Por Luis Nassif, no Jornal GGN:
O filme “O Processo”, documentário da cineasta Maria Augusta Ramos, sobre o impeachment, tem dois personagens principais.
Um deles, falante, retórico, excepcional orador é o ex-Ministro José Eduardo Cardoso, sem o qual não teria sido possível nem o filme, nem o impeachment.
O outro, quieto, impassível, irredutível a qualquer argumento, o relator do pedido de admissibilidade da Comissão de Justiça do Senado, e principal artífice político do impeachment, Antonio Anastasia.
Agora, a mídia começou a dança ritual da autofagia, com Urano devorando seus filhos, no caso Aécio Neves. É uma falsa demonstração de isenção, porque inútil, sem riscos e em cima de um pato manco. Mas, ao mesmo tempo, é impressionante a revelação da estrutura de corrupção montada por Aécio, a maneira como atuou em todas as instâncias, em todos os campos, e com total desfaçatez. Desmente totalmente a visão de Aécio como o adolescente mimado, porque problemático, sendo conduzido pela mão. Era o chefão.
No entanto, nada disso teria sido possível sem a participação discreta de Anastasia. Mas tão discreta que tem sido poupado de todas as investigações, apesar da notoriedade adquirida como agente principal do impeachment.
Se tudo fosse como “O Poderoso Chefão”, na imagem pretensamente criativa de Sérgio Moro, Antonio Anastasia seria Tom Hagen, o conseglieri interpretado por Robert Duval; e Aécio Neves o Santino “Sonny” Corleone, o filho imprudente e violento de Don Corleone, interpretado por James Caan.
Na qualidade de vice-governador, na gestão 2007-2010 de Aécio, Anastasia comandou o “choque de gestão”, uma tentativa de implantar ferramentas gerenciais e de responsabilidade fiscal no Estado. Não sujou as mãos diretamente nas três grandes tacadas de Aécio: a Cidade Administrativa, os negócios envolvendo a Andrade Gutierrez e a Cemig e as operações com Dimas Toledo, o Marcos Valério de Furnas.
Mas foi a âncora central do governo Aécio, responsável pela principal vitrine, o “choque de gestão” e pelo governo de fato, o interino permanente de um governador que, de 2007 a 2010, preferia o Leblon a Belo Horizonte.
Por tudo isso, é didático comparar o voto de Anastasia, no relatório do impeachment, com o papel de Anastasia, como governador de fato e, depois, de direito de Minas. É uma belíssima introdução ao estudo da hipocrisia na política nacional, porque tendo como personagem central um professor centrado, preparado, e não as bestas-feras do Congresso, que berravam em nome das famílias, das mães, dos filhos e depois ia comemorar com as amantes até a próxima volta do parafuso da Lava Jato.
Anastasia iludiu a muitos. E me incluo no campo dos iludidos. A máscara começou a cair após o jogo de cena do Senado e dos levantamentos feitos pelo sucessor sobre as contas de Minas.
Peça 1 – o voto do relator Anastasia
O voto de Anastasia, pela admissibilidade do processo do impeachment, é uma apologia inesquecível à responsabilidade fiscal.
Responsabilidade fiscal como âncora da República
Na parte conceitual, diz ele, no voto a favor da admissibilidade do pedido de impeachment
"O tema orçamentário, com a correta gestão dos recursos públicos, é tão sensível para o regime republicano brasileiro que, em todas as Constituições do Brasil (exceto a Carta outorgada de 1937) (…) constaram disposições expressas qualificando como crime de responsabilidade do Presidente da República os atos que atentem contra a lei orçamentária, demonstrando a relevância do cumprimento da norma orçamentária para o regime democrático."
Foi dramático, para acentuar a gravidade dos episódios analisados:
Está em risco, neste momento, a preservação de um regime de responsabilidade fiscal conquistado a duras penas."
Sacou dos manuais e de sua enorme experiência com o choque de gestão de Minas, os princípios básicos da responsabilidade fiscal:
"O sentido último desses crimes poderia ser resumido em duas admoestações ao administrador público: 1) é proibido gastar mais do que se arrecada; 2) é proibido comprometer o orçamento mais do que está permitido pelo Poder Legislativo"
A tipificação dos crimes de responsabilidade
Definidos os conceitos, Anastasia passou à tipificação dos supostos crimes cometidos.
Primeiro, o edição de decretos antes da aprovação pelo Congresso, mero problema formal. Foram apenas remanejamentos de despesas, e não criação de novas despesas, conforme explicado pela defesa de Dilma. Enfatizou que alguns dos decretos foram promulgados no bimestre em que as contas públicas estavam no vermelho. A defesa explicou fechado o ano, o orçamento já estava em conformidade com a Lei.
Mas Anastasia tratou de criminalizar um bimestre de déficit, uma mancha indesculpável na sacralidade da responsabilidade fiscal:
A LRF não se limitou a exigir o estabelecimento de metas anuais. Por se pautar na prevenção de riscos e correção de desvios, a lei exige que as metas de resultado primário, conquanto sejam fixadas em bases anuais, sejam monitoradas ao longo do ano mediante pontos de controle bimestrais e quadrimestrais. Não fosse assim, estariam as metas anuais expostas a toda sorte de dinâmicas que, no limite, poderiam dar azo a justificativas centradas em esperançosas “apostas de fim de ano”."
Segundo, os atrasos no ressarcimento dos bancos públicos, interpretados como empréstimo.
"Quanto à contratação de operações de crédito, a suposta ilegalidade teria decorrido, principalmente, da inobservância do disposto no art. 36 da LRF, o qual veda a realização de operação de crédito entre uma instituição financeira estatal e o ente da Federação que a controle, na qualidade de beneficiário do empréstimo”.
De nada adiantou a defesa explicar que não poderia ser operação de crédito, pois não tinha contrato assinado nem data de vencimento definida. E que os atrasos foram colocados em dia. No final do ano, em que pese a crise fiscal, não havia sido criada nenhuma despesa adicional, ao que previa o orçamento.
Entendidos esses pontos, vamos tirar Anastasia de sua cadeira cômoda de gendarme da responsabilidade fiscal e analisar o Anastasia gestor.
Peça 2 – Anastasia como maestro principal do choque de gestão
Inflou o cálculo da Receita Corrente Líquida (RCL).
A RCL é base de toda a Lei de Responsabilidade Fiscal, utilizado como parâmetro para cálculos dos principais indicadores, como gasto com pessoal e nível de endividamento.
Segundo a LRF, o cálculo da RCL deve ser feito somando-se as receitas arrecadadas no mês em referência e nos onze anteriores, considerando-se algumas deduções e excluindo-se as duplicidades.
Entre 2003 e 2007, o governo de Minas deixou de deduzir da RCL vários itens, como contribuição patronal para a previdência social, para a saúde, contribuição do servidor para a saúde etc. Com isso inflou em 6 a 10% a RCL, em relação àquela calculada pelo Tribunal de Contas do Estado, com consequências diretas sobre as contas públicas.
Aumento do endividamento
Essa manipulação do numerador, ajudou a inflar os resultados do “choque fiscal” e, com esse artifício, a voltar mais cedo para o mercado de crédito.
Em 2009, para um resultado orçamentário de R$ 566 milhões, as as operações de crédito foram de R$ 1,5 bilhão. Com a conta correta, transformou um déficit de R$ 1 bilhão em um falso superávit
A DLC (Dívida Líquida Consolidada) saltou de de R$ 30,5 bilhões em 2002 para R$ 60,5 bilhões em 2010. Mas o mago Anastasia divulgava anualmente superávits inexistentes.
Peça 3 – Anastasia como governador
A manipulação do fundo previdenciário
Como governador, Anastasia cometeu um dos maiores saques contra o futuro fiscal do Minas.
Hoje em dia, o grande peso das contas estaduais está na previdência, com funcionários se aposentando sem a constituição de reservas matemáticas capazes de garantir seus direitos.
Minas Gerais gera R$ 7 bilhões de superávit fiscal. Com Previdência Social, há um gasto anual de R$ 22 bilhões e apenas R$ 5 bilhões de contribuições recolhidas. Metade da folha do Estado, hoje em dia, é de aposentados.
A construção de um sistema previdenciário é desafio de longo prazo.
Em 2003, o governador Itamar Franco – tido como irresponsável no plano fiscal – fez segregação da massa de aposentados. A partir dali, haveria um fundo equilibrado, 65 mil pessoas que ingressaram na aposentadoria, e um fundo com patrimônio de R$ 3 bilhões. Com isso, e outras jogadas, o déficit orçamentário de 2003 caiu de R$ 7 bilhões para R$ 3 bilhões.
À revelia do Ministério da Previdência, Antônio Anastasia extinguiu o fundo e trouxe aposentados e recursos para o orçamento. Com a manobra, maquiou as contas em um ano, e jogou 65 mil aposentados para dentro do orçamento. Ou seja, para resolver seu problema de um ano, comprometeu o orçamento estadual por décadas.
Em 2014, o déficit previdenciário era de R$ 9 bilhões. Hoje em dia, saltou para R$ 16 bilhões. São 200 mil aposentados, 20 mil com idade acima de 80 anos.
Voltemos à página 57, do relatório do impeachment. Vale a repetição para enfatizar a alta dose de hipocrisia do impeachment e a irresponsabilidade fiscal de quem se autonomeou o tutor da responsabilidade fiscal
"O tema orçamentário, com a correta gestão dos recursos públicos, é tão sensível para o regime republicano brasileiro que, em todas as Constituições do Brasil (exceto a Carta outorgada de 1937), conforme bem lembrou o Deputado Jovair Arantes em seu Relatório aprovado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, constaram disposições expressas qualificando como crime de responsabilidade do Presidente da República os atos que atentem contra a lei orçamentária, demonstrando a relevância do cumprimento da norma orçamentária para o regime democrático."
Reajustes da folha
Só os reajustes concedidos no último ano do governo Anastasia impactaram a folha em R$ 2,7 bilhões.
Os dividendos da Cemig
No apagar das luzes, foi apresentado uma previsão orçamentária manipulada, inflando a receita patrimonial com previsão de dividendos da Cemig da ordem de R$ 4,8 bilhões, contra uma média de R$ 2 bilhões dos anos anteriores. As reestimativas indicaram um déficit da ordem de R$ 7,3 bilhões.
Manipulando os dados da saúde
Pela Emenda Constitucional no. 29, de 29/05/1950, há percentual mínimo de 12% da RCL para financiamento da saúde. Os dados oficiais indicavam mais que 12% do orçamento em saúde. As estatísticas do SIOPS (Sistema de Informações sobre Orçamento Público em Saúde), vinculado ao Ministério da Saúde, indicavam quase metade da meta.
O que o governo mineiro fez foi aproveitar a não regulamentação das despesas para incluir gastos com “Polícia Militar de Minas Gerais, Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais, Secretaria do Estado de Defesa Social, IPSEMG, Fundação Estadual de Meio Ambiente, Instituto da Previdência dos Servidores Militares do Estado de Minas Gerais, Fundo de Apoio Habitacional da Assembleia Legislativa (FUNDHAB)”.
Com isso, conseguiu disfarçar déficits orçamentários em quase todo o período, agravando nos dois últimos anos.
Peça 4 – Anastasia candidato ao governo
Candidatando-se novamente a governador, com a herança de Aécio Neves sendo revelada a todo instante, é possível que, finalmente, cesse a blindagem de Anastasia. E a opinião pública seja informada de como uma belíssima vocação de homem público acabou subordinada ao que de pior a política mineira produziu desde o governo Newton Cardoso.
O filme “O Processo”, documentário da cineasta Maria Augusta Ramos, sobre o impeachment, tem dois personagens principais.
Um deles, falante, retórico, excepcional orador é o ex-Ministro José Eduardo Cardoso, sem o qual não teria sido possível nem o filme, nem o impeachment.
O outro, quieto, impassível, irredutível a qualquer argumento, o relator do pedido de admissibilidade da Comissão de Justiça do Senado, e principal artífice político do impeachment, Antonio Anastasia.
Agora, a mídia começou a dança ritual da autofagia, com Urano devorando seus filhos, no caso Aécio Neves. É uma falsa demonstração de isenção, porque inútil, sem riscos e em cima de um pato manco. Mas, ao mesmo tempo, é impressionante a revelação da estrutura de corrupção montada por Aécio, a maneira como atuou em todas as instâncias, em todos os campos, e com total desfaçatez. Desmente totalmente a visão de Aécio como o adolescente mimado, porque problemático, sendo conduzido pela mão. Era o chefão.
No entanto, nada disso teria sido possível sem a participação discreta de Anastasia. Mas tão discreta que tem sido poupado de todas as investigações, apesar da notoriedade adquirida como agente principal do impeachment.
Se tudo fosse como “O Poderoso Chefão”, na imagem pretensamente criativa de Sérgio Moro, Antonio Anastasia seria Tom Hagen, o conseglieri interpretado por Robert Duval; e Aécio Neves o Santino “Sonny” Corleone, o filho imprudente e violento de Don Corleone, interpretado por James Caan.
Na qualidade de vice-governador, na gestão 2007-2010 de Aécio, Anastasia comandou o “choque de gestão”, uma tentativa de implantar ferramentas gerenciais e de responsabilidade fiscal no Estado. Não sujou as mãos diretamente nas três grandes tacadas de Aécio: a Cidade Administrativa, os negócios envolvendo a Andrade Gutierrez e a Cemig e as operações com Dimas Toledo, o Marcos Valério de Furnas.
Mas foi a âncora central do governo Aécio, responsável pela principal vitrine, o “choque de gestão” e pelo governo de fato, o interino permanente de um governador que, de 2007 a 2010, preferia o Leblon a Belo Horizonte.
Por tudo isso, é didático comparar o voto de Anastasia, no relatório do impeachment, com o papel de Anastasia, como governador de fato e, depois, de direito de Minas. É uma belíssima introdução ao estudo da hipocrisia na política nacional, porque tendo como personagem central um professor centrado, preparado, e não as bestas-feras do Congresso, que berravam em nome das famílias, das mães, dos filhos e depois ia comemorar com as amantes até a próxima volta do parafuso da Lava Jato.
Anastasia iludiu a muitos. E me incluo no campo dos iludidos. A máscara começou a cair após o jogo de cena do Senado e dos levantamentos feitos pelo sucessor sobre as contas de Minas.
Peça 1 – o voto do relator Anastasia
O voto de Anastasia, pela admissibilidade do processo do impeachment, é uma apologia inesquecível à responsabilidade fiscal.
Responsabilidade fiscal como âncora da República
Na parte conceitual, diz ele, no voto a favor da admissibilidade do pedido de impeachment
"O tema orçamentário, com a correta gestão dos recursos públicos, é tão sensível para o regime republicano brasileiro que, em todas as Constituições do Brasil (exceto a Carta outorgada de 1937) (…) constaram disposições expressas qualificando como crime de responsabilidade do Presidente da República os atos que atentem contra a lei orçamentária, demonstrando a relevância do cumprimento da norma orçamentária para o regime democrático."
Foi dramático, para acentuar a gravidade dos episódios analisados:
Está em risco, neste momento, a preservação de um regime de responsabilidade fiscal conquistado a duras penas."
Sacou dos manuais e de sua enorme experiência com o choque de gestão de Minas, os princípios básicos da responsabilidade fiscal:
"O sentido último desses crimes poderia ser resumido em duas admoestações ao administrador público: 1) é proibido gastar mais do que se arrecada; 2) é proibido comprometer o orçamento mais do que está permitido pelo Poder Legislativo"
A tipificação dos crimes de responsabilidade
Definidos os conceitos, Anastasia passou à tipificação dos supostos crimes cometidos.
Primeiro, o edição de decretos antes da aprovação pelo Congresso, mero problema formal. Foram apenas remanejamentos de despesas, e não criação de novas despesas, conforme explicado pela defesa de Dilma. Enfatizou que alguns dos decretos foram promulgados no bimestre em que as contas públicas estavam no vermelho. A defesa explicou fechado o ano, o orçamento já estava em conformidade com a Lei.
Mas Anastasia tratou de criminalizar um bimestre de déficit, uma mancha indesculpável na sacralidade da responsabilidade fiscal:
A LRF não se limitou a exigir o estabelecimento de metas anuais. Por se pautar na prevenção de riscos e correção de desvios, a lei exige que as metas de resultado primário, conquanto sejam fixadas em bases anuais, sejam monitoradas ao longo do ano mediante pontos de controle bimestrais e quadrimestrais. Não fosse assim, estariam as metas anuais expostas a toda sorte de dinâmicas que, no limite, poderiam dar azo a justificativas centradas em esperançosas “apostas de fim de ano”."
Segundo, os atrasos no ressarcimento dos bancos públicos, interpretados como empréstimo.
"Quanto à contratação de operações de crédito, a suposta ilegalidade teria decorrido, principalmente, da inobservância do disposto no art. 36 da LRF, o qual veda a realização de operação de crédito entre uma instituição financeira estatal e o ente da Federação que a controle, na qualidade de beneficiário do empréstimo”.
De nada adiantou a defesa explicar que não poderia ser operação de crédito, pois não tinha contrato assinado nem data de vencimento definida. E que os atrasos foram colocados em dia. No final do ano, em que pese a crise fiscal, não havia sido criada nenhuma despesa adicional, ao que previa o orçamento.
Entendidos esses pontos, vamos tirar Anastasia de sua cadeira cômoda de gendarme da responsabilidade fiscal e analisar o Anastasia gestor.
Peça 2 – Anastasia como maestro principal do choque de gestão
Inflou o cálculo da Receita Corrente Líquida (RCL).
A RCL é base de toda a Lei de Responsabilidade Fiscal, utilizado como parâmetro para cálculos dos principais indicadores, como gasto com pessoal e nível de endividamento.
Segundo a LRF, o cálculo da RCL deve ser feito somando-se as receitas arrecadadas no mês em referência e nos onze anteriores, considerando-se algumas deduções e excluindo-se as duplicidades.
Entre 2003 e 2007, o governo de Minas deixou de deduzir da RCL vários itens, como contribuição patronal para a previdência social, para a saúde, contribuição do servidor para a saúde etc. Com isso inflou em 6 a 10% a RCL, em relação àquela calculada pelo Tribunal de Contas do Estado, com consequências diretas sobre as contas públicas.
Aumento do endividamento
Essa manipulação do numerador, ajudou a inflar os resultados do “choque fiscal” e, com esse artifício, a voltar mais cedo para o mercado de crédito.
Em 2009, para um resultado orçamentário de R$ 566 milhões, as as operações de crédito foram de R$ 1,5 bilhão. Com a conta correta, transformou um déficit de R$ 1 bilhão em um falso superávit
A DLC (Dívida Líquida Consolidada) saltou de de R$ 30,5 bilhões em 2002 para R$ 60,5 bilhões em 2010. Mas o mago Anastasia divulgava anualmente superávits inexistentes.
Peça 3 – Anastasia como governador
A manipulação do fundo previdenciário
Como governador, Anastasia cometeu um dos maiores saques contra o futuro fiscal do Minas.
Hoje em dia, o grande peso das contas estaduais está na previdência, com funcionários se aposentando sem a constituição de reservas matemáticas capazes de garantir seus direitos.
Minas Gerais gera R$ 7 bilhões de superávit fiscal. Com Previdência Social, há um gasto anual de R$ 22 bilhões e apenas R$ 5 bilhões de contribuições recolhidas. Metade da folha do Estado, hoje em dia, é de aposentados.
A construção de um sistema previdenciário é desafio de longo prazo.
Em 2003, o governador Itamar Franco – tido como irresponsável no plano fiscal – fez segregação da massa de aposentados. A partir dali, haveria um fundo equilibrado, 65 mil pessoas que ingressaram na aposentadoria, e um fundo com patrimônio de R$ 3 bilhões. Com isso, e outras jogadas, o déficit orçamentário de 2003 caiu de R$ 7 bilhões para R$ 3 bilhões.
À revelia do Ministério da Previdência, Antônio Anastasia extinguiu o fundo e trouxe aposentados e recursos para o orçamento. Com a manobra, maquiou as contas em um ano, e jogou 65 mil aposentados para dentro do orçamento. Ou seja, para resolver seu problema de um ano, comprometeu o orçamento estadual por décadas.
Em 2014, o déficit previdenciário era de R$ 9 bilhões. Hoje em dia, saltou para R$ 16 bilhões. São 200 mil aposentados, 20 mil com idade acima de 80 anos.
Voltemos à página 57, do relatório do impeachment. Vale a repetição para enfatizar a alta dose de hipocrisia do impeachment e a irresponsabilidade fiscal de quem se autonomeou o tutor da responsabilidade fiscal
"O tema orçamentário, com a correta gestão dos recursos públicos, é tão sensível para o regime republicano brasileiro que, em todas as Constituições do Brasil (exceto a Carta outorgada de 1937), conforme bem lembrou o Deputado Jovair Arantes em seu Relatório aprovado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, constaram disposições expressas qualificando como crime de responsabilidade do Presidente da República os atos que atentem contra a lei orçamentária, demonstrando a relevância do cumprimento da norma orçamentária para o regime democrático."
Reajustes da folha
Só os reajustes concedidos no último ano do governo Anastasia impactaram a folha em R$ 2,7 bilhões.
Os dividendos da Cemig
No apagar das luzes, foi apresentado uma previsão orçamentária manipulada, inflando a receita patrimonial com previsão de dividendos da Cemig da ordem de R$ 4,8 bilhões, contra uma média de R$ 2 bilhões dos anos anteriores. As reestimativas indicaram um déficit da ordem de R$ 7,3 bilhões.
Manipulando os dados da saúde
Pela Emenda Constitucional no. 29, de 29/05/1950, há percentual mínimo de 12% da RCL para financiamento da saúde. Os dados oficiais indicavam mais que 12% do orçamento em saúde. As estatísticas do SIOPS (Sistema de Informações sobre Orçamento Público em Saúde), vinculado ao Ministério da Saúde, indicavam quase metade da meta.
O que o governo mineiro fez foi aproveitar a não regulamentação das despesas para incluir gastos com “Polícia Militar de Minas Gerais, Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais, Secretaria do Estado de Defesa Social, IPSEMG, Fundação Estadual de Meio Ambiente, Instituto da Previdência dos Servidores Militares do Estado de Minas Gerais, Fundo de Apoio Habitacional da Assembleia Legislativa (FUNDHAB)”.
Com isso, conseguiu disfarçar déficits orçamentários em quase todo o período, agravando nos dois últimos anos.
Peça 4 – Anastasia candidato ao governo
Candidatando-se novamente a governador, com a herança de Aécio Neves sendo revelada a todo instante, é possível que, finalmente, cesse a blindagem de Anastasia. E a opinião pública seja informada de como uma belíssima vocação de homem público acabou subordinada ao que de pior a política mineira produziu desde o governo Newton Cardoso.
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