Por Paulo Moreira Leite, em seu blog:
O país de 2018 é outro mas a reação de Lula é a mesma de 2006, quando o massacre da AP 470 se aproximava de seu gabinete no Planalto, estimulado por empresários, políticos e advogados que conspiravam por sua queda: "Manda dizer para a avenida Paulista que não vou fugir como Jango nem dar um tiro no peito como Getúlio".
No pronunciamento na Casa de Portugal, em 22 de janeiro, doze anos depois, Lula disse aos navegantes da mais profunda crise institucional que o país enfrenta desde 1964: "Não vou fugir, não vou me matar. Vou ficar aqui", disse.
O aqui não vem a ser um endereço geográfico, mas é a imensa nuvem da resistência brasileira, composta por militantes, dirigentes e aquela massa de homens e mulheres do povo que aparecem nessas horas, como um barbeiro que presta serviços num salão de Bertioga, professores com camiseta da Apeoesp, trabalhadores, bancários e alguns profissionais liberais do centro da cidade. Aqueles brasileiros e brasileiras que o acompanham em todos os lugares, como se fossem as mesmas pessoas, querendo as mesmas coisas, só com outra sonoridade na fala, seja no interior da Paraíba, no Norte de Minas Gerais, no Rio de Janeiro, em Picos, no Piauí.
Em 2006, eles bloquearam um golpe em gestação que, na visão do senador Jorge Bornhausen, um dos mais acabados cérebros que o conservadorismo radical já produziu no país, iria "nos livrar (a eles, bem entendido) dessa raça por 30 anos". Em 2018, eles garantem a Lula o lugar único numa campanha eleitoral na qual, unindo-se a sua volta, o Brasil pode ter a melhor chance de escapar - no último momento - de uma tragédia que pode prolongar-se por décadas de insanidade.
(Pelo menos um de seus adversários em 2018 admite que Lula é a única chance de unir o país para vencer o apocalipse mas não consegue imaginar seu retrato na urna eletrônica do TSE. Está convencido de que será caçado e cassado muito antes).
Num país onde o apoio popular à candidatura Lula é a força que domina a política e projeta nosso futuro a esse ponto, como o Pão de Açúcar na areia de Copacabana, só podendo ser vencida por vergonha, baionetas e muito sangue, todos estão interessados em seu "espólio", diz o próprio interessado, mais divertido do que indignado. Não deixa de incluir aí os "amigos e meio amigos".
"Quem quiser me tirar do jogo vai ter que arcar com as consequências de cometer um crime contra a Constituição", disse. "Eles estão numa situação mais difícil do que a minha. Sabem que mentiram". Diz que a Polícia Federal mentiu, o Ministério Público mentiu e que Sérgio Moro fez uma "sentença mentirosa lamentavelmente corroborada pelo TRF-4".
Num tom de voz levemente afetado de quem tenta imitar Tom Cavalcanti fazendo a paródia de Fátima Bernardes ele diz: " Ah, seria tão bom se o Dallagnol (Deltan Dallagnol, chefe da força tarefa da Lava Jato) tivesse aqui agora, gente. Poderia olhar para vocês e perceber se vocês pertencem a uma quadrilha, que ele diz que o PT é." Após uma pausa, encaixa um raciocínio sobre desigualdades e privilégios que ajudaram a produzir a Lava Jato: "na verdade ele irá perceber que aqui tem homens e mulheres que trabalharam, que não puderam estudar, mas foram responsáveis pelo pagamento do estudo que ele teve e muita gente da classe trabalhadora não conseguiu ter. E se ele conhecesse as pessoas que militam no PT ele não diria uma imbecilidade, de que o PT foi criado para roubar este país".
Em sua própria versão da Carta Testamento - sim, o país não vive dias banais como mostra o olhar da menina que teve a mochila revistada por soldados da intervenção federal - ele não escreverá "saio da vida para entrar na História". Não deixará de usar o humor para avançar suas ideias e rir sempre que puder, até sem querer. Afirma que irá ficar aqui até o fim da História, mesmo que o palco se transforme em cadafalso, porque esse comportamento ajuda 210 milhões - menos 1% - a permanecerem vivos e é assim que aprendeu a ficar em paz.
Aos 72 anos, completou um longo trajeto de quem deixou de ser torneiro-mecânico para se tornar quem é. Pode partilhar a emoção de milhões de outros sabendo que também é sua. Foi o que aconteceu ao ouvir o inesquecível discurso de formatura da bolsista de Direito da PUC-SP que não tremeu nem gaguejou para denunciar o preconceito de professores e dos próprios colegas. Seus cabelos raros e muito brancos fazem parte desse orgulho. Por isso fala em milhões de Lulas. Explica que "Lula" não é apenas uma pessoa, mas uma ideia, que tantos ajudaram a criar e por isso é possível ter esperança de que não vai desaparecer com ele. Por isso defende tanto o PT.
Não está interessado nas confissões patéticas dos conspiradores que, meio século após a tragédia de 1954, foram capazes de admitir que participaram de uma "revolução errada" contra os desamparados e nada podem fazer além de pedir desculpas póstumas - também ouvidas pelos protagonistas de 1964. Tem a firmeza de quem não pretende aliviar o serviço de seus carrascos e demais prestadores de serviço numa operação contra a democracia que opera no plano da obscenidade política e já deixou de respeitar os mesmos "escrúpulos de consciência" que aprovaram o AI-5 em 1968, exatamente 50 anos atrás.
Deixa claro que não pretende perder uma única oportunidade de lutar até o fim - seja lá quando e como vier.
O país de 2018 é outro mas a reação de Lula é a mesma de 2006, quando o massacre da AP 470 se aproximava de seu gabinete no Planalto, estimulado por empresários, políticos e advogados que conspiravam por sua queda: "Manda dizer para a avenida Paulista que não vou fugir como Jango nem dar um tiro no peito como Getúlio".
No pronunciamento na Casa de Portugal, em 22 de janeiro, doze anos depois, Lula disse aos navegantes da mais profunda crise institucional que o país enfrenta desde 1964: "Não vou fugir, não vou me matar. Vou ficar aqui", disse.
O aqui não vem a ser um endereço geográfico, mas é a imensa nuvem da resistência brasileira, composta por militantes, dirigentes e aquela massa de homens e mulheres do povo que aparecem nessas horas, como um barbeiro que presta serviços num salão de Bertioga, professores com camiseta da Apeoesp, trabalhadores, bancários e alguns profissionais liberais do centro da cidade. Aqueles brasileiros e brasileiras que o acompanham em todos os lugares, como se fossem as mesmas pessoas, querendo as mesmas coisas, só com outra sonoridade na fala, seja no interior da Paraíba, no Norte de Minas Gerais, no Rio de Janeiro, em Picos, no Piauí.
Em 2006, eles bloquearam um golpe em gestação que, na visão do senador Jorge Bornhausen, um dos mais acabados cérebros que o conservadorismo radical já produziu no país, iria "nos livrar (a eles, bem entendido) dessa raça por 30 anos". Em 2018, eles garantem a Lula o lugar único numa campanha eleitoral na qual, unindo-se a sua volta, o Brasil pode ter a melhor chance de escapar - no último momento - de uma tragédia que pode prolongar-se por décadas de insanidade.
(Pelo menos um de seus adversários em 2018 admite que Lula é a única chance de unir o país para vencer o apocalipse mas não consegue imaginar seu retrato na urna eletrônica do TSE. Está convencido de que será caçado e cassado muito antes).
Num país onde o apoio popular à candidatura Lula é a força que domina a política e projeta nosso futuro a esse ponto, como o Pão de Açúcar na areia de Copacabana, só podendo ser vencida por vergonha, baionetas e muito sangue, todos estão interessados em seu "espólio", diz o próprio interessado, mais divertido do que indignado. Não deixa de incluir aí os "amigos e meio amigos".
"Quem quiser me tirar do jogo vai ter que arcar com as consequências de cometer um crime contra a Constituição", disse. "Eles estão numa situação mais difícil do que a minha. Sabem que mentiram". Diz que a Polícia Federal mentiu, o Ministério Público mentiu e que Sérgio Moro fez uma "sentença mentirosa lamentavelmente corroborada pelo TRF-4".
Num tom de voz levemente afetado de quem tenta imitar Tom Cavalcanti fazendo a paródia de Fátima Bernardes ele diz: " Ah, seria tão bom se o Dallagnol (Deltan Dallagnol, chefe da força tarefa da Lava Jato) tivesse aqui agora, gente. Poderia olhar para vocês e perceber se vocês pertencem a uma quadrilha, que ele diz que o PT é." Após uma pausa, encaixa um raciocínio sobre desigualdades e privilégios que ajudaram a produzir a Lava Jato: "na verdade ele irá perceber que aqui tem homens e mulheres que trabalharam, que não puderam estudar, mas foram responsáveis pelo pagamento do estudo que ele teve e muita gente da classe trabalhadora não conseguiu ter. E se ele conhecesse as pessoas que militam no PT ele não diria uma imbecilidade, de que o PT foi criado para roubar este país".
Em sua própria versão da Carta Testamento - sim, o país não vive dias banais como mostra o olhar da menina que teve a mochila revistada por soldados da intervenção federal - ele não escreverá "saio da vida para entrar na História". Não deixará de usar o humor para avançar suas ideias e rir sempre que puder, até sem querer. Afirma que irá ficar aqui até o fim da História, mesmo que o palco se transforme em cadafalso, porque esse comportamento ajuda 210 milhões - menos 1% - a permanecerem vivos e é assim que aprendeu a ficar em paz.
Aos 72 anos, completou um longo trajeto de quem deixou de ser torneiro-mecânico para se tornar quem é. Pode partilhar a emoção de milhões de outros sabendo que também é sua. Foi o que aconteceu ao ouvir o inesquecível discurso de formatura da bolsista de Direito da PUC-SP que não tremeu nem gaguejou para denunciar o preconceito de professores e dos próprios colegas. Seus cabelos raros e muito brancos fazem parte desse orgulho. Por isso fala em milhões de Lulas. Explica que "Lula" não é apenas uma pessoa, mas uma ideia, que tantos ajudaram a criar e por isso é possível ter esperança de que não vai desaparecer com ele. Por isso defende tanto o PT.
Não está interessado nas confissões patéticas dos conspiradores que, meio século após a tragédia de 1954, foram capazes de admitir que participaram de uma "revolução errada" contra os desamparados e nada podem fazer além de pedir desculpas póstumas - também ouvidas pelos protagonistas de 1964. Tem a firmeza de quem não pretende aliviar o serviço de seus carrascos e demais prestadores de serviço numa operação contra a democracia que opera no plano da obscenidade política e já deixou de respeitar os mesmos "escrúpulos de consciência" que aprovaram o AI-5 em 1968, exatamente 50 anos atrás.
Deixa claro que não pretende perder uma única oportunidade de lutar até o fim - seja lá quando e como vier.
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