Por Saul Leblon, no site Carta Maior:
O que se busca caracterizar hoje no Brasil com a palavra golpe é na verdade um retrocesso equivalente a um ciclo de ‘des-emancipação social’. Sua abrangência e brutalidade correspondem a uma ruptura do pacto da sociedade sem consulta-la, o que dificilmente se completará sem atingir o núcleo duro das garantias individuais, as liberdades civis e os direitos políticos.
Diante da escalada temerária, constrange o silencio daqueles que, ideologicamente, avocam-se a filiação ao republicanismo, à independência de poderes, a isonomia diante da lei e o respeito ao sufrágio universal.
Na devastação de um país trincado pela ofensiva conservadora, submetido a um dispositivo midiático que se aliou a milícias de procuradores e caçadores de cabeças vermelhas, faz falta a voz e a coragem da defesa liberal da Constituição e do Estado de Direito.
Onde estão os verdadeiros liberais brasileiros?
Resulta inútil a busca no ambiente acoelhado das togas que se esgueiram na Suprema Corte.
Ou nos corredores da adesão grosseira do liberalismo acadêmico ao golpe.
Desse deserto avulta a memória de um grande advogado brasileiro, conservador nos costumes, mas ferrenho defensor dos direitos individuais, por isso escudeiro lendário dos perseguidos pelo autoritarismo de qualquer matiz.
A falta que faz um Sobral Pinto no Brasil do golpe de 31 de agosto de 2016 está pesada e medida na sua biografia.
Em abril de 1984, em discurso diante de um milhão de pessoas no comício das Diretas, na Candelária, a voz nonagenária levou a multidão ao delírio ao afirmar aquilo que hoje nenhuma toga pranteada tem o desassombro de repetir:
‘Quero falar à nação brasileira, através desta multidão de um milhão de conterrâneos. Nós queremos que se restaure no Brasil o preceito do artigo primeiro, parágrafo primeiro da Constituição Federal: ‘Todo poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido’. Esta é a minha mensagem; este é o meu desejo; este é o meu propósito’.
Não foi um casamento da conveniência com a oportunidade.
Heráclito Fontoura Sobral Pinto, jurista, advogado mineiro, conhecido como “Senhor Justiça”, ‘o homem que não tinha preço’ - porque nunca cobrou honorários de quase trezentos presos políticos que defendeu, entre eles Carlos Prestes, Arraes, Juscelino etc - jamais tolerou golpes e ditaduras.
Sobral não cobrava causas que envolvessem a defesa das liberdades democráticas.
Como advogado e liberal, considerava seu dever opor-se à violação da Constituição.
Crítico do materialismo comunista (foi um dos fundadores da Pontifícia Universidade Católica, a PUC), chegou a manifestar simpatia pelo golpe de 1964.
Rapidamente corrigiu-se.
Uma semana após a derrubada de Jango, entendeu que a justificativa liberal do movimento era uma farsa.
E diante da farsa, não contemporizou. Escreveria então uma carta famosa ao ditador, general Castelo Branco:
‘Sinto-me no dever de comunicar (…) que os argumentos ora invocados para combater o comunismo foram os mesmos que Mussolini invocou na Itália em 1922 e que Hitler invocou em 1934 na Alemanha. (…) Vivo da advocacia, pela advocacia e, para a advocacia, por entre dificuldades financeiras e profissionais que só Deus conhece. Só tenho uma arma, senhor presidente: a minha palavra franca, leal e indomável’ (9 de abril de 1964).
Era assim o liberal a quem os generais consideravam mais difícil calar do que ao Congresso
Sobral foi o primeiro a utilizar a palavra ‘ditadura’ contra o regime.
Detido em 1969 no AI-5, passou a defender presos políticos, sendo lendária a altivez de sua presença em tribunais militares, a acusar o regime de exceção, dedo em riste em direção aos juízes fardados.
Aos pedidos de tolerância para as ‘inovações democráticas’ introduzidas na Constituição pelos juristas da ditadura, o velho liberal reservava respostas demolidoras.
Vivo fosse, como reagiria Sobral ao entendimento recente da Corte Especial do Tribunal Regional Federa (SC,PR,RS), que isentou o juiz Sergio Moro em violações flagrantes da Lava jato –‘ porque uma operação especial não precisa seguir as regras dos processos comuns’, disseram os magistrados.
O velho jurista provavelmente dispararia seu canhão liberal autentico e indignado. Exatamente como fez diante de considerações equivalentes da ditadura em 1968: ‘Senhores, existe peru à brasileira, mas não democracia à brasileira. A democracia é universal, sem adjetivos’.
Sobral morreu em 1991.
Os liberais que hoje se oferecem à barganha com a história, colocando no plano secundário convicções inegociáveis do bravo jurista, não apenas silenciam diante da violação do artigo primeiro, parágrafo primeiro da Constituição Federal.
Vão muito além disso.
Endossam o ataque maciço, esférico, abusado --perverso em um quadro de recessão brutal-- a vários outros direitos consagrados na Carta de 1988, engrossando um processo de ‘des-emancipação’ social de consequências imponderáveis.
A intolerância aos direitos sociais não é estranha à gênese do liberalismo.
De certa forma, o que se assiste hoje no Brasil é a viagem de volta ao cuore liberal reinante no ventre do capitalismo selvagem dos séculos XVIII e XIX.
O termo ‘des-emancipação’, cunhado pelo filósofo marxista italiano, Domenico Losurdo, no seu livro ‘Contra-História do Liberalismo’, descreve o moedor de carne humana em ação nesses tempos pioneiros.
Mais que negar novos direitos, o que ressalta do bordão liberal nas sociedades inglesa, norte-americana e francesa é a determinação de ‘des-emancipar’.
Ou seja, devolver ao absoluto desamparo a parcela majoritária da sociedade privada dos meios pelos quais se reproduziam as relações de poder e produção no capitalismo.
É disso também que se trata no caso das reformas trabalhista e previdenciária anunciadas pelo golpe no Brasil. O mesmo se pode dizer das consequências da PEC 241 no acesso a direitos públicos essenciais --a escola e a saúde, entre outros.
O conjunto requer uma ruptura de ciclo histórico para se instalar. Mais que um golpe parlamentar, o regime da ‘des-emacipação ‘ no Brasil do século XXI exige a fascistização dos instrumentos de Estado.
A escalada policial de um Ministério Público e de um juiz que assombram a cidadania brasileira ao subordinarem o Estado de Direito a conveniências pessoais e partidárias ilustra o calibre da espiral em marcha. Ou não será disso que se trata quando, há uma semana das eleições o ministro da Justiça do golpe, o notório direitista radical do PSDB, Alexandre Moraes anuncia em campanha novas ações trepidantes da Lava Jato e nesta segunda feira, o juiz Sergio Moro o confirma, prendendo o ex-ministro Palocci?
O ajuste de contas partidário, que não disfarça mais seu propósito seletivo, choca o ovo do arbítrio sob o manto virtuoso do combate à corrupção.
A sigla política que o conservadorismo não conseguiu vencer em quatro eleições presidenciais --e pela qual teme ser derrotado num quinto escrutínio, está sendo dizimada aos olhos da sociedade por um torniquete de interesses que enlaça, à desforra da plutocracia e dos derrotados de 2014, o ‘ajuste de mercado’ e o ‘messianismo jurídico’.
Quem irá detê-los?
O silêncio dos liberais autênticos sobrecarrega a tarefa que é sobretudo da rua.
Mais que o silêncio, o endosso mudo ou ‘técnico’ inocula na sociedade a anestesiante ampola da naturalização de uma ruptura que imobiliza e subjuga.
O decano da Suprema Corte do país apressou-se na semana passada em abençoar a prisão do ex-ministro Guido Mantega, realizada por força policial em um hospital onde o economista acompanhava a esposa, pre-sedada para uma cirurgia contra o câncer (leia a repulsa dos intelectuais de esquerda ao arbítrio http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Nota-publica-em-defesa-da-ordem-constitucional-em-desagravo-a-Guido-Mantega/4/36885
Diante do repúdio generalizado, Sergio Moro recuou expondo a motivação eleitoreira de seu gesto.
Mas o burocrata de toga já havia sancionado o exibicionismo autoritário lendo trechos convenientes da legislação.
Não faiscou ali um grão da dignidade desassombrada de Heráclito Sobral Pinto.
Não teve a coragem, a altivez do velho jurista para arguir uma prisão escorada em motivação indigente: a declaração do empresário Eike Batista ao MP, de que atendera, ‘com recursos próprios’, a uma solicitação do ex-ministro de contribuição eleitoral ao PT -- isonômica, afirmou, conforme uma diretriz de doar ao PT, PSDB, Cristovam Buarque...
Disso tudo Moro pinçou a oportunidade de capturar Mantega em um hospital.
E o ‘liberal’ da Suprema Corte a tudo endossou.
Esse, de qualquer forma, não é um roteiro de duelo entre bons e maus; entre togas acoelhadas e liberais autênticos.
O pano fundo que move as peças –e as define pela cumplicidade ou a resistência-- são asressurgências dos instintos primais do poder econômico, num ciclo global em que o sistema todo passou dos limites e arrasta junto os fracos e os desprovidos de grandeza.
A ordem econômica mundial atravessou o Rubicão e não dá mostras de se autorregenerar como os mercados esperam de si mesmos.
Ao contrário.
Sinais de uma resiliência incurável, que a mídia local minimizou o quanto pode na determinação de afirmar a centralidade do ‘desgoverno’ petista, irrompem de todas as latitudes.
Os bancos centrais já injetaram cerca de U$S 10 trilhões nos mercados financeiros desde 2008, quando tudo começou.
Dinheiro destinado à aquisição de ‘papeis podres’, inflados na farra especulativa e que agora murcham em linha com a anemia global.
Uma epidemia de juros negativos varre o planeta.
A tentativa de firmar as pernas bambas dos mercados financeiros com liquidez ilimitada engessou US$ 14 trilhões investidos em títulos públicos a taxas de retorno zero ou negativas.
Inútil.
As bolsas borbulham, mas antes de ser a recuperação é o aviso da maleita: são as empresas que recompram as próprias ações com o dinheiro grátis fornecidos pelos BCs.
A circularidade estéril rende dividendos à República dos Acionistas, bônus milionários aos diretores.
Zero de emprego.
Não poderia ser diferente.
Um número resume todos os demais: a indústria mundial do aço opera a 60% da capacidade.
A viabilidade siderúrgica exige 80% de uso do potencial instalado.
Não há demanda capaz de promover esse estirão.
Não é só uma conta de chegar.
Algumas coisas se perderam para sempre, dos anos 70 para cá.
O chão estrutural da demanda e do investimento capitalista foi comprometido nos quarenta anos antecedentes em que o consenso neoliberal dizimou o emprego e o salário de qualidade.
Os maiores parques industriais do capitalismo - mas também fatias dos emergentes - foram deslocados para o baixo custo asiático, em espécie ou através das importações de manufaturados (caso do Brasil).
Pior: a vertigem do Estado mínimo suprimiu o arsenal público que assegurava a manutenção da taxa de investimento na economia (financiamento e grandes obras).
Delegou-se à supremacia financeira a centralidade da acumulação. O desenvolvimento, a democracia, a política e demais instancias da sociedade - inclusive a subjetividade do nosso tempo, foram subordinados aos desígnios dos mercados sem lei.
Nos EUA, a classe média foi esfarelada e vive a sua pior situação econômica em 30 anos.
O poder de compra das famílias assalariadas da maior nação capitalista da terra está abaixo do nível pré-crise e mais aquém do pico de 1999.
A fatia dos salários na renda dos EUA é 5% inferior a do início do século.
Estamos falando propositalmente da economia que reuniria os sinais mais encorajadores da ‘retomada’ diuturnamente anunciada e frustrada.
A estagnação evidencia a falta que faz tudo o que a democracia e o Estado cederam ao mercado nesse período.
É nesse deserto que o conservadorismo brasileiro irrompe para golpear a democracia e reproduzir aqui receita que estrebucha no planeta.
A saber: escalpelar direitos e degradar relações de trabalho e assim maximizar a taxa de exploração do plantel em uso, já que não há espaço para incorporar novos contingentes à extração do suor.
A expressão ‘trabalho-livre’ nessas condições, diz Losurdo referindo-se às balizas liberais que ordenaram a exploração da mão de obra nos séculos XVIII e XIX, soa como um oxímoro.
O filósofo italiano recapitula o esforço épico dos destituídos para civilizar essa relação social fundada em interesses díspares, na qual a luta pela democracia social será sempre inconclusa e instável, defrontando-se regulamente com os limites da costura estrutural que a contradiz e repele.
Sem organização permanente, impossível reter conquistas, resistir ao assalto, avançar em direção a novos direitos.
É esse o maior flanco brasileiro evidenciado pela crise e o golpe.
O vazio abriu as porteiras à regressão liberal desavergonhada.
Losurdo chama a atenção para a flexibilidade das ideias diante do cinzel da história.
Originalmente a serviço da revogação da cidadania, posteriormente o liberalismo se adaptaria aos avanços sociais sólidos, como aconteceu nos anos de ouro do Estado do Bem-Estar Social, no pós-guerra europeu.
O elástico, porém, nunca rompeu o vínculo com a origem .
O retorno ao estado bruto agora no Brasil confirma essa resiliência de cepa ao eleger um marco histórico a retroceder: a Carta emancipadora de 1988. E a ferramenta política a aniquilar: a sigla que, tendo feito ressalvas ao resultado da Constituinte de 1988, tornou-se o seu principal esteio ao chegar ao governo.
No livro de leitura pedagógica para entender os dias que correm, e os liberais que se agacham, Losurdo descreve episódios históricos de ‘des-emancipação’ promovidos pela retroescavadeira liberal que agora serve ao golpe no Brasil
Liberais do início do século XVIII, como Defoe e Benthan, viam com simpatia as workhouses erguidas em Bristol, por exemplo.
Essas penitenciárias dissimuladas compunham uma espécie de conjunção do regime escravo com o da liberdade.
Funcionavam para o capitalismo em fraldas como um almoxarifado do exército industrial de reserva, ademais de limparem as ruas das sobras das ‘classes infelizes’, livrando-as dos pobres, os bêbados, os pedintes, os desocupados e suas famílias.
Seriam necessários mais dois séculos, porém, para um candidato a prefeito no Brasil - um liberal - explicitar a intolerância gástrica à pobreza que enoja e causa vômito às sensibilidades superiores.
Como se vê, a seta do tempo não se quebrou. Mais recentemente, um novo choque de eficiência no capitalismo inglês de Thatcher e Cameron individualizaria as ‘casas de trabalho, desobrigando-se o poder público das despesas com alimentação e vigilância.
A nova tecnologia inglesa estoca a mão de obra em sua própria casa. Reduzida a um insumo igual a qualquer matéria-prima, ela só é requisitada do depósito caseiro quando a demanda assim o exigir: o patrão pagará então o equivalente e tão somente ao seu tempo de uso pela engrenagem produtiva.
Há 700 mil ‘insumos humanos’ desse tipo estocados no capitalismo britânico hoje.
A workhouse do século XXI explica, entre outras coisas, por que um marxista coerente, como Jeremy Corbyn --para surpresa dos analistas da Economist que o davam como morto, foi reeleito à presidência do Partido Trabalhista inglês, na semana passada, com votação superior a de um ano atrás (62,5%).
Os ‘des-emancipados’ vegetam, mas não estão mortos.
O que as ressurgências do século XVIII reservam a eles –como o fazem os ideólogos da terceirização brasileira e da prevalência do negociado sobre o legislado na CLT-- é a prevalência do mérito individual sobre o direito social universal.
A platitude baseia-se na crença de que a construção da sociedade é movida pelo interesse egoísta extrapolado, mecanicamente, na prescrição de uma engenharia social rudimentar: a luta individual pela felicidade leva ao fastígio coletivo.
Aclamados pensadores, como Adam Smith, condicionavam na verdade a centralidade do interesse próprio à irrepreensível obediência a referências morais e religiosas que ordenariam um trilho ético rigoroso. Os impulsos unilaterais assim pautados convergiriam para uma comunidade de laços e valores impecavelmente compartilhados.
Nesse ambiente sacro o papel profano do Estado seria mínimo.
No capitalismo realmente existente as coisas se dão de forma um pouco diferente.
Não é difícil –aliás é muito fácil— deduzir o resultado da supremacia do interesse egoísta em sociedades nas quais, ao lado da luta desesperada de milhões de indivíduos desvalidos, avultam interesses corporativos desmesurados, sobretudo aqueles cujo produto é o dinheiro, sua reprodução e as suas consequências.
A crise mundial é obra dessa assimetria leonina.
A inexcedível capacidade da ganância impor seu absolutismo à sociedade, deixa pouco espaço à acomodação espontânea das partes contrapostas dentro do todo.
É sob esse pano de fundo que a ‘des-emancipação’ toca as trombetas do apocalipse social no Brasil, cujo Estado foi assaltado pelos mordomos dos mercados.
A marcha dos acontecimentos não mente.
Quase 52% dos reajustes salariais realizados em julho e agosto ficaram abaixo da taxa de inflação.
A folha de pagamento do setor privado já encolheu cerca de 4% em 12 meses.
A renda dos brasileiros pobres, e a dos mais pobres, despencou quase 9% este ano.
O desemprego que mais cresce no país –1/3 de todas as demissões— atinge o núcleo duro da coesão social, ou seja, os trabalhadores com mais de dois anos de carteira, 45% deles chefes de família.
A estratégia de ‘des-emancipação’ não se satisfará em extorquir uma década de ganhos reais de poder de compra dos salários.
A voragem é imiscível com o todo que a circunda.
Inclua-se: 60 milhões de novos consumidores ingressados no mercado, a cobrar cidadania plena; um salário mínimo 70% maior em poder de compra –inclusive de aposentados, a dificultar a compressão geral da massa salarial; um sistema de habitação popular subsidiado; bancos públicos ativos; uma Petrobras e um BNDES fechando as lacunas da ausência de instrumentos estatais de coordenação econômica; políticas de conteúdo nacional a devolver um impulso industrializante ao país; os desdobramentos de um acróstico –os BRICS– em instrumentos de contrapeso à hegemonia dos mercados financeiros globais…
A faxina requerida é tão virulenta que convoca o árduo trabalho do escovão repressivo e do detergente ideológico para dissolver a resistência indevidamente alojadas em estruturas de consumo, serviços e participação.
As sirenes da história anunciam confrontos intensos no front.
Em seu livro, Domenico Losurdo alerta que a lógica da ‘des-emancipação’ não reconhece barreirasentre o mercado e a política.
A restauração conservadora francesa, por exemplo, depois de deflagrada esfarelou avanços acumulados desde a derrubada da Bastilha.
Entre eles, o sufrágio universal masculino: aprovado em 5 de março de 1848 foi revogado em 1850. Assim também como uma nova lei de imprensa impôs obstáculos econômicos e políticos à sobrevivência da imprensa popular (lembra algo?).
As idas e vindas das conquistas sociais neste longo amanhecer desautoriza qualquer ingenuidade sobre as nuvens que se acumulam no horizonte do golpe no Brasil.
O silencio dos liberais grita a sua omissão diante da tempestade anunciada.
A julgar pelas raízes da história, continuará assim.
Até que as ruas civilizem novamente o mercado e as elites, a ponto de tornar a memória de Sobral Pinto algo mais que uma lápide extravagante no cemitério liberal brasileiro.
O que se busca caracterizar hoje no Brasil com a palavra golpe é na verdade um retrocesso equivalente a um ciclo de ‘des-emancipação social’. Sua abrangência e brutalidade correspondem a uma ruptura do pacto da sociedade sem consulta-la, o que dificilmente se completará sem atingir o núcleo duro das garantias individuais, as liberdades civis e os direitos políticos.
Diante da escalada temerária, constrange o silencio daqueles que, ideologicamente, avocam-se a filiação ao republicanismo, à independência de poderes, a isonomia diante da lei e o respeito ao sufrágio universal.
Na devastação de um país trincado pela ofensiva conservadora, submetido a um dispositivo midiático que se aliou a milícias de procuradores e caçadores de cabeças vermelhas, faz falta a voz e a coragem da defesa liberal da Constituição e do Estado de Direito.
Onde estão os verdadeiros liberais brasileiros?
Resulta inútil a busca no ambiente acoelhado das togas que se esgueiram na Suprema Corte.
Ou nos corredores da adesão grosseira do liberalismo acadêmico ao golpe.
Desse deserto avulta a memória de um grande advogado brasileiro, conservador nos costumes, mas ferrenho defensor dos direitos individuais, por isso escudeiro lendário dos perseguidos pelo autoritarismo de qualquer matiz.
A falta que faz um Sobral Pinto no Brasil do golpe de 31 de agosto de 2016 está pesada e medida na sua biografia.
Em abril de 1984, em discurso diante de um milhão de pessoas no comício das Diretas, na Candelária, a voz nonagenária levou a multidão ao delírio ao afirmar aquilo que hoje nenhuma toga pranteada tem o desassombro de repetir:
‘Quero falar à nação brasileira, através desta multidão de um milhão de conterrâneos. Nós queremos que se restaure no Brasil o preceito do artigo primeiro, parágrafo primeiro da Constituição Federal: ‘Todo poder emana do povo e em seu nome deve ser exercido’. Esta é a minha mensagem; este é o meu desejo; este é o meu propósito’.
Não foi um casamento da conveniência com a oportunidade.
Heráclito Fontoura Sobral Pinto, jurista, advogado mineiro, conhecido como “Senhor Justiça”, ‘o homem que não tinha preço’ - porque nunca cobrou honorários de quase trezentos presos políticos que defendeu, entre eles Carlos Prestes, Arraes, Juscelino etc - jamais tolerou golpes e ditaduras.
Sobral não cobrava causas que envolvessem a defesa das liberdades democráticas.
Como advogado e liberal, considerava seu dever opor-se à violação da Constituição.
Crítico do materialismo comunista (foi um dos fundadores da Pontifícia Universidade Católica, a PUC), chegou a manifestar simpatia pelo golpe de 1964.
Rapidamente corrigiu-se.
Uma semana após a derrubada de Jango, entendeu que a justificativa liberal do movimento era uma farsa.
E diante da farsa, não contemporizou. Escreveria então uma carta famosa ao ditador, general Castelo Branco:
‘Sinto-me no dever de comunicar (…) que os argumentos ora invocados para combater o comunismo foram os mesmos que Mussolini invocou na Itália em 1922 e que Hitler invocou em 1934 na Alemanha. (…) Vivo da advocacia, pela advocacia e, para a advocacia, por entre dificuldades financeiras e profissionais que só Deus conhece. Só tenho uma arma, senhor presidente: a minha palavra franca, leal e indomável’ (9 de abril de 1964).
Era assim o liberal a quem os generais consideravam mais difícil calar do que ao Congresso
Sobral foi o primeiro a utilizar a palavra ‘ditadura’ contra o regime.
Detido em 1969 no AI-5, passou a defender presos políticos, sendo lendária a altivez de sua presença em tribunais militares, a acusar o regime de exceção, dedo em riste em direção aos juízes fardados.
Aos pedidos de tolerância para as ‘inovações democráticas’ introduzidas na Constituição pelos juristas da ditadura, o velho liberal reservava respostas demolidoras.
Vivo fosse, como reagiria Sobral ao entendimento recente da Corte Especial do Tribunal Regional Federa (SC,PR,RS), que isentou o juiz Sergio Moro em violações flagrantes da Lava jato –‘ porque uma operação especial não precisa seguir as regras dos processos comuns’, disseram os magistrados.
O velho jurista provavelmente dispararia seu canhão liberal autentico e indignado. Exatamente como fez diante de considerações equivalentes da ditadura em 1968: ‘Senhores, existe peru à brasileira, mas não democracia à brasileira. A democracia é universal, sem adjetivos’.
Sobral morreu em 1991.
Os liberais que hoje se oferecem à barganha com a história, colocando no plano secundário convicções inegociáveis do bravo jurista, não apenas silenciam diante da violação do artigo primeiro, parágrafo primeiro da Constituição Federal.
Vão muito além disso.
Endossam o ataque maciço, esférico, abusado --perverso em um quadro de recessão brutal-- a vários outros direitos consagrados na Carta de 1988, engrossando um processo de ‘des-emancipação’ social de consequências imponderáveis.
A intolerância aos direitos sociais não é estranha à gênese do liberalismo.
De certa forma, o que se assiste hoje no Brasil é a viagem de volta ao cuore liberal reinante no ventre do capitalismo selvagem dos séculos XVIII e XIX.
O termo ‘des-emancipação’, cunhado pelo filósofo marxista italiano, Domenico Losurdo, no seu livro ‘Contra-História do Liberalismo’, descreve o moedor de carne humana em ação nesses tempos pioneiros.
Mais que negar novos direitos, o que ressalta do bordão liberal nas sociedades inglesa, norte-americana e francesa é a determinação de ‘des-emancipar’.
Ou seja, devolver ao absoluto desamparo a parcela majoritária da sociedade privada dos meios pelos quais se reproduziam as relações de poder e produção no capitalismo.
É disso também que se trata no caso das reformas trabalhista e previdenciária anunciadas pelo golpe no Brasil. O mesmo se pode dizer das consequências da PEC 241 no acesso a direitos públicos essenciais --a escola e a saúde, entre outros.
O conjunto requer uma ruptura de ciclo histórico para se instalar. Mais que um golpe parlamentar, o regime da ‘des-emacipação ‘ no Brasil do século XXI exige a fascistização dos instrumentos de Estado.
A escalada policial de um Ministério Público e de um juiz que assombram a cidadania brasileira ao subordinarem o Estado de Direito a conveniências pessoais e partidárias ilustra o calibre da espiral em marcha. Ou não será disso que se trata quando, há uma semana das eleições o ministro da Justiça do golpe, o notório direitista radical do PSDB, Alexandre Moraes anuncia em campanha novas ações trepidantes da Lava Jato e nesta segunda feira, o juiz Sergio Moro o confirma, prendendo o ex-ministro Palocci?
O ajuste de contas partidário, que não disfarça mais seu propósito seletivo, choca o ovo do arbítrio sob o manto virtuoso do combate à corrupção.
A sigla política que o conservadorismo não conseguiu vencer em quatro eleições presidenciais --e pela qual teme ser derrotado num quinto escrutínio, está sendo dizimada aos olhos da sociedade por um torniquete de interesses que enlaça, à desforra da plutocracia e dos derrotados de 2014, o ‘ajuste de mercado’ e o ‘messianismo jurídico’.
Quem irá detê-los?
O silêncio dos liberais autênticos sobrecarrega a tarefa que é sobretudo da rua.
Mais que o silêncio, o endosso mudo ou ‘técnico’ inocula na sociedade a anestesiante ampola da naturalização de uma ruptura que imobiliza e subjuga.
O decano da Suprema Corte do país apressou-se na semana passada em abençoar a prisão do ex-ministro Guido Mantega, realizada por força policial em um hospital onde o economista acompanhava a esposa, pre-sedada para uma cirurgia contra o câncer (leia a repulsa dos intelectuais de esquerda ao arbítrio http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/Nota-publica-em-defesa-da-ordem-constitucional-em-desagravo-a-Guido-Mantega/4/36885
Diante do repúdio generalizado, Sergio Moro recuou expondo a motivação eleitoreira de seu gesto.
Mas o burocrata de toga já havia sancionado o exibicionismo autoritário lendo trechos convenientes da legislação.
Não faiscou ali um grão da dignidade desassombrada de Heráclito Sobral Pinto.
Não teve a coragem, a altivez do velho jurista para arguir uma prisão escorada em motivação indigente: a declaração do empresário Eike Batista ao MP, de que atendera, ‘com recursos próprios’, a uma solicitação do ex-ministro de contribuição eleitoral ao PT -- isonômica, afirmou, conforme uma diretriz de doar ao PT, PSDB, Cristovam Buarque...
Disso tudo Moro pinçou a oportunidade de capturar Mantega em um hospital.
E o ‘liberal’ da Suprema Corte a tudo endossou.
Esse, de qualquer forma, não é um roteiro de duelo entre bons e maus; entre togas acoelhadas e liberais autênticos.
O pano fundo que move as peças –e as define pela cumplicidade ou a resistência-- são asressurgências dos instintos primais do poder econômico, num ciclo global em que o sistema todo passou dos limites e arrasta junto os fracos e os desprovidos de grandeza.
A ordem econômica mundial atravessou o Rubicão e não dá mostras de se autorregenerar como os mercados esperam de si mesmos.
Ao contrário.
Sinais de uma resiliência incurável, que a mídia local minimizou o quanto pode na determinação de afirmar a centralidade do ‘desgoverno’ petista, irrompem de todas as latitudes.
Os bancos centrais já injetaram cerca de U$S 10 trilhões nos mercados financeiros desde 2008, quando tudo começou.
Dinheiro destinado à aquisição de ‘papeis podres’, inflados na farra especulativa e que agora murcham em linha com a anemia global.
Uma epidemia de juros negativos varre o planeta.
A tentativa de firmar as pernas bambas dos mercados financeiros com liquidez ilimitada engessou US$ 14 trilhões investidos em títulos públicos a taxas de retorno zero ou negativas.
Inútil.
As bolsas borbulham, mas antes de ser a recuperação é o aviso da maleita: são as empresas que recompram as próprias ações com o dinheiro grátis fornecidos pelos BCs.
A circularidade estéril rende dividendos à República dos Acionistas, bônus milionários aos diretores.
Zero de emprego.
Não poderia ser diferente.
Um número resume todos os demais: a indústria mundial do aço opera a 60% da capacidade.
A viabilidade siderúrgica exige 80% de uso do potencial instalado.
Não há demanda capaz de promover esse estirão.
Não é só uma conta de chegar.
Algumas coisas se perderam para sempre, dos anos 70 para cá.
O chão estrutural da demanda e do investimento capitalista foi comprometido nos quarenta anos antecedentes em que o consenso neoliberal dizimou o emprego e o salário de qualidade.
Os maiores parques industriais do capitalismo - mas também fatias dos emergentes - foram deslocados para o baixo custo asiático, em espécie ou através das importações de manufaturados (caso do Brasil).
Pior: a vertigem do Estado mínimo suprimiu o arsenal público que assegurava a manutenção da taxa de investimento na economia (financiamento e grandes obras).
Delegou-se à supremacia financeira a centralidade da acumulação. O desenvolvimento, a democracia, a política e demais instancias da sociedade - inclusive a subjetividade do nosso tempo, foram subordinados aos desígnios dos mercados sem lei.
Nos EUA, a classe média foi esfarelada e vive a sua pior situação econômica em 30 anos.
O poder de compra das famílias assalariadas da maior nação capitalista da terra está abaixo do nível pré-crise e mais aquém do pico de 1999.
A fatia dos salários na renda dos EUA é 5% inferior a do início do século.
Estamos falando propositalmente da economia que reuniria os sinais mais encorajadores da ‘retomada’ diuturnamente anunciada e frustrada.
A estagnação evidencia a falta que faz tudo o que a democracia e o Estado cederam ao mercado nesse período.
É nesse deserto que o conservadorismo brasileiro irrompe para golpear a democracia e reproduzir aqui receita que estrebucha no planeta.
A saber: escalpelar direitos e degradar relações de trabalho e assim maximizar a taxa de exploração do plantel em uso, já que não há espaço para incorporar novos contingentes à extração do suor.
A expressão ‘trabalho-livre’ nessas condições, diz Losurdo referindo-se às balizas liberais que ordenaram a exploração da mão de obra nos séculos XVIII e XIX, soa como um oxímoro.
O filósofo italiano recapitula o esforço épico dos destituídos para civilizar essa relação social fundada em interesses díspares, na qual a luta pela democracia social será sempre inconclusa e instável, defrontando-se regulamente com os limites da costura estrutural que a contradiz e repele.
Sem organização permanente, impossível reter conquistas, resistir ao assalto, avançar em direção a novos direitos.
É esse o maior flanco brasileiro evidenciado pela crise e o golpe.
O vazio abriu as porteiras à regressão liberal desavergonhada.
Losurdo chama a atenção para a flexibilidade das ideias diante do cinzel da história.
Originalmente a serviço da revogação da cidadania, posteriormente o liberalismo se adaptaria aos avanços sociais sólidos, como aconteceu nos anos de ouro do Estado do Bem-Estar Social, no pós-guerra europeu.
O elástico, porém, nunca rompeu o vínculo com a origem .
O retorno ao estado bruto agora no Brasil confirma essa resiliência de cepa ao eleger um marco histórico a retroceder: a Carta emancipadora de 1988. E a ferramenta política a aniquilar: a sigla que, tendo feito ressalvas ao resultado da Constituinte de 1988, tornou-se o seu principal esteio ao chegar ao governo.
No livro de leitura pedagógica para entender os dias que correm, e os liberais que se agacham, Losurdo descreve episódios históricos de ‘des-emancipação’ promovidos pela retroescavadeira liberal que agora serve ao golpe no Brasil
Liberais do início do século XVIII, como Defoe e Benthan, viam com simpatia as workhouses erguidas em Bristol, por exemplo.
Essas penitenciárias dissimuladas compunham uma espécie de conjunção do regime escravo com o da liberdade.
Funcionavam para o capitalismo em fraldas como um almoxarifado do exército industrial de reserva, ademais de limparem as ruas das sobras das ‘classes infelizes’, livrando-as dos pobres, os bêbados, os pedintes, os desocupados e suas famílias.
Seriam necessários mais dois séculos, porém, para um candidato a prefeito no Brasil - um liberal - explicitar a intolerância gástrica à pobreza que enoja e causa vômito às sensibilidades superiores.
Como se vê, a seta do tempo não se quebrou. Mais recentemente, um novo choque de eficiência no capitalismo inglês de Thatcher e Cameron individualizaria as ‘casas de trabalho, desobrigando-se o poder público das despesas com alimentação e vigilância.
A nova tecnologia inglesa estoca a mão de obra em sua própria casa. Reduzida a um insumo igual a qualquer matéria-prima, ela só é requisitada do depósito caseiro quando a demanda assim o exigir: o patrão pagará então o equivalente e tão somente ao seu tempo de uso pela engrenagem produtiva.
Há 700 mil ‘insumos humanos’ desse tipo estocados no capitalismo britânico hoje.
A workhouse do século XXI explica, entre outras coisas, por que um marxista coerente, como Jeremy Corbyn --para surpresa dos analistas da Economist que o davam como morto, foi reeleito à presidência do Partido Trabalhista inglês, na semana passada, com votação superior a de um ano atrás (62,5%).
Os ‘des-emancipados’ vegetam, mas não estão mortos.
O que as ressurgências do século XVIII reservam a eles –como o fazem os ideólogos da terceirização brasileira e da prevalência do negociado sobre o legislado na CLT-- é a prevalência do mérito individual sobre o direito social universal.
A platitude baseia-se na crença de que a construção da sociedade é movida pelo interesse egoísta extrapolado, mecanicamente, na prescrição de uma engenharia social rudimentar: a luta individual pela felicidade leva ao fastígio coletivo.
Aclamados pensadores, como Adam Smith, condicionavam na verdade a centralidade do interesse próprio à irrepreensível obediência a referências morais e religiosas que ordenariam um trilho ético rigoroso. Os impulsos unilaterais assim pautados convergiriam para uma comunidade de laços e valores impecavelmente compartilhados.
Nesse ambiente sacro o papel profano do Estado seria mínimo.
No capitalismo realmente existente as coisas se dão de forma um pouco diferente.
Não é difícil –aliás é muito fácil— deduzir o resultado da supremacia do interesse egoísta em sociedades nas quais, ao lado da luta desesperada de milhões de indivíduos desvalidos, avultam interesses corporativos desmesurados, sobretudo aqueles cujo produto é o dinheiro, sua reprodução e as suas consequências.
A crise mundial é obra dessa assimetria leonina.
A inexcedível capacidade da ganância impor seu absolutismo à sociedade, deixa pouco espaço à acomodação espontânea das partes contrapostas dentro do todo.
É sob esse pano de fundo que a ‘des-emancipação’ toca as trombetas do apocalipse social no Brasil, cujo Estado foi assaltado pelos mordomos dos mercados.
A marcha dos acontecimentos não mente.
Quase 52% dos reajustes salariais realizados em julho e agosto ficaram abaixo da taxa de inflação.
A folha de pagamento do setor privado já encolheu cerca de 4% em 12 meses.
A renda dos brasileiros pobres, e a dos mais pobres, despencou quase 9% este ano.
O desemprego que mais cresce no país –1/3 de todas as demissões— atinge o núcleo duro da coesão social, ou seja, os trabalhadores com mais de dois anos de carteira, 45% deles chefes de família.
A estratégia de ‘des-emancipação’ não se satisfará em extorquir uma década de ganhos reais de poder de compra dos salários.
A voragem é imiscível com o todo que a circunda.
Inclua-se: 60 milhões de novos consumidores ingressados no mercado, a cobrar cidadania plena; um salário mínimo 70% maior em poder de compra –inclusive de aposentados, a dificultar a compressão geral da massa salarial; um sistema de habitação popular subsidiado; bancos públicos ativos; uma Petrobras e um BNDES fechando as lacunas da ausência de instrumentos estatais de coordenação econômica; políticas de conteúdo nacional a devolver um impulso industrializante ao país; os desdobramentos de um acróstico –os BRICS– em instrumentos de contrapeso à hegemonia dos mercados financeiros globais…
A faxina requerida é tão virulenta que convoca o árduo trabalho do escovão repressivo e do detergente ideológico para dissolver a resistência indevidamente alojadas em estruturas de consumo, serviços e participação.
As sirenes da história anunciam confrontos intensos no front.
Em seu livro, Domenico Losurdo alerta que a lógica da ‘des-emancipação’ não reconhece barreirasentre o mercado e a política.
A restauração conservadora francesa, por exemplo, depois de deflagrada esfarelou avanços acumulados desde a derrubada da Bastilha.
Entre eles, o sufrágio universal masculino: aprovado em 5 de março de 1848 foi revogado em 1850. Assim também como uma nova lei de imprensa impôs obstáculos econômicos e políticos à sobrevivência da imprensa popular (lembra algo?).
As idas e vindas das conquistas sociais neste longo amanhecer desautoriza qualquer ingenuidade sobre as nuvens que se acumulam no horizonte do golpe no Brasil.
O silencio dos liberais grita a sua omissão diante da tempestade anunciada.
A julgar pelas raízes da história, continuará assim.
Até que as ruas civilizem novamente o mercado e as elites, a ponto de tornar a memória de Sobral Pinto algo mais que uma lápide extravagante no cemitério liberal brasileiro.
1 comentários:
Em resumo:
Tâmo ferrados !!!
A grande pergunta é:
Como sair desta JOSTA !!!
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