Venezuela. Foto: Jornalistas Livres |
A indignação do conservadorismo verde-amarelo diante Assembléia Constituinte Venezuelana só pode ser vista como um insulto aos brasileiros. Do ponto de vista de democracia, não tem nenhuma reserva moral ou política para reclamar da situação.
Neste domingo, os venezuelanos irão às urnas para escolher 545 membros de uma Assembléia Constituinte, que serão encarregados de formular uma nova carta de leis para o país.
Você deve ter lido e ouvido críticas ao processo, e eu aconselho a leitura de uma entrevista do jurista Luiz Moreira, aqui neste espaço, para alguns esclarecimentos.
Em qualquer caso, não vamos perder de vista o principal: enquanto o país vizinho, descrito como uma "ditadura", matriz do "populismo" bolivariano, realiza eleições para permitir que a população possa escolher, no voto em urna, direto, como ficará a ordem econômica, social e política do país, os brasileiros estão reduzidos a uma posição de cativeiro político. Alguma dúvida?
São parlamentares, escolhidos pelas eleições mais corruptas de nossa história, que estão definindo o futuro de uma população de 200 milhões de pessoas, numa escandalosa Constituinte sem voto. Descaradamente, jamais submeteram seus projetos a qualquer tipo de consulta popular. Sabem que seriam rejeitados por margens gigantescas, como mostram pesquisas com índices de reprovação na base se cinco contra um ou até mais. Foi assim que se enterrou uma legislação trabalhista de mais de 70 anos. É assim que se pretende passar a faca na Previdência Social. Também se aprovou uma lei de limites de gastos que irá cortar pela raiz o embrião de Estado de bem-estar social e impor ao país um regime de austeridade que pretende bloquear investimentos necessários ao desenvolvimento por duas décadas.
Não custa lembrar que eles afastaram uma presidente sem crime de responsabilidade configurado e, mais uma vez em troca de mais dinheiro, pretendem manter em seu cargo um sucessor comprometido definitivamente em denúncias de corrupção.
Temer é, na prática, o Constituinte do Brasil 2017. Henrique Meirelles, aquele que recebeu R$ 217 milhões em cinco anos, preferindo deixar tudo depositado no exterior, é seu relator.
Eles não enfrentam operações da CIA. Nem uma oposição que comete atos terroristas que a imprensa amiga acoberta. Seu primeiro ato de governo foi repassar a riqueza do pré-sal para os padrinhos do Norte. Recusando-se a fazer o mesmo, o governo Maduro resiste. Aos trancos, em muitos barrancos. Mas não entrega. É por essa razão -- que nada tem de nobre -- que pretendem derrotá-lo de qualquer maneira, sob qualquer pretexto.
A Venezuela enfrenta uma situação de conflagração política aberta -- e é preciso ser muito desonesto para apontar erros cometidos pelo governo Maduro como principal causa da situação.
Conhecido por uma elite que mantém reservas, no exterior, infinitamente superiores aos investimentos e depósitos que realiza no território nacional, a Venezuela encara conspirações e atos sucessivos de sabotagem política e econômica, desde a posse de Hugo Chávez, eleito em 1999, num pleito que rompeu um esquema café-com-leite que os brasileiros conheceram muito tem até 1930. Ele foi reeleito mais duas vezes, sempre por margens jamais contestadas, ainda que enfrentasse uma oposição cada vez mais ousada e inescrupulosa do ponto de vista dos valores democráticos.
Recordando: em 1999, uma primeira Constituinte foi simplesmente boicotada pela oposição, na esperança de que a maioria arrasadora do governo -- 121 votos num plenário de 130 -- levaria a uma crise e uma intervenção militar norte-americana. Nada. Três anos depois, tentou-se derrubar o governo eleito pela paralisação da PDVSA, a empresa de petróleo, principal e quase única fonte nacional de riqueza. A seguir, ocorreu um golpe de Estado, que incluiu o sequestro de Hugo Chávez. A reação popular impediu que o presidente fosse executado, garantiu o retorno de Chávez ao palácio consolidou o apoio das Forças Armadas ao governo.
Quando alguém reclamar de Maduro, lembre-se de Temer. Aqui, a oposição venezuelana chegou ao poder.
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