A declaração do ex-secretário de juventude do governo Temer, Bruno Júlio, gerou comoções diversas tanto na vida real como na vida virtual. Várias pessoas apoiaram-no em relação à frase, sobre o massacre no presídio de Manaus, de que “tinha que ter era uma chacina por dia”. Ao lado de outras, condenei veementemente sua declaração – apesar de saber que é isso que a parte majoritária da sociedade deseja: soluções rápidas e práticas para os indesejados e os indesejáveis.
Concordo com Jefferson Lima, ex-secretário de juventude do governo Dilma Rousseff, quando disse que com tal declaração Bruno Júlio se afasta da figura de gestor público e se aproxima da de um “agitador que estimula o ódio”. Entretanto, queria dizer aqui que esta “solução” já está sendo posta em prática, ainda que de maneira invisível.
Não me surpreende tal declaração, ainda mais vindo de onde vem: de um filho de um deputado que está enrolado na Máfia das Sanguessugas, ou de um cara que foi acusado pela ex-namorada de agressão. Surpreende, entretanto, o fato de Bruno Júlio ter declarado isso enquanto secretário de juventude (de um governo ilegítimo, mas isso é detalhe). A mim, pelo menos, mostra um grande desconhecimento técnico e político acerca da pasta que gerenciava.
Chama a atenção tal declaração vir de um jovem que ocupava um secretariado referente ao seu segmento social – a juventude. Provavelmente ele, galgado a tal posto, possua desconhecimento de fato dos assuntos relacionados à sua pasta – como vem sendo a tônica no atual governo federal, ilegítimo. Por muito pouco Bruno Júlio não ocupara a pasta de subsecretário de Juventude em Minas Gerais, comandando pelo tucano travestido de petista Fernando Pimentel. Mas, apesar dos pesares, eu não acho totalmente inválida a infeliz declaração do ex-secretário temeroso. Mesmo porque o Brasil já vive um cenário diário de chacinas, principalmente entre a população juvenil.
O Mapa da Violência de 2014, focado na questão da mortalidade juvenil pelo o que é chamado de fatores externos (homicídios, suicídios e acidentes de trânsito), traz alguns pontos a partir dos quais podemos dizer que tal frase já se realiza de alguma forma. No ano de 2012, o IBGE estimava haver 52,2 milhões de jovens no país, representando mais de um quarto da população geral (26,9%). Entretanto, o DATASUS (banco de dados do Ministério da Saúde) registra para esse ano um total de 30.072 homicídios de jovens, 53,4% do total geral de homicídios ocorridos em todo o país (em torno de 56 mil). Em 2012, um Carandiru juvenil acontecia a cada um dia e meio no Brasil. E se trata de um Carandiru preto: para cada jovem branco morto, três jovens negros eram são vitimados.
O problema da violência no país não se encontra apenas no âmbito da “maldade das pessoas”, como se afirma no senso comum (ou por uma vertente psicossociológica equivocada, ao estilo lombrosiano). Fia-se essa situação em uma questão estrutural e crônica de desigualdades diversas – quanto mais desigual uma nação, mais violenta ela é; a América Latina hoje vive essa realidade, e com o andamento do golpe de estado promovido em 2016 é provável que o Brasil se torne referência nesse processo de promoção de desigualdades.
E podem estar certos de que a violência poderá recrudescer e se tornar cada vez mais impiedosa – tanto por esse processo de formação de desigualdades como pela relação odienta que estamos estabelecendo com nossos pares. A declaração de Bruno Júlio é uma pequena ponta de um iceberg nessa questão.
A fala do ex-secretário revela, mais do que um fascismo inerente à sua trajetória, um desconhecimento do lugar que ocupava. Se Bruno Júlio fosse uma pessoa que se percebesse enquanto gestor de uma pasta de juventude, se fosse minimamente inteligente para saber o que faz (independentemente da sua coloração partidária, pouco me importando ser coxinha), não teria emitido tal palpite infeliz. Mas já saberia, de antemão, que as chacinas que ele deseja acontecer por semana nos presídios já ocorrem diariamente nas ruas, e que não teria necessidade de pedir mais.
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