Por Antonio Martins, no site Outras Palavras:
Há um elefante sob o tapete da política institucional brasileira, desde ontem. Ao reconhecer que há sinais de verdade nas delações dos executivos da Odebrecht e pedir investigação sobre os expoentes máximos dos principais partidos do país, o ministro Edson Fachin, do STF, criou um fato político extraordinário. Se interpretado corretamente e se – mais importante – houver coragem para tirar dele todas as suas dolorosas consequências, ele poderá reverter a maré de retrocessos que varre o país. Porque seus três sentidos principais são claros.
Primeiro. Enfraqueceu-se dramaticamente, porque tornou-se inverossímil, o discurso que associava corrupção a esquerda. Este discurso marca o cenário político e o debate de ideias no Brasil há doze anos, desde o “Mensalão”. Levou ao golpe parlamentar de 2016. E manteve eficácia depois. No governo Temer, cada ataque aos direitos sociais, cada nova concessão às elites, é justificado como uma suposta correção de rumos, como um ato para por fim à “lambança” que a mídia associa – até agora com sucesso – aos governos Lula e Dilma.
A lista de Fachin desmonta esta história da carochinha, esta conversa para brasileiro dormir. Ela escancara que a corrupção está no DNA do sistema político. As eleições são caríssimas. Ninguém se elege sem dinheiro das maiores empresas. Todas elas exigem, como contrapartida, que os governantes executem seus projetos; que os senadores, deputados e vereadores votem leis que as favorecem. A representação popular está sequestrada. Na lista de Fachin estão todos os ministros importantes de Temer; todos os tucanos emplumados – Aécio, Serra, Alckmin; todos os ministros importantes do governo Temer; todos os cardeais do Congresso que comandam a aprovação das leis antissociais. O álibi acabou, o discurso esvaziou-se, o rei está nu. Nenhum desses retrocessos poderá ser adotado a pretexto de “limpar” o país. Faz enorme diferença.
O segundo sentido da lista de Fachin é ainda mais crucial – porém, doloroso também para a esquerda histórica. Ao chegar aos governos, ela foi capturada pelas lógicas de conluio entre o poder econômico e o politico. Lula e Dilma não tocaram nos direitos dos humildes – nem nos privilégios da Casa Grande. Nos seus governos, as empreiteiras, os bancos, as grandes empresas multinacionais e as “campeãs nacionais” continuaram dando as cartas.
Águas passadas não movem moinhos. Mas haverá disposição de agir diferente, no futuro? Lula é candidatíssimo em 2018. Chico Alencar também. Mas o que o PT, o PSOL ou o PCdoB, por exemplo, têm a dizer sobre a Reforma Política? Se chegarem ao governo, continuarão reféns de um Congresso eleito com dinheiro do poder econômico e subordinado aos seus lobbies?
O terceiro sentido da lista da Odebrecht pode ser encarado como uma provocação que não é dirigida nem ao sistema representativo, nem à esquerda histórica – mas aos movimentos e às pessoas que querem Outra Política. Não é o momento de assumirmos a responsabilidade de fazer, nós mesmos, aquilo que cobramos — em vão — dos que sabemos que não nos representam? Intuímos, com muito realismo, que a Reforma Política não virá dos partidos. Mas é cômodo criticá-los.
Se a falsidade do sistema politico está exposta; e se já sabemos que a esquerda deste sistema acomodou-se a ele, por que não assumir o protagonismo? Uma Reforma Política profunda pode ser, também, popular. Pode começar, por exemplo, com uma proposta muito concreta: submeter a referendo revogatório, todas as principais medidas adotadas no governo Temer. A terceirização. A entrega do Pré-Sal. O congelamento dos gastos sociais. Os obstáculos à demarcação de terras indígenas e dos povos originários. A contra-reforma da Previdência, caso o Congresso ouse aprová-la.
Uma Reforma Política autêntica não deve ser feita para aperfeiçoar o sistema de representação – mas para questioná-lo, colocá-lo em xeque e, em especial, criar mecanismos de democracia direta e participativa. Ela pode incluir, por exemplo, facilitar os plebiscitos e referendos sobre temas cruciais; permitir candidaturas autônomas, independentes de partidos, a todos os postos eletivos; limitar os salários dos representantes; eliminar privilégios como o custeio da educação e saúde privadas; instituir o Orçamento Participativo, inclusive por meios eletrônicos, em todos os níveis de governo; submeter os mandatos a consultas revogatórias; prever mecanismos para que os próprios cidadãos intervenham na redação de leis complexas, que exigem saberes específicos.
Subitamente, o caráter corrupto e primitivo do sistema político brasileiro está exposto. Tudo indica, também, que a disposição de reformá-lo não partirá de seu interior. A questão é: nós, que sabemos de seus limites e misérias, estamos dispostos lutar pela transformação? Ou transferiremos, nós também, esta responsabilidade?
Há um elefante sob o tapete da política institucional brasileira, desde ontem. Ao reconhecer que há sinais de verdade nas delações dos executivos da Odebrecht e pedir investigação sobre os expoentes máximos dos principais partidos do país, o ministro Edson Fachin, do STF, criou um fato político extraordinário. Se interpretado corretamente e se – mais importante – houver coragem para tirar dele todas as suas dolorosas consequências, ele poderá reverter a maré de retrocessos que varre o país. Porque seus três sentidos principais são claros.
Primeiro. Enfraqueceu-se dramaticamente, porque tornou-se inverossímil, o discurso que associava corrupção a esquerda. Este discurso marca o cenário político e o debate de ideias no Brasil há doze anos, desde o “Mensalão”. Levou ao golpe parlamentar de 2016. E manteve eficácia depois. No governo Temer, cada ataque aos direitos sociais, cada nova concessão às elites, é justificado como uma suposta correção de rumos, como um ato para por fim à “lambança” que a mídia associa – até agora com sucesso – aos governos Lula e Dilma.
A lista de Fachin desmonta esta história da carochinha, esta conversa para brasileiro dormir. Ela escancara que a corrupção está no DNA do sistema político. As eleições são caríssimas. Ninguém se elege sem dinheiro das maiores empresas. Todas elas exigem, como contrapartida, que os governantes executem seus projetos; que os senadores, deputados e vereadores votem leis que as favorecem. A representação popular está sequestrada. Na lista de Fachin estão todos os ministros importantes de Temer; todos os tucanos emplumados – Aécio, Serra, Alckmin; todos os ministros importantes do governo Temer; todos os cardeais do Congresso que comandam a aprovação das leis antissociais. O álibi acabou, o discurso esvaziou-se, o rei está nu. Nenhum desses retrocessos poderá ser adotado a pretexto de “limpar” o país. Faz enorme diferença.
O segundo sentido da lista de Fachin é ainda mais crucial – porém, doloroso também para a esquerda histórica. Ao chegar aos governos, ela foi capturada pelas lógicas de conluio entre o poder econômico e o politico. Lula e Dilma não tocaram nos direitos dos humildes – nem nos privilégios da Casa Grande. Nos seus governos, as empreiteiras, os bancos, as grandes empresas multinacionais e as “campeãs nacionais” continuaram dando as cartas.
Águas passadas não movem moinhos. Mas haverá disposição de agir diferente, no futuro? Lula é candidatíssimo em 2018. Chico Alencar também. Mas o que o PT, o PSOL ou o PCdoB, por exemplo, têm a dizer sobre a Reforma Política? Se chegarem ao governo, continuarão reféns de um Congresso eleito com dinheiro do poder econômico e subordinado aos seus lobbies?
O terceiro sentido da lista da Odebrecht pode ser encarado como uma provocação que não é dirigida nem ao sistema representativo, nem à esquerda histórica – mas aos movimentos e às pessoas que querem Outra Política. Não é o momento de assumirmos a responsabilidade de fazer, nós mesmos, aquilo que cobramos — em vão — dos que sabemos que não nos representam? Intuímos, com muito realismo, que a Reforma Política não virá dos partidos. Mas é cômodo criticá-los.
Se a falsidade do sistema politico está exposta; e se já sabemos que a esquerda deste sistema acomodou-se a ele, por que não assumir o protagonismo? Uma Reforma Política profunda pode ser, também, popular. Pode começar, por exemplo, com uma proposta muito concreta: submeter a referendo revogatório, todas as principais medidas adotadas no governo Temer. A terceirização. A entrega do Pré-Sal. O congelamento dos gastos sociais. Os obstáculos à demarcação de terras indígenas e dos povos originários. A contra-reforma da Previdência, caso o Congresso ouse aprová-la.
Uma Reforma Política autêntica não deve ser feita para aperfeiçoar o sistema de representação – mas para questioná-lo, colocá-lo em xeque e, em especial, criar mecanismos de democracia direta e participativa. Ela pode incluir, por exemplo, facilitar os plebiscitos e referendos sobre temas cruciais; permitir candidaturas autônomas, independentes de partidos, a todos os postos eletivos; limitar os salários dos representantes; eliminar privilégios como o custeio da educação e saúde privadas; instituir o Orçamento Participativo, inclusive por meios eletrônicos, em todos os níveis de governo; submeter os mandatos a consultas revogatórias; prever mecanismos para que os próprios cidadãos intervenham na redação de leis complexas, que exigem saberes específicos.
Subitamente, o caráter corrupto e primitivo do sistema político brasileiro está exposto. Tudo indica, também, que a disposição de reformá-lo não partirá de seu interior. A questão é: nós, que sabemos de seus limites e misérias, estamos dispostos lutar pela transformação? Ou transferiremos, nós também, esta responsabilidade?
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