam ampliar direitos sociais, distribuir renda e aprofundar os instrumentos de participação social em qualquer que seja o espaço político.
Não vejo nenhum problema nisso, a priori. Afinal, defendo a liberdade de expressão. A sociedade brasileira é complexa e convivemos no Brasil com as mais diferentes matizes políticas que se antagonizam historicamente. O problema está no fato de que este amplo arco de posições – a diversidade cultural, social e a pluralidade política e de opiniões sobre os mais diferentes temas que interessam à sociedade brasileira – não estão presentes nos meios de comunicação brasileiros.
O problema está no fato de que o Estadão não tem o direito de me atacar pessoalmente, citando o meu nome em um editorial cujo contexto induz ao leitor que eu defendo a censura. Isso não é liberdade de imprensa. Nunca o jornal me procurou para me entrevistar e saber o que eu defendo e minhas opiniões sobre esse assunto. A partir de manifestações públicas, distorce minha posição e a do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, entidade na qual estou como coordenadora geral, tirando-as de contexto e ocultando o que não lhes interessa (para quem se interessar segue abaixo o editorial na íntegra).
Esta é a forma dos meios de comunicação privados/comerciais construírem sua narrativa para combater e desconstruir os movimentos que lutam por direitos e democracia. A estratégia mais usada por eles é o ataque e o uso de adjetivos que as pessoas não sabem exatamente o que significam, mas que são utilizados para causar medo. É uma forma de nos colocar um carimbo de “perigosos”, “terroristas”. Assim, nos acusam de querer promover a censura, de querer acabar com a liberdade de imprensa, nos chamam de bolivarianos, de fundamentalistas islâmicos, e agora de petistas – já que eles conseguiram transformar o petismo como sinônimo de coisas ruins, corruptas e autoritárias. Contudo, em nenhuma linha apresentam realmente o que propomos. Se o fizessem, não poderiam nos atacar como fazem.
Por isso, um grande número de organizações da sociedade, ativistas, comunicadores, jornalistas, produtores culturais, intelectuais, acadêmicos, entre outros, defendem e lutam há muitos anos pela democratização da comunicação no Brasil.
Com o processo de redemocratização da sociedade brasileira, esse tema passou a ganhar mais relevância. A ação articulada destes movimentos resultou num capítulo específico da Constituição Federal para tratar da Comunicação Social Eletrônica, que trouxe diretrizes e princípios que o Estado brasileiro deveria observar para garantir um ambiente de pluralidade e diversidade nos meios de comunicação.
Infelizmente, a maior parte destes dispositivos permanecem sem regulação, porque o Congresso Nacional não ousa enfrentar o poder político e econômico dos meios de comunicação que interditam esse debate: de um lado pela presença de um grande número de parlamentares que são concessionários de rádio e televisão, ou são patrocinados por estes meios; de outro porque os meios de comunicação iniciaram uma verdadeira cruzada contra a bandeira da democratização da comunicação, tentando transformar seus defensores em perigosos agentes da censura.
E seguimos sem diversidade e pluralidade, e seguimos sem a garantia da liberdade de expressão para todos e todas. A comunicação é um direito inscrito no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, que diz: “Todo indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, este direito implica a liberdade de manter as suas próprias opiniões sem interferência e de procurar, receber e difundir informações e ideias por qualquer meio de expressão independentemente das fronteiras”. Este texto é de 1948, bom dizer.
Veja, receber e difundir opiniões, não só receber. O que o jornal O Estado de São Paulo oculta de forma proposital de seus leitores é que ter uma comunicação democrática implica em ter meios de comunicação que reflitam a diversidade, que deem voz aos mais amplos setores da sociedade. Vozes que são silenciadas pelo Estadão, pelos grandes jornais e revistas, pelas emissoras privadas de rádio e televisão.
Esses veículos de comunicação têm vínculos estreitos com interesses econômicos que são incompatíveis com a luta dos trabalhadores por seus direitos, com a ampliação do papel do Estado para garantir direitos básicos de saúde, educação, moradia, para mudar a lógica da ocupação das cidades, com a luta pelo direito à terra, com a discussão dos direitos humanos e civis. Por isso, não apenas silenciam essas vozes e invisibilizam essas lutas, como também as criminalizam. Assim, esses temas, quando aparecem nesses meios de comunicação privados/comerciais, é de forma depreciativa e preconceituosa.
E como pode se viabilizar uma comunicação mais democrática? Com políticas públicas que promovam e estimulem a diversidade informativa, com uma regulação que estabeleça mecanismos para efetivar o que prevê a Constituição Federal em seu artigo 223 – é preciso haver complementariedade entre os sistemas públicos, privados e estatal na radiodifusão. E, ainda, definir como impedir que os meios de comunicação social sejam objeto de monopólio e oligopólio como preconiza o artigo 220. É isso que significa lutar pela democratização de comunicação, e não propor mecanismos de censura, como afirma de forma maldosa o jornal paulista.
Por isso, entre outras bandeiras, defendemos o fortalecimento da comunicação pública e consideramos a criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) uma conquista histórica na luta pelo direito à comunicação no Brasil. A lei 11.652/2008, que criou a EBC, é a materialização de uma luta de anos. A EBC é uma conquista da sociedade, não é projeto de nenhum partido. Ela nasce do reconhecimento de que a comunicação pública é um pilar indispensável para a promoção da diversidade e da pluralidade e uma garantia para a liberdade de expressão.
Não vou perder tempo me contrapondo, aqui, a todos os adjetivos que o Estadão usou para atacar a EBC e os que a defendem e lutam por uma comunicação mais democrática. Eles são tão desqualificados e estereotipados que tornariam o debate muito rasteiro. Prefiro apresentar argumentos e dados para mostrar a importância de defender a EBC.
Claro que a construção de um sistema público – praticamente do zero – encerra desafios em todas as suas fases: desde a definição comum do conceito de rede pública, passando por questões relacionadas à forma de gestão, programação, composição de recursos financeiros e humanos, construção de infraestrutura, diálogo com a sociedade para definição de como se dará a participação desta em todas as etapas, entre outros. Desafios que precisam ser enfrentados a partir da compreensão de que é preciso reafirmar e fortalecer a necessidade de uma comunicação pública. Não de que se deve extingui-la.
A EBC reúne nove emissoras de rádio, uma agência de notícias na internet (Agência Brasil) e duas emissoras de televisão (TV Brasil e TV Brasil Internacional). O Estadão e os outros veículos que aprofundaram os ataques à EBC desde o afastamento da presidenta Dilma Rousseff repetem exaustivamente que é preciso acabar com a “TV do Lula”, ou a “TV da Dilma”, com a “TV traço” etc. Mas escondem de seus leitores e telespectadores informações relevantes como o fato de a TV Brasil ter 10,8% de sua programação destinada a programas educativos, enquanto a Rede Globo, por exemplo, tem apenas 2,3%. Que a TV Brasil veiculou 120 títulos de filmes nacionais, sendo a maior janela para a produção audiovisual nacional na TV aberta do país. A Globo veiculou 87 títulos. Já a Bandeirantes e a Record não veicularam nenhum.
Escodem que na grade de programação da TV Brasil há títulos direcionados para debater temas da diversidade étnico-racial, direitos humanos, cidadania, inclusão; que tem o primeiro programa de televisão voltado para discutir os temas da comunidade LGBT. Nenhum deles têm espaço na mídia privada/comercial.
Por isso, a importância da EBC e da TV Brasil: porque a comunicação pública existe para ser complementar à comunicação privada e a estatal. Complementar porque esses temas não são tratados pela mídia privada, então cabe à comunicação pública abordá-los.
Mas, mesmo ocupando um lugar que é distinto do que ocupam os meios comerciais, a existência da EBC os incomoda demais. Justamente porque ela aborda estes temas, justamente porque ela provoca reflexão sobre os assuntos que são tratados de forma rasteira pela mídia privada. E reafirmo, sem medo de estar cometendo qualquer atentado à liberdade de expressão: existe um oligopólio privado nos meios de comunicação no Brasil que detém o monopólio da circulação da informação, que dita padrões culturais e sociais, que banaliza e chancela a cultura do estupro, o machismo, o racismo e mais recentemente tem dado guarida ao discurso do ódio. E esses meios não aceitam a existência da EBC e o fortalecimento de uma comunicação que promova um discurso, uma narrativa diferente dessa.
Quando o FNDC – fórum que reúne mais de 550 entidades regionais e nacionais – defende a democratização dos meios de comunicação, não defende fechar veículos, não defende censurar ninguém. Nós defendemos a regulação, defendemos o direito de resposta, defendemos mais diversidade, defendemos que se respeitem os direitos humanos em veículos que têm uma função social prevista na Constituição. Onde isso pode ser censura?
Quem está defendendo fechar meios é o Estadão e os que estão fazendo coro em torno da bandeira de acabar com a EBC e de fechar a TV Brasil.
Por fim, a questão do financiamento. O Estado de São Paulo nos acusou de estarmos defendendo que o Estado financie o pensamento único. Mas aqui, mais uma vez, eles negam aos seus leitores a informação de que o Estado já financia o pensamento único difundido pelo oligopólio privado.
Nos últimos 13 anos, “os governos do PT”, para usar a narrativa do Estadão, destinaram 6,5 bilhões de reais apenas para a Rede Globo (isso sem falar do jornal, revistas e outros empresas vinculadas ou grupo Globo). Defendemos que é papel do Estado fomentar a diversidade e a pluralidade, portanto, cabe a ele financiar a comunicação pública e mais: criar políticas para financiar veículos comunitários e alternativos. Isso é defender diversidade e pluralidade.
Se pensam que com esses ataques vão nos intimidar e nos calar, estão enganados. Vamos continuar lutando porque acreditamos que sem uma comunicação democrática não há democracia. E a nossa democracia encontra-se em xeque neste momento. Vamos defendê-la e aprofundá-la!
* Renata Mielli é coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação e secretária geral do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
Não vejo nenhum problema nisso, a priori. Afinal, defendo a liberdade de expressão. A sociedade brasileira é complexa e convivemos no Brasil com as mais diferentes matizes políticas que se antagonizam historicamente. O problema está no fato de que este amplo arco de posições – a diversidade cultural, social e a pluralidade política e de opiniões sobre os mais diferentes temas que interessam à sociedade brasileira – não estão presentes nos meios de comunicação brasileiros.
O problema está no fato de que o Estadão não tem o direito de me atacar pessoalmente, citando o meu nome em um editorial cujo contexto induz ao leitor que eu defendo a censura. Isso não é liberdade de imprensa. Nunca o jornal me procurou para me entrevistar e saber o que eu defendo e minhas opiniões sobre esse assunto. A partir de manifestações públicas, distorce minha posição e a do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, entidade na qual estou como coordenadora geral, tirando-as de contexto e ocultando o que não lhes interessa (para quem se interessar segue abaixo o editorial na íntegra).
Esta é a forma dos meios de comunicação privados/comerciais construírem sua narrativa para combater e desconstruir os movimentos que lutam por direitos e democracia. A estratégia mais usada por eles é o ataque e o uso de adjetivos que as pessoas não sabem exatamente o que significam, mas que são utilizados para causar medo. É uma forma de nos colocar um carimbo de “perigosos”, “terroristas”. Assim, nos acusam de querer promover a censura, de querer acabar com a liberdade de imprensa, nos chamam de bolivarianos, de fundamentalistas islâmicos, e agora de petistas – já que eles conseguiram transformar o petismo como sinônimo de coisas ruins, corruptas e autoritárias. Contudo, em nenhuma linha apresentam realmente o que propomos. Se o fizessem, não poderiam nos atacar como fazem.
Por isso, um grande número de organizações da sociedade, ativistas, comunicadores, jornalistas, produtores culturais, intelectuais, acadêmicos, entre outros, defendem e lutam há muitos anos pela democratização da comunicação no Brasil.
Com o processo de redemocratização da sociedade brasileira, esse tema passou a ganhar mais relevância. A ação articulada destes movimentos resultou num capítulo específico da Constituição Federal para tratar da Comunicação Social Eletrônica, que trouxe diretrizes e princípios que o Estado brasileiro deveria observar para garantir um ambiente de pluralidade e diversidade nos meios de comunicação.
Infelizmente, a maior parte destes dispositivos permanecem sem regulação, porque o Congresso Nacional não ousa enfrentar o poder político e econômico dos meios de comunicação que interditam esse debate: de um lado pela presença de um grande número de parlamentares que são concessionários de rádio e televisão, ou são patrocinados por estes meios; de outro porque os meios de comunicação iniciaram uma verdadeira cruzada contra a bandeira da democratização da comunicação, tentando transformar seus defensores em perigosos agentes da censura.
E seguimos sem diversidade e pluralidade, e seguimos sem a garantia da liberdade de expressão para todos e todas. A comunicação é um direito inscrito no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, que diz: “Todo indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, este direito implica a liberdade de manter as suas próprias opiniões sem interferência e de procurar, receber e difundir informações e ideias por qualquer meio de expressão independentemente das fronteiras”. Este texto é de 1948, bom dizer.
Veja, receber e difundir opiniões, não só receber. O que o jornal O Estado de São Paulo oculta de forma proposital de seus leitores é que ter uma comunicação democrática implica em ter meios de comunicação que reflitam a diversidade, que deem voz aos mais amplos setores da sociedade. Vozes que são silenciadas pelo Estadão, pelos grandes jornais e revistas, pelas emissoras privadas de rádio e televisão.
Esses veículos de comunicação têm vínculos estreitos com interesses econômicos que são incompatíveis com a luta dos trabalhadores por seus direitos, com a ampliação do papel do Estado para garantir direitos básicos de saúde, educação, moradia, para mudar a lógica da ocupação das cidades, com a luta pelo direito à terra, com a discussão dos direitos humanos e civis. Por isso, não apenas silenciam essas vozes e invisibilizam essas lutas, como também as criminalizam. Assim, esses temas, quando aparecem nesses meios de comunicação privados/comerciais, é de forma depreciativa e preconceituosa.
E como pode se viabilizar uma comunicação mais democrática? Com políticas públicas que promovam e estimulem a diversidade informativa, com uma regulação que estabeleça mecanismos para efetivar o que prevê a Constituição Federal em seu artigo 223 – é preciso haver complementariedade entre os sistemas públicos, privados e estatal na radiodifusão. E, ainda, definir como impedir que os meios de comunicação social sejam objeto de monopólio e oligopólio como preconiza o artigo 220. É isso que significa lutar pela democratização de comunicação, e não propor mecanismos de censura, como afirma de forma maldosa o jornal paulista.
Por isso, entre outras bandeiras, defendemos o fortalecimento da comunicação pública e consideramos a criação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) uma conquista histórica na luta pelo direito à comunicação no Brasil. A lei 11.652/2008, que criou a EBC, é a materialização de uma luta de anos. A EBC é uma conquista da sociedade, não é projeto de nenhum partido. Ela nasce do reconhecimento de que a comunicação pública é um pilar indispensável para a promoção da diversidade e da pluralidade e uma garantia para a liberdade de expressão.
Não vou perder tempo me contrapondo, aqui, a todos os adjetivos que o Estadão usou para atacar a EBC e os que a defendem e lutam por uma comunicação mais democrática. Eles são tão desqualificados e estereotipados que tornariam o debate muito rasteiro. Prefiro apresentar argumentos e dados para mostrar a importância de defender a EBC.
Claro que a construção de um sistema público – praticamente do zero – encerra desafios em todas as suas fases: desde a definição comum do conceito de rede pública, passando por questões relacionadas à forma de gestão, programação, composição de recursos financeiros e humanos, construção de infraestrutura, diálogo com a sociedade para definição de como se dará a participação desta em todas as etapas, entre outros. Desafios que precisam ser enfrentados a partir da compreensão de que é preciso reafirmar e fortalecer a necessidade de uma comunicação pública. Não de que se deve extingui-la.
A EBC reúne nove emissoras de rádio, uma agência de notícias na internet (Agência Brasil) e duas emissoras de televisão (TV Brasil e TV Brasil Internacional). O Estadão e os outros veículos que aprofundaram os ataques à EBC desde o afastamento da presidenta Dilma Rousseff repetem exaustivamente que é preciso acabar com a “TV do Lula”, ou a “TV da Dilma”, com a “TV traço” etc. Mas escondem de seus leitores e telespectadores informações relevantes como o fato de a TV Brasil ter 10,8% de sua programação destinada a programas educativos, enquanto a Rede Globo, por exemplo, tem apenas 2,3%. Que a TV Brasil veiculou 120 títulos de filmes nacionais, sendo a maior janela para a produção audiovisual nacional na TV aberta do país. A Globo veiculou 87 títulos. Já a Bandeirantes e a Record não veicularam nenhum.
Escodem que na grade de programação da TV Brasil há títulos direcionados para debater temas da diversidade étnico-racial, direitos humanos, cidadania, inclusão; que tem o primeiro programa de televisão voltado para discutir os temas da comunidade LGBT. Nenhum deles têm espaço na mídia privada/comercial.
Por isso, a importância da EBC e da TV Brasil: porque a comunicação pública existe para ser complementar à comunicação privada e a estatal. Complementar porque esses temas não são tratados pela mídia privada, então cabe à comunicação pública abordá-los.
Mas, mesmo ocupando um lugar que é distinto do que ocupam os meios comerciais, a existência da EBC os incomoda demais. Justamente porque ela aborda estes temas, justamente porque ela provoca reflexão sobre os assuntos que são tratados de forma rasteira pela mídia privada. E reafirmo, sem medo de estar cometendo qualquer atentado à liberdade de expressão: existe um oligopólio privado nos meios de comunicação no Brasil que detém o monopólio da circulação da informação, que dita padrões culturais e sociais, que banaliza e chancela a cultura do estupro, o machismo, o racismo e mais recentemente tem dado guarida ao discurso do ódio. E esses meios não aceitam a existência da EBC e o fortalecimento de uma comunicação que promova um discurso, uma narrativa diferente dessa.
Quando o FNDC – fórum que reúne mais de 550 entidades regionais e nacionais – defende a democratização dos meios de comunicação, não defende fechar veículos, não defende censurar ninguém. Nós defendemos a regulação, defendemos o direito de resposta, defendemos mais diversidade, defendemos que se respeitem os direitos humanos em veículos que têm uma função social prevista na Constituição. Onde isso pode ser censura?
Quem está defendendo fechar meios é o Estadão e os que estão fazendo coro em torno da bandeira de acabar com a EBC e de fechar a TV Brasil.
Por fim, a questão do financiamento. O Estado de São Paulo nos acusou de estarmos defendendo que o Estado financie o pensamento único. Mas aqui, mais uma vez, eles negam aos seus leitores a informação de que o Estado já financia o pensamento único difundido pelo oligopólio privado.
Nos últimos 13 anos, “os governos do PT”, para usar a narrativa do Estadão, destinaram 6,5 bilhões de reais apenas para a Rede Globo (isso sem falar do jornal, revistas e outros empresas vinculadas ou grupo Globo). Defendemos que é papel do Estado fomentar a diversidade e a pluralidade, portanto, cabe a ele financiar a comunicação pública e mais: criar políticas para financiar veículos comunitários e alternativos. Isso é defender diversidade e pluralidade.
Se pensam que com esses ataques vão nos intimidar e nos calar, estão enganados. Vamos continuar lutando porque acreditamos que sem uma comunicação democrática não há democracia. E a nossa democracia encontra-se em xeque neste momento. Vamos defendê-la e aprofundá-la!
* Renata Mielli é coordenadora geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação e secretária geral do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé.
*****
Editorial do jornal O Estado de São Paulo
‘Debate’ como eles gostam
24/06/2016
A audiência pública realizada na Câmara dos Deputados na terça-feira passada para debater a situação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) mostrou bem o que a companheirada entende por “debate”: um encontro entre amigos com o objetivo único de chancelar a doutrina do partido ao qual pertencem ou com o qual simpatizam. Nada mais apropriado para uma reunião destinada a discutir a “comunicação pública” – expressão que, na boca da companheirada petista, ganha um significado muito peculiar: trata-se da comunicação com o objetivo exclusivo de espalhar o evangelho do PT.
A EBC está na berlinda desde que o presidente em exercício Michel Temer decidiu desmontar o aparelho petista que dominava a empresa. Logo que assumiu, Temer demitiu da direção da EBC o jornalista Ricardo Melo, que Dilma Rousseff nomeara poucos dias antes de ser afastada da Presidência, numa clara manobra da petista para criar um enclave no governo Temer. Assim, a tropa de choque dilmista teria à sua disposição uma plataforma de comunicação para defender a tese do “golpe”. Tanto isso é verdade que Ricardo Melo, assim que voltou à direção da EBC por força de uma liminar da Justiça, mandou a emissora entrevistar Dilma e ordenou que os veículos da empresa voltassem a tratá-la como “presidenta”.
Esse episódio ilustra o caráter privado da EBC, contrariando o que prometiam seus idealizadores nos idos de 2007, quando a empresa foi criada por ordem do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A EBC deveria ser uma empresa de comunicação pública, a serviço dos cidadãos e voltada para a produção de programas que estimulassem a cultura e ousassem no formato, sem compromissos comerciais e muito menos políticos. Na prática, tornou-se um cabide de empregos para jornalistas amigos do governo petista, que em troca transformaram a EBC em porta-voz do partido.
Isso ficou claro no “debate” promovido pelos apaniguados do PT na Câmara a título de defender a EBC. No jogral ensaiado pela turma, o alvo foi o já surrado “monopólio da radiodifusão comercial”, ao qual a EBC seria o heroico contraponto. “Quem se opõe à construção de uma comunicação pública forte são aqueles que detêm o monopólio da circulação das notícias e das ideias, do discurso sobre a nossa sociedade”, disse Renata Mielli, coordenadora de um tal Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. Como se sabe, “democratização da comunicação” é um eufemismo para o ataque à imprensa livre, que os petistas desde sempre enxergam como instrumentos de poder das “elites”. Nesse caso, o papel da EBC é claríssimo: funcionar como a TV do PT nessa batalha de comunicação, torrando dinheiro público, é claro, pois os petistas não sabem atuar de outra maneira.
Assim, quando a presidente do Conselho Curador da EBC, Rita Freire, disse no “debate” na Câmara que “nós não vamos deixar que toquem na EBC”, ela vocalizou o pensamento dos que se julgam donos da empresa. Em outra ocasião, quando Temer tomou a decisão de mexer na EBC, Rita disse que era preciso “urgentemente” desvincular a empresa da Presidência da República. De fato, essa é uma das patologias congênitas da EBC: ela foi constituída para ser controlada por Lula. O curioso é que somente agora, quando a Presidência não é mais do PT, o Conselho Curador se preocupou com esse problema.
Mas é claro que não se pode cobrar coerência ou racionalidade de quem está defendendo o sequestro do Estado por um partido que se considera o único porta-voz legítimo de todas as minorias e defensor dos direitos do povo. “Onde o índio, o coletivo de mulheres, os LGBTs, o movimento sem-teto e outros tantos teriam espaço?”, perguntou Ricardo Melo, presidente da EBC, que em seguida arrematou: “É isso o que irrita o governo que está aí. O que está acontecendo é, na verdade, não só um desmonte da empresa de comunicação pública, mas um ataque político à democracia". Exótica essa noção de democracia, segundo a qual é legítimo que o dinheiro publico financie a difusão do pensamento único.
A audiência pública realizada na Câmara dos Deputados na terça-feira passada para debater a situação da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) mostrou bem o que a companheirada entende por “debate”: um encontro entre amigos com o objetivo único de chancelar a doutrina do partido ao qual pertencem ou com o qual simpatizam. Nada mais apropriado para uma reunião destinada a discutir a “comunicação pública” – expressão que, na boca da companheirada petista, ganha um significado muito peculiar: trata-se da comunicação com o objetivo exclusivo de espalhar o evangelho do PT.
A EBC está na berlinda desde que o presidente em exercício Michel Temer decidiu desmontar o aparelho petista que dominava a empresa. Logo que assumiu, Temer demitiu da direção da EBC o jornalista Ricardo Melo, que Dilma Rousseff nomeara poucos dias antes de ser afastada da Presidência, numa clara manobra da petista para criar um enclave no governo Temer. Assim, a tropa de choque dilmista teria à sua disposição uma plataforma de comunicação para defender a tese do “golpe”. Tanto isso é verdade que Ricardo Melo, assim que voltou à direção da EBC por força de uma liminar da Justiça, mandou a emissora entrevistar Dilma e ordenou que os veículos da empresa voltassem a tratá-la como “presidenta”.
Esse episódio ilustra o caráter privado da EBC, contrariando o que prometiam seus idealizadores nos idos de 2007, quando a empresa foi criada por ordem do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A EBC deveria ser uma empresa de comunicação pública, a serviço dos cidadãos e voltada para a produção de programas que estimulassem a cultura e ousassem no formato, sem compromissos comerciais e muito menos políticos. Na prática, tornou-se um cabide de empregos para jornalistas amigos do governo petista, que em troca transformaram a EBC em porta-voz do partido.
Isso ficou claro no “debate” promovido pelos apaniguados do PT na Câmara a título de defender a EBC. No jogral ensaiado pela turma, o alvo foi o já surrado “monopólio da radiodifusão comercial”, ao qual a EBC seria o heroico contraponto. “Quem se opõe à construção de uma comunicação pública forte são aqueles que detêm o monopólio da circulação das notícias e das ideias, do discurso sobre a nossa sociedade”, disse Renata Mielli, coordenadora de um tal Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação. Como se sabe, “democratização da comunicação” é um eufemismo para o ataque à imprensa livre, que os petistas desde sempre enxergam como instrumentos de poder das “elites”. Nesse caso, o papel da EBC é claríssimo: funcionar como a TV do PT nessa batalha de comunicação, torrando dinheiro público, é claro, pois os petistas não sabem atuar de outra maneira.
Assim, quando a presidente do Conselho Curador da EBC, Rita Freire, disse no “debate” na Câmara que “nós não vamos deixar que toquem na EBC”, ela vocalizou o pensamento dos que se julgam donos da empresa. Em outra ocasião, quando Temer tomou a decisão de mexer na EBC, Rita disse que era preciso “urgentemente” desvincular a empresa da Presidência da República. De fato, essa é uma das patologias congênitas da EBC: ela foi constituída para ser controlada por Lula. O curioso é que somente agora, quando a Presidência não é mais do PT, o Conselho Curador se preocupou com esse problema.
Mas é claro que não se pode cobrar coerência ou racionalidade de quem está defendendo o sequestro do Estado por um partido que se considera o único porta-voz legítimo de todas as minorias e defensor dos direitos do povo. “Onde o índio, o coletivo de mulheres, os LGBTs, o movimento sem-teto e outros tantos teriam espaço?”, perguntou Ricardo Melo, presidente da EBC, que em seguida arrematou: “É isso o que irrita o governo que está aí. O que está acontecendo é, na verdade, não só um desmonte da empresa de comunicação pública, mas um ataque político à democracia". Exótica essa noção de democracia, segundo a qual é legítimo que o dinheiro publico financie a difusão do pensamento único.
1 comentários:
Ninguem atenta tanto contra a liberdade de expressao como a midia holigarquica monopolista brasileira, os piores inimigos da democracia.
Postar um comentário