Por Ricardo Kotscho, em seu blog:
O que tem a ver minha avó materna alemã com os melancólicos últimos dias do ano do presidente Temer num cenário de fim de feira?
Tudo começou com um vídeo do começo dos anos 60 do século passado que o escriba amigo Humberto Werneck me mandou junto com os votos de feliz ano novo.
Mostra cenas do patético aniversário de 90 anos de uma aristocrática senhora alemã em sua mansão, na companhia apenas do mordomo, também um ancião.
A mesa foi posta para cinco comensais, mas os outros quatro já haviam morrido há mais de vinte anos.
O mordomo serviu vinho para madame e seus convidados, tropeçando a toda hora no tapete de pele de onça com a cabeça do bicho.
Depois de tomar ele mesmo as taças dos ausentes, o mordomo, cada vez mais tropego, foi trazendo os pratos para a aniversariante que parecia bem feliz.
Fez-me lembrar da oma Tünes, o apelido familiar de Florentine Heinz, que veio para o Brasil com meus pais depois da Segunda Guerra.
Também já a caminho dos noventa, sofrendo de artérioesclerose, minha vó de vez em quando resolvia oferecer um banquete aos seus amigos já mortos, com comidas finas, talheres de prata e porcelana alemã, tudo a que tinha direito.
Era difícil convencer Tünes de que a turma dela não viria por motivos de força maior. Minha mãe, chegando cansada do trabalho, ainda tinha que desmontar a festa.
Ao voltar da minha breve viagem pelo passado, fui dar uma sapeada nas notícias.
A fase não anda mesmo boa para o presidente que conseguiu sobreviver no cargo, mas parece que já não governa mais.
Em poucas horas, sofreu duros revezes.
Foi obrigado a refazer a portaria que praticamente revogava a Lei Áurea e agora prevê penas mais duras para quem explora o trabalho escravo.
E viu a presidente do STF, Carmen Lúcia, vetar parcialmente o seu generoso indulto de Natal em causa própria, atendendo a pedido da procuradora geral Raquel Dodge, por ele nomeada.
Ambas utilizaram palavras duras contra o ato do presidente, criando um novo atrito entre o Judiciário e o Executivo.
Para completar, Michel Temer se viu obrigado a cancelar sua viagem de férias para a praia de Mangaratiba, uma base militar no Rio, por razões médicas. Que fase…
Como minha avó e a aniversariante nonagenária, o presidente “reformista” parece viver em outra realidade e acreditar nas lorotas que conta, toda hora sendo obrigado a voltar atrás em suas decisões, meio perdido neste fim de feira federal.
Está explicado o motivo do título aparentemente estranho?
Nada mais deve nos parecer estranho nestes dias finais de 2017, um ano que não deveria nem ter começado.
Oma Tünes, que já não entendia português, certamente não entenderia mais nada.
Vida que segue.
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